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Ricardo Noblat: Relapso, foi. Desonesto, Janot não é

Janot está pagando o preço por ter sido descuidado, relapso e até temerário quando se reuniu com um advogado de Joesley em um botequim de Brasília

De Rodrigo Janot, Procurador Geral da República em final de mandato, o mínimo que se diz nos gabinetes mais poderosos de Brasília é que foi feito de bobo pelos delatores do Grupo JBS, e traído por seu homem de confiança Marcelo Miller, até há pouco procurador da República ocupado com casos da Lava Jato.

O máximo, que Janot e Miller embolsaram algum dinheiro do Grupo JBS para apressar os ritos de sua delação premiada. Miller abandonou o emprego estável na Procuradoria para ajudar na defesa do grupo. Mas desde antes de fazê-lo, orientou a delação de Joesley Batista e discutiu futuros honorários.

Faz sentido, sim, dizer que Janot foi feito de bobo. E que sua pressa em denunciar Temer levou-o a aceitar as exigências descabidas de Joesley para delatar. Daí a sugerir que ele possa ter sido desonesto, não faz o menor sentido. Nada tem a ver com a biografia dele. Nem com seus atos recentes. É maldade pura. Ofensa.

Janot estaria refém de Miller se com ele tivesse extraído vantagens financeiras da delação de Joesley e dos executivos da JBS. Uma vez refém, não o investigaria como fez, não o acusaria de ter atuado como advogado de defesa de Joesley enquanto era procurador, e não pediria sua prisão temporária negada pelo ministro Edson Fachin.

O que Miller não teria a contar para rebater Janot e destruí-lo se o procurador-geral de fato fosse seu refém... Janot está pagando o preço por ter sido descuidado, relapso e até temerário quando se reuniu com um advogado de Joesley em um botequim de Brasília. Não por ter prevaricado. Quem disser o contrário que prove.

 

 


Hubert Alquéres: Centrão, de coadjuvante a protagonista

Desde a redemocratização, o Centrão sempre esteve no poder, mas em papel de coadjuvante. Fernando Henrique Cardoso e Lula, com enormes diferenças, contaram com as forças do atraso em nome da governabilidade. Mas sem transformá-las em principal núcleo de sua base de sustentação.

Com a vitória no Congresso do “Fica Temer”, a constelação de siglas partidárias que formam essa massa gelatinosa adquiriu status de protagonista. Chegou ao núcleo duro do poder, em condomínio com o PMDB, com quem tem identidades nos métodos e na forma de se fazer política.

A assunção do Centrão altera os polos da dualidade estabelecida no governo Temer. Desde o início havia um lado renovador, expresso na equipe econômica, em quadros como Pedro Parente e mesmo em políticos antenados com a modernidade como José Serra e Mendonça Filho.

Havia também o lado arcaico constituído por partidos e políticos formados e forjados em práticas patrimonialistas. Velhos camaradas como Geddel Vieira Lima, Romero Jucá, Moreira Franco, Eliseu Padilha.

Michel Temer é originário desse campo. Por circunstâncias, se compôs com o polo reformista.

Os dois blocos não deixaram de existir, bem como os seus conflitos. O que muda de figurino é a opção do presidente pelo atraso como forma de administrar o contencioso em sua base de sustentação.

Até a delação da JBS, Temer vislumbrava a possibilidade de entrar para a história como um presidente reformista, condottieri da travessia para 2018. Daí nasceu a agenda da reforma, a autoridade da equipe econômica e a escolha do PSDB como principal aliado. Quanto mais seu grupo era atingido, mais força ele transferia para os tucanos, pois necessitava deles para manter a pinguela.

Se antes a preocupação era com a imagem com a qual entraria na história, com a denúncia do Procurador Geral da República, Rodrigo Janot, passou a ser pela sobrevivência. Às favas a história e a opinião pública. Com esse espírito foi a guerra no Congresso, tendo o Centrão como principal estaca de sustentação.

Em grande medida, a escolha se deu por falta de opção. Com o escândalo que o vitimou, perdeu apoios no PSB, PPS e PSDB. Seu aliado preferencial entrou em barafunda com o enrosco do seu presidente licenciado Aécio Neves.

O PSDB saiu da votação dividido, não confiável aos olhos do governo, e queimado com seus eleitores que não aceitam suas dubiedades éticas. Ainda teve de pagar o mico do parecer do tucano mineiro Paulo Abi-Ackel, à favor de Temer. Tudo isso para, mais cedo ou mais tarde, ser alvo da “reacomodação de forças” no interior do governo.

Sim, os tucanos são os grandes perdedores desse imbróglio, com suas vísceras expostas à opinião pública. Divididos, ou não, continuarão no governo, mas com status rebaixado, como coadjuvantes. E com a autoestima de seus militantes esgarçada.

A decepção de peessedebistas históricos com as dubiedades do alto tucanato fica patente em carta dos economistas Edmar Bacha, Elena Landau, Gustavo Franco e Luiz Roberto Cunha ao senador Tasso Jereissati: “Infelizmente, incapaz até agora de se dissociar de um governo manchado pela corrupção institucionalizada que herdou do PT, o PSDB tem optado por deixar vazio o centro político ético de que o país tanto precisa”.

A hegemonia no interior do condomínio governista sai das mãos das forças comprometidas com a austeridade fiscal, com os fundamentos macroeconômicos e com as reformas e vai para setores acostumados à gastança, que só entendem a linguagem da liberação de verbas e cargos.

Essas forças podem até dar uma base sólida a Temer para enfrentar novas denúncias, o que não pode ser confundido com a necessária estabilidade para levar as reformas adiante. Mesmo uma reforma da previdência extremamente desidratada, limitada à idade mínima, encontrará resistência em uma base que se move exclusivamente em função de interesses clientelistas e fisiológicos.

A dependência do Centrão põe em riscos ganhos da política econômica, compromete o equilíbrio das contas públicas e alimenta desconfianças do mercado de que Temer fará novas concessões populistas às corporações para preservar o seu mandato.

A equipe econômica fica tensionada pela compulsão da base de fazer bondades com o erário público. Há um exemplo emblemático: a expectativa era obter R$ 13 bilhões com a MP do Refis/2017, mas a arrecadação deve ficar em R$ 500 milhões se for aprovado o parecer do deputado Newton Cardoso Jr (PMDB-MG), que atendeu a pleitos de empresários da indústria e do agronegócio.

De concessão em concessão o governo perde seu ímpeto reformista, deixa de lado qualquer veleidade modernizante.

O Centrão estava órfão e recolhido ao fundo do palco desde a cassação do seu líder Eduardo Cunha. Com a delação de Wesley Batista vislumbrou a oportunidade de voltar ao primeiro plano, cerrando fileira em torno de Temer. Assumiram o papel de Pit Bull do Temerismo por saber que é dando que se recebe. E já estão recebendo.

 

* Hubert Alquéres é professor e membro do Conselho Estadual de Educação (SP). Lecionou na Escola Politécnica da USP e no Colégio Bandeirantes e foi secretário-adjunto de Educação do Governo do Estado de São Paulo