Day: outubro 7, 2020
Vera Magalhães: Vacina em novembro
Erradicação da loucura que assola o mundo tem de começar pela eleição dos EUA
Parecia impossível que algum líder mundial fosse superar o festival de loucuras que Jair Bolsonaro protagonizou durante a pandemia do novo coronavírus, subindo em lombo de cavalo, promovendo aglomerações, indo a atos antidemocráticos, mostrando cloroquina para as emas, etc.
Mas aconteceu. Desde que foi diagnosticado com covid-19, na semana passada, Donald Trump deixou o pupilo brasileiro no chinelo em termos de impostura e inadequação não apenas ao cargo que ocupa e ao qual se agarra com unhas e dentes, mas também aos princípios básicos de civilidade e convívio público no curso de uma emergência sanitária.
O homem mais poderoso do planeta foi internado na sexta-feira com muitas dúvidas pairando quanto à data exata de seu diagnóstico, se ele promoveu eventos já sabendo que estava doente ou a gravidade do quadro antes e depois de ser hospitalizado.
À falta de transparência inimaginável para um País que se gaba de ser o berço e o guardião da democracia ocidental se somou a boçalidade desvairada.
Desesperado diante do revés da doença quando fazia questão de zombar dela, vender tratamentos mandrakes e defender e praticar comportamentos sociais irresponsáveis, Trump quis se mostrar forte.
Para isso, expôs assessores, seguranças e equipe do hospital a risco de contaminação. O carro em que ele fez o desfile patético é blindado inclusive para ataques químicos e biológicos, o que significa dizer que, se nada entra, tampouco sai. A carga viral de um presidente doente ficou toda concentrada no interior do carro, sujeitando os demais ocupantes a riscos.
A diferença entre os Estados Unidos e o Brasil é que lá existem menos puxa-sacos e lambe-botas que aqui. E, quando um presidente se comporta como um moleque, há quem, mesmo entre os que o circundam, com coragem para dizer em voz alta. Foi o que fez o médico James Phillips, do hospital Walter Reed. “Eles podem ficar doentes. Eles podem morrer. Por teatro político”, atestou.
Lá como aqui este teatro que se prolonga já cobrou muito em termos de corrosão dos valores e dos marcos civilizatórios. Que um presidente decida se comportar como um bufão num debate e a comissão nacional encarregada de organizar tais eventos não deixe claro que isso não irá se repetir sob hipótese alguma é sinal de que Trump venceu mais um round e conseguiu enfraquecer mais uma estrutura que sustenta a democracia norte-americana – que, mesmo com todas as suas lacunas e falhas, é uma das mais estáveis do mundo.
Por tudo isso é vital a importância da eleição dos Estados Unidos, para o mundo e para o Brasil. A era de governantes fanfarrões calhou de coincidir com o maior flagelo humano, social e econômico que as atuais gerações – sejam as mais novas, sejam as que estão vendo antecipado seu tempo útil – irão conviver no curso de suas vidas.
A presença de figuras como Trump e Bolsonaro em postos de comando agrava exponencialmente os efeitos desse calvário. Mais de 200 mil mortos lá, quase 150 mil aqui e tanto um quanto outro seguem distraídos e distraindo os seus governados com factoides midiáticos. Lá a busca vale-tudo por uma reeleição cada vez mais difícil. Aqui a costura de terreno político com vista ao mesmo objetivo e para proteger a família presidencial, cada vez mais enredada numa trama que explicita o uso de dinheiro público de gabinetes para enriquecimento.
Não se sabe o mal que Trump ainda pode fazer, desde propagar o vírus para os que o cercam até colocar em dúvida a transição do poder caso se efetive a derrota que as pesquisas apontam. Mas é fácil analisar a importância que sua eventual saída de cena em novembro representará para começar a trazer de volta a racionalidade perdida à política brasileira. Que assim seja.
Merval Pereira: Me dá um dinheiro aí
Seria simplificação atribuir à incompetência política do governo o novo adiamento do anúncio do programa social de renda que ampliará o Bolsa Família para abrigar os quase 40 milhões de “invisíveis” que vieram nos assombrar na pandemia.
Tirem-se os que não deveriam receber, os bandidos que receberam na cadeia, os fraudadores. Sobram ainda milhões de “invisíveis”. Esse número assombroso de pessoas que dependem do apoio do governo no momento em que o país parou de girar sua economia é formado na maioria por trabalhadores autônomos informais que entraram em situação de miserabilidade por absoluta falta de trabalho.
São ambulantes, biscateiros, flanelinhas que perderam na pandemia seus clientes habituais, e hoje dependem do governo para a transição econômica, que promete ser mais demorada do que se esperava. Onde achar dinheiro para alimentar esses milhões de bocas?
Não há solução sem que alguma categoria sofra prejuízos, sem que interesses de castas sejam feridos. Não é impressionante que existam cerca de R$ 15 bilhões por ano no pagamento indevido de salários acima do máximo de R$ 39 mil?
Mas para cortar esses supersalários e outras distorções da gestão pública, é preciso encarar desafios que só mesmo um presidente reformista poderia fazer. Mas Bolsonaro não é reformista, apenas finge. Os adiamentos do anúncio das reformas e do Renda Cidadã só refletem essa dificuldade: como arranjar dinheiro para garantir a reeleição sem prejudicar as corporações que o apóiam?
O auxílio emergencial, que o governo queria que fosse de R$ 200 e acabou sendo elevado para R$ 600 pela pressão do Congresso, deveria terminar em dezembro, já reduzido para R$ 300 nesses últimos três meses do ano. Mas a existência desses milhões de “invisíveis” não permite que se interrompa o apoio da renda mínima a esses brasileiros.
A questão é que também não é possível manter-se programa social desse tipo indefinidamente, nem rodar a maquininha para fabricar o dinheiro necessário. Na pandemia, foi necessário, mesmo que a dívida pública chegue a 100% do PIB. Tempos de guerra.
O governo vê-se agora em uma armadilha. O auxílio emergencial aumentou a popularidade do presidente Bolsonaro, tornando-se um instrumento político tão forte quanto o Bolsa-Família foi para o PT, especialmente nas regiões mais pobres do país.
Assim como Lula fez, Bolsonaro está em transição de eleitorado, perdendo apoiadores nas grandes cidades e capitais, especialmente na classe média, e se aproximando do eleitor do norte-nordeste. O programa Renda Cidadã é o que vai lhe garantir a sobrevivência política.
Tendo chegado ao Poder circunstancialmente, passando-se por quem nunca foi, ele já perdeu todas as fichas que o diferenciavam, mesmo enganosamente, dos demais políticos. Já não combate a corrupção, mas se uniu aos políticos mais fisiológicos em ação para salvar-se de um impeachment provável se continuasse na rota de colisão com o Supremo e o Congresso.
Abandonou seus seguidores mais radicais, que não entendem que é preciso mudar para sobreviver. O sonho do golpe de Estado por dentro, acalentado por Bolsonaro até recentemente, foi abortado diante da evidência de que as instituições republicanas funcionam como contrapeso aos ataques extremistas.
Para tentar se reeleger, Bolsonaro teve que retornar ao velho jogo político, assim como Lula fez com o mensalão. Os dois se retroalimentam para sobreviver, e jogam nas regras do jogo pré-estabelecido. Lula, que antes acusava a Justiça brasileira de conluio contra ele, está aguardando que o novo ministro do Supremo indicado por Bolsonaro ocupe o lugar de Celso de Mello e garanta a maioria a favor da parcialidade de Moro.
O presidente Bolsonaro, que se valeu do prestígio de Moro para estabelecer-se como o grande guardião da moralidade pública, agora depende da desmoralização de seu herói para salvar a si e aos seus no mesmo Supremo Tribunal Federal que ameaçou fechar.
O grito de “basta” dado em frente ao Alvorada, como um sinal a seus seguidores de que a guerra seria desencadeada, transformou-se em uma amizade fraternal com ministros que anteriormente eram execrados. Tudo está como sempre foi em Brasília.
Provavelmente em dezembro, depois das eleições municipais, saberemos de onde sairá o dinheiro, se do corte de outros gastos, ou do malabarismo para ultrapassar o obstáculo que é o teto de gastos.
Rosângela Bittar: Arranjos de mão dupla
Um arranjo de mão dupla demonstrará o efeito do apoio de Bolsonaro a Russomanno
Que Jair Bolsonaro tem rara capacidade de transferir votos, não há dúvida. Elegeu três filhos em colégios eleitorais distintos e um sem-número de desconhecidos coronéis, capitães e majores, País afora. O outro líder nacional com essa capacidade é Lula, provisoriamente contido pelas circunstâncias.
A disputa pela Prefeitura de São Paulo tornou-se campo ideal para efeito demonstração deste bolsonarismo por patrocínio. Será um verdadeiro recenseamento, com precisão estatística. Não importa a falta de homogeneidade, cada bolsonarista sabe precisamente o seu tipo.
Alguns são remanescentes do encantamento pelo já superado discurso de combate à corrupção; outros por serem apaixonados pelo porte e potência das armas; uns da direita sectária; outros, terrivelmente militantes religiosos. Todos pela adesão irrestrita ao seu profeta.
Celso Russomanno (Republicanos), cansado de insistir em derrotas sucessivas, precedidas por triunfais pole positions em pesquisas eleitorais, viu no apoio do presidente a chance de dar uma identidade à sua candidatura. O esquema agradou a Bolsonaro, que havia liquidado seus grupos organizados em São Paulo de quem se afastou com desdém ao chegar à Presidência.
Um arranjo de mão dupla demonstrará o efeito deste apoio. No primeiro, Russomanno é o beneficiário. Tenta empurrar Bolsonaro, em seu lugar, no ataque ao seu adversário direto, Bruno Covas (PSDB), ao mesmo tempo em que força a transformação do presidente em alvo. Nas últimas 48 horas, Russomanno insistiu mil vezes que a coligação de Covas é a frente paulista anti-Bolsonaro. O presidente, popular e fortão, segue na frente, e o candidato a prefeito fica um passo atrás, livre das escaramuças.
Outro efeito em teste é a inversão da roda da ciranda. Neste, o beneficiário é Bolsonaro. Russomanno torna-se o símbolo do eleitorado cujo voto foi a ele transferido e porta-estandarte do bolsonarismo em São Paulo. O eleitorado o acompanha, mas exige que proteja Bolsonaro e use a máquina a seu serviço. Russomanno, de patrocinado, passa a patrocinador.
Kassio com K. Sem ilusões: todos os passos amistosos do presidente Jair Bolsonaro em direção ao Supremo Tribunal Federal têm um único e fisiológico objetivo. O de proteger o primogênito Flávio Bolsonaro.
A preocupação com este filho é obsessão e determina a relação do presidente com os tribunais superiores. A indicação de Kassio Marques, negociação conduzida por 01 para a vaga do decano Celso de Mello, integra este conjunto de providências objetivas.
Desagradou a três alas de apoiadores do presidente e satisfez a outras três. Os que esperneiam são originários do lavajatismo convertidos ao bolsonarismo; são os líderes evangélicos que já saboreavam a vaga; e os radicais ligados ao inacreditável Olavo de Carvalho, que ainda teima em influenciar o governo com gritos e palavrões.
Já os três grupos que aprovaram a escolha têm outras motivações. O apoio da Ordem dos Advogados foi corporativista, sem peso político ou ideológico; o Centrão vislumbrou também proteção aos interesses amplamente conhecidos; e um terceiro grupo gostou porque se sentiu aliviado. Temia que o escolhido tivesse um perfil de lobisomem, alguém incompatível com os ritos, linguagem e notável saber jurídico.
Na história recente do Supremo cita-se muito o caso de Luiz Fux, o novo presidente. À maneira carioca, o então surfista juiz minimizou, numa conversa com o então ministro José Dirceu, os riscos judiciais a que o mensalão expunha o governo Lula. “Deixa que eu mato no peito.” Um aceno não cumprido que, por isso mesmo, pertence aos registros da memória.
Caboclo nordestino, o mínimo que os aliados do governo esperam do piauiense Kassio Marques é que, se prometeu alguma coisa, cumpra.
‘Economia tem taxas medíocres de investimento’, diz Nelson Tavares Filho
Provável vitória dos democratas nas eleições norte-americanas, ausência de uma política ambiental e investimentos baseados em aumento da dívida pelo governo Bolsonaro são fatores que podem influenciar a economia do país, levando a uma alta da inflação e dos juros
O economista Nelson Tavares Filho, especialista em planejamento estratégico, é enfático ao projetar um cenário preocupante no Brasil. “A economia brasileira vem apresentando taxas medíocres de investimento, 1,35% do PIB”, alerta, em artigo que publicou na 23ª edição da revista Política Democrática Online, produzida e editada pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira), em Brasília.
Clique aqui e acesse a 23ª edição da revista Política Democrática Online!
Todos os conteúdos da publicação têm acesso gratuito no site da FAP. De acordo com o economista, o problema ocorre porque os gastos correntes inadiáveis veem ocupando o espaço no orçamento. “Inúmeras estatais estão dependendo do orçamento público para pagar suas folhas salariais, sem contrapartida de ofertar um bom serviço público. Mas fechar uma estatal hoje significa subtrair ‘poder’ de um congressista. A base formada pelo governo Bolsonaro irá dificultar muito o ajuste necessário ao Estado brasileiro”, afirma.
Segundo o especialista, um detalhe importante poderá favorecer a apresentação de taxas de crescimento positivas em 2021. “O efeito estatístico causado pela diminuição do PIB em 2020. Outra questão que poderá influir no crescimento é o auxílio a ser pago a camadas mais pobres da população. 65% do crescimento é ocasionado pelos gastos familiares, e este auxílio aumenta o poder de compra dessa população integralmente, pois não possuem condições de poupar”, analisa.
Pelo valor estimado para o PIB (US$ 6,5 trilhões) e do “PIB per capita” (US$ 28 mil) no Brasil, conforme analisa o autor, é fácil deduzir que a empresa aguarda desenvolvimento significativo no longo prazo. “No cenário de curto prazo, com as variáveis mencionadas, o crescimento ocorrerá mais por efeito estatístico e/ou desrespeitando normas e leis que constituem base para um crescimento de longo prazo”, escreve ele.
O economista destaca que não são dois cenários excludentes. “Mas a prevalecer no curto prazo crescimento nas condições explicitadas, mais difícil será a realização do cenário de longo prazo traçado pela empresa”, afirma ele.
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Luiz Carlos Azedo: De bem com o teto
Parece incrível, a velha política de conciliação começa a dar o ar de sua graça novamente, nas articulações de bastidor, envolvendo o governo Bolsonaro, o Congresso e o Supremo
Um dos períodos mais turbulentos da História do Brasil foi o regencial, entre a abdicação de D. Pedro I, em 1831, e o Golpe da Maioridade de D. Pedro II, então com 15 anos, em 1840. Os liberais reivindicavam a ampliação da autonomia dos governos provinciais e a reforma de alguns aspectos contidos na Constituição de 1824; os conservadores eram favoráveis à manutenção da estrutura política centralizada e à preservação dos poderes reservados ao imperador. Foi um período em que a integridade territorial do Brasil e a monarquia andaram ameaçadas por rebeliões sangrentas: Cabanada (1832-1835), em Pernambuco; Farroupilha (1835-1845), no Rio Grande do Sul (República Rio-grandense) e em Santa Catarina (República Juliana); Cabanagem (1835-1840), no Pará; Revolta dos Malês (1835); Sabinada (1837-1838), na Bahia; Balaiada (1838-1841), no Maranhão.
Nesse ambiente, ao assumir o governo, o jovem imperador D. Pedro II foi apoiado e prestigiou a presença de liberais no ministério, mas os escândalos de violência e corrupção nas eleições provocaram a dissolução do gabinete liberal e convocação dos conservadores de volta ao poder. Como as disputas entre ambos continuaram, a alternativa foi D. Pedro II buscar uma posição de equidistância e formar um gabinete com figuras ilustres das duas correntes políticas. Foi assim que nasceu o Ministério da Conciliação, em 1853, encabeçado pelo mineiro Honório Hermeto Carneiro Leão, o Marquês de Paraná. Apesar de ter-se extinguido formalmente em 1858, esse sistema de alianças se manteve até a década de 1870, marcando o apogeu do período imperial, financiado pelos recursos advindos da exportação do café. As pressões decorrentes da Guerra do Paraguai (1864-1870) e o crescimento das lutas pela abolição da escravidão levariam à ruptura da conciliação, resultando na criação do Partido Republicano por setores liberais mais radicais, em 1870.
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, artífice de uma aliança improvável entre o PSDB e o antigo PFL nas eleições de 1994, juntamente com o falecido deputado federal Luiz Eduardo Magalhães (PFL-BA), recomendava a seus ministros e aliados a leitura de Um Estadista no Império, de Joaquim Nabuco, que exalta a política de conciliação como uma estratégia fundamental para consolidação do Brasil como nação e sua governabilidade. Era uma resposta às críticas que sofria por parte de lideranças de seu próprio partido e da esquerda de modo geral, por causa das alianças que fez com os setores conservadores, principalmente os políticos que representavam as oligarquias do Norte e do Nordeste.
Pacto fiscal
Desde o Império, não foram poucos os momentos em que a política de conciliação renasceu das cinzas. A eleição de Prudente de Moraes, por exemplo, na sucessão de Floriano Peixoto, em 1894, foi um deles, pois conseguiu pacificar o Rio Grande do Sul, negociando o fim da Revolução Federalista (1893-1895). Outro momento importante foi o governo de Juscelino Kubistchek, eleito com base numa aliança de pessedistas, trabalhistas e comunistas. No governo Jango, o regime parlamentarista foi uma tentativa de conciliação, encabeçada por Tancredo Neves e San Tiago Dantas, que acabou frustrada pela volta do presidencialismo, em 1962, aprovado em plebiscito, e o radicalismo da esquerda, que não queria a volta de Juscelino, nas eleições previstas para 1965, em razão de sua política de “conciliação com o imperialismo”.
Por mais incrível que possa parecer, a velha política de conciliação começa a dar o ar de sua graça novamente, nas articulações de bastidor, envolvendo o governo Bolsonaro, o Congresso e o Supremo Tribunal Federal (STF). É um pacto conservador, que está sendo urdido a churrascos, pedaços de pizza, uísque, café e tubaína, mas ninguém pode negar que o primado da política está se restabelecendo. Se a oposição está perplexa e imobilizada com o que está acontecendo, a extrema-direita bolsonarista, mais ideológica, está esperneando e se sentindo traída. Os fatos estão mostrando uma mudança de estratégia do Palácio do Planalto, além de um reposicionamento de outros atores políticos, que sempre foram influentes no Congresso.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e o ministro da Economia, Paulo Guedes, por exemplo, que andavam se digladiando em público, selaram um pacto em defesa do teto de gastos, em nome da responsabilidade fiscal. O grande padrinho do encontro foi o senador Renan Calheiros (MDB-AL), por intermédio do ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Bruno Dantas e do seu atual presidente, José Múcio Monteiro, uma velha raposa política pernambucana, que patrocinaram um jantar entre ambos, que teve como madrinha a senadora Kátia Abreu (MDB-TO). Isso quer dizer que tudo está pacificado? Longe disso. O senador Márcio Bittar (MDB-AC) ainda não conseguiu arrancar da equipe econômica de Guedes uma fonte de pagamento para o Renda Cidadã, cujo relatório ficou para a próxima semana. Enquanto isso, o presidente do Congresso, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e o líder do Centrão, deputado Arthur Lira (PP-AL), disputam o controle da Comissão de Orçamento da União.