Revista PD #48: A centro-esquerda deve unir o brasil

Partidos da centro-esquerda, como o PPS, o PSB, o PV e a Rede, devem buscar a união de todos os brasileiros que se reconhecem em um projeto democrático de prosperidade econômica e justiça social para o Brasil.
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Partidos da centro-esquerda, como o PPS, o PSB, o PV e a Rede, devem buscar a união de todos os brasileiros que se reconhecem em um projeto democrático de prosperidade econômica e justiça social para o Brasil 

Por Júlio Martins
Revista Política Democrática #48

Devem fugir da disputa esquerda x direita que divide o país e que tem impedido a união de amplas forças democráticas. Essa convergência é necessária para que o país vença os gigantescos desafios do presente.

É preciso superar a polarização que se estabeleceu desde as eleições de 1994. De um lado, a aliança PSDB-PFL, que governou até 2002. De outro, a coligação PT-PMDB, que liderou o país até 2016. Tal polarização dividiu os progressistas e favoreceu ao atraso. Impediu uma agenda comum dos democratas social-reformistas para o avanço de várias reformas capazes de elevar a qualidade de vida do povo de maneira significativa e sustentável.

Para unir todos os democratas social-reformistas do Brasil, a centro-esquerda deve evitar dois extremos. De um lado, refutar uma aliança sem bases programáticas, como a que se verificou recentemente, quando o PT se uniu à direita (PP de Maluf) e à centro-direita (PMDB sarneysista) para combater o centro (PSDB) e a centro-esquerda (PPS, PSB, PV e Rede).

O resultado de tal aliança fisiológica foi desnudada pela Lava-Jato: um gigantesco esquema patrimonialista de utilização da coisa pública para fins privados e partidários. Um projeto de poder para um partido único, no lugar de um projeto para o país, negociado consensualmente por uma frente social e política multipartidária.

Além do desastre do mais profundo e mais duradouro ciclo recessivo da história da República, com graves consequências sociais de 14 milhões de desempregados e de queda da arrecadação para o financiamento dos serviços públicos na União, nos Estados e municípios, tal aliança populista desmoralizou perigosamente instituições democráticas fundamentais da democracia representativa, como os partidos e o Congresso, e abriu espaço para a emergência de candidaturas reacionárias e parafascistas.

Por outro lado, pela sua experiência histórica, partidos como o PPS, o PV e o PSB não devem avalizar frentes políticas estreitas, restritas à esquerda e à extrema-esquerda, com um programa sectário que não expresse, nem de longe, o consenso das forças democráticas do país.

Tal proposta, ao contrário da intenção de seus formuladores, diminui o poder transformador dos socialistas, ao colocar a esquerda política num gueto, isolada da maioria da sociedade e das forças democráticas, favorecendo as forças conservadoras, ainda que inadvertidamente.

É impossível governar o Brasil baseado tão somente em setores de esquerda e de extrema-esquerda, minoritários na sociedade e no Congresso. Aferrados a preconceitos ideológicos, as propostas de tais grupos estão presas ao passado e são caminho certo para o desastre econômico, com as consequências negativas que vivemos hoje no Brasil e em outros países da América Latina. Em vez de unir, elas dividem os brasileiros.

Sem exclusão de nenhuma força política democrática e reformista, a centro-esquerda deve mais uma vez, a exemplo da eleição de 2014, propor a união de socialistas, socialdemocratas e liberal-democratas em torno de um novo pacto político e social, com foco na transparência e fortalecimento da democracia representativa, no desenvolvimento sustentável e na promoção do bem-estar social.

A centro-esquerda deve superar a dicotomia estereotipada esquerda x direita. Ao mesmo tempo em que afirme sua responsabilidade social, em defesa de políticas que melhorem a qualidade dos serviços públicos em educação, saúde, transportes e moradia, deve mostrar seu compromisso com a responsabilidade fiscal e com um ambiente econômico necessário a um desenvolvimento autossustentado e ecologicamente saudável.

Aqui também deve evitar dois extremos. De um lado, rejeitar o Estado mínimo e o capitalismo sem regulamentação social em detrimento do interesse público. De outro lado, deve se distanciar de qualquer orientação populista irresponsável, que ponha em risco o equilíbrio das contas públicas, fundamental para uma retomada do crescimento em base sólidas.

Por cima de estreitezas ideológicas, é preciso unir cidadãos de diferentes e variados pensamentos para a tarefa comum de aperfeiçoar as instituições democráticas, com reformas políticas que ampliem o poder de controle dos cidadãos sobre o sistema político, os partidos, o Congresso, o governo e o poder econômico-financeiro.

A centro-esquerda tem estrutura, quadros e lideranças capazes de dialogar e unir o Brasil para os desafios do século XXI, como a integração soberana e competitiva do país na economia global; o enfrentamento do desemprego estrutural; a superação da crise do clima pela reconversão tecnológica, pelo uso de energias renováveis, pela preservação da natureza e pelo consumo consciente; a construção e o fortalecimento de instituições globais e multilaterais capazes de incentivar o diálogo e a cooperação econômica entre as nações e vencer as estreitezas nacionais, a
xenofobia e o terrorismo.

Apostar na polarização esquerda x direita, na velha disputa PT x PSDB, é apostar no passado, em mais do mesmo. A centro-esquerda deve dar respostas do futuro para as novas demandas da sociedade brasileira e do mundo.

* Júlio Martins é ensaísta e jornalista

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