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Pedro Doria: Duas ideias novas pela democracia

Em essência, elas preveem que os algoritmos das grandes plataformas digitais precisam ser mais transparentes

Esta semana, duas propostas diferentes para como lidar com a desinformação on-line foram postas na mesa. São inovadoras, se implementadas mudarão de forma radical como as grandes plataformas digitais funcionam. Ambas têm por objetivo defender as democracias dos movimentos populistas e autoritários que as capturaram subvertendo as redes sociais. Uma é um projeto de lei da União Europeia. Outra, a ideia de um trio de acadêmicos puxados pelo cientista político Francis Fukuyama. E ambas podem funcionar juntas, se completam.

Os detalhes da nova legislação europeia iam ser divulgados na terça-feira, durante uma teleconferência em que as grandes companhias do Vale do Silício estariam representadas. A conversa foi adiada para a quarta que vem. De qualquer forma, o DSA — ou Ato dos Serviços Digitais na sigla em inglês — será apresentado também na semana que vem ao Parlamento Europeu. A partir daí, ao longo de 2021, os países membros da UE deverão ratificar o texto um por um. Então vira lei no mercado comum.

Em essência, os princípios são simples. Quando o Facebook apresentar ao usuário um post, deverá ter um botãozinho que explique por que aquele e não outro foi selecionado. Vale também para publicidade. E toda propaganda precisa ter explícito quem pagou por sua veiculação.

Em essência, os algoritmos precisam ser transparentes. É fundamental que as pessoas compreendam: as redes sociais, os sites de vídeo, os mecanismos de busca estão escolhendo o que nos apresentam. Pois precisarão explicar por quê. Vale para as grandes: Facebook, Google, Amazon — as líderes de mercado.

A nova legislação também exigirá que as companhias compartilhem os dados com reguladores em determinadas situações. Assim como pode, noutras, exigir que dados sejam compartilhados com concorrentes para não criar vantagens indevidas.

As gigantes digitais apresentam um dilema novo no debate sobre monopólios. Um dos problemas é que por um fenômeno chamado Efeito de Rede, no digital empresas tendem ao monopólio. Quanto mais gente usa uma rede social, mais aquela rede é útil. Quanto mais vídeos há num site, melhor ele é. Mas quando a conversa sobre política se concentra nestes ambientes e o que chega a nós é escolhido pelos algoritmos escritos pelas gigantes do Vale, elas terminam com poder demasiado.

Assim como, descobrimos, suas plataformas podem ser sequestradas por populistas que burlam os sistemas.

A proposta da União Europeia é tornar obrigatório explicar como os algoritmos escolhem a informação que chega a nós. A de Francis Fukuyama e do cientista da computação Ashish Goel, ambos de Stanford, que se reuniram com o economista especializado em antitruste Barak Richman, de Duke, vai em paralelo: middleware.

Ou, ao invés de as gigantes fornecerem o algoritmo, vamos tercerizá-los.

Continuamos usando Facebook, Twitter, YouTube. Mas poderemos escolher outras empresas que fornecem algoritmos de seleção do conteúdo que preferimos. Estes filtros escritos por terceiros podem literalmente escolher o que aparece. Ou serviriam para etiquetar o que é informação falsa, controversa, que falta contexto.

De acordo com a ideia da proposta do trio puxado por Fukuyama, em um artigo publicado na revista Foreign Affairs, estes terceiros seriam obrigados a manter total transparência a respeito de seus critérios editoriais e técnicos.

As duas propostas, a europeia e a dos professores, podem funcionar separadamente ou em conjunto. Em comum têm o fato de serem originais. Além de atentarem para o problema imenso que temos em garantir a proteção da democracia com um ambiente de informação no qual as pessoas voltem a ter voz a respeito do que recebem.