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RPD | Raul Jungmann: Congresso Nacional, Defesa e Forças Armadas

O Parlamento deve assumir suas responsabilidades e definir os rumos da Defesa Nacional e das Forças Armadas, sob pena de amanhã ser qualificado como agente omisso do nosso destino e dos destinos da defesa e da democracia, avalia Raul Jungmann

À minha Casa de origem, onde durante três mandatos de deputado federal fui membro da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, permito-me dirigir um apelo em favor de um tema premente que volta à pauta legislativa para apreciação parlamentar.

A Presidência da República enviou ao Congresso Nacional a terceira revisão da Política Nacional de Defesa (PND), a Estratégia Nacional de Defesa (END) e o Livro Branco da Defesa Nacional. Revisados a cada quatro anos, os textos em questão contêm as mais importantes decisões sobre a defesa do país e o papel das Forças Armadas na manutenção da soberania, interesses nacionais, território, recursos, povo e identidade.

A Política estabelece os objetivos da Defesa Nacional; a estratégia, os meios e ações para alcançá-los; e o Livro Branco é um grande inventário – efetivos, equipamento, disposição e recursos – das nossas Forças Armadas, dando transparência à sua estrutura, organização, recursos e promovendo a confiança junto às demais nações.

Tornados norma pela lei complementar 136 /2010, da qual fui relator na Câmara, as três peças visam submeter ao poder político da Nação os objetivos e meios necessários para a dissuasão de ameaças externas, de sustentação ao nosso desenvolvimento e de projetação do poder nacional onde for preciso, em apoio à política externa e à capacidade de dizer não em nome da nação quando for necessário.

Até aqui, o Congresso Nacional tem-se omitido na definição do papel das Forças Armadas nesse abrangente contexto. Exemplo disso, a política e a estratégia anteriores, de 2016 a 2020, foram aprovadas pelo Senado e Câmara em votação simbólica, sem a realização de uma audiência pública sequer, sem debates e sem participação da sociedade.

Aliás, a política de defesa e a estratégia de defesa de 2016, enviadas em 18 de novembro daquele ano, só lograram aprovação em 17 de dezembro de 2018, dois anos após. Não sancionadas pelo presidente Temer, de saída, também não o foram pelo presidente atual, ficando o Brasil com oito anos de defasagem nessa área, contando apenas como os textos de 2012.

A política e a estratégia de 2020 são políticas de Estado que agora já contemplam possíveis conflitos armados na América do Sul; a situação do Atlântico Sul, por onde passam 97% de nossas exportações, atrai interesses de nações ao norte pela descoberta de petróleo no Golfo da Guiné.

A Amazônia segue sob pressão, e o Ministério da Defesa reivindica que seu orçamento passe dos atuais 1,5% do PIB para 2%. Esse cenário precisa ser analisado, debatido, modificado, ou não, e aprovado pelo Congresso Nacional.

Num mundo com riscos de conflito em alta, em que armas baseadas em tecnologias disruptivas são desenvolvidas, em que o sistema de contenção da corrida nuclear vem sendo desmontado e no qual países incrementam seus orçamentos de defesa, nos imaginarmos uma ilha de paz perpétua é ilusão suicida.

Reafirmemos nosso caráter pacífico e o respeito às demais nações. Nossa observância às regras do multilateralismo e aos acordos e tratados internacionais dos quais somos signatários, e à nossa Constituição. Mas é inexorável que nossa ascensão como nação nos conduza a maiores responsabilidades globais em que restrições e ameaças venham a tentar tolher nossos passos.

No momento em que os militares estão no centro do debate, é hora de o poder político assumir suas responsabilidades e definir os rumos da defesa nacional e das Forças Armadas, sob pena de amanhã ser qualificado como agente omisso do nosso destino, defesa e democracia.

*Raul Jungmann é ex-deputado federal, foi Ministro do Desenvolvimento Agrário e Ministro Extraordinário de Política Fundiária do governo FHC, Ministro da Defesa e Ministro Extraordinário da Segurança PPública do governo Michel Temer. Escreve no Capital Político.