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O Globo: Relatório sobre opositores ‘é crime muito grave’, afirma Raul Jungmann

Para ele, este tipo de monitoramento é vedado pela lei, e a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) tem estrutura suficiente para produzir informações de qualidade

Vinicius Sassine, O Globo

BRASÍLIA — O ex-ministro Raul Jungmann afirma que a produção de um dossiê contra opositores do presidente Jair Bolsonaro é um “crime muito grave” e que é preciso identificar e punir a “cadeia de responsabilidade que está acima”. Para ele, este tipo de monitoramento é vedado pela lei, e a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) tem estrutura suficiente para produzir informações de qualidade.

Por que gasta-se mais com ações de inteligência e de segurança na Presidência da República, na sua visão?

Os protocolos de segurança presidencial elevam o nível de exigência. Numa tentativa de interpretação minha, no caso do presidente Bolsonaro, o fato de ter sofrido um atentado contra a vida dele efetivamente fez com que se ampliassem os dispositivos e o pessoal na área de segurança.

E com inteligência?

Há dois tipos de inteligência. Uma voltada a gerar informações para decisões, para o uso pelo presidente. Isto é feito pelo GSI, com o suporte da Abin. E há a inteligência policial. Isto está na própria lei do Sistema Brasileiro de Inteligência. O controle desta última é feito pelo Ministério Público Federal. Já a inteligência como suporte à tomada de decisão não tem a característica policial, portanto não pode monitorar grupos de pessoas, a não ser com autorização judicial. E está sob controle de comissão do Congresso.

Os dois tipos de inteligência são passíveis de controle.

Sim. O relatório da secretaria do Ministério da Justiça (de monitoramento de grupos antifascistas) só poderia ter ocorrido com autorização e controle judicial. A lei de criação da Abin, que é o órgão central do sistema, não permite monitoramento. Não há autorização. Eles não podem grampear, monitorar, nem com autorização judicial.

Quão grave é a elaboração desse relatório?

Um órgão de inteligência transgrediu a lei, cometeu um delito. É preciso identificar os responsáveis, em que nível houve essa ordem política. Esta ordem claramente atenta contra direitos e garantias constitucionais e, portanto, contra a própria democracia. É um crime muito grave. É preciso identificar a cadeia de responsabilidade. É algo que tem de ser exemplarmente identificado e punido. Preocupa por ter se dado dentro do aparato de Estado.

O presidente fez mudanças na Abin. Havia necessidade?

Não tenho em mãos a avaliação, mas acredito que a Abin, até o momento em que estivemos no governo, tinha uma estrutura. Dispõe de quadros qualificados e gera informações eficientes. Aquela estrutura era suficiente. O que é fundamental é que essa estrutura tem de estar sob o controle do Congresso, obedecer a lei e jamais se confundir com inteligência policial.


El País: Ministro da Justiça admite monitoramento de grupo antifascista em depoimento no Congresso

Em sessão sigilosa a que o EL PAÍS teve acesso, André Mendonça minimiza dossiê produzido por sua pasta e diz que Bolsonaro e Lewandowski, do STF, foram monitorados na gestão Dilma

O ministro da Justiça, André Mendonça, admitiu que uma secretaria subordinada a ele produziu um extenso relatório com informações sobre 579 servidores públicos da área de segurança pública, policiais e professores universitários que se alinham com o movimento antifascista. A declaração foi feita em um depoimento sigiloso na tarde desta sexta-feira em sessão virtual da Comissão de Controle das Atividades de Inteligência do Congresso Nacional. É a primeira vez que algum representante do Governo Jair Bolsonaro (sem partido) admite a existência do documento. “Fui me deparar pela primeira vez com um relatório de inteligência justamente em função deste caso concreto, o relatório existe”, afirmou ao grupo de 12 deputados e senadores que participaram do encontro.

A existência do documento foi revelada pelo UOL e acendeu alerta entre organismos de direitos humanos e críticos de Bolsonaro, que veem no monitoramento o desejo do Planalto de criar uma “polícia política”. Um de seus alvos, o antropólogo e ex-secretário nacional de Segurança Pública, Luiz Eduardo Soares, disse que Bolsonaro conseguiu realizar o seu sonho e recriar o Serviço Nacional de Informações aos moldes do existente na ditadura militar.

O jornal EL PAÍS teve acesso a parte da explanação do ministro, que respondeu aos questionamentos dos congressistas. Em sua fala, ele se queixou do termo dossiê antifascista usado pela imprensa que revelou a produção do documento. Mendonça disse que se trata de um relatório de inteligência e seria legal, apesar de sigiloso, enquanto que o dossiê, em sua análise é um termo pejorativo, que demonstra que algo irregular tem sido feito.

“Dossiê é algo feito às escuras, para fins indevidos, que não está no sistema, que não está documentado formalmente. Dossiê é algo que você não distribui para órgãos públicos de inteligência de todo os Estados da Federação.” Segundo ele, o documento foi distribuído para todos os órgãos do Sistema Brasileiro de Inteligência e para os órgãos do subsistema de inteligência e segurança pública. Ou seja, para as secretarias estaduais, inclusive de governos que são de oposição a Bolsonaro.

O ministro minimizou a gravidade da situação e disse que é natural que o Governo monitore eventos que possam resultar na intervenção de agentes de segurança pública. Nos 30 minutos de fala ao qual a reportagem teve acesso, Mendonça citou outros sete relatórios produzidos por secretarias do Ministério da Justiça, entre 2013 e 2016 – durante a gestão Dilma Rousseff – em que militantes, políticos, entre eles o atual presidente Jair Bolsonaro, e até um juiz do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski, eram alvos do monitoramento. Nesse grupo de relatórios, estavam as avaliações da pasta sobre os movimentos pelo impeachment de Dilma, greves na área de segurança e de reivindicações feitas por agentes públicos.

Entre os monitorados nos anos petistas, conforme Mendonça disse aos congressistas, também estavam o atual secretário de Política Econômica do Ministério da Economia, Adolfo Sachsida, o senador José Serra (PSDB-SP), os deputados e ex-deputados federais Aécio Neves (PSDB-MG), Roberto Freire (Cidadania-SP) e Darcísio Perondi (MDB-RS), além de militantes dos movimentos Brasil Livre – Kim Kataguiri (atual deputado pelo DEM), Renan Santos e Fernando Holiday (hoje vereador em SP) –, do Nas Ruas, Bia Kicis (hoje deputado pelo PSL) e do Vem Pra Rua, Rogério Chequer (candidato derrotado ao Governo de SP pelo NOVO). “Essas pessoas são perigosas? Não são, mas estavam envolvidas em movimentos, em atividades que demandavam atenção das áreas de segurança pública”. Todas elas, em algum momento, participaram de protestos ou se manifestaram publicamente a favor da destituição de Dilma.

Ao defender a produção do dossiê antifascista, o ministro da Justiça disse que não fez nenhum juízo de valor sobre os monitorados e não atribui delitos a elas. “Não há no âmbito do ministério nenhuma investigação contra as pessoas citadas nesse relatório de 2020. Assim como não há aqui naqueles de 2013. A atividade de inteligência não é atividade com relação a crime. Ela envolve também crime. Mas são atividades para prevenção na área de segurança”.

Mendonça também tratou da demissão de Gilson Libório da Diretoria de Inteligência da Secretaria de Operações Integradas (Seopi), o órgão que assinou o documento. “Embora não tenha verificado nenhuma ilicitude, a situação trouxe uma dúvida sobre a regularidade dos procedimentos. Eu avaliei, sem fazer juízo de negativo de valor nenhum à conduta do Libório, que tínhamos de garantir e demonstrar a total imparcialidade na condução da sindicância e, para isso, ele precisaria não estar mais lá”. O novo diretor da Seopi é o delegado da Polícia Federal Thiago Marcantonio Ferreira. A reunião durou cerca de três horas.


Ricardo Noblat: Ministro da Justiça topa depor em segredo sobre servidores monitorados

Mendonça nada aprendeu com Tancredo Neves

André Mendonça, ministro da Justiça, não precisaria ter nascido em Minas Gerais para aprender com o ex-presidente Tancredo Neves o que ele dizia sobre segredos e conversas sigilosas. Uma vez, ao ouvir de um interlocutor que tinha um segredo, mas que só lhe contaria se ele prometesse guardar, Tancredo respondeu:

– Então não me conte. Se você, que é o dono do segredo, não consegue guardá-lo, imagine eu.

Outra vez, já candidato a presidente da República em 1984, cercado por jornalistas interessados em conversar com ele mesmo que fosse de maneira reservada e sob o compromisso de nada publicarem, Tancredo concordou, mas fez antes uma ressalva:

– E então, vamos conversar? Mas não em sigilo. Esta é a maneira mais rápida, eficiente e segura de se propagar por todo o país quem disse, o quê e onde.

É verdade que pelo menos uma vez, Tancredo convocou jornalistas em Brasília e advertiu-os de antemão: “Se o que lhes direi for publicado, nunca mais direi nada”. E contou que o então presidente João Figueiredo faria uma reforma ministerial para fortalecer a candidatura de Paulo Maluf à sua sucessão.

Em seguida, Tancredo disse quais ministros seriam demitidos, e deu o nome dos seus substitutos. Não havia redes sociais à época. No dia seguinte, sem citarem Tancredo, os jornais publicaram o que ouviram dele. Furioso com o vazamento da informação, Figueiredo desistiu da reforma. Era o que Tancredo queria.

Convidado a depor à Comissão Mista de Controle das Atividades de Inteligência do Congresso sobre o monitoramento de servidores públicos federais da área de segurança que se declararam antifascistas, o ministro Mendonça, primeiro, recusou. O assunto, segundo ele, era extremamente sigiloso.

Pressionado, concordou em depor, e é o que fará na próxima sexta-feira à tarde em sessão virtual promovida por seu ministério. De suas casas, deputados e senadores poderão interrogá-lo à vontade. É claro, sob a condição de nada falarem depois sobre o que o Mendonça disse ou preferiu ocultar.

Façam suas apostas. Quantas horas depois começarão a circular nas redes sociais as confidências de Mendonça?

O bloco Unidos Contra a Lava Jato saúda o povo e pede passagem

Mais fortes são os interesses que cada um representa
O que une o senador Flávio Bolsonaro (Republicano), Lula (PT), o ex-governador Geraldo Alckmin (PSDB), o deputado Rodrigo Maia (DEM) e o ministro Dias Toffoli, presidente do Supremo Tribunal Federal? Resposta: seu desapreço pela Operação Lava Jato.

No caso de alguns deles, desapreço é pouco – oposição visceral. Por múltiplas razões, algumas as mesmas, outras só parecidas. Cada um deles não é apenas cada um. Flávio, por exemplo, é ele, seu pai e os irmãos. Lula, o PT e parte da esquerda.

Maia é o Congresso quase todo. Pelo menos a maioria dos deputados e uma grande fatia dos senadores. Alckmin é o PSDB, cujas estrelas mais reluzentes se apagaram. Toffoli representa uma parcela expressiva dos tribunais superiores, mas não somente eles.

Flávio, o pai e os irmãos se elegeram pegando carona na Lava Jato e exaltando seu principal líder, o juiz Sergio Moro. Agora diz que integrantes da Lava Jato têm “interesse político ou financeiro”, como revela em entrevista publicada, hoje, pelo jornal O GLOBO.

Finalmente, o senador admite que Fabrício Queiroz, seu parceiro em negócios sujos, pagou várias de suas contas pessoais. E cobra do ministro Paulo Guedes, da Economia, mais dinheiro para financiar programas sociais e construir obras de infraestrutura.

Tudo, naturalmente, em benefício do pai, em campanha escancarada e permanente para obter um novo mandato em 2022 – mas essa é outra história. Flávio jura que a produtividade no Ministério da Justiça aumentou depois da saída de Moro.

Sua birra com a Lava Jato, que jamais havia manifestado, na verdade tem a ver com Moro, unicamente com Moro, ou preferencialmente com Moro. O ex-juiz e ex-ministro aspira suceder papai Bolsonaro, e isso é demais para o Zero UM.

Pulemos Lula e o PT. São conhecidos seus motivos para querer demolir a Lava Jato. Os de Alckmin e do PSDB, idem. A Lava Jato passou como uma motoniveladora sobre Alckmin, o senador José Serra, o deputado Aécio Neves, e quem mais do PSDB?

Sobrou João Doria, governador de São Paulo, que se dependesse de Bolsonaro teria sido igualmente triturado para não lhe fazer sombra à direita. Com que roupa, mas com que roupa Doria irá pedir votos para presidente? A imagem do PSDB foi para o esgoto.

É fato que os procuradores da Lava Jato de Curitiba tentaram investigar o presidente da Câmara dos Deputados sem dizer que o faziam. Mas não é por isso que Maia quer assistir ao enterro da Lava Jato. É porque a maioria dos seus liderados também quer.

Maia sonha em seguir presidindo a Câmara. O regimento interno não permite. Como não permite David Alcolumbre (DEM-AP) reeleger-se presidente do Senado. Flávio defende a reeleição de Alcolumbre porque ele tem colaborado com o governo.

Não defende a de Maia porque “ele tem embarricado” muitos projetos do governo. Mas, como ensinava o deputado Ulysses Guimarães, se há maioria no Congresso faz-se qualquer coisa, “menos homem virar mulher ou mulher virar homem”.

Ou até isso, hoje, poderia ser feito. O que importa é que ainda não se deve descartar a hipótese de Maia e Alcolumbre ser reeleitos. E, para tal, eles precisam agradar os eleitores, muitos alvos da Lava Jato e que culpam Moro pelo seu infortúnio.

Quem imaginou que uma frente tão ampla acabaria formada para desmontar a que já foi considerada a maior e mais bem-sucedida operação de combate à roubalheira no mundo? É o que se vê. Flávio, Lula, Alckmin, Maia, Toffoli, unidos jamais serão vencidos.


Ricardo Noblat: No governo Bolsonaro, servidor público antifascista inspira cuidados

Por que será?
A Secretaria de Operações Integradas do Ministério da Justiça admitiu que monitora 579 funcionários públicos federais que se declararam antifascistas nas redes sociais. A intenção da medida, segundo a Secretaria, é “prevenir práticas ilegais” e garantir a segurança. Não especificou que “práticas ilegais” os antifascistas costumam cometer. E por que elas ameaçam a segurança.

Por sinal, segurança de quem? Das autoridades constituídas em geral? Do presidente da República em particular? Do Estado como um todo? Quem sabe do planeta, uma vez que as redes sociais aproximam as pessoas e é possível que existam antifascistas em toda parte? Por que ser antifascista é algo perigoso? Aos olhos de quem? Está escrito em que lei, norma ou portaria?

Providência similar não foi tomada pela mesma Secretaria contra funcionários públicos que se declararam fascistas nas redes sociais. É de supor-se, portanto, que esses não representam uma ameaça, quando nada ao governo do presidente Jair Bolsonaro. Ou vai ver que o serviço público está livre de fascistas. Ou que fascistas sejam mais prudentes e prefiram não se assumir como tal.

Resta outra hipótese: por razões ainda não suficientemente estudadas, os fascistas do serviço público e o governo Bolsonaro descobriram surpresos que compartilham os mesmos propósitos. Assim não haveria por que o Ministério da Justiça despender tempo e dinheiro vigiando-os. Para quê? Falam a mesma língua. Entendem-se bem. Os antifascistas é que devem se cuidar.

Nada de usarem as redes sociais para dizerem que são contra o fascismo, uma “ideologia política ultranacionalista e autoritária caracterizada por poder ditatorial, repressão da oposição por via da força e forte arregimentação da sociedade e da economia”. Nada de assinarem manifestos condenando outras ideologias que guardem alguma semelhança com o fascismo.

Os celulares já não inspiram confiança e a escuta se faz, hoje, a longas distâncias. Seu melhor amigo pode delatá-lo amanhã. Evitem estranhos. Evitem jogar conversa fora. Conversas cifradas podem facilmente ser decifradas. Vejam se não estão sendo seguidos. Aproveitem esses tempos de pandemia e usem máscara até que tudo isso passe. Com fé em Deus e no voto, vai passar.

Vozes

Pandemia em discussão

  • “Há consenso entre os especialistas de que poderíamos ter tido outro manejo da crise, de que pudéssemos ter reduzido significativamente os danos causados pela pandemia”. (Gilmar Mendes, ministro do STF, sobre a proximidade da marca dos 100 mil mortos pelo Covid-19 no Brasil)
  • “O Sistema Único de Saúde, SUS, foi silenciado com uma ocupação militar [no ministério]. Deixamos de ter uma gestão em saúde para ter uma ocupação por quem quer promoção na carreira militar”. (Luiz Henrique Mandetta, ex-ministro da Saúde)
  • “Se fala muito sobre a vacina da covid-19. Entramos no consórcio de Oxford, e tudo indica que ela vai dar certo e 100 milhões de unidades chegarão para nós. Não é daquele outro país, não. Tá ok, pessoal?” (Jair Bolsonaro, em critica indireta à vacina chinesa contra o vírus)
  • “A discussão não é se é CPMF ou micro-imposto digital. Daqui a pouco vão inventar um nome em inglês para ficar mais bonito, para que a sociedade aceite mais impostos”. (Rodrigo Maia, presidente da Câmara dos Deputados)
  • “É incompreensível discutir essas coisas quando temnos próxima uma crise apocalíptica, envolvendo emprego, problemas fiscais, quebradeira de empresas. O mundo está lidando com o assunto e, nós, nos divertindo com projetos de reforma tributária”. (Everaldo Maciel, ex-Secretário da Receita Federal)