explosão

Nas entrelinhas: O pacto de Bolsonaro com os violentos

Luiz Carlos Azedo | Correio Braziliense

Enquanto o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) negocia os ministérios que ainda estão vagos com os aliados de centro que o apoiaram no segundo turno — um jogo de xadrez cuja rainha é a senadora Simone Tebet, que concorreu à Presidência da República pelo MDB — aumenta a tensão entre os atores encarregados da segurança de sua posse, principalmente depois de uma bomba ter sido desativada em um caminhão tanque de querosene de aviação, nas proximidades do Aeroporto Internacional de Brasília.

No começo, imaginou-se que era apenas uma provocação, mas o avançar das investigações mostra que estava realmente sendo preparado um atentado terrorista. George Washington de Oliveira Sousa, um empresário de 54 anos, responsável por instalar o “artefato explosivo”, apoiador de Bolsonaro, confessou sua intenção de atentado, na expectativa de que o ato provocasse o caos e uma intervenção militar antes da posse de Lula.

No apartamento que o extremista alugou no Sudoeste, no Distrito Federal, os policiais encontraram um fuzil, espingardas, revólveres, munição e outros artefatos explosivos. A Polícia Civil afirma saber que o homem teve ajuda e atua para identificar e prender os outros envolvidos. George Washington era frequentador de audiências públicas no Congresso e participava do acampamento de bolsonaristas defronte ao Quartel Geral (QG) do Exército, que continua sendo o principal ponto de concentração dos radicais de extrema direita que não aceitam a vitória do candidato petista.

Um outro artefato foi encontrado domingo, no Gama, região administrativa do Distrito Federal, pesando 40kg. Ainda não se sabe quem colocou a bomba no local e se o explosivo, desativado por policiais do Grupo de Operações da Polícia Civil, tem relação com o artefato colocado do empresário no eixo de um caminhão-tanque, abastecido com 63 mil litros de querosene de aviação (28 mil no primeiro compartimento, e 35 mil no segundo), no sábado passado.

Milícia política

Ontem, o blogueiro bolsonarista Oswaldo Eustáquio foi preso, a pedido da Polícia Federal, com aval da Procuradoria-Geral da República (PGR), por ordem do ministro Alexandre de Moraes, responsável pelo inquérito das fake news no Supremo Tribunal Federal (STF). A prisão não tem nada a ver diretamente com o fracassado atentado terrorista, a ordem já havia sido dada por Moraes durante a semana. Eustáquio não tem cumprido as medidas cautelares impostas após a revogação de sua prisão. O blogueiro foi preso em junho de 2020, a pedido do Ministério Público Federal (MPF), também por envolvimento com atos antidemocráticos que pediam o fechamento do Congresso e do STF. Em prisão domiciliar, o blogueiro já foi proibido de usar redes sociais e manter contato com outros investigados por fatos recentes, como o ataque ao prédio da Polícia Federal e a uma Delegacia de Polícia Civil no setor hoteleiro Norte.

O presidente Jair Bolsonaro não fez nenhum comentário sobre ambos os casos e continua alimentando a esperança dos radicais de que ainda vai dar um golpe de Estado. Os seus partidários mais fanáticos continuam à porta dos quartéis, sem que nada seja feito pelas autoridades locais nem pelo Exército. O atual chefe do Executivo tem um pacto com os violentos. Primeiro, com as milícias do Rio de Janeiro, cujo modelo de atuação naturalizou e traduziu para a política. Aproveitando-se dos interesses corporativos de categoriais profissionais embrutecidas pelos riscos da própria atividade, além de atiradores e indivíduos que cultuam a violência por temperamento ou ideologia, o presidente da República formou uma milícia política, armada até os dentes, que começa a dar sinais de que pode recorrer à luta armada e ao terrorismo para tentar fazer valer seus propósitos golpistas.

A democracia é uma conquista civil da qual não se pode abrir mão precisamente porque, onde ela foi instaurada, substituiu a violenta luta pela conquista do poder por uma disputa partidária com base na livre discussão de ideias. Condenar as eleições, esse ato fundamental do sistema democrático, em nome da guerra ideológica, significa atingir a essência não do Estado, mas da única forma de convivência possível na liberdade e por meio da liberdade que até agora conseguimos realizar, na longa história de prepotência e violência da nossa sociedade. O povo resolveu a disputa pelo voto, em eleições pacíficas e ordeiras, mas um grupo de radicais de extrema-direita ainda acredita que os militares, liderados por Bolsonaro, darão um golpe. De certa forma, até que a posse se realize, a existência dos acampamentos alimenta essa esperança.

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