Luiz Carlos Azedo: Secos e molhados

“As conversas de Bolsonaro com os líderes do Centrão foram muito protocolares, apesar da aparente informalidade, e muito pouco resolutivas”.
Foto: Marcos Corrêa/PR
Foto: Marcos Corrêa/PR

“As conversas de Bolsonaro com os líderes do Centrão foram muito protocolares, apesar da aparente informalidade, e muito pouco resolutivas”

O presidente Jair Bolsonaro assinou, ontem, 18 decretos para comemorar os 100 dias de governo, entre os quais os projetos de autonomia do Banco Central e de educação domiciliar, muito polêmicos. Após a cerimônia em que anunciou a medida, o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, fez um balanço das realizações do governo, dizendo que o presidente havia cumprido mais do que as 35 metas anunciadas no Plano dos 100 dias. O pacote mistura medidas de grande alcance para a economia com mudanças meramente burocráticas, como num armazém de secos e molhados.

As medidas anunciadas, ontem, também foram incluídas no balanço de realizações. “Existem ações que precisavam estar delimitadas e apresentadas. Como o estudo em casa, a questão do Banco Central. São coisas que vão se prolongar. Nosso compromisso era ter uma ação dentro dos 100 primeiros dias que mostrasse que o governo estava trabalhando nisso”, explicou Lorenzoni. Na avaliação do governo, a reforma da Previdência será aprovada no primeiro semestre deste ano; a reforma tributária será o passo seguinte. “Iniciaremos no segundo semestre a descentralização dos recursos para estados e municípios. Vamos caminhar para uma reforma tributária que simplifique o sistema”, anunciou.

Entre as medidas de maior alcance anunciadas ontem estão a minuta de termo aditivo de revisão do contrato de cessão onerosa, firmado entre a União e a Petrobras em 2010; o projeto de lei complementar que garante autonomia ao Banco Central; e o projeto que será enviado ao Congresso para regulamentar a educação domiciliar, com “requisitos mínimos que os pais ou responsáveis legais deverão cumprir”. Outro projeto padroniza o procedimento adotado para instituições públicas e privadas para a nomeação dos seus dirigentes, passando a prever que os dirigentes e administradores de bancos públicos, como o Banco do Brasil e a Caixa, tenham de ser aprovados pelo Banco Central, usando critérios que serão estabelecidos pelo Conselho Monetário Nacional.

O Rubicão do governo, porém, continua sendo a Previdência. Enquanto Bolsonaro fazia o balanço, deputados do chamado Centrão se articulavam na Câmara para inverter a pauta da próxima sessão da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, com objetivo de votar a PEC das emendas impositivas de bancada ao Orçamento da União antes do relatório sobre a reforma da Previdência. Pedem precedência por se tratar de um projeto da própria Casa, que foi alterado no Senado e, por isso mesmo, precisa ser novamente apreciado pelos deputados, antes de ser promulgado.

A inversão da pauta depende do presidente da comissão, deputado Felipe Francischini (PSL-PR), que sofre forte pressão. Caso não aceite a mudança, o próprio plenário da CCJ pode inverter a pauta, o que não é improvável. Os articuladores do governo veem na mudança uma manobra para atrasar a reforma e aumentar o poder de barganha do Centrão. Na verdade, as conversas de Bolsonaro com os líderes do Centrão foram muito protocolares, apesar da aparente informalidade, e muito pouco resolutivas. Havia expectativa de nomeação de um político para o Ministério da Educação, mas essa não foi a opção do presidente da República, que nomeou o economista Abraham de Bragança Vasconcelos Weintraub para o cargo.

Doutores e excelências

Entre as medidas assinadas por Bolsonaro, ontem, estão a revogação de 250 decretos considerados desnecessários, na linha da desburocratização, além da extinção de conselhos e cargos vagos ou que vierem a vagar; e a criação do Comitê Interministerial de Combate à Corrupção para assessorar elaboração, implementação e avaliação de políticas públicas de combate à corrupção. Um decreto que determina o uso de “senhor” e “senhora” para o tratamento de autoridades, inclusive em cerimônias, proibindo “vossa excelência” e “doutor”, exceto “nos casos em que haja previsão legal ou exigência de outros Poderes e entes federados”. O decreto exclui da regra as comunicações com autoridades estrangeiras e organismos internacionais. Outra medida simplifica a conversão de multa ambiental simples em serviço de preservação.

Também foram lançadas a Política Nacional de Turismo, com objetivo de desenvolver segmentos turísticos relacionados ao Patrimônio Mundial Cultural e Natural do Brasil; a Política Nacional de Alfabetização, que estabelece as diretrizes para as futuras ações e programas do governo de redução do analfabetismo; e a Política Nacional de Drogas. No varejo, ainda foram anunciadas medidas sobre modificação de veículos para compor frotas de táxi e locadoras, doação de bens para a administração pública, e unificação dos portais do governo na internet.

http://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-secos-e-molhados/

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