Day: março 26, 2020

Merval Pereira: Um presidente sozinho

Um movimento de desobediência civil está instalado no país desde o primeiro panelaço, que foi se espalhando por estados e regiões

O presidente Bolsonaro, por escolha própria, está completamente isolado. Não tem partido, não tem o apoio dos governadores, não tem diálogo dentro do Congresso. Já não governa mais. Um movimento de desobediência civil está instalado no país desde o primeiro panelaço, que foi se espalhando por estados e regiões à medida que ele se demonstrava inapto para exercer a presidência da República, especialmente num momento de grave crise de saúde pública como o que estamos vivendo. Os governadores, em maior ou menor grau, já anunciaram que não seguirão as orientações do governo se colidirem com as normas da Organização Mundial da Saúde. A população, mostram as pesquisas, apoia essa prudência.

Como é espontâneo por sua natureza tosca, Bolsonaro revelou em entrevistas o que lhe aflige, o efeito da crise econômica que certamente virá recair sobre o seu governo. Não se mostra capaz de enxergar além do horizonte puramente eleitoral, e isso demonstrou ontem na reunião de governadores do sudeste, ao levar a discussão para o campo politico-eleitoral, descompensado com as críticas que acabara de receber de maneira dura, mas respeitosa, do governador de São Paulo João Doria.

Que Doria é candidato a presidente da República em 2022, ninguém desconhece. Mas, no momento, ele está se comportando como um líder diante da crise da Covid-19 que se abate principalmente sobre o Estado que governa. Bolsonaro, mesmo que vislumbre por trás dessa postura de Doria uma máscara que procura esconder sua intenção eleitoral de se contrapor a ele, mostrou-se um desastrado ao escancarar sua irritação diante de um adversário que sabe jogar o jogo político, expondo suas deficiências.

A preocupação de Bolsonaro tem razão de ser, pois com seu comportamento irresponsável diante da crise, está se abrindo um amplo caminho para o tal candidato de centro que se apresente como alternativa aos radicalismos de esquerda e direita.

Doria está aproveitando o momento para demonstrar uma capacidade de gestão que o credencia a se apresentar como essa alternativa. Cada vez mais fica claro que a preocupação de Bolsonaro com a economia do país não tem nada a ver com o bem-estar do povo, mas com a necessidade de mostrar melhorias econômicas que respaldem sua candidatura à reeleição.

A mesma situação em que se encontra hoje o presidente dos Estados Unidos, que disputará a reeleição ainda este ano. Ao mimetizar Trump, mas sem o dinheiro que o presidente americano tem a seu dispor, o presidente Bolsonaro assumiu um risco que não poderia, e precipitou-se.

O próprio Trump, ao anunciar que gostaria de ver as atividades econômicas voltando à normalidade pela Páscoa, deu-se um prazo para avaliar a situação. Bolsonaro, não. Assumiu a decisão de acabar com a quarentena imediatamente, no segundo dia de sua implantação em todo o país.

A questão não é se teremos que suspender esse confinamento, mas quando, e através de qual planejamento. Esse é o grande tema em discussão pelo mundo, mas nós no Brasil ainda não chegamos ao pico da crise da Covid-19, e tememos que ela se alastre perigosamente quando atingir as comunidades mais carentes.

Os governadores do país todo, de diversos partidos políticos, estão mobilizados mais ou menos na mesma direção, baseados nas recomendações do ministério da Saúde, que até hoje segue as orientações da Organização Mundial da Saúde. O ministro Luiz Henrique Mandetta há alguns dias já dava mostras de que tentava evitar que o presidente Bolsonaro se desagradasse de seu sucesso junto à opinião pública.

Ontem, depois de ter sido desautorizado em transmissão nacional de radio e televisão, Mandetta deu um jeito de se aproximar ainda mais das posições de Bolsonaro, e se afastar da imagem técnica que dava segurança à população. Falou mais alto o diploma de deputado federal do que o de médico, e Mandetta se aproxima da desmoralização.

Que só não é total porque ficou de estudar a proposta de Bolsonaro. Espera-se que aproveite sua última chance para apresentar ao presidente um planejamento tecnicamente coerente para uma saída cautelosa da política de confinamento.


Steve Wynn Files Defamation Lawsuit Against Former Salon Director, Makes Early Exit from Wynn Las Vegas Villa

Steve Wynn Files Defamation Lawsuit Against Former Salon Director, Makes Early Exit from Wynn Las Vegas Villa

Steve Wynn remains on the offensive in defending their character against numerous allegations of intimate misconduct. In a lawsuit filed Thursday in Clark County District Court, the billionaire accused former salon artistic director Jorgen Nielsen of defamation.

Steve Wynn claims Jorgen Nielsen, one of his former hair salon artistic directors, made false statements to the media.

Nielsen was one of two people to go on the record with The Wall Street Journal for its January bombshell that publicized decades of sexual allegations that are wrongdoing against the Las Vegas visionary. The former Wynn Las vegas, nevada salon supervisor stated employees were terrified regarding the company owner.

'In falsely Mr. Wynn that is accusing of misconduct in the #MeToo era, Defendant Nielsen acted with all the unlawful purpose of smearing Mr. Wynn and creating workplace dilemmas for Mr. Wynn,' the lawsuit declares.

In the January 27 WSJ expose, Nielsen is quoted as saying, 'Everybody was petrified.' The stylist claimed that both he and other hair salon employees told upper management about Steve Wynn's alleged misconduct, but 'nobody was there to assist us.'

Wynn Blames Ex-Wife

The Wall Street Journal piece ignited a relations that are public for Wynn and the organization. Although he continues to deny all allegations, the nearby scandal ultimately led to their resignation as CEO and chairman of the board.Read more


José Serra: Contra a covid-19

Medidas devem ser voltadas não só para a saúde, mas ter impacto positivo na economia

O quadro imposto pela “crise do coronavírus” exige respostas imediatas. Para começar, a coordenação das diferentes iniciativas tomadas no País precisa considerar o que está sendo feito no resto do mundo. Debelar a covid-19 e amenizar os efeitos sobre a renda das famílias é árdua tarefa. Por isso tenho sugerido a adoção de um protocolo socioeconômico para tratar do problema, incluída a criação de um fundo específico para tornar viáveis eventuais aportes realizados por pessoas físicas e jurídicas.

A escalada do número de contaminados levou a Organização Mundial da Saúde (OMS) a declarar uma pandemia. Torna-se compulsório o acompanhamento sistemático do volume de contagiados com e sem sintomas; hospitalizados graves ou não; e, lamentavelmente, o número de mortos. Até ontem, antes de fecharmos este artigo, o Brasil tinha 2.433 casos confirmados e 57 mortos.

A situação é inédita: restrições à circulação de pessoas, mercadorias e serviços; interrupção das atividades de trabalho e lazer; fechamento da maioria das empresas de comércio e elevação dos gastos públicos. As consequências das restrições impostas demonstram que não é só uma gripe. A pandemia afeta, sobremaneira, a saúde econômica global e não é preciso aqui reiterar os desastrosos resultados na indústria, no comércio e no sistema financeiro mundial. É imperativo, portanto, que Poderes e autoridades brasileiras se unam na busca de alternativas que mitiguem as dificuldades que enfrentamos e que aumentarão muito daqui em diante.

Precisamos observar o que está acontecendo no resto do mundo, não exatamente para copiar outros países, mas para entendermos o que deve ser feito no Brasil. Por exemplo, o papel da política monetária está esgotado nos países europeus. Nos Estados Unidos, antes de reduzirem a zero a taxa de juros, havia algum raio de manobra. Agora não mais. Por outro lado, cabe enfatizar, o ativismo da política fiscal está amplamente presente na Europa e nos EUA e deverá ser cada vez mais forte entre nós.

Cada medida a ser tomada deve ser bem contextualizada. No Brasil ainda há margens para redução das taxas de juros e ampliação das linhas de crédito ou refinanciamentos, a fim de evitar falências generalizadas. Do mesmo modo, deve-se recorrer, no campo fiscal, a políticas de subsídios que ajudem a preservar a capacidade produtiva e incentivar a indústria de medicamentos, material hospitalar, etc., para elevar a oferta tão necessária neste momento. A atuação deve concentrar-se em três frentes: expansão do gasto direto em saúde, em volume expressivo e de maneira célere, transferências de renda às famílias mais pobres e distribuição de alimentos.

Reafirmo: vivenciamos o início do que pode ser a maior crise econômica em tempos de paz, com forte choque de oferta e de demanda em nível mundial. As medidas a serem tomadas devem contemplar não apenas ações voltadas para a saúde, mas, simultaneamente, exercer impactos positivos sobre a dinâmica das economias. No Brasil, efeito perverso sobre a renda e o emprego, sobretudo dos trabalhadores informais, autônomos e microempresários, com a queda abrupta da atividade econômica, requer decisões tempestivas do governo central e do Congresso. Ao anunciar apoio a esses segmentos e enviar o decreto de estado de calamidade, o governo deu passos na direção correta.

Podemos, contudo, fazer mais. Penso que uma alternativa seria criar o que denominaria protocolo socioeconômico, tendo como carro-chefe ações na área da saúde: fortalecimento do SUS, ampliação emergencial do número de UTIs, com hospitais de campanha – o Exército pode tomar essa iniciativa – e reforço do atendimento das unidades básicas de saúde. Associando-se a isso o fortalecimento do Sistema Único de Assistência Social, garantindo direitos socioassistenciais e atendimento mais adequado às pessoas em vulnerabilidade social e em situação de rua. Melhorando a atenção primária.

Além dessas medidas, devem-se adotar, por exemplo, ações que identifiquem os idosos que vivem em assentamentos e em moradias precárias, sem saneamento básico. Isso é possível recorrendo ao Cadastro Único, instrumento criado na esfera federal para impulsionar as ações sociais, uma das muitas benditas heranças do governo FHC. O cadastro permite não só identificar quem é pobre ou extremamente pobre, mas também saber em que condições vivem essas pessoas, tamanho das famílias, faixa etária de cada um de seus membros e o tipo de benefício social que recebem. O instrumento já temos, basta utilizá-lo.

Para garantir a implementação desse protocolo podem-se utilizar os recursos do fundo que mencionei no início, destinando também à pesquisa e compra de medicamentos. Abarcaria ainda dinheiro público, concentrando as ações e garantindo transparência aos gastos. É uma saída orçamentária para acelerar todo o processo, que será penoso e demandará, acima de tudo, atuação eficiente do Estado.

A meu ver, essas são algumas das muitas dimensões a serem trabalhadas para enfrentarmos esse microrganismo que tomou o mundo de assalto e nos tornou reféns.

*Senador (PSDB-SP)


Eugênio Bucci: Por que, em vez da doença, eu prefiro a cura como metáfora

É hora de doar tudo o que pudermos a quem não tem, é hora de bater panela...

Susan Sontag viu nas doenças do nosso tempo, o câncer e a aids, metáforas poderosas para pensarmos sobre as mentalidades que nos aprisionam e nos fazem cativos de preconceitos e medos irracionais. Acertou no nervo. Seus livros A Doença como Metáfora e Aids e suas Metáforas viraram clássicos instantâneos. Mas agora, diante da pandemia da covid-19, em que a civilização foi inteira para a enfermaria – e em parte para a UTI –, a metáfora que olha para nós com ares de esfinge não está na doença, mas na cura.

Sim, eu bem sei que a cura não existe. Não há vacina. Não dispomos de remédios específicos e comprovados, a despeito da propalada cloroquina presidencial. Por enquanto não há um fármaco que aniquile o coronavírus. Quando muito, a medicina nos socorre combatendo os sintomas e os médicos nos apoiam para ganhar tempo, enquanto o corpo, como diria Voltaire, trata de neutralizar a moléstia.

Não há solução individual para ninguém. Uma pessoa que desenvolva um quadro grave da doença terá de contar com os paliativos hospitalares, de um lado, e, de outro, com o próprio organismo para restabelecer o corpo. É só o que temos. Na dimensão coletiva, porém, podemos recorrer a um arranjo coletivo para enfrentar a enfermidade com eficácia. Individualmente, somos indefesos, mas agindo em conjunto, socialmente, podemo-nos proteger. As esperanças que podemos ter são esperanças coletivas. É por aí que começa a metáfora da cura (da cura que ainda não há, mas já é metafórica).

As medidas que os países que não são governados por loucos estão adotando ilustram o que quero dizer. A diminuição organizada dos contatos sociais – com a interrupção das aulas, dos comícios e dos cultos religiosos, além de festas (de aniversário, inclusive) e funerais – vai se mostrando eficaz para retardar e diminuir a intensidade do chamado pico de contaminação. Se não formos por aí, será o caos. Se o volume de casos graves explodir acima de um patamar suportável, faltarão, como se viu em outros países, leitos de UTI com respiradores. Ato contínuo, virá o sufocamento do sistema de saúde, o que vai esgarçar o tecido social, com o risco da generalização de mercados negros (não só de álcool em gel) e da violência descontrolada.

A única opção sensata que temos é ficar em casa e, acima disso, ajudar aqueles que não têm moradias adequadas – e não leem estas páginas – a se proteger. Dependemos agora de renúncia e solidariedade. A renúncia é individual: consiste em abrir mão de sair por aí passeando (para buscar o prazer) ou trabalhando (para buscar dinheiro). A solidariedade, claro, só se realiza no plano coletivo. Dispensar os trabalhadores domésticos sem lhes cortar o salário é o mínimo, mas não é suficiente. Estamos sendo chamados a fazer mais.

O mais interessante é que ninguém pode controlar se será ou não será infectado, mas todo mundo pode controlar, ao menos um pouco, se será ou não um vetor de contágio. Ninguém será bem-sucedido em ficar à distância do vírus, por mais que mantenha no armário do banheiro um estoque de máscaras cirúrgicas (que estariam mais bem empregadas se fossem doadas a um hospital). O vírus virá, seja no desenho da netinha ou no prato que o restaurante caro manda entregar por motoboy. Mas temos chances de ser mais bem-sucedidos em postergar o momento em que o vírus que está em nós atinja o próximo.

Eis, então, a metáfora: a única forma de cuidar de nós é cuidar do outro. Se eu quiser cuidar de mim, individualmente, de forma egoísta, estou roubado e, mais ainda, os outros ao meu redor também estão. Note bem o improvável leitor: no caso presente, os vícios privados não nos levarão a benefícios públicos. Só nos levarão ao desastre.

Vamos dizer “não” ao desastre. Vamos dizer “sim” ao pensamento. A metáfora nos desafia a repactuar as bases da civilização enferma. O Estado despachante do capital precisa ser questionado. Os governos autoritários e destituídos de empatia precisam ser derrotados. O sujeito que faz pose de fortão e chama a pandemia de gripezinha, apoiado em fake news, precisa ser desmascarado. É hora de doar tudo o que pudermos a quem não tem, é hora de bater panela e piscar as luzes do apartamento (para quem tem panela, energia elétrica e apartamento).

É hora disso tudo, mas sem lenga-lenga de autoajuda, pelo amor de Deus. Essa conversa de redescobrir o valor da família e as delícias de lavar com cândida o chão da cozinha, francamente, não dá pé. Haja afetação. Haja mariantonietismo. Eu não vejo nenhuma vantagem em ficar trancado no meu endereço domiciliar dando aulas para um notebook, por meio do qual meus alunos tentam me entender e fazer perguntas tão atentas quanto generosas. Quero reencontrar o quanto antes as pessoas que amo e de quem preciso sentir o calor, o beijo, o abraço. Gosto de perdigotos no meio da rua. Sinto saudades das calçadas sobre a quais salivam, enquanto sonham, as famílias que não têm casa para morar e precisam ser salvas.

No mais, a metáfora me intriga.

*Jornalista, é professor da ECA-USP


Zeina Latif: Bom senso

O momento pede união. O medo de errar e ser julgado não pode paralisar gestores

A polarização da sociedade migrou para quem é a favor ou contra o confinamento social. De um lado, quem se preocupa com as perdas humanas diante do colapso iminente do sistema de saúde; de outro, quem teme a recessão. O presidente, por sua vez, estimula a polarização ao defender que tudo deveria “voltar à normalidade”.

Não há como ser binário. O isolamento é inevitável diante da rápida transmissão da doença. A questão é como fazê-lo de forma racional e cuidadosa. É o chamado confinamento vertical.

O debate é necessário porque parece elevado o risco de um isolamento prolongado, a julgar pelo ritmo de crescimento de infectados, certamente subnotificado.

A definição de regras e critérios precisa partir do governo federal, coordenando os entes da federação.

As recomendações devem se basear em análise de custo-beneficio de cada opção disponível, contando com o trabalho conjunto de profissionais da área de saúde, economistas, prefeitos e subprefeitos, e líderes de diferentes segmentos da sociedade e do setor produtivo.

Fácil falar, difícil implementar.

É possível liberar o comércio de rua e o funcionamento de bares e restaurantes, mas com limitações no número de funcionários e no fluxo de pessoas? Quais as exigências mínimas das autoridades sanitárias e de saúde?

É possível prover segurança sanitária no transporte público, higienizando os meios de transporte, limitando o número de pessoas transportadas, mudando os procedimentos nos terminais, fazendo testes aleatórios nos passageiros?

É possível implementar rodízio de horário e de dias para funcionamento de empresas? Em que setores isso é possível?

Como cuidar da população mais carente, já que, diferente do que acredita o presidente, não será possível confinar apenas os mais velhos em lares com exíguo espaço e onde moram muitas pessoas?

É possível preparar as escolas públicas para receber crianças e idosos, claro que em locais diferentes? Como viabilizar isso?

O que fazer com moradores de rua?

Há riscos de todos os lados. A primeira condição para minimizá-los é ter informação, ampla, precisa, transparente e de qualidade. Profissionais e consumidores precisam saber como proceder.
Não há fórmula pronta a ser importada sem ajustes. Tampouco há políticas definitivas, pois os problemas surgirão aos poucos. Será necessária vigilância dos gestores públicos, capacidade de reação tempestiva e flexibilidade para ajustar as políticas.

A decisão sobre o tipo de confinamento deve acompanhar a discussão sobre a melhor utilização dos recursos públicos. No momento, obter recursos é um problema menor. A prioridade deve ser os gastos com saúde e socorro aos mais vulneráveis. Há muita logística envolvida, porém. Onde comprar ventiladores, exames, materiais de atendimento? Como aumentar a produção e fazer o melhor uso do material escasso? Como fazer o dinheiro chegar a quem mais precisa?

Há muitas perguntas e poucas repostas.

A fala do presidente em cadeia nacional pecou não apenas pelo uso político da crise, jogando no colo dos governadores e prefeitos a responsabilidade pela recessão, mas pela omissão. E a cada frase proferida, Bolsonaro revelou sua incompreensão sobre a natureza do problema e a dura realidade da maioria das pessoas.

O discurso de Angela Merkel inspira: “...nós devemos (..) nos concentrar em uma coisa: desligar atividades públicas o mais rápido possível. Naturalmente, nós devemos fazer isso com racionalidade e senso de proporção, porque o Estado continuará a funcionar, os suprimentos com certeza continuarão a ser assegurados e nós queremos preservar a atividade econômica do melhor jeito que pudermos.”

Qual é a nossa proporção?

O momento pede união. O medo de errar e ser julgado não pode paralisar os gestores. Com coordenação e responsabilidades compartilhadas, o peso nos ombros de cada gestor diminui, permitindo a tomada mais adequada e eficiente de decisões. Evita-se também o oportunismo.

Assim, será mais fácil dar as respostas que o País precisa e reduzir os custos da crise.

*Consultora e doutora em economia pela USP


Ribamar Oliveira: EUA podem emitir moeda. E o Brasil?

Governo brasileiro vai apelar para a venda de reservas cambiais?

Em uma guerra, a primeira vítima é a verdade, já dizia, em 1917, o senador americano Hiram Johnson (alguns atribuem a frase ao grande dramaturgo grego Ésquilo).

Parodiando o senador, em uma recessão, a primeira vítima são os impostos. Quando os empresários começam a encontrar dificuldades em seus negócios, com retração acentuada das vendas, a primeira coisa que fazem é deixar de cumprir suas obrigações tributárias. Este é o principal problema que os governos estaduais, municipais e federal vão enfrentar nos próximos meses, pois, com a queda da receita tributária, terão muito menos recursos para realizar as ações de combate à pandemia do novo coronavírus.

Terão que contar com a ajuda financeira da União. E de grande monta. Mas e o governo federal, onde encontrará recursos?

O que está no horizonte é uma retração brutal da atividade econômica no Brasil e no mundo, provocada, principalmente, pela quarentena a que está sendo submetida grande parte da população. Setores industriais importantes estão parando. E, para completar, o comércio está fechado. Como observou uma importante fonte do governo, “quando o setor de serviços para, acabou”. A expectativa, portanto, é de forte queda da arrecadação federal, estadual e municipal. Em que proporção isso vai acontecer, ainda é uma incógnita.

A receita tributária registrada em março não será um bom indicador, porque os pagamentos de tributos têm certa defasagem. A maior parte dos tributos é paga no mês seguinte ao da competência.

O anexo de riscos fiscais, da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) válida para este ano, dá algumas informações para se avaliar o impacto da recessão sobre a receita tributária. O anexo informa que a variação de 1 ponto percentual do PIB tem impacto de 0,13% na receita previdenciária e de 0,64% nos tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal. Isto significa que para cada 1 p.p. de queda do PIB, a arrecadação com tributos será reduzida em R$ 7,1 bilhões. A receita do Orçamento foi estimada com base em um crescimento de 2,3% do PIB. Mas isso é só o começo.

Há um efeito também da inflação sobre a receita tributária. Segundo o anexo da LDO, uma variação de 1 ponto percentual na inflação tem impacto de 0,13% na receita previdenciária e de 0,61% nas demais receitas administradas pela SRF. Assim, se a inflação ficar 1 p.p. menor que a taxa usada na estimativa da receita, ela ficará R$ 6,8 bilhões abaixo. Por causa da recessão, a inflação ficará abaixo da prevista no Orçamento, que foi de 3,53%, acumulada neste ano.

Um dos principais efeitos da retração da atividade será o aumento do desemprego. As empresas já começaram a demitir, pois estão sem receita para pagá-los. Uma variação de 1 ponto percentual na massa salarial (que é a soma de todos os salários pagos durante o ano) tem impacto de 0,80% na receita previdenciária e de 0,06% nas demais receitas administradas pela SRF. Uma queda de 1 p.p. na massa salarial traria redução de R$ 4,1 bilhões nas receitas, segundo o anexo da LDO.

Se a taxa de câmbio e a taxa de juros variarem em 1 p.p., a arrecadação sofrerá um impacto de 0,10% e de 0,03%, respectivamente. Então, com uma subida de 1 p.p. do câmbio e dos juros, a receita poderá subir R$ 1,3 bilhão. No momento atual, a taxa de câmbio está em alta e a taxa de juros está em baixa.

Haverá perdas também nas chamadas receitas não administradas. O anexo da LDO não estimou, por exemplo, o efeito da queda dos preços do petróleo na receita com royalties do petróleo, que passou a ser essencial para alguns Estados e municípios. A previsão oficial de R$ 68 bilhões para esta receita neste ano foi feita com base em uma cotação média de US$ 58,96 por barril de petróleo. O preço internacional está abaixo de US$ 30. Esta arrecadação terá forte queda neste ano.

No caso das concessões de serviços públicos, o problema é ainda mais grave. O governo programou para este ano uma arrecadação de R$ 16 bilhões com a privatização da Eletrobras. Hoje, é certo que essa receita não ingressará nos cofres do Tesouro, mesmo porque não há clima no mercado para uma privatização. Outras receitas de concessão também não se realizarão.

Esses são os efeitos negativos nas receitas primárias federais. O anexo da LDO não considera, nem poderia, os efeitos da recessão na arrecadação do ICMS, que é um tributo estadual, nem na do ISS, que é municipal. O impacto negativo nos dois impostos será muito forte, embora ainda não se tenha uma estimativa oficial.

Quanto maior forem a recessão econômica e o aumento do desemprego, maior será a redução das receitas tributárias.

O Valor teve acesso a uma projeção preliminar que aponta para perda de R$ 70 bilhões para a arrecadação do governo federal neste ano, na comparação com o que estava programado no Orçamento. Mas não são conhecidas as variáveis utilizadas para se chegar a esta cifra.

O presidente Jair Bolsonaro já anunciou que o governo federal vai compensar os fundos de participação dos Estados e dos municípios (FPE e FPM) pela queda prevista das receitas do Imposto de Renda e do IPI, que compõem os fundos. O governo dará R$ 4 bilhões por mês ao FPE e ao FMP, durante quatro meses. Os governadores já disseram que é pouco.

Haverá também perda de receitas financeiras para o governo federal, pois o Supremo Tribunal Federal (STF) autorizou alguns Estados a não pagarem suas dívidas com a União. Depois dessa decisão, Bolsonaro autorizou uma moratória de seis meses nos pagamentos dos débitos estaduais com a União. Esse prazo, no entanto, não será respeitado, pois os governadores ingressarão no STF pedindo que o não pagamento seja autorizado enquanto durarem os efeitos negativos da epidemia sobre as suas receitas e as suas despesas.

O custo fiscal da crise provocada pelo coronavírus será imenso. Alguns especialistas chegam a falar em mais de R$ 500 bilhões. O governo ainda não divulgou uma previsão. O montante dependerá da duração da pandemia e da duração da recessão econômica.

De onde o governo federal vai tirar os recursos para compensar as perdas das receitas tributárias, para custear as despesas adicionais que será obrigado a fazer na área da saúde, para sustentar os programas de ajuda financeira a trabalhadores informais e às pessoas mais vulneráveis da população e, ao mesmo tempo, ajudar financeiramente Estados e municípios? Para custear o seu pacote de mais de US$ 2 trilhões, o governo americano vai colocar títulos no mercado para captar recursos e, quase certamente, emitir dólares, que é uma moeda aceita mundialmente. O governo brasileiro também vai emitir títulos para arrecadar dinheiro. Vai apelar também para a emissão de moeda? Ou vender reservas?


Maria Cristina Fernandes: A carta da renúncia

A costura de uma renúncia, como saída, passa pela anistia aos filhos

A tese do afastamento do presidente viralizou nas instituições. O combate à pandemia já havia unido o país, do plenário virtual do Congresso Nacional ao toque de recolher das favelas. Com o pronunciamento em rede nacional, o presidente conseguiu convencer os recalcitrantes de que hoje é um empecilho para a batalha pela saúde da nação. Se contorná-lo já não basta, ainda não se sabe como será possível tirá-lo do caminho e, mais ainda, que rumo dar ao poder em tempos de pandemia. A seguir a cartilha do presidiário Eduardo Cunha, seu afastamento apenas se dará quando se encontrar esta solução. E esta não se resume a Hamilton Mourão.

Ao desafiar a unanimidade nacional, no uniforme de vítima de poderes que não lhe deixam agir para salvar a economia, Bolsonaro já sabia que não teria o endosso das Forças Armadas para uma aventura que extrapole a Constituição. Era o que precisaria fazer para flexibilizar as regras de confinamento adotadas nos Estados. Duas horas antes do pronunciamento presidencial, o Exército colocou em suas redes sociais o vídeo do comandante Edson Leal Pujol mostrando que a farda hoje está a serviço da mobilização nacional contra o coronavírus.

Pujol falou como comandante de uma corporação que tem a massa de seus recrutas originários das comunidades mais pobres do país, hoje o foco de disseminação mais preocupante para as autoridades sanitárias. Disse que agirá sob a coordenação do Ministério da Defesa. Em nenhum momento pronunciou o presidente. Moveu-se pela percepção de que uma tropa aquartelada hoje é mais segura que uma tropa solta. Na mão inversa do trem desgovernado do discurso presidencial daquela noite.

Quando já estava claro que descartara o papel de guarda pretoriana, Pujol reforçou a importância do combate ao coronavírus: “Talvez seja a missão mais importante de nossa geração”. Vinte e quatro horas depois, o vídeo ultrapassava 500 mil visualizações, mais do que o dobro do efetivo do Exército.

O distanciamento contaminou os ministros militares com assento no Palácio do Planalto. “Não quero ter minha digital nisso”, comentou um deles ao perceber o rumo provocativo que o pronunciamento da noite de quarta-feira teria. Deixou o Palácio antes da gravação, conduzida sob o comando dos filhos e da milícia digital do bolsonarismo.

A insistência do presidente na tese esticou a corda com os governadores e com o Congresso, que amanheceu na quarta-feira colocando pilha na saída do ministro Luiz Henrique Mandetta. A pressão atingiu o pico do dia com o rompimento do governador de Goiás, Ronaldo Caiado (DEM), com o presidente. Aliado de primeira hora de Bolsonaro, presença mais frequente, entre seus pares, nas solenidades do Palácio do Planalto, Caiado foi um dos principais padrinhos de Mandetta, um deputado do Mato Grosso do Sul que não disputou em outubro de 2018 porque temia não se reeleger.

O ministro negaria a demissão num entrevista em que citou Caiado, mas não Bolsonaro. O Congresso mantinha a aposta na saída de Mandetta como mais um tapume no isolamento do presidente quando João Doria, na reunião de governadores com o presidente, partiu para o confronto. O discurso de palanque do governador de São Paulo não é unanimidade entre os envolvidos em busca de uma solução de consenso, especialmente os da farda, mas sua ação deliberada para levar os governadores a recusar interlocução com o presidente, caiu como uma luva para a estratégia de levar Bolsonaro ao limite do isolamento.

Para viabilizar o enfrentamento dos governadores, o Congresso busca meios de manter o acesso dos Estados a recursos com os quais possam manter suas políticas de combate à doença, hoje confrontadas pelo Planalto. O pronunciamento acabou por frear a proposta de emenda constitucional com a qual se pretendia criar um orçamento paralelo para viabilizar as ações de Bolsonaro no combate à pandemia e calar a tecla com a qual o presidente se diz impedido de agir pelo Congresso. Cogitou-se até incluir nesta PEC instrumentos com os quais Bolsonaro poderia ter mais poderes sobre o confinamento e o confisco de insumos hospitalares, como meio de evitar o Estado de Sítio.

Ainda que Bolsonaro hoje não tenha nem 10% dos votos em plenário, um processo de impeachment ainda é de difícil de viabilidade. Motivos não faltariam. Os parlamentares dizem que Bolsonaro, assim como a ex-presidente Dilma Rousseff, já não governa. Se uma caiu sob alegação de que teria infringido a Lei de Responsabilidade Fiscal, o outro teria infrações em série contra uma “lei de responsabilidade social”. Permanece sem solução, porém, o déficit de legitimidade de um impeachment em plenário virtual.

Vem daí a solução que ganha corpo, até nos meios militares, de uma saída do presidente por renúncia. O problema é convencê-lo. A troco de que entregaria um mandato conquistado nas urnas? O bem mais valioso que o presidente tem hoje é a liberdade dos filhos. Esta é a moeda em jogo. Renúncia em troca de anistia à toda tabuada: 01, 02 e 03. Foi assim que Boris Yeltsin, na Rússia, foi convencido a sair, alegam os defensores da solução.

Não faltam pedras no caminho. A primeira é que não há anistia para uma condenação inexistente. A segunda é que ao fazê-lo, a legião de condenados da Lava-Jato entraria na fila da isonomia, sob a alcunha de um “Pacto de Moncloa” tupiniquim. A terceira é que o Judiciário, agastado com o bordão que viabilizou o impeachment de Dilma (“Com Supremo com tudo”), resistiria a embarcar. E finalmente, a quarta:

Quem teria hoje autoridade para convencer o presidente? Cogita-se, à sua revelia, dos generais envolvidos na intervenção do Rio, PhDs em milícia.

A única razão para se continuar nesta pedreira é que, por ora, não há outra saída. Na hipótese de se viabilizar, o capitão pode estar a caminho de encerrar sua carreira política como começou. Condenado por ter atentado contra o decoro, a disciplina e a ética da carreira militar, Bolsonaro foi absolvido em segunda instância. Em “O cadete e o capitão” (Todavia, 2019), Luiz Maklouff, esboça a tese de que a absolvição foi a saída encontrada para o capitão deixar a corporação.

Em seguida, o Bolsonaro disputaria seu primeiro mandato como vereador no Rio. Trinta e quatro anos depois, a borracha está de volta para esfumaçar o passado. Desta vez, com o intuito de tirá-lo da política.


Juan Arias: Amanhã pode ser tarde demais para deter Bolsonaro

Bolsonaro não só caçoa de uma epidemia que coloca o mundo de joelhos, como tenta se aproveitar dela para minar as instituições democráticas

Nada poderia ser pior do que minimizar o perigo que corre hoje o Brasil nas mãos de um personagem, como o capitão reformado e ultradireitista Jair Bolsonaro, que não só caçoa de uma epidemia que está colocando o mundo de joelhos, como tenta se aproveitar dela para minar as instituições democráticas e sustentar sua ânsia de poder.

Aproveitar este momento de angústia nacional para politizar um drama em que o país está entre a vida e a morte pensando em sua reeleição, é um crime sem perdão.

Com seu estilo sibilino de dizer e se desdizer, de brincar de esconde-esconde, o presidente acaba confundindo e impondo seu estilo de aprendiz de ditador enquanto há quem ainda o veja como inofensivo por considerá-lo um despreparado e incapaz. Pelo contrário, aquele que sonhou em ser general do Exército e acabou como simples capitão é mais perigoso à democracia do que muitos pensam. Vai roendo sem que percebamos nossas liberdades e capacidades de decisão. E espera o momento propício para dar o golpe.

Quem pensava que os militares, começando pelos generais que ele colocou no Governo, seriam garantia contra seus caprichos autoritários hoje se veem isolados e retirados do Governo contra sua vontade se não se colocarem às suas ordens. Todos os seus pecados vão sendo perdoados, até contra o senso comum. Permitem que ele apresente ao exterior uma imagem do país que vai na contramão dos maiores líderes mundiais na luta contra a epidemia do coronavírus porque se pensa que ninguém vai acreditar nele.

O presidente é mais perigoso do que parece porque suas ambições de poder são muito maiores do que imaginam até os que estão ao seu lado. Sua capacidade de totalitarismo e de desejo de colocar aos seus pés as instituições democráticas são insaciáveis e já existem desde jovem, quando sendo simples soldado sonhava em presidir o país utilizando até métodos de terror, como quando no quartel brincava de ser terrorista e subversivo. Também à época o Exército o perdoou porque o considerava inofensivo e ingênuo. Hoje vemos que não era.

Foi considerado como inofensivo também quando já na política, como deputado, fazia troça dos valores democráticos, exaltava as ditaduras e a tortura e humilhava as mulheres e os de outras preferências sexuais. Ele podia tudo porque era considerado inofensivo, do baixo clero. Podia vomitar as maiores barbaridades porque se pensava que era um personagem folclórico, até engraçado, um zé ninguém. Não era. E chegou ao maior cargo do Estado e por voto popular.

Em meio ao drama da epidemia do coronavírus que assusta o mundo e ainda não sabemos quantas vítimas causará, o presidente continua irresponsavelmente em sua teimosia de negar as evidências e ir contra a opinião pública altamente majoritária como revelou a última pesquisa do Datafolha. E se aproveita da tragédia para sonhar até mesmo em impor o estado de sítio e colocar o Exército no comando do país. Exército que, para concretizar seu antigo sonho de poder, agora como Presidente teria aos seus pés.

Enquanto os que realmente importam no país e são responsáveis por seu destino continuarem subestimando os sonhos secretos de onipotência do capitão da reserva, deveriam olhar para trás na história para lembrar que foram personagens que em sua época pareciam inócuos e farsantes que acabaram criando holocaustos e guerras para se vingar dos que os consideravam figuras menores e inofensivas. Será preciso lembrar nomes dos grandes tiranos da História que surgiram da mediocridade da política? Não é difícil lembrar da tragédia do mundo cada vez que para governá-lo forem colocadas em seu comando personagens menores, considerados inofensivos e facilmente domináveis que se tornam insaciáveis em sua loucura pelo poder absoluto.

Se os lúcidos, os normais, os que são capazes de exercer o poder como um serviço à comunidade, acabarem devorados pelas ânsias de poder dos medíocres e falsos loucos capazes de tudo para continuar no pedestal do poder, amanhã pode ser tarde demais.

Não deixemos que o Brasil verdadeiro, hoje amedrontado, o que trabalha e se sacrifica para se apresentar ao mundo como o grande país que é por tradição e história, por sua capacidade de suportar as piores crises, por suas riquezas naturais e espirituais acabe sufocado pela ignorância e a loucura dos que desejam transformá-lo em uma republiqueta periférica no mundo.

Esse amor pelas atitudes violentas e de confronto contra todos, pelos conflitos violentos, pela política do ódio sempre foi o sonho de todos os aprendizes a ditadores que tentaram camuflar seus complexos de inferioridade com o troar dos canhões e o sacrifício de milhões de pessoas perpetrado no altar da loucura política da sede de domínio.

Que o Brasil, assustado com razão por uma epidemia que mata e transforma a todos em prisioneiros de guerra, não espere mais e procure a fórmula constitucional que permita colocar o país nas mãos de alguém normal, sem patologias e delírios de poder capaz de lidar com sensatez nessas horas críticas que podem marcar o futuro de um país que está se revelando solidário e com vontade de vencer essa batalha e continuar com sua vocação de paz e seus desejos de felicidade.

Que o Brasil não precise se arrepender de não ter reagido a tempo deixando que alguém que já deu provas suficientes de que é incapaz de governar um país dessa envergadura e menos ainda em momentos decisivos como esse, continue perigosamente arrastando-o a uma aventura cujo final não é difícil de se imaginar.

E é para hoje. Amanhã será tarde demais.


Afonso Benites: Isolado, Bolsonaro vê Exército, vice Mourão e 27 governadores marcarem distância na crise do coronavírus

Criticado por chamar doença de “gripezinha”, presidente perde aliado Caiado. Presidente do Itaú, maior banco brasileiro, diz: “Sinto falta de um administrador da crise”

Enquanto a população se isola em suas casas para tentar ajudar na contenção do novo coronavírus em boa parte do país, o presidente brasileiro, Jair Bolsonaro (sem partido) fica cada vez mais isolado politicamente. Lideranças do Congresso Nacional, o vice-presidente Hamilton Mourão, representantes do Judiciário, governadores, prefeitos, entidades médicas e até parte da cúpula militar marcaram distância da conduta do mandatário na crise. Entre o pronunciamento em rede de rádio e TV na noite de terça-feira, no qual criticou medidas de isolamento social e voltou a chamar a Covid-19 de uma “gripezinha”, e o início da noite de quarta, cresceram as manifestações contrárias ao principal representante da ultradireita na América do Sul. O comportamento de Bolsonaro conseguiu até unificar discursos de seus opositores, que costumam agir de maneira desalinhada.

O presidente também foi emparedado por governadores da região mais rica e populosa do país, o Sudeste. Quase em uníssono, os representantes de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo disseram, em reunião desta quarta, que preferiam seguir as orientações da Organização Mundial da Saúde às considerações sem embasamento do presidente. Foram acompanhados pelos outros 23 governadores brasileiros.

Em uma teleconferência, um antigo aliado de palanque do presidente, o paulista João Doria (PSDB), iniciou uma discussão, dizendo que Bolsonaro precisava ter calma. “Presidente, como brasileiro e governador, peço que você tenha serenidade, calma e equilíbrio. Mais do que nunca, o senhor precisa comandar e liderar o país.” A resposta veio de maneira irritada: “Guarde suas observações para 2022, quando vossa excelência poderá destilar todo o seu ódio e demagogia”. Doria é pré-candidato à sucessão presidencial.

O mandatário também perdeu apoio de um dos poucos governadores que se declarava bolsonarista-raiz no país, o goiano Ronaldo Caiado (DEM). Médico de formação e político há mais de três décadas, Caiado foi um dos primeiros a declarar sustentação à gestão Bolsonaro. Em um duro pronunciamento, ele disse: “Não posso admitir que venha um presidente da República, lavar as mãos, e responsabilizar outras pessoas pela falência da economia e de empregos. Não faz parte da postura de um governante. Estadistas têm de assumir dificuldades do momento que passam”.

O pronunciamento de Bolsonaro na noite de terça-feira frisou dar atenção à economia, mais do que à saúde, justamente em um momento em que a curva de casos começa a ficar ascendente – são 2.433 registros de contaminados e 57 óbitos. “O sustento das famílias deve ser preservado. Devemos, sim, voltar à normalidade. Algumas poucas autoridades estaduais e municipais devem abandonar o conceito de terra arrasada, como proibição de transporte, fechamento de comércio e confinamento em massa”.

Entidades municipalistas e representantes da classe médica, chamaram o pronunciamento de equivocado. “Postura irresponsável, alicerçada em convicções sem embasamento científico, que semeiam a discórdia e até mesmo a convulsão social, compromete as relações federativas”, diz trecho de nota da Frente Nacional de Prefeitos. “Se a intenção foi acalmar, a reação da sociedade mostra que ele não alcançou seus objetivos”, afirmou o presidente de Associação Paulista de Medicina, José Luiz Gomes do Amaral.

Assim, Bolsonaro, mais uma vez, cometeu o que em política não costuma dar certo: ter de explicar o que disse em um discurso. “Pode ser que ele tenha se expressado de uma forma que não foi a melhor”, disse o vice-presidente, o general Hamilton Mourão (PRTB). Conforme Mourão, “a posição do nosso Governo, por enquanto é uma só: o isolamento e o distanciamento social”. É a mesma linha que vinha sendo adotada pelo ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta.

Ao longo do dia, chegou a circular em Brasília que o ministro, um médico que já foi secretário de Saúde e deputado federal, poderia pedir demissão ou ser demitido. Seu substituto seria ou um militar que comanda a Agência Nacional de Vigilância Sanitária, Antônio Barra, ou o deputado e ex-ministro da Cidadania, Osmar Tera (MDB-RS). O próprio Mandetta botou panos quentes na situação. “Saio daqui na hora que acharem que eu não devo trabalhar, o presidente achar, porque ele que me chamou, ou se eu estiver doente. Ou num momento que eu achar que esse período todo de turbulência já tenha passado e eu possa não ser mais útil”.

Se não bastassem os recados da classe política, Bolsonaro teve de ouvir também os enviados pela classe econômica. Em entrevista ao jornal O Globo, o presidente do Itaú, o maior banco brasileiro, Candido Bracher, disse que sentia a falta no Executivo federal de um administrador de crises. “Sinto falta de um administrador da crise, de alguém que coordene todos os esforços do Governo e possa administrar o arsenal variado de medidas para combater a crise”.

Dos quartéis, o discurso foi prévio ao pronunciamento de Bolsonaro. Enquanto o presidente minimizava os efeitos sanitários da Covid-19, o comandante do Exército, o general Edson Leal Pujol, tratava o combate à enfermidade como um dos maiores desafios da atual geração. “Uma de nossas responsabilidades com a nação nesse momento de crise é que nossa tropa deve manter a capacidade operacional para enfrentar o desafio e fazer a diferença. Talvez seja a missão mais importante de nossa geração”, disse em um vídeo divulgado no canal do Exército no YouTube poucas horas antes do discurso do presidente.

Maia fecha porta ao impeachment
De volta à esfera política, no Congresso Nacional a percepção é de que ficou clara a tentativa eleitoral de Bolsonaro em suas últimas manifestações. Quatro congressistas que costumam se alinhar às pautas bolsonaristas no Legislativo relataram, de maneira reservada ao EL PAÍS, que o presidente está mais preocupado com sua campanha à reeleição, no longínquo ano de 2022, do que com a saúde da população. “Ele foi eleito com apoio forte do empresariado. O PIB de 2019 subiu 1,1%. Para este ano devemos ter uma recessão. Se não conseguir melhorar a economia, perde sustentação”, afirmou um parlamentar.

Entre esses legisladores, o presidente reagiu de maneira antecipada ao rebote econômico da crise, que deve vir e cuja profundidade vai depende de quão o longo processo de lockdown (fechamento) durar. “Todo mundo sabe que o Brasil não é a Europa. Que nossa economia não aguenta ficar 90 dias parada. Mas ainda estava cedo para fazer um discurso econômico. Ainda estamos há algumas semanas do pico de casos. Era melhor o Bolsonaro esperar um pouco para demonstrar essa preocupação econômica. Falar agora demonstrou insensibilidade”, disse outro congressista.

As movimentações do presidente fazem com que, ainda de maneira tímida, comece a ganhar força em Brasília grupos que defendem o impeachment do presidente. Ao menos sete pedidos foram protocolados na Câmara. Não há, contudo, uma sustentação política capaz de dar andamento a esses pedidos, por enquanto. “Não há motivo de impeachment", cortou o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, que é quem ter o poder legal de fazer um pedido de destituição no Congresso. “Como o Governo pode falar de isolamento vertical sem ter plano de contingenciamento para idosos de baixa renda?”, seguiu Maia. “Por mais que ache que o presidente esteja cometendo crimes contra a saúde pública, ao agir dessa maneira, temos de cuidar de uma crise de cada vez”, disse o líder de um partido de direita.

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William Waack: Sopa para o azar

Bolsonaro escorregou feio na falsa disputa entre saúde da economia e saúde das pessoas

No Brasil, a ideia de morrer pela coletividade é um conceito distante. A complacência com a morte e a violência é o que expressa melhor um traço da nossa sociedade – basta observar como nós, brasileiros, conseguimos conviver com taxas horrendas de criminalidade há tanto tempo. Enquanto nos orgulhamos e exaltamos a nossa cordialidade, bom humor e alegria de viver.

Com decisiva ajuda do presidente Jair Bolsonaro, mas não só dele, o debate sobre a crise do coronavírus e suas consequências aqui descambou para um ácido maniqueísmo entre saúde das pessoas versus saúde da economia. Debate que, no fundo, mal encobre uma falsa dicotomia. Não dá para separar uma coisa da outra.

No extremo lógico do argumento abraçado por Bolsonaro vamos chegar a uma questão ética que ele provavelmente nem percebe, e que está contida na expressão “darwinismo social”. Simplificando bastante, significa tolerar que os mais frágeis sucumbam, pois assim determinam as “leis” da evolução social – além da noção (pouco difundida na nossa sociedade) do “bem comum”.

Bolsonaro e a defesa que faz da “saúde da economia” (simploriamente, ele deixou-se identificar com um lado na falsa dicotomia) espelham o fato de a sociedade brasileira tolerar a convivência com brutalidade (e desigualdade e miséria), mas, como cálculo político, traduz um perigoso erro de leitura da realidade. Pois, em política, mesmo com nossas notórias hipocrisias, ninguém conseguirá sobreviver associado à noção de que os mais frágeis precisam perecer pelo bem comum da economia.

Bolsonaro não é um jogador de xadrez e, por isso, é difícil assumir que seus atos sejam uma sequência de lances. Ele é um ser político intuitivo que reage a estímulos dados por um grupo restrito de “conselheiros” obcecados por posturas ideológicas que pouco passam de fantasias perigosas, à paranoia das “conspirações” e ao cálculo prático de quais vantagens políticas se oferecem no prazo mais imediato. Além de copiar o deus Trump, que viu os índices de popularidade subirem quando começou a falar que as pessoas querem voltar a trabalhar.

No caso da crise do coronavírus, ele a enxerga como uma ameaça pessoal trazida pela deterioração provável (só se discute o tamanho) da economia e, consequentemente, dos seus índices de aprovação e chances eleitorais. Ocorre que, nessa competição para superar adversários eleitorais reais ou imaginários – governadores de Estado –, ele abriu uma fissura institucional de consequências políticas difíceis de serem antecipadas (só se discute o tamanho).

É o fato de que passaram a existir várias autoridades no enfrentamento da crise, em vários níveis da Federação. Sem que exista – além da formalização de comitês vários – uma liderança central que seria essencial para enfrentar o que vem por aí, em qualquer sentido. Ao contrário do que parece supor Bolsonaro, o público dificilmente fará uma distinção entre quem disse o quê neste momento sobre como combater a crise.

“Quem tinha razão” vai importar muito pouco lá na frente, pois o País – parte-me o coração ter de dizer isso – já entrou na dupla catástrofe de saúde pública e de economia devastada. A questão da liderança surge mais uma vez como um peso negativo no enfrentamento de nossos problemas – faltaram lideranças consequentes em todos os graves episódios e, sobretudo, lideranças com visões além dos seus interesses políticos mais próximos.

Terminei o texto da semana passada afirmando que o coronavírus era uma ameaça grave para Jair Bolsonaro. Entendido, como ele foi, como uma liderança surgida numa onda disruptiva, a onda de 2018. Não calculava, porém, que a crise pudesse diminuí-lo com tanta rapidez. É o que acontece, como se diz em gíria, quando alguém se empenha em dar tanta sopa para o azar.


Luiz Carlos Azedo: O soldado mais lento

“Enquanto governadores e prefeitos mantêm a política de distanciamento social da Saúde, o ministro Mandetta manobra para não entrar em rota de colisão com Bolsonaro”

Reza a cartilha da infantaria que o ritmo da coluna depende do soldado mais lento, o comandante apenas orienta o rumo da marcha, pois, se acelerar demais, a tropa se dispersa pelo caminho. Formado numa unidade de elite — a Brigada de Paraquedista —, o presidente Jair Bolsonaro conhece os manuais, mas foi treinado para lutar na retaguarda do inimigo, sem front de batalha definido, improvisando muito para chegar aos objetivos. É mais ou menos o que está fazendo na crise do coronavírus, depois de se dar conta de que estava sendo o soldado mais lento, em vez de comandar a coluna.

O bate-boca com o governador de São Paulo, João Doria, que está no epicentro da epidemia, ontem, desnudou as preocupações de Bolsonaro no surpreendente pronunciamento de terça-feira à noite, no qual atacou governadores, prefeitos e a imprensa e criticou a política de distanciamento social: as eleições de 2022. O presidente da República viu na atuação de Doria uma ameaça ao seu projeto de reeleição, porque se deu conta de que a recessão é inevitável, não somente por causa da política de isolamento social: o Brasil já vinha num voo de galinha, frustrando as expectativas geradas pela sua própria eleição, em 2018.

Bolsonaro resolveu mirar a retaguarda dos governadores e prefeitos: os 40 milhões de pessoas ameaçadas de ficarem desempregadas, falidas ou sem nenhuma outra atividade, em razão da crise. A recessão, que está vindo a galope, chegaria de qualquer maneira, porque estamos diante do que pode ser a maior crise da economia mundial desde a Grande Depressão. Se não descobrirem logo uma remédio eficaz para os contaminados e uma vacina que imunize os demais, será inevitável, a não ser que haja uma ação coordenada dos governos das principais economias para mitigar os efeitos da retração global.

Seu discurso teve muita repercussão nas redes sociais e atingiu plenamente o alvo: jogou a culpa da recessão futura nos governadores e prefeitos. Bolsonaro lida com a morte como uma contingência inevitável. Prefere um ciclo breve de epidemia, com uma taxa de letalidade em torno de 3% a 5%, do que uma recessão dessa mesma ordem. Bolsonaro não é médico, que também lida racionalmente com a morte, mas com uma visão humanista, como o governador de Goiás, Ronaldo Caiado (DEM), um aliado de primeira hora, que, ontem, rompeu com o presidente da República e questionou a autoridade de Bolsonaro para tomar decisões de ordem sanitária.

Entretanto, Bolsonaro faz política pelas redes sociais, que reagiram sob seu comando. Os partidários do presidente ganharam uma nova narrativa, saíram da defensiva e partiram para cima dos governadores e prefeitos, melhorando muito o nível de aprovação de Bolsonaro, que havia despencado nesse ambiente das redes sociais. A aposta no confronto aberto, porém, politizou a epidemia e manteve o clima de polarização eleitoral na sociedade, ainda que de forma completamente extemporânea.

Economia
Enquanto governadores e prefeitos mantêm a política de distanciamento social recomendada pelo Ministério da Saúde, o ministro Luiz Henrique Mandetta manobra para não entrar em rota de colisão com Bolsonaro e acabar moído no confronto. Outros atores também se movimentam. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM), negocia a aprovação de cortes de despesas nos três Poderes, inclusive redução temporária de salários de servidores, para destinar mais recursos para a saúde. Esse pacote está sendo elaborado pelo secretário do Tesouro, Mansueto de Almeida. O ministro da Economia, Paulo Guedes, mergulhou. Está sendo eclipsado também pelo presidente do Banco Central (BC), Campos Neto, e pelo presidente da Caixa Econômica Federal, Pedro Guimarães, que já estão sendo cotados para substituí-lo. Guedes é um ultraliberal, dificilmente aceitará uma guinada keynesiano na economia que contrarie frontalmente seus princípios.

Outro personagem importante se movimentou na crise, o vice-presidente Hamilton Mourão, que defendeu o isolamento social como uma política de governo, ao contrário de Bolsonaro. Nos bastidores, comenta-se que seu pronunciamento havia sido combinado com os generais que hoje compõem o Estado-maior do Palácio do Planalto. Na véspera, o comandante do Exército, Leal Pujol, fez um pronunciamento que gerou muitas especulações: “O braço forte atuará se for necessário. E a mão amiga estará mais estendida do que nunca aos nossos irmãos brasileiros”, disse. Trocando em miúdos, reafirmou que a Força é uma instituição do Estado e está em condições operacionais para promover a ajuda humanitária e conter distúrbios sociais, além de evitar que a epidemia chegue aos quartéis e às famílias dos militares.

http://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-o-soldado-mais-lento/


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