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Imagem: Maurenilso Freire

Nas entrelinhas: o fantasma do comunismo renasceu com o bolsonarismo

Luiz Carlos Azedo/Entrelinhas/Correio Braziliense

“Um fantasma ronda a Europa — o fantasma do comunismo. Todas as potências da velha Europa se aliaram numa caçada santa a esse fantasma: o papa e o czar, Metternich e Guizot, radicais franceses e policiais alemães. Que partido oposicionista não é acusado de comunista por seus adversários no governo?”

As primeiras palavras do Manifesto Comunista de 1848 publicado por Karl Marx e Friedrich Engels em Londres, em inglês, francês, alemão, flamengo e dinamarquês, parecem saltar das estantes empoeiradas para a pesquisa Ipec divulgada no domingo pelo jornal O Globo.

Para 44% dos brasileiros, o Brasil corre o risco de “virar um país comunista” sob o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Segundo a pesquisa, 33% concordam totalmente com a afirmação de que um novo regime poderia ser implantado no país; 13% concordam parcialmente com a tese. Discordam total ou parcialmente da ideia 48% dos entrevistados.

A pesquisa mostra que a essência do bolsonarismo é o anticomunismo. O ex-presidente Jair Bolsonaro trata toda a esquerda e mesmo setores liberais como uma “ameaça comunista”. Na campanha eleitoral de 2022, teve nome e sobrenome: Luiz Inácio Lula da Silva. Continua sendo um divisor de águas da política brasileira: 81% dos que afirmam que a gestão Lula é “ruim ou péssima” concordam com o risco de comunismo. Já 71% dos que consideram o governo Lula “bom ou ótimo” rejeitam a afirmação.

A “ameaça comunista” é um tema recorrente na política brasileira, corroborado pela história do Brasil. Fundado por anarquistas, sob a liderança do jornalista e crítico literário Astrojildo Pereira, o Partido Comunista surgiu em 1922. Colheu lideranças da primeira grande onda de greves operárias no Brasil, que ocorreu em 1917, o “ano vermelho”, pois coincidiu com a Revolução Russa.

O Partido Comunista logo foi posto na ilegalidade. Em janeiro de 1927, reconquistou a legalidade, com a eleição de Azevedo Lima para a Câmara de Deputados. Em agosto, foi posto novamente na ilegalidade, pela “Lei Celerada” (Decreto n° 5.221) do governo de Washington Luís. Com o trabalho assalariado e a crescente urbanização, a questão social havia emergido nas grandes cidades e se tornara um caso de polícia.

Naufrágio no passado

A lei limitava a atuação da oposição ao governo e a direito de reunião, pois permitia ao governo fechar por tempo determinado sindicatos, clubes ou sociedades que convocassem ou apoiassem publicamente greves ou protestos. Também proibia a propaganda desses temas e impedia a distribuição de panfletos ou jornais que apoiassem ou incitassem greves e manifestações. A imprensa foi amordaçada. Os sindicatos foram duramente reprimidos, trabalhadores estrangeiros socialistas e anarquistas foram deportados do país.

Com a entrada no Partido Comunista do líder tenentista Luiz Carlos Prestes, comandante da famosa coluna que leva seu nome e o do general Miguel Costa, o comunismo deixou de ser um fantasma. Com o levante comunista em quartéis do Rio de Janeiro, de Recife e de Natal, em novembro de 1935, durante a ditadura de Getúlio Vargas, passou a ser tratado como uma ameaça real. Com o fracasso da chamada Intentona Comunista, Prestes passou nove anos na cadeia.

Entretanto, o fantasma voltou a rondar o Brasil em 1964, durante o governo João Goulart, que assumiu o poder com a renúncia de Jânio Quadros e propôs um programa de reformas de base, entre as quais a agrária. Um discurso de Prestes na Associação Brasileira de Imprensa (ABI), no qual exagerava a influência comunista no governo, seria um dos pretextos para a destituição de Jango pelos militares, em março de 1964.

No livro A Mente Naufragada, o cientista político norte-americano Mark Lilla explica que o espírito reacionário difere muito do conservador. Trata-se de invocar o passado para nele viver sem transformações, o que é muito diferente da atitude do conservador, que tem o passado e suas tradições como referência para agir no presente e construir o futuro.

Lilla conclui que mente reacionária naufragou, “porque olha para os destroços de um passado que lhe parece ameaçado, e luta para salvá-lo, porque não sabe conviver com as mudanças”. Ironicamente, porém, isso faz do reacionarismo um fenômeno “moderno” no mundo da globalização e do multiculturalismo.

No Brasil, o grande porta-voz do pensamento reacionário é o ex-presidente Jair Bolsonaro, que não conseguiu se reeleger. Esgrime o fantasma do comunismo contra toda a esquerda, principalmente o PT, um partido de base operária e social-democrata, que retroalimenta o fantasma do comunismo pela sua narrativa classista e, principalmente, devido às boas relações com Cuba, Venezuela, Nicarágua e, agora, a China.


Caio Gomez/CB/D.A Press

Nas entrelinhas: fusões partidárias fortalecerão ainda mais o Centrão

Luiz Carlos Azedo/Correio Braziliense

Temos atualmente 28 partidos. Formalmente, o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), com um deputado, requer a fusão com o Patriota (quatro deputados) para formar o partido Mais Brasil. Solidariedade (quatro deputados) pede a incorporação do Partido Republicano da Ordem Social, o PROS (três deputados). O Podemos (12 deputados) solicita a incorporação do Partido Social Cristão, o PSC (seis deputados). Mas a movimentação mais importante é a federação ou fusão do PP (47 deputados) e do União Brasil (59 deputados), que resultará na formação da maior bancada da Câmara, com 106 deputados.

Dos 28 partidos e federações que concorreram nas eleições passadas, apenas 13 receberão recursos do Fundo Partidário em 2023, 15 não elegeram deputados federais, nem obtiveram votos suficientes para alcançar a chamada cláusula de desempenho. Os partidos que sobreviveram estão canibalizando os demais. As maiores bancadas na Câmara são do PL, de Jair Bolsonaro, com 99 deputados, e da federação PT-PV-PCdoB, com 81 deputados, que protagonizam a polarização entre o governo Lula e a oposição.

A fusão ou formação de uma federação do PP, liderado pelo ex-ministro da Casa Civil Ciro Nogueira e pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (AL), com o União Brasil, sob comando do deputado Luciano Bivar (PE) e o ex-prefeito de Salvador ACM Neto, consolida a hegemonia do Centrão no Congresso, alicerçado no controle sobre a distribuição de emendas do relator no Orçamento da União.

Essa hegemonia no Congresso cria condições mais favoráveis para o Centrão arrancar concessões do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, seja na ocupação de cargos do governo, seja na aprovação de seus projetos, que geralmente caminham lado a lado. Além disso, o controle sobre as emendas, ao lado das mordomias e privilégios dos detentores de mandatos, além dos recursos dos fundos partidário e eleitoral, desequilibrarão a disputa nas eleições municipais.

Outras fusões e incorporações também deverão ocorrer e compor um espectro partidário mais reduzido e de perfil político mais claro. Considerando o perfil das legendas, a direita mais ideológica será representada pela aliança do PL com o Republicanos, sob forte influência do ex-presidente Jair Bolsonaro, cuja capacidade de transferência de votos nas eleições ficou provada em 2018, 2020 e 2022.

MDB e PSD, com 42 deputados cada, são as forças mais importantes de centro e centro-direita, respectivamente, o que deixa muito pouco espaço para o surgimento de um partido social-liberal, ao centro. PSB, PDT e a Federação Rede-PSol ocupam o espaço da centro-esquerda, ao fazer aliança com Lula. A federação PSDB-Cidadania, com 18 deputados, saiu muito enfraquecida da eleição e vive uma indefinição em relação ao rumo a tomar, uma vez que a opção de ampliação da federação com o Podemos não se consolidou e o projeto da “terceira via” subiu no telhado, com a participação de Simone Tebet no governo Lula. Além disso, suas bancadas se deslocaram da centro-esquerda para a centro-direita.

Crescer ou crescer

Quando Lula se refere à “cooperativa de partidos”, está passando recibo de que essa movimentação pode se tornar uma dor de cabeça nesse começo de mandato. A grande maioria do Congresso se move por interesses, velhas práticas como o patrimonialismo, o fisiologismo e o clientelismo estão vivíssimas. Tudo converge para as emendas de relator, nas quais os verdadeiros autores não são conhecidos. Mesmo nos partidos mais programáticos, o transformismo se impôs durante a gestão de Lira, reconduzido ao cargo com amplíssima maioria. Não existe mais “baixo clero” porque, agora, quem manda são suas principais lideranças, muitas das quais desconhecidas do grande público.

Nesse contexto, Lula navega em meio à calmaria que antecede a borrasca. Haverá uma queda de braço entre o governo e a oposição, na qual o Centrão será o fiel da balança. A mão pesada do governo sempre influencia as votações, ainda mais com um presidente recém-eleito, mas isso depende da preservação da popularidade de Lula, que venceu por estreita margem e enfrenta uma oposição radical nas redes sociais, que já demonstrou ser capaz de ganhar as ruas.

A maior ameaça à governabilidade é a situação da economia, principalmente o baixo crescimento, que inviabiliza as promessas de campanha de Lula. As medidas tomadas pelo governo até agora, tanto na área econômica — como a cobrança de impostos sobre combustíveis — quanto na área social — caso do novo Bolsa Família —, não têm sustentabilidade enquanto a taxa de juros estiver em 13,75%.

Com um crescimento do PIB de 2,9% em 2022, o mercado começa a projetar uma inflação da ordem de 4,9% para este ano, bem abaixo do último Boletim Focus, que era de 5,9%. Se isso ocorrer, o presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, estará na berlinda novamente, porque a taxa de juros se tornará uma ameaça ainda maior ao governo Lula. Não por acaso, a artilharia petista novamente se voltou contra ele, porém, sua blindagem é o Centrão.

https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-fusoes-partidarias-fortalecerao-ainda-mais-o-centrao/

Tragédia em São Sebastião, em São Paulo | Foto: Nelson Almeida AFP

Nas entrelinhas: A tragédia de São Sebastião e a sagração de Lampião

Luiz Carlos Azedo/Entrelinhas/Correio Braziliense*

A tragédia causada pelas chuvas torrenciais em São Sebastião e adjacências, no litoral norte de São Paulo — provocada pela degradação ambiental nas encostas da Serra do Mar e pelas mudanças climáticas decorrentes do aquecimento global, para o qual contribui fortemente o desmatamento da Amazônia —, foi como uma ducha de água fria em pleno carnaval. Não desanimou os foliões de raça, principalmente nos grandes centros carnavalescos, mas mexeu com quase todos, pelo drama humano que estamos vivendo e a certeza de que o planeta realmente está passando por eventos climáticos desastrosos, que aumentam de escala a cada ano.

O episódio serviu para nos mostrar a grande diferença entre os governos atual e anterior, negacionista do aquecimento global. Ao contrário do comportamento do ex-presidente Jair Bolsonaro durante a tragédia ocorrida em Santa Catarina, em dezembro passado, na segunda-feira de carnaval, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deixou a base naval de Aratu, na Bahia, onde passava os dias de carnaval, para vistoriar os estragos, confortar a população e coordenar a ação de seu governo junto ao governo paulista e à prefeitura da cidade. Além da empatia com os flagelados, Lula demonstrou disposição de trabalhar com um adversário político, o governador Tarcísio de Freitas (PR), para tratar do que é mais importante: o socorro às vítimas e a recuperação da infraestrutura da região, principalmente a Rio-Santos, cujo tráfego foi interrompido.

Vendo as cenas pela tevê, lembrei-me do último filme de Akira Kurosawa, Depois da chuva, concluído postumamente. Todo o roteiro, a escalação do elenco e pré-produção foram realizados com o diretor em vida. Ao falecer, em setembro de 1998, aos 88 anos, seu filho ofereceria a direção para seu assistente, Takashi Koizumi, que a agarrou com as duas mãos. Ilhei Misawa (Akira Terao) é um ronin em busca de emprego, que vive o dilema de lutar ou não por dinheiro. Ao lado de sua mulher, Tayo Misawa (Yoshiko Miyazaki), é obrigado a parar em uma pequena hospedaria, porque o rio que deveria atravessar transbordou.

A chuva impede que as pessoas saiam para trabalhar, sobretudo carregadores e artistas errantes. Demorará dias até que o leito do rio volte ao normal e seja possível atravessá-lo novamente, o que gera uma crise social, devido à falta de alimentos e aos desentendimentos que surgem quando o egoísmo e o altruísmo estão em confronto aberto diante da escassez. O humanismo de Kurosawa transborda na tela, ao final do filme: quando a chuva passa, o ronin vai às compras e volta com os mantimentos para alimentar os demais abrigados. A comida farta muda da água para o vinho o comportamento das pessoas, que celebram a vida.

A analogia surge por causa das notícias de que, ao lado da grande mobilização dos órgãos públicos e dos voluntários da Defesa Civil, há uma grande demonstração de solidariedade entre os moradores e da população paulista, por meio de doações de água potável, alimentos, roupas, colchões e cobertores para os desabrigados. Infelizmente, também foram registrados saques aos caminhões que transportavam essas doações, talvez por necessidade, muito provavelmente por banditismo mesmo. Vimos também um governo federal preocupado com os mais necessitados, trabalhando de forma coordenada. Ontem mesmo, o presidente Lula já estava em Brasília, liderando seus ministros.

Carnaval da Imperatriz

Mas vamos falar de carnaval. A Imperatriz Leopoldinense venceu o desfile de escolas de samba do Rio de Janeiro pela 10ª vez, depois de um jejum de 22 anos, com o enredo “O Aperreio do Cabra que o Excomungado Tratou com Má-querença e o Santíssimo não Deu Guarida”. Fez um desfile praticamente perfeito, que contou a saga de Lampião no contexto do Nordeste da década de 1920. A Imperatriz trouxe Matheus Nachtergaele e Regina Casé como Lampião e Maria Bonita, respectivamente, mas o grande destaque foi a filha do casal, Expedita Ferreira da Silva, na última alegoria, que celebrava a herança cultural de Lampião. Com 90 anos, também desfilou na Mancha Verde, no domingo, em São Paulo.

Com três mil componentes divididos em 24 alas, com cinco carros alegóricos, a Imperatriz resgatou a vida de Lampião e seu bando no imaginário popular nordestino, com seus beatos, repentistas, cordelistas, carpideiras e mamulengos. O carnavalesco Leandro Vieira desenvolveu um enredo inspirado nas histórias delirantes de cordéis nordestinos, nosso realismo fantástico, que falam da chegada do cangaceiro Lampião ao céu e ao inferno: A Chegada de Lampião no Inferno, O Grande Debate que Teve Lampião com São Pedro e A Chegada de Lampião no Céu.

Lampião é um mítico anti-herói do nosso cangaço. Na década de 1960, o historiador inglês Eric Hobsbawn incluiu Lampião entre um grupo de criminosos “sociais”, porém se baseou mais nas lendas do que nos fatos, como ele próprio admitiu. Para Alberto Passos Guimarães, foi um fenômeno do banditismo das “classes perigosas”. O cangaço serviu de inspiração para obras como Grande sertão: Veredas, de Guimarães Rosa; o Auto da Compadecida, de Ariano Suassuna; e O Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro, de Glauber Rocha. Produto da miséria, das injustiças sociais e da violência nos sertões nordestinos, Lampião foi glamorizado pela cultura popular, assim como o ronin de Kurosawa.

https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-a-tragedia-de-sao-sebastiao-e-a-sagracao-de-lampiao/

Governo Lula | Arte: Maurenilson Freire

Nas entrelinhas: Qual a natureza do governo Lula?

Luiz Carlos Azedo/Correio Braziliense

Uma das dificuldades para compreender o atual cenário político é a lulofobia da elite política e econômica do país, que majoritariamente apoiou a reeleição do presidente Jair Bolsonaro. O hegemonismo do PT na montagem do governo, porém, fortalece esse sentimento nos setores que só apoiaram o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva no segundo turno, mas tiveram um papel decisivo na derrota de Bolsonaro e seu projeto autoritário. A chave para resolver essa contradição é ampliar a base de sustentação do petista incorporando essas forças ao governo. Lula fará um governo democrático, com certeza, ao contrário da gestão Bolsonaro. Mas com que amplitude?

A resposta é a nomeação da senadora Simone Tebet para a equipe ministerial. Havia uma expectativa de que ela fosse indicada para o Ministério do Desenvolvimento Social, que gerencia o Bolsa Família, mas essa é uma marca do governo Lula, em grande parte responsável pela sua volta ao poder, graças às mulheres e aos mais pobres, sobretudo nordestinos. Portanto, não é nenhum absurdo que o cargo venha a ser ocupado pelo ex-governador do Piauí Wellington Dias (PT), que comandou o seu estado por quatro mandatos e foi um dos articuladores políticos da transição, sobretudo nas negociações com o Senado, para o qual acaba de ser eleito novamente.

O presidente do MDB, deputado Baleia Rossi (SP), foi o principal fiador da candidatura de Simone Tebet à Presidência e defende sua participação no governo desde o início da transição, ao lado de mais dois ministros do MDB, um indicado pelo Senado e outro pela Câmara. Entretanto, há uma disputa na bancada do Senado pela indicação, entre Jader Barbalho (PA) e Renan Calheiros (AL). Ao escolher Dias para o Desenvolvimento Social, Lula deu o recado de quem escala o time é ele, que venceu as eleições, mas isso não significa a exclusão de Simone Tebet. Nos bastidores do novo governo, ontem, ela estava cotada para ser ministra do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, que é um cargo muito importante, mas sem o mesmo apelo social. Ela ainda reluta.

Protesto em São Paulo (SP). Foto: Elineudo Meira/@fotografia.75
Protesto contra Bolsonaro em Maceió (AL). Foto: Gustavo Marinho/Fotos Públicas
Protesto contra Bolsonaro em Maceió (AL). Foto: Gustavo Marinho/Fotos Públicas
Protesto contra Bolsonaro em Maceió (AL). Foto: Gustavo Marinho/Fotos Públicas
Protesto contra Bolsonaro em Maceió (AL). Foto: Gustavo Marinho/Fotos Públicas
Grito dos Excluídos em Porto Alegre (RS). Foto:Caco Argemi/CPERS/Fotos Públicas
Grito dos Excluídos em Porto Alegre (RS). Foto:Caco Argemi/CPERS/Fotos Públicas
Grito dos Excluídos em Porto Alegre (RS). Foto: Maí Yandara/Fotos Públicas
Grito dos Excluídos em Porto Alegre (RS). Foto: Maí Yandara/Fotos Públicas
Grito dos Excluídos em Porto Alegre (RS). Foto: Maí Yandara/Fotos Públicas
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Grito dos Excluídos em Porto Alegre (RS). Foto: Maí Yandara/Fotos Públicas
Grito dos Excluídos em Porto Alegre (RS). Foto: Maí Yandara/Fotos Públicas
Grito dos Excluídos em Porto Alegre (RS). Foto: Maí Yandara/Fotos Públicas
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Grito dos Excluídos em Porto Alegre (RS). Foto:Caco Argemi/CPERS/Fotos Públicas
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Grito dos excluídos/Protesto em São Paulo (SP). Foto: Roberto Parizotti/Fotos Públicas
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Protesto em São Paulo (SP). Foto: Elineudo Meira/@fotografia.75
Protesto em São Paulo (SP). Foto: Elineudo Meira/@fotografia.75
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Protesto em São Paulo (SP). Foto: Elineudo Meira/@fotografia.75
Protesto contra Bolsonaro em Maceió (AL). Foto: Gustavo Marinho/Fotos Públicas
Protesto contra Bolsonaro em Maceió (AL). Foto: Gustavo Marinho/Fotos Públicas
Protesto contra Bolsonaro em Maceió (AL). Foto: Gustavo Marinho/Fotos Públicas
Protesto contra Bolsonaro em Maceió (AL). Foto: Gustavo Marinho/Fotos Públicas
Grito dos Excluídos em Porto Alegre (RS). Foto:Caco Argemi/CPERS/Fotos Públicas
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Grito dos Excluídos em Porto Alegre (RS). Foto: Maí Yandara/Fotos Públicas
Grito dos Excluídos em Porto Alegre (RS). Foto: Maí Yandara/Fotos Públicas
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Grito dos excluídos/Protesto em São Paulo (SP). Foto: Roberto Parizotti/Fotos Públicas
Grito dos excluídos/Protesto em São Paulo (SP). Foto: Roberto Parizotti/Fotos Públicas
Grito dos excluídos/Protesto em São Paulo (SP). Foto: Roberto Parizotti/Fotos Públicas
Protesto em São Paulo (SP). Foto: Elineudo Meira/@fotografia.75
Protesto em São Paulo (SP). Foto: Elineudo Meira/@fotografia.75
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Lula tem dito a interlocutores que vai nomear petistas para metade do governo e compartilhar a outra metade com os aliados. Entre os petistas, tem descartado os senadores com mais experiência e influência na Casa presidida por Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que é o seu aliado principal no Congresso. O Senado é uma trincheira para conter o poder do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). E prestigiado aqueles que foram mais solidários com ele durante a sua prisão e/ou exerceram peso eleitoral muito importante na campanha. Tropas de assalto, porém, não são boas tropas de ocupação, diz um velho jargão militar. Lula sabe disso.

O núcleo dirigente do PT é o círculo mais próximo de Lula: Gleisi Hoffmann, a presidente do partido, que permanecerá na Câmara, ao lado do deputado Rui Falcão. Aloizio Mercadante foi indicado para a presidência do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômica e Social (BNDES), o ex-prefeito de Araraquara Edinho Silva é cotado para a Secretaria de Comunicação da Presidência. Lula cercou-se de petista e aliados com grande experiência administrativa: o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad na Fazenda, o ex-governador da Bahia Rui Costa na Casa Civil, o ex-governador do Maranhão Flávio Dino (PSB) na Justiça e o ex-presidente do tribunal de Contas da União (TCU) José Múcio Monteiro, um político conservador, na Defesa.

Coalizão democrática

Se considerássemos apenas os nomes anunciados até agora, com boa vontade, teríamos um governo popular, com o perfil de frente única da esquerda tradicional na década de 1930. Mas Lula deve anunciar hoje os nomes dos demais ministros, cuja divulgação adiou para esperar a votação da PEC da Transição na Câmara. A simples nomeação de Simone Tebet para um ministério importante já mudará a natureza do governo, que ganha o caráter de coalizão democrática de centro-esquerda. As possibilidades de ampliar ainda mais o governo seriam entregar o Ministério da Fazenda a um representante do sistema financeiro, opção já descartada, ou um pedaço suculento da Esplanada, principalmente o Ministério da Saúde, a Arthur Lira. O indicado era o relator da PEC da Transição, Elmar Nascimento (União-BA), mas Lula não aceitou. Mais pela forma como a proposta foi feita, na base do dá ou desce, do que pela intenção de excluir o PP.

A votação da PEC na Câmara, ontem, mostrou um racha no Centrão, com o PL de Valdemar Costa Neto e Jair Bolsonaro fora do acordo feito por Lira com os líderes de bancada. O racha no Centrão é alvissareiro para Lula, principalmente se levarmos em conta a composição futura da Câmara, na qual o PL terá a maior bancada, com 99 deputados. A federação PT-PCdoB-PV terá 80 deputados (PT com 68, PCdoB com 6 e PV com 6). A terceira opção para ampliar o governo seria a incorporação da federação PSDB-Cidadania, mas o PSDB, ao contrário do Cidadania, já se pôs na oposição. E tenta ampliar a federação com o Podemos para servir de cabeça de ponte à candidatura do governador gaúcho eleito Eduardo Leite em 2026. Obviamente, uma carroça à frente dos bois.

https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-qual-a-natureza-do-governo-lula/

Maurenilson Freire

Nas entrelinhas: Do iliberalismo de Bolsonaro à partidocracia do Centrão

Luiz Carlos Azedo/Correio Braziliense

Nas negociações em curso no Congresso para a aprovação da PEC da Transição, corremos o risco de pular da banha quente da frigideira para cair na panela com água fervendo. Explico: interromper o curso do projeto iliberal do presidente Jair Bolsonaro, porém ser aprisionado por uma partidocracia comandada pelo Centrão. Duas decisões judiciais tentaram interromper esse processo, aquela na qual o Supremo Tribunal Federal (STF), por maioria de 6 a 5, aprovou o parecer de sua presidente, ministra Rosa Weber, e considerou inconstitucional o chamado orçamento secreto; e a liminar do ministro Gilmar Mendes que possibilita a edição de medida provisória extraordinária para a concessão do Bolsa Família no valor R$ 600 e mais R$ 150 por criança de até seis anos.

Entretanto, as duas decisões serviram para acelerar a aprovação da PEC. As do Supremo representaram uma invertida no todo-poderoso presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que estava chantageando o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva para que o relator da PEC, deputado Elmar Nascimento (União-BA), fosse nomeado ministro da Saúde. Mas há mais coisas entre o céu e a terra do que os aviões de carreira, como diria o humorista Barão de Itararé. O pacto perverso, fisiológico e provinciano do colégio de líderes com Lira falou mais alto. A própria bancada do PT, que se antecipou ao presidente eleito no apoio à reeleição de Lira, foi uma das forças interessadas em manter a PEC e aprová-la a toque de caixa. Negociaram um pagamento extra de R$ 16,3 milhões em emendas parlamentares para cada deputado e senador em troca da aprovação da PEC.

O empoderamento do Congresso durante o governo Bolsonaro, do ponto de vista do Orçamento da União, era funcional para o governo que se encerra, porque não havia programa de desenvolvimento. O eixo do governo era desmonte das políticas públicas universalistas e o retrocesso institucional. Por que se preocupar com as emendas, se a reeleição permitiria a venda da Petrobras e outras estatais para fazer caixa e daria a Bolsonaro, com a adoção de um regime iliberal, o poder de recorrer aos instrumentos de coerção do Estado para intimidar, não somente a oposição, mas o próprio Congresso? Agora, com a eleição de Lula, a situação é outra no Executivo; porém, teremos um Parlamento ainda mais fisiológico e conservador a partir do próximo ano.

O perigo nessa conjuntura é a consolidação da partidocracia em formação no Congresso, sob a hegemonia do Centrão e a liderança de Lira. Esse fenômeno surgiu com a formação de grandes legendas de massa e se consolidou na década de 70, em alguns países da Europa, que adotaram o financiamento público da política. Isso fortaleceu os principais líderes das siglas e sua burocracia, porém a participação da sociedade civil na vida política foi progressivamente bloqueada, a começar pelos próprios partidos. O fortalecimento da partidocracia se dá quando os recursos do financiamento público são gerenciados sem orçamento e controle público, sem critérios justos de distribuição dos recursos entre seus diretórios e candidatos.

Captura

Além disso, o fortalecimento do poder financeiro das cúpulas partidárias, em detrimento da difusão de sua política e incorporação da sociedade às suas atividades, também se dá por meio da distribuição de funções remuneradas e da ocupação de cargos públicos. Isso leva à formação de profissionais da política que se mantêm por si mesmo, que vivem da política, e não para a política, como Max Weber havia previsto na sua célebre palestra A política como vocação, na Universidade de Munique, em 1919. Num país de forte tradição patrimonialista, uma herança do nosso passado colonial e escravocrata, onde velhas oligarquias ainda têm grande peso no Parlamento, o resultado desse fenômeno é o distanciamento do Congresso das instituições da sociedade e a ojeriza do cidadão comum à política, aos partidos e a seus políticos de forma generalizada.

Desde 2013, existe um conflito latente entre o mundo da política e a vida real dos cidadãos, que se traduziu em grandes manifestações e na contestação geral ao nosso sistema político-partidário. Como não é um privilégio do Brasil, em todos os países, esse conflito tem resultado no fortalecimento da extrema direita e dos projetos iliberais. Bolsonaro perdeu o poder e o apoio momentâneo do Centrão, mas ninguém deve se iludir quanto à força que ainda tem na opinião pública e numa base eleitoral que se articula pelas redes sociais. Quando uma pesquisa mostra que 32% dos eleitores são a favor de uma intervenção militar, não estão só os malucos e fanáticos que tentam contato com extraterrestres, adoram pneus e rezam ajoelhado na chuva à porta dos quartéis, sem medo de raios e trovoadas.

O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva se equilibra numa corda bamba, embora tenha a legitimidade da eleição e o poder concentrado do governo nas mãos. O seu problema agora é a captura do PT pela lógica da partidocracia, como ocorreu no mensalão e nos escândalos da Petrobras, e que levou Lula à prisão. Como lidar com a força do Centrão sem ser tragado, como negociar com o Arthur Lira sem fazer concessões que possam comprometer o sucesso do próprio governo? Não será com um orçamento que inviabiliza programas de investimentos e as prioridades do governo. O que está se decidindo agora, na largada do novo governo, é estratégico. Pode levar Lula ao sucesso ou ao desastre.

https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-do-iliberalismo-de-bolsonaro-a-partidocracia-do-centrao/

PCB protagonizou luta pela democracia | Imagem: Caio Gomez

Nas entrelinhas: PCB, da luta armada à defesa da democracia

Luiz Carlos Azedo/Correio Braziliense

Biógrafo do jornalista Carlos Castelo Branco (Todo aquele imenso mar de liberdade) e do senador Teotônio Vilela (Senhor República), o escritor e jornalista político Carlos Machi lança hoje o seu mais novo livro: Longa jornada até a democracia (Fundação Astrojildo Pereira), o primeiro volume de uma história dos 100 de fundação do Partido Comunista Brasileiro (PCB), desde as ideias que lhe dariam origem, em 1922, até a realização do VI Congresso, em dezembro de 1967. Será às 19h, no Beirute, tradicional reduto de estudantes, jornalistas e boêmios de esquerda, na Asa Sul do Plano Piloto de Brasília.

Quem imagina uma obra apologética e maniqueísta, irá se surpreender. O livro conta a história do PCB como quem prepara o peixe com um olho no gato e o outro na frigideira. O duplo olhar de Marchi contextualiza o papel do PCB na história do Brasil e, ao mesmo tempo, mostra as contradições de seus dirigentes com a antiga União Soviética, e entre eles próprios. Um processo no qual uma das vítimas foi o próprio fundador do partido, o jornalista e escritor Astrojildo Pereira, que caiu em desgraça após uma viagem a Moscou, em 1930, mesmo depois de capitular diante dos dirigentes do Comintern, que consideravam muito próxima uma revolução comunista no Brasil.

Carlos Marchi lançará livro Longa Jornada até a Democracia, em Brasília

Livro Longa Jornada até a Democracia, de Carlos Marchi, será lançado em São Paulo

Havia, sim, uma revolução em gestação, mas era a de 1930, liderada por Getúlio Vargas, com adesão dos líderes tenentistas. Entretanto, não obteve apoio de Luiz Carlos Prestes, que havia se aproximado dos comunistas. Astrojildo lhe entregara uma mala de obras marxistas durante o exílio do comandante da Coluna Prestes na Bolívia. Por pura ironia, Prestes voltaria ao Brasil anos depois, para fazer a tal revolução, enquanto Astrojildo amargava o ostracismo político: vendia bananas e escrevia críticas literárias e ensaios sobre a sociedade brasileira.

O livro tem um olhar crítico sobre a atuação de Prestes, sem embargo de reconhecer seu papel decisivo na história do Brasil. O líder comunista teve o destino do país nas mãos em 1930, quando recusou o comando da Revolução, e em 1945, quando saiu da cadeia e decidiu apoiar Vargas, na redemocratização. Quando o ex-ditador voltou ao poder, eleito em 1950, os comunistas lhe fizeram oposição. Só foram defendê-lo depois do suicídio, em agosto de 1954.

A tórrida paixão entre Prestes e Olga Benário, a judia alemã treinada pelos serviços de inteligência do Exército Vermelho e escalada para fazer sua segurança, chamava atenção. Era um casal improvável: ele, baixinho; ela, muito alta — razão pela qual a volta de Prestes de Moscou para o Brasil foi uma longa viagem, que durou quatro meses e virou lua de mel. Percorreram várias capitais europeias, atravessaram o Atlântico até Nova York, de onde desceram para Montevidéu. A entrada clandestina no Brasil, com escalas em Buenos Aires e Florianópolis, foi rocambolesca.

Aggiornamento

Marchi põe o holofote nas divergências na cúpula do Comintern sobre a linha a ser adotada por Prestes e no papel de um agente inglês infiltrado no grupo de revolucionários que o assessorava. O alemão Johann De Graaf, que era oficial do Exército Vermelho, desembarcou no Brasil com o nome falso de Franz Paul Gruber. Foi encarregado de montar uma caixa-forte que explodiria com os documentos de Prestes e os planos da insurreição, mas isso não aconteceu. Johann manteve os serviços de inteligência britânicos informados sobre tudo e chegou a receber uma carta de agradecimento de Vargas. Olga, grávida quando foi presa com Prestes, foi deportada para a Alemanha. Morreu num campo de concentração nazista, onde nasceu Anita Leocádia Prestes.

Ao longo do livro, o foco de Marchi é o progressivo “aggiornamento” do PCB, da opção pela armada, em 1935, ao compromisso com a democracia, na Declaração de Março de 1958. Como bom repórter, revela, em primeira mão, a localização do “aparelho” no qual foi realizado o 6º Congresso do PCB, em São Paulo, em 1967, quando o partido adotou a linha de ampla frente democrática para a redemocratização do país e rechaçou a opção pela guerrilha urbana contra o regime militar, defendida pelo líder comunista Carlos Marighela e alguns dirigentes históricos do PCB, sem a menor chance de dar certo.

Contraditoriamente, na preparação do congresso, o dirigente comunista Salomão Malina, ex-integrante da Força Expedicionária Brasileira (FEB) e herói da tomada de Montese, na Itália, durante a II Guerra Mundial (recebeu a Cruz de Combate de 1ª Classe), perdeu os dedos da mão direita e teve o pulmão perfurado ao desativar uma granada defeituosa. Em coma, foi operado clandestinamente no Hospital das Clínicas de São Paulo.

Sapador, Malina estava encarregado de garantir a fuga de Prestes caso o congresso fosse localizado pelos órgãos de segurança do regime militar. Mais tarde, seria o último secretário-geral do partido e, em 1991, apoiaria a mudança do nome e da sigla do PCB para PPS, atual Cidadania.

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Luiz Carlos Azedo: Quando o mercado não resolve

A greve dos caminhoneiros tem um componente externo, a alta do dólar e seu impacto nos preços do petróleo, e outro interno, a crise política e ética, que fragilizou muito o governo

A greve dos caminhoneiros — na verdade, um grande locaute das empresas de transportes e distribuidoras, muito mais do que apenas dos avulsos — pegou o governo de calça curta. Em três dias, pôs em colapso o abastecimento de combustível, com grande especulação de preços nos postos de gasolina, e parte da frota de ônibus de transporte urbano nas garagens das principais cidades do país. Particularmente grave, ontem, foi o desabastecimento dos aeroportos, sem querosene para os aviões em alguns estados e no Distrito Federal. No começo da noite, o presidente de Petrobras, Pedro Parente, anunciou a redução de 10% no preço do diesel, por 15 dias, para que possa haver uma negociação entre as partes envolvidas.

Parente é apontado como o grande pivô da crise, por causa da política de preços da Petrobras, que acompanha o mercado internacional, dolarizado. Na entrevista coletiva de ontem, afirmou que a iniciativa de reduzir o preço do diesel foi da diretoria da empresa, diante do caos no sistema de transportes do país, mas garantiu que a política de preços da estatal não será alterada. O fato é que o mercado não foi capaz de se regular no setor; o impacto na política de preços gerou uma crise grave, que tensiona as relações da Petrobras com o governo e não terá uma solução técnica desvinculada de ampla negociação política. Um fator de desestabilização do governo às vésperas do processo eleitoral.

O presidente da Petrobras, porém, é um experiente executivo do setor público e sabe como a banda toca nessas horas. O recuo tático dele foi providencial, porque a primeira cabeça a rolar na crise seria a dele; e, com isso, todo o esforço para pôr a Petrobras nos eixos poderia ir por água abaixo. A paralisação é nacional, a própria Petrobras foi duramente atingida, pois o bloqueio das estradas e da saída de caminhões-tanque das refinarias já ameaçam a própria produção da empresa, que será interrompida se a greve continuar. Segundo a Petrobras, o preço do diesel deve cair 1,54% nas refinarias. A Agência Nacional do Petróleo, do Gás Natural e dos Biocombustíveis (ANP) avalia que o preço médio do diesel nas bombas já acumula alta de cerca de 8% no ano, ou seja, muito acima da inflação acumulada no período, de 0,92%, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Nas negociações com os caminhoneiros, conduzidas pelo ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, não se chegou a uma solução razoável. As medidas adotadas pelo governo, inicialmente para reduzir o preço do diesel, no qual os impostos representam 50%, não foram suficientes para baixar os valores na bomba. O governo precisa de contrapartidas no Orçamento da União para deixar de coletar os tributos federais; a parte do leão dos impostos cobrados, porém, corresponde aos governos estaduais, por causa do ICMS. É preciso um acordo com os governadores, o que toma tempo.

Apesar de enfraquecido, o governo negocia com um porrete na mão, pois o juiz Marcelo Pinheiro, da 16ª Vara Federal do Distrito Federal, concedeu reintegração de posse de seis rodovias federais (BR-040, BR-050, BR-060, BR-070, BR-080 e BR-251) bloqueadas pelos caminhoneiros. Determinou a imediata liberação do tráfego, autorizando “medidas indispensáveis ao resguardo da ordem e, principalmente, para segurança das pessoas afetadas com o movimento paredista”. Pinheiro autorizou o uso de força policial “para assegurar que, durante a intimação dos requeridos e desobstrução das rodovias, não sejam praticados atos ilícitos ou depredatórios”. A ação foi impetrada pela União contra a Associação Brasileira de Caminhoneiros (Abcam).

Sem apoio
Conciliador, o presidente Michel Temer pediu “trégua” de dois ou três dias aos caminhoneiros para encontrar uma “solução satisfatória” sobre o preço dos combustíveis, segundo ele próprio anunciou numa solenidade no Palácio do Planalto, ao mesmo tempo em que Padilha negociava com os grevistas. “Desde domingo, estamos trabalhando nesse tema para dar tranquilidade não só ao brasileiro, que não quer ver paralisado o abastecimento, e tentando encontrar uma solução que facilite a vida dos caminhoneiros”, afirmou. O problema é que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), não está nem aí para as dificuldades do governo. Em entrevista, desmentiu que a reoneração da folha de pagamento, aprovada pela Casa, venha a ser utilizada na composição do acordo com os caminhoneiros. De quebra, retirou de pauta a privatização da Eletrobras, provocando forte queda na Bolsa de Valores de São Paulo. Maia é pré-candidato a presidente da República.

A greve tem um componente externo, a alta do dólar e seu impacto nos preços do petróleo, e outro interno, a crise política e ética, que fragilizou muito o governo e gera insegurança por causa da imprevisibilidade dos resultados eleitorais. Há um conflito distributivo que o governo não tem força para gerenciar sem apoio do Congresso que, por sua vez, está agindo irresponsavelmente. Na noite de ontem, por exemplo, no Senado, por muito pouco uma emenda jabuti na medida provisória que permite a venda direta de petróleo do pré-sal (MPV 811/2017) não comprometeu os leilões do pré-sal que estão marcados. Antes da MP, a lei de criação da Pré-Sal Petróleo S/A (PPSA — Lei 12.304/2010) permitia apenas a contratação de agentes de comercialização para vender o petróleo da União. Com a MP, fica permitido à PPSA realizar diretamente a venda da parte de óleo devida à União na exploração de campos da bacia do pré-sal com base no regime de partilha.

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Luiz Carlos Azedo: Suprema encruzilhada

Até a noite de ontem, ninguém sabia ainda o que seria votado hoje no Supremo, exceto a intenção anunciada pelo ministro Marco Aurélio Mello de “levar à mesa” um polêmico pedido de esclarecimento sobre execução da pena em segunda instância, que animava os petistas a pressionar o Supremo a livrar Lula da cadeia. No começo da noite, Marco Aurélio recuou. Não se tratava de uma decisão sobre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mas sobre o destino da Operação Lava-Jato e de todos os políticos que nela estão enrolados, o que envolve manobras de bastidor de grandes bancas de advocacia, partidos políticos e até mesmo ministros da Supremo.

Marco Aurélio tem em mãos dois pedidos de habeas corpus, um do ex-ministro Antônio Palocci, do PT, atualmente preso na carceragem da Polícia Federal em Curitiba, e outro do deputado Paulo Maluf, do PP, em prisão domiciliar em São Paulo, cuja apreciação está prevista para hoje. Regimentalmente, esse tipo de pedido tem preferência, mas Marco Aurélio pretendia sugerir que a presidente do Supremo, ministra Cármen Lúcia, pusesse primeiro em apreciação a questão da execução da pena para condenados em segunda instância. Esse virou um tema recorrente da Corte, que parece um veículo obrigado a fazer todas as tesourinhas do Eixão de Brasília.

O pedido de liminar havia sido impetrado, em nome do Partido Ecológico Nacional (PEN), pelo advogado Antônio Carlos de Almeida Castro. Ontem, porém, a legenda o destituiu da representação. Seu substituto, o advogado Paulo Fernando Mello, afirmou que o pedido de liminar foi apresentado sem anuência da direção do partido. Disse que a legenda é a favor da prisão em segunda instância e pediria a retirada da liminar da pauta do Supremo Tribunal Federal (STF), esvaziando uma crise que se anunciava.

Almeida Castro também havia entrado com um pedido de liminar contra a prisão em segunda instância em nome do Instituto de Garantias Penais, que reúne advogados, na condição de “amicus curiae”, ou seja, parte interessada no processo. O desembarque do PEN levou Marco Aurélio a rejeitar o pedido do IGP. Uma semana depois de o Supremo negar um pedido de habeas corpus para Lula (negado em votação muito apertada: 6 a 5), o pedido enfrenta a oposição do Ministério Público, pois a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, se manifestou contrária à concessão da liminar. Disse que o pedido se baseia na suposição de que haveria um voto favorável da ministra Rosa Weber.

Coerência
Mais uma vez, as pressões e contrapressões convergiam para a ministra Rosa Weber, que rejeitou o habeas corpus de Lula, mas questiona doutrinariamente a execução da pena a partir de condenação em segunda instância. Entretanto, a ministra aplica a jurisprudência vigente, com o argumento de que o respeito ao colegiado fortalece o Judiciário, o direito e a segurança jurídica. Para Weber, a mudança de composição do tribunal e da opinião de um dos seus integrantes, no caso o ministro Gilmar Mendes (que era a favor e agora lidera os ministros que são contrários à prisão em segunda instância), “não justificaria a mudança de entendimento da Corte em tão breve tempo”.

Esse é o busílis do adiamento do julgamento. Seu desfecho estará nas mãos de Rosa Weber se a presidente da Corte, ministra Cármen Lúcia, resolver submeter o assunto aos seus pares. Nos bastidores do Judiciário, ontem, cresciam novamente as apostas de que Rosa Weber votaria a favor da liminar. No julgamento da semana passada, porém, a ministra disse que seria mais coerente não mudar a jurisprudência agora, sob impacto da prisão do ex-presidente Luiz Inácio da Silva e das denúncias contra outros políticos importantes.

A repercussão internacional da prisão de Lula favorece as pressões de outros políticos enrolados na Lava-Jato sobre ministros de suas relações e aprofunda a divisão no Supremo. Ontem, mais uma vez, o relator da Operação Lava-Jato, ministro Edson Fachin, ficou isolado na segunda turma do Supremo, que decidiu transferir o ex-governador Sérgio Cabral, que está preso em Curitiba, de volta para o Rio de Janeiro. Votaram a favor da transferência os ministros Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Antônio Dias Toffoli. O ministro Celso de Mello não participou da sessão.


Luiz Carlos Azedo: Cenários da incerteza

A saída de Lula da eleição não trouxe grande alteração nas pesquisas. A candidatura de Geraldo Alckmin, que seria o candidato do centro, continua estagnada. Colabora para isso a crise do PSDB

A pesquisa Datafolha de ontem, em seus noves cenários, mostrou que a situação de incerteza política aumenta com a saída de Luiz Inácio Lula da Silva, embora a polarização entre o ex-presidente e o deputado Jair Bolsonaro, que assumiu a liderança (de 15% a 20% de intenções de voto), deixe de existir, exceto para os petistas. Sim, porque a pesquisa eleitoral ainda alimenta a estratégia de manutenção da pré-candidatura de Lula até que seja declarado oficialmente inelegível. Entretanto, também revela que isso pode ser um erro desastroso para o PT. A rejeição de Lula está em 53% e tende a crescer com a agenda negativa do petista nos tribunais, puxando para baixo seus índices de intenções de voto, que variam entre 37% e 34%, dependendo do cenário.

Com Jair Bolsonaro firme na liderança, Marina Silva se mantém em segundo lugar em todos os cenários, oscilando entre 8% e 16% (sem Lula). A entrada em cena de Luciano Huck, que consta de três cenários (varia de 5% a 8% de intenções de votos), puxa Lula para baixo e todos os demais candidatos que disputam a segunda colocação. Com Lula candidato, o apresentador aparece empatado com Ciro Gomes, que tem de 7% a 13% de intenções de votos, e Geraldo Alckmin, de 6% a 11%, mas perde para Ciro no cenário em que o petista está fora da disputa. Álvaro Dias (de 3% a 6%) vem logo atrás em todos os cenários. João Doria (de 4% a 6%) e Joaquim Barbosa (de 3% a 8%) completam o terceiro pelotão quando são incluídos na pesquisa. Resumo da ópera: a saída de cena de Lula pulveriza o quadro eleitoral na largada.

A estratégia petista pode virar um tiro no pé do candidato mais cotado para substituir Lula, o ex-governador Jacques Wagner. Embora tenha muita identidade com os militantes petistas e um reduto eleitoral consolidado, a Bahia, o petista teria que aguardar a impugnação do registro da candidatura de Lula para se tornar candidato, o que é temerário. Primeiro, porque o desgaste do ex-presidente da República deve aumentar por causa da Operação Lava-Jato; segundo, porque o tempo para Wagner fazer campanha se reduzirá dramaticamente. O ex-governador baiano tem apenas 2% de intenções de votos, um a menos do que o ex-presidente Fernando Collor de Mello, por exemplo. Sua substituição pelo ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad não muda nada.

Centro órfão
A saída de Lula da eleição não trouxe grande alteração na pesquisa porque a candidatura do governador Geraldo Alckmin, que seria o nome do centro, continua estagnada. Colabora para isso a disputa interna do PSDB, na qual o prefeito de Manaus, Arthur Virgílio Neto, vem fazendo duros ataques ao paulista, além das dificuldades que enfrenta para fazer a aliança com o PSB, do vice-governador Márcio França, que assumirá o governo e já anunciou que será candidato à reeleição, com ou sem apoio dos tucanos. O estranhamento com o presidente Michel Temer também atrapalha a candidatura de Alckmin, que não consegue ampliar suas alianças nacionalmente.

Essa situação estimula o surgimento de candidaturas de centro, que tentam ocupar o espaço vazio da eleição. O mais provável é que a pulverização se mantenha até o início do horário eleitoral, quando o volume de recursos partidários e o tempo de rádio e televisão começarão a fazer a diferença para os candidatos que conseguirem fechar coligações mais robustas. Essa é a aposta tanto de Alckmin como de ninguém menos do que o presidente Michel Temer se a reforma da Previdência for aprovada.

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