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José Roberto Mendonça de Barros: Política ambiental é entrave ao crescimento

Instituições que comandam cerca de US$ 45 trilhões participam de movimento que não pretende investir e comprar ativos de companhias que não tenham boas práticas ambientais, sociais e ambientais

Aos poucos, o mundo começa a vencer a crise do coronavírus, embora com velocidades muito distintas em diferentes regiões. Vimos, ao longo de 2020, muitos países – quase todos na Ásia – lidarem bem com a ameaça da covid-19 e que já estão avançados na recuperação do crescimento. 

Em contrapartida, Europa e Estados Unidos enfrentam agora uma segunda onda da doença, fato que está barrando uma retomada mais robusta na produção e no mercado de trabalho, a despeito da enorme expansão fiscal e monetária empreendida. Mas com um sinal de esperança nesta virada do ano: o pico dos novos casos e mortes coincide, felizmente, com o sucesso de várias vacinas e o início da imunização em larga escala da população. É, portanto, razoável pensar que a maior parte da economia mundial estará em crescimento no segundo semestre de 2021.

Ao mesmo tempo, deveremos assistir a novas tensões e tendências.

No campo das tensões, destaca-se a percepção, exposta e exacerbada pela pandemia, das grandes desigualdades entre pessoas, setores e regiões. Também é certo que a disputa entre as duas grandes potências globais em diversas áreas vai continuar, a despeito da derrota de Trump.

Muitas coisas novas vão se consolidar. Para mim, as mais importantes são a aceleração do progresso técnico, o enfrentamento da questão ambiental e a consequente aceleração da transição energética.

Esse simples resumo da economia global mostra como a situação brasileira é desoladora neste início de 2021.

Antes de tudo porque o negacionismo e o trato dado à covid-19 pelo presidente Bolsonaro encerraram em grande estilo mais uma década perdida. Como disse recentemente o prof. Antonio Delfim Netto, o Brasil desaprendeu a crescer, algo que já estava presente em meu livro Crescer não é fácil, de 2012.

A piora da atual situação será bastante acentuada pela despreocupação na aquisição de vacinas e pela permanente campanha do governo federal contra o necessário distanciamento social e outros cuidados. O resultado será retardar a volta ao trabalho e à normalidade, ainda mais com o final da ajuda emergencial.

Não é impossível um crescimento negativo no PIB do primeiro trimestre em relação ao último de 2020. O primeiro semestre será muito fraco.

Além dos descaminhos e dos absurdos da política governamental relativa à pandemia, temos mais duas áreas nas quais há que se construir algum horizonte antes de imaginar uma retomada do crescimento. Falo aqui da política fiscal e da política externa/ambiental.

A questão fiscal é fácil de descrever, mas quase impossível de encaminhar de forma adequada nas condições atuais. Trata-se de equacionar o que se quer do orçamento: qual a projeção realista de receitas (com ou sem elevação de impostos), o total de despesas e o consequente déficit. É preciso também compatibilizar gastos obrigatórios, a dimensão dos programas de transferências (novo Bolsa Família?) e o volume de investimentos públicos. Evidentemente, o tamanho do déficit tem de ser compatível com uma trajetória aceitável da dívida pública, sob pena de pressionar o dólar e os juros

Eventuais alterações de regras (como a PEC Emergencial) terão de ser aprovadas para dar apoio adequado ao programa votado.

Dado que o objetivo prioritário do Executivo é a reeleição, que o apetite da nova base do governo é insaciável e que o nível de atividade é baixo, a missão acima descrita é quase impossível.

Finalmente, devemos considerar as políticas externa e ambiental frente à situação internacional, que entra em nova fase com a eleição de Biden e após as negociações do Brexit.

O primeiro caso é fácil de expor: a derrota de Trump deve levar ao encerramento da carreira do mais medíocre chanceler de todos os tempos. Nunca tivemos um ministro que comemora ter transformado o Brasil num pária internacional.

A retomada da diplomacia civilizada entre Estados Unidos e seus principais parceiros deve, antes de tudo, acelerar a pauta do Acordo de Paris, da luta contra o aquecimento global e da sustentabilidade ambiental.

A situação brasileira nesse quesito ficará insustentável, bem como a posição do ministro Salles. Não há como evitar a percepção de que a política brasileira dos últimos anos enfraqueceu a fiscalização e o zelo na lida contra a derrubada ilegal da floresta, com a consequente elevação das queimadas.

A maioria das empresas globais está se posicionando para reduzir compra de produtos que não tenham claramente demonstração de origem e certificações de boas práticas, como é o caso de muita coisa que vem da Amazônia. E isso é uma ameaça real. Atividades ilegais jamais trarão desenvolvimento verdadeiro para a região.

Além disso, em 2020 consolidou-se o movimento de empresas e fundos de investimento de não comprarem ativos de companhias que não tenham boas práticas ambientais, sociais e de governança (ESG, em inglês). Apenas para ver o tamanho da ameaça: assumiram essa posição instituições que comandam a bagatela de US$ 45 trilhões.

Considerando-se, finalmente, que já tem havido uma saída líquida de investidores estrangeiros do País, a conclusão é inevitável: a nossa política ambiental tornou-se um obstáculo ao crescimento econômico e social. 

Conteúdo Completo:

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