Encontro de militantes marca lançamento de livros no Rio de Janeiro

Volume II de Longa Jornada até a democracia – os cem anos do Partidão 1922/2022 teve tarde de autógrafos na capital fluminense
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Volume II de Longa Jornada até a democracia – os cem anos do Partidão 1922/2022 teve tarde de autógrafos na capital fluminense

Reencontros, abraços e lembranças de momentos compartilhados. Esse foi o tom do lançamento, nesta quinta-feira (14/3), no Rio de Janeiro, do segundo volume do livro Longa Jornada até a democracia, escrito pelo jornalista Eumano Silva. O local escolhido foi a quase centenária Taberna da Glória, na região central da cidade, e reuniu políticos e lideranças que participaram ativamente da construção do Partido Comunista Brasileiro (PCB) e dos diferentes partidos surgidos a partir de sua trajetória de resistência.

O lançamento foi em dose dupla, na ocasião também chegou ao público o livro Uma vida bem vivida, autobiografia de Roberto Percinoto, ex-membro do Partidão e ex-presidente do Sindicato dos Bancários Rio durante o período da ditadura. O evento compartilhado teve razão de ser, Percinoto foi um dos 50 militantes comunistas entrevistados por Eumano para a elaboração de Longa Jornada. Em conjunto, as duas obras retratam, cada uma a seu modo, a luta por direitos, liberdade e democracia.

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“Embora com diretrizes diferentes, considero dois livros com a mesma dimensão: a da memória da luta política de esquerda aqui no Brasil. Memórias que trazem às gerações mais jovens o conhecimento da atuação de militantes daquela época, que entregavam sua vida em prol de um projeto de país melhor”, afirma o ex-presidente da OAB-RJ, ex-deputado federal e atual secretário nacional do Consumidor, Wadih Damous.

Para o vereador do município do Rio de Janeiro e ex-ministro da Igualdade Racial Edson Santos (PT-RJ), os dois livros são fundamentais para que se possa ter noção da importância comunista no processo de redemocratização. “São cofres fechados que se abrem hoje e a gente vê, tanto do ponto-de-vista da abnegação dos dirigentes comunistas, quanto do sofrimento que a ditadura impôs a essas pessoas”, conta.

A também vereadora do Rio Teresa Bergher (Cidadania) parabenizou os dois autores e ressaltou o poder da literatura para disseminação do conhecimento. “A oportunidade de poder conhecer a história de uma sigla como o PCB é muito importante. Nada supera a leitura, a cultura, então que os dois autores façam muito sucesso com seus livros”, disse ela.

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Documento da luta democrática

Longa jornada até a democracia – Volume II foi um trabalho de pouco mais de dois anos de pesquisa intensa, que incluiu acesso a documentos militares inéditos guardados no Arquivo Nacional, registros oficiais do próprio PCB, além de entrevistas com militantes. O resultado são mais de 800 páginas de um registro minucioso de uma trajetória com relevância ímpar até os dias atuais.

“Quando eu iniciei, não imaginava encontrar tanto material, tanto documento. O livro ficou maior do que eu imaginava, mas é uma história que merece isso. Estou muito satisfeito pela oportunidade de contar um pedaço da história do Brasil pouco conhecido. É um relato de como o país recuperou a democracia, que acho uma discussão muito atual. Hoje, no momento em que nós temos a nossa democracia sendo atacada, acho que o livro ajuda a entender como é que se se luta por uma democracia e o quanto isso é importante para o Brasil”, conta Eumano Silva.

O livro faz parte de um projeto amplo da Fundação Astrojildo Pereira para celebrar, por meio de diferentes linguagens, eventos e produções, os cem anos da fundação PCB e os frutos da luta do Partidão. O conselheiro e ex-diretor-geral da FA Caetano Araújo teve participação direta na condução do projeto e comemora o lançamento do segundo livro. “Nós publicamos outros livros, fizemos eventos, seminários, estamos finalizando um filme. O primeiro volume de Longa Jornada, escrito por Carlos Marchi abordou desde a fundação, em 1922, até 1967. Agora o volume dois abarca o período pós-67 em diante, até a mudança da sigla para PPS. Enquanto o livro do Marchi se debruçou sobre a bibliografia, dando a ela uma nova visão, o do Eumano traz informação factual nova obtida com as entrevistas e a pesquisa em documentos inéditos”, explica Araújo.

De acordo com Araújo, esse resgate histórico realizado nas obras é essencial no atual contexto brasileiro, com resquícios das consequências da ascensão da extrema-direita no país e no mundo. “Nós tivemos um presidente que foi apologista da ditadura. Então, isso mostra que esse livro tem uma função pedagógica e política importante hoje. O álibi de todos os autoritários é o anticomunismo, e esse álibi precisa ser desmistificado, ser combatido. Esse livro é uma ferramenta importante para esse combate”, afirma.

O ex-governador do Rio Moreira Franco parabeniza o esforço da FAP para esse resgate histórico. “Essa memória é fundamental para se conhecer o Brasil de hoje. Essa conquista democrática se deve à lucidez da estratégia tomada naquela época, que foi a de mobilização popular, de acreditar na força do povo como a arma mais importante para a conquista da democracia, ” ressalta.

O jornalista Paulo César Pereira relembra a inspiração que a resistência do Partidão foi para a sociedade civil durante os anos de chumbo e a importância do registro das pessoas que construíram a legenda. “Não se escreve a história política do Brasil sem que a gente ouça os comunistas”, diz.

E foi ouvindo pessoas, como o também jornalista Ricardo Moraes, filiado ao partido desde 1971, que o livro de Eumano Silva foi construído. “Minha história é familiar porque meu pai também foi do partido no período da Segunda Guerra Mundial, foi preso em 1964, eu fui preso pelo DOI-CODI junto com o Vladmir Herzog. O Eumano é um grande jornalista e conta todas essas histórias no livro, o que me emociona porque a gente construiu o partido e o partido continua vivo hoje”, comenta.

Testemunha particular da história

De personagem a escritor. Na tarde de autógrafos no Rio de Janeiro, o militante comunista e líder sindical Roberto Percinoto figurou como entrevistado de Eumano Silva e também como autor de seu próprio livro. A obra Uma vida bem vivida relata suas memórias desde a infância como trabalhador rural, depois, já um jovem adulto na cidade como bancário, dirigente sindical, militante social e político. “Eu me filiei clandestinamente no Partido Comunista pós-64, depois do golpe. Na minha atividade sindical tive momentos muito bons, mas outros um tanto difíceis, como um mandato cassado pelo Jarbas Passarinho, ministro da ditadura, em 1969, e passei um período de três meses preso na Ilha das Flores. Mas também fizemos a lua pelas eleições diretas, fui um dos oradores naquele comício da Candelária que, segundo a imprensa, teve um milhão de pessoas e figuras importantes falaram como Guimarães Neves, Sobral Pinto e Roberto Freire, representando o PCB. Estive também no comício da Central do Brasil em 1964, estava lá com o Jango. Criamos aqui no Rio o MIA – Movimento Intersindical Anti-arroxo, para revogação da lei de arroxo salarial do Delfim Neto” conta ele, afirmando que seu livro é uma contribuição singela para os movimentos sociais. Diante de uma trajetória tão singular, o deputado estadual Luiz Paulo Corrêa (PSD/RJ) compara Percinoto ao antigo Repórter Esso, com o diferencial de que não apenas testemunha, mas também constrói a história. “Ele passou pelo longo e duro período da ditadura, trabalhou pela reconstrução do processo democrático, jamais se afastou da luta política e sempre sonhou com um Brasil mais justo, mais humano, com democracia. Um socialdemocrata em sua essência. Tenho uma grande admiração pelo Percinoto porque ele é um homem de ação que entendeu os tempos em que vivemos, se adaptou a eles, sem jamais abandonar suas convicções. ”

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