Eliane Catanhêde

Eliane Cantanhêde: Geisel sem pedestal

Não há ‘meio ditador’, mas Geisel foi um ditador que operou pelo fim da ditadura

Tudo nestes tempos revoltos vira uma guerra insana e até cruel na internet e é exatamente esse o caso, agora, da bombástica revelação da CIA de que o então presidente Ernesto Geisel transformou a execução de opositores em política de Estado. Isso mexe com as mais profundas feridas e as mais arraigadas ideologias, mas a radicalização, para qualquer lado, continua sendo o pior caminho.

Como ponderou o presidente Michel Temer, em conversa comigo na sexta-feira, não se trata de uma versão nacional, mas da CIA, e nem tudo o que a CIA diz é necessariamente verdade. Acrescente-se: os Estados Unidos invadiram e aniquilaram o Iraque, sem aval do Conselho de Segurança da ONU, com base na informação da sua agência de inteligência de que Saddam Hussein desenvolvia sofisticadas armas químicas e biológicas. Foi um erro grosseiro. Ou uma mentira intencional.

O documento trazido à luz pelo professor Matias Spektor é uma nova frente de pesquisa sobre a verdadeira identidade e os reais propósitos do governo Geisel. Mas funciona como uma delação premiada: é uma versão, precisa ser recheada de provas. Dúvidas: como a reunião e a decisão de Geisel jamais vazaram no próprio Brasil? Por que um ou mais generais envolvidos contariam justamente para os norte-americanos, se eles se baseavam no velho nacionalismo que exalava ojeriza aos EUA? Para agradar a Washington?

Mas, “se non é vero, é ben trovato”. Apesar da “distensão lenta, gradual e segura” de Geisel, a ditadura continuou executando e torturando os adversários – ou “subversivos perigosos”, como registra a CIA.

Presidentes não são obrigados a saber tudo (assim como Lula nunca soube do mensalão?) e Geisel poderia até não saber de uma ou duas mortes. Mas de tantas? Ele demitiu o general Ednardo D’Ávila Mello após o assassinato de Wladimir Herzog, mas pelas mortes e torturas? Ou porque ele desafiava a abertura e o que o então presidente mais prezava: sua autoridade?

O fato é que o documento atinge profundamente a biografia de Geisel, com quem eu conversava uma a duas vezes por ano, depois da Presidência. E ele sempre com muito cuidado de não se vender como o “mocinho” lutando contra os “bandidos” do seu próprio regime. Criticava genericamente a “linha dura”, mas nunca foi enfático, indignado, contra seus métodos. Subliminarmente, era como se fossem um “mal necessário”.

A partir da CIA, há dois personagens num só: o ditador determinado a devolver o País aos civis e o pragmático convencido de que tinha de dançar conforme a música dominante no regime: a favor de matar e torturar, inclusive quase meninos, em nome do combate ao comunismo. Esse confronto entre as intenções de Geisel e sua submissão ao regime é claro na obra magistral de Elio Gaspari sobre a ditadura. E foi bem resumido, ontem, por Spektor: “O que Geisel fez foi chamar para si a responsabilidade (da repressão), para poder abrir”.
Ceder para avançar.

Seria mais fácil, e aplaudido, escrever um texto apaixonado contra o ditador assassino ou, muitíssimo pior, em defesa da guerra contra o comunismo. A política e a história, porém, não se fazem com paixão. Se comprovada, a informação da CIA derruba Geisel do pedestal de quem jamais compactuou com os “desaparecimentos”. Mas não apaga a realidade de que ele efetivamente se empenhou pela abertura. Não existe “meio ditador”, mas Ernesto Geisel foi um ditador que operou para derrubar a ditadura.

Que o documento da CIA reabra serenamente a Comissão da Verdade e o debate sobre o reconhecimento de responsabilidade das Forças Armadas, como defende seu último presidente, Pedro Dallari. A verdade às vezes dói, mas nada como a verdade para curar velhas e evitar futuras feridas.


Eliane Cantanhêde: Guerra de nervos

De repente, um frenesi para acabar com o foro de todo mundo. Será já? E para valer?

Os atos seguintes à restrição de foro privilegiado de deputados e senadores confirmam que a questão já está madura nas instituições e na sociedade brasileira. Seja retaliação ou não, há mobilização para limitar o foro também para os outros Poderes, o Executivo e o próprio Judiciário. Resta ver se vai andar mesmo.

O próximo presidente do Supremo, Dias Toffoli, não perdeu tempo. No mesmo dia da decisão sobre os parlamentares, um funcionário já entregava no seu gabinete uma caixa de um palmo e meio de altura com os processos contra quem tem mandato. No dia seguinte, ele já enviava nove deles para outras instâncias.

Nesta semana, Toffoli deu um passo ainda mais largo, ao levar para a presidente Cármen Lúcia duas propostas de súmulas vinculantes, ou seja, para submeter todas as instâncias abaixo à decisão do Supremo. Mas com uma interpretação, digamos, ampliada.

A primeira proposta é para a regra que passa a valer para deputados e senadores ser estendida a todos os que têm foro privilegiado no Legislativo, Executivo, Judiciário e Ministério Público. A segunda proposta é para tornar inconstitucionais todas as previsões de foro privilegiado nas constituições estaduais e na Lei Orgânica do Distrito Federal. A intenção é limitar o foro de 55 mil agentes públicos nas esfera federal, estadual e municipal.

No mesmo embalo, o ministro Luís Felipe Salomão, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), empurrou para a primeira instância em João Pessoa um processo contra o governador Ricardo Coutinho (PSB) por crime que teria sido cometido antes do atual mandato. O ministro usou a decisão do STF, mas a verdade é que essa decisão não gerava vinculação automática.

Logo, ele quis foi jogar luzes para a questão, que agora vai parar na Corte Especial do STJ, que é, ou era, foro privilegiado para governadores, desembargadores e conselheiros dos tribunais de contas dos Estados.

Se o Judiciário pisou no acelerador, o Legislativo não ficou atrás e a Câmara instalou a Comissão Especial para analisar a restrição de foro para todo mundo, inclusive ministros de Estado e ministros de tribunais superiores. Pelo projeto em discussão, só manteriam, ou manterão, a prerrogativa os presidentes da República, do STF, da Câmara e do Senado.

É claro que os parlamentares vão jurar que isso não tem nada a ver com retaliação, mas a data da criação da comissão – na semana seguinte à restrição de foro só para deputados e senadores – indica exatamente o contrário. Soa assim: “Se vale para nós, por que não vale para os outros?”

Tudo parece muito rápido, mas calma lá! Estamos falando de Brasil, de Justiça e de Congresso Nacional. No Supremo, há ainda um longo caminho para as duas propostas de súmulas vinculantes de Toffoli, que ainda irão à análise da Procuradoria-Geral da República e dependem depois de Cármen Lúcia pôr ou não em pauta. Quanto tempo isso pode demorar? Vá se saber...

E, no Congresso, há um obstáculo de ordem prática, objetiva: enquanto durar a intervenção federal na segurança pública do Rio, nenhuma emenda constitucional pode ser votada. E há outros mais prosaicos: com Copa do Mundo, convenções partidárias e campanha eleitoral, quando haverá quórum para uma votação assim? Possivelmente, só no ano que vem. Se houver...

Então, há muita correria, mas não esperem que seja para chegar logo a algum lugar. Por enquanto, é só guerra de nervos, para não falar em confronto entre Poderes.

Lula
Por que, em rara unanimidade, o plenário virtual da Segunda Turma negou o agravo para anular a prisão de Lula? Porque os votos foram estritamente técnicos.


Eliane Cantanhêde: Sem favorito(s)

Hoje, uma aposta seria Ciro e Alckmin no segundo turno. Amanhã? Ninguém sabe

Sabe o que faz esta eleição tão atípica, diferente das demais? A esta altura, já havia um favorito em 1994, 1998 e 2002 e já se sabia quem iria para o segundo turno em 2006, 2010 e 2014. Agora, não. Os candidatos se embolam e se contorcem. Nenhum deles é favorito ou está virtualmente no segundo turno.

Lula está fora. Bolsonaro bateu no teto. O resto é o resto e cada um tenta fechar alianças, ganhar uns minutos a mais na TV, montar equipe, articular um esquema de financiamento sólido (e que não dê problemas depois...), além, claro, de subir nas pesquisas. Está uma pedreira.

Há quem insista na candidatura de Lula, preso em Curitiba, sabendo que se trata de ficção. Há quem defenda Fernando Haddad como plano B. Há quem admita o inadmissível na história do partido: abrir mão da cabeça de chapa para Ciro Gomes, do PDT.

Ora Haddad é presidenciável, ora disputa a vice de Ciro, agora já é opção para o governo de São Paulo. Mais um pouco, vira candidato a síndico de prédio. É o PT enfraquecendo o PT.

Gleisi Hoffmann, aliás, diz que Ciro não passa no PT nem com “reza brava”, mas o fato é que ele se fortalece com a fraqueza do PT e tenta servir de boia para o partido trazer junto o PCdoB de Manuela d’Ávila e o PSOL de Guilherme Boulos e, ao mesmo tempo, tornar-se palatável à elite financeira. Lula gostaria de todos juntos, mas não é uma operação fácil.

De qualquer forma, Ciro vai se habilitando ao segundo turno e seus articuladores devem acender velas e investir em chazinhos e ervas para que ele não saia socando jornalistas e eleitores e matando suas próprias chances.

Quanto a Bolsonaro: com a prisão de Lula, ele nem cresceu, como previam uns, nem esvaziou, como torciam outros. Simplesmente estagnou. E é estagnado que tenta atrair partidos, deputados, tempo de TV e recursos para sua campanha. E deve morrer de medo de enfrentar debates ao vivo, que podem ter um efeito inverso para ele: em vez de crescer, minguar.

Pelo centro, um centro com cara e jeito de esquerda, concorrem Joaquim Barbosa e Marina Silva. Uma chapa entre os dois seria poderosa, mas... Joaquim e o PSB brincam de gato e rato, Marina nem admite conversar sobre ser vice e ninguém, na verdade, sabe o que o ex-presidente do STF pensa sobre economia, crise fiscal, reforma da Previdência. Sem isso, o País não sai do fundo e continua asfixiando justamente os mais pobres – que são a maioria.

Geraldo Alckmin, que não atinge dois dígitos e precisa crescer em São Paulo, continua atraindo as atenções (e a aflição) de quem não pula no barco das esquerdas nem no da direita bolsonarista. Ele pode não encantar, mas se beneficia da percepção de que é o único candidato que, apesar de tudo, ainda pode trazer oficialmente o MDB e o DEM, com seus preciosos minutos de TV e sua forte capilaridade.

Michel Temer é tão candidato hoje quanto era no início, ou seja, zero candidato. E, por isso, ele comanda as negociações PSDB-MDB com desenvoltura e até descuido. Ou o presidente esqueceu que Henrique Meirelles saiu da Fazenda para disputar o Planalto pelo MDB?

Como Temer, Rodrigo Maia não chegou em algum minuto a crer nas suas chances. E, sem ele, o DEM tende a somar com PSDB, MDB e PSD em torno de Alckmin. Mas, atenção: em todos haverá dissidentes.

Como eles, também Flávio Rocha, João Amoêdo e o próprio Meirelles tenderão a apoiar Alckmin, principalmente num eventual segundo turno entre ele e Ciro, por exemplo. Mas, juntos, terão de tourear Álvaro Dias, uma peça-chave nessa arena. Dias não tem força para ganhar, mas pode ter para derrotar Alckmin, que, de quebra, para complicar, convive com um fantasma: Paulo Preto, o Palocci do PSDB.


Eliane Cantanhêde: Lula solto?

Não é provável, mas tudo é possível no plenário virtual da Segunda Turma

Pergunta que não quer calar, inclusive dentro do próprio Supremo: por que o ministro Edson Fachin enviou para o plenário virtual da Segunda Turma um agravo regimental da defesa do ex-presidente Lula? Por que não para o plenário real da Turma ou para o próprio plenário do tribunal? Afinal, o que está em jogo é grave: manter ou não Lula na cadeia.

Com o Supremo pegando fogo e a Segunda Turma a toda hora botando mais lenha na fogueira com decisões no mínimo polêmicas, a sensação – ou suspeita? – é de que recorrer ao plenário virtual foi para proteger os ministros e evitar que se exponham ao vivo e em cores durante a votação. Ou seja, possam tomar uma decisão até mesmo esdrúxula sem a exposição direta à opinião pública.

A votação virtual, por escrito, foi aberta na última sexta-feira e vai até a próxima quinta-feira, com o anúncio do resultado no dia seguinte. Depois disso, os votos estarão abertos, mas voto escrito é muito diferente de voto com a cara, a voz e as expressões do ministro, e sem debates desgastantes ao vivo. Digamos que é menos constrangedor – se o voto, evidentemente, for constrangedor.

Primeiro, a defesa de Lula entrou com uma reclamação, alegando que o TRF-4, de Porto Alegre, havia descumprido a determinação do STF de só prendê-lo após o fim do julgamento, até dos embargos dos embargos. Como o próprio Fachin negou provimento (embargos dos embargos não têm efeito suspensivo, são considerados meramente protelatórios), os advogados entraram com o agravo que recebe os votos virtuais dos cinco ministros da Segunda Turma.

Tecnicamente, conforme especialistas, o agravo perdeu o objeto, porque a reclamação foi antes da análise dos embargos dos embargos, agora já concluída pelo TRF-4. Seria, assim, uma votação simples e, em favor de Fachin, esse teria sido o motivo para que ele optasse pelo plenário virtual, que é justamente para casos simples. Mas será simples mesmo?

A defesa de Lula tem o objetivo explícito de anular a autorização de prisão dada pelo TRF-4 e aplicada pelo juiz Sérgio Moro. Logo, de anular a própria prisão. E esses recursos estão no mesmo embalo da decisão da própria Segunda Turma de tirar de Moro os trechos sobre Lula nas delações da Odebrecht.

Com base nela, a defesa entrou com pedido para retirar de Moro não só esses trechos, mas todo o inquérito sobre o sítio de Atibaia – que, segundo o juiz, foi calcado em outras provas e começou antes mesmo das delações da Odebrecht. Relator, o ministro Dias Toffoli negou o pedido, argumentando, em tradução livre, que uma coisa (os trechos da delação) é uma coisa, outra coisa (o inquérito do sítio) é outra coisa.

Como Toffoli tem tomado decisões consideradas extravagantes até por alguns colegas – como a autorização para Demóstenes Torres concorrer em outubro, mesmo após a cassação pelo Senado –, paira uma dúvida no lindo prédio de vidro e concreto do Supremo: Toffoli negou monocraticamente aquele pedido da defesa de Lula para reduzir preventivamente o impacto da decisão do plenário virtual da Segunda Turma?

Vamos saber em alguns dias, mas a avaliação de quem vive nesse clima é que, se for uma decisão técnica, o agravo da defesa de Lula será derrubado por unanimidade, por cinco a zero. Mas será tão técnica assim? Pelo histórico da turma, que se contrapõe à Primeira, dá sempre 3 a 2 ou 4 a 1, com Toffoli, Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski de um lado, Fachin do outro e o decano Celso de Mello como pêndulo. Logo, tudo pode acontecer. Inclusive Lula ser solto.

Foro
A favor da restrição do foro privilegiado, Cláudio Lamachia (OAB) compara com a indústria e admite que não será uma festa: “A capacidade instalada da Justiça está aquém da demanda”.


Eliane Cantanhêde: Fim do foro, fim da festa?

Restrição ao foro foi grande passo, mas as dúvidas são muitas e vão durar

Ao restringir o foro privilegiado para senadores e deputados federais apenas por crimes cometidos durante o mandato e relativos a ele, o Supremo quebrou um paradigma, abriu uma ampla avenida para derrubar o foro de demais autoridades e lavou a alma da opinião pública. Mas isso é só o começo.

Depois da sessão, perguntei à presidente Carmen Lúcia quando a mudança vai começar na prática: “Imediatamente”, ela respondeu, sem titubear. E pode ser hoje. As dúvidas, porém, são muitas:

1) O próprio STF terá de avaliar, caso a caso, o que é e o que não é crime relativo ao mandato. Receber propina para votar um projeto, evidentemente, é. O marido bater na mulher, ao contrário, não tem nenhuma relação com a função. E quando o deputado dá um tapa na cara de alguém num evento político, como aconteceu no Pará?

2) Após a decisão do STF, os advogados vão avaliar se é melhor para o réu ficar no STF ou ir para a primeira instância. E vem a maratona de recursos, numa direção ou outra. Quanto tempo isso dará ao réu e quanta energia tomará do ministro e de uma turma do STF?

2) Não haverá mudança de instância após a instrução do processo – quando o ministro dá prazo às partes para alegações finais –, pelo princípio da “prorrogação de competência”. Afinal, o juiz que acompanha um caso, ouve acusação e defesa e conhece as provas é o mais apto para proferir a sentença. Então, dois casos semelhantes poderão ter destinos diferentes por questão de timing. Um ficará no STF, outro irá para a primeira instância. Uma confusão.

4) Todos os processos referentes à Lava Jato irão automaticamente para o juiz Sérgio Moro, ou uns vão para o Rio, outros para Brasília, outros ainda para a Bahia e assim por diante? Com 18 mil juízes no País, há ou não o risco de olhares, interpretações e sentenças muito díspares? Para uns réus, a ida para a primeira instância será o inferno e, para outros, o paraíso?

5) Mais: Moro está numa Vara especializada nos crimes da Lava Jato, mas em Belo Horizonte, por exemplo, há dezenas de juízes com milhares de processos referentes a tráfico, estelionato, assassinato etc. Quando um juiz receber um caso do Supremo, por sorteio, vai se deparar com um processo complexo, cheio de minúcias e de excelentes advogados pagos a peso de ouro. Isso vai ou não parar tudo até ele tomar pé da situação?

6) Renan Calheiros, Romero Jucá e Aécio Neves, campeões de inquéritos entre os que têm foro no STF, enfrentam processos por variados motivos. Cada processo vai para um Estado, uma Vara, um juiz? Vão ter advogados em Curitiba, Brasília, São Paulo, Minas, Alagoas, Roraima? Vão virar muitos Renans, Jucás e Aécios?

7) Como indagou o ministro Gilmar Mendes, o que acontece com os processos de parlamentares que trocam de cargo? Detalhando: como deputado, o sujeito era julgado no STF, agora cai na primeira instância, aí vira ministro e volta para o STF? E, se é demitido, volta de novo para o juiz de primeira instância?

8) Aliás, quando virá a “isonomia” cobrada por Dias Toffoli? Ou seja, e a restrição de foro também para ministros, governadores, membros do próprio Supremo...? Nesse caso, um dos 18 mil juízes poderá pedir busca e apreensão no Planalto e no STF?

9) E a principal dúvida é se, e quando, vier o fim da prisão em segunda instância. O sujeito será julgado antes na primeira e depois na segunda instância, mas, condenado, o que acontecerá? Nada. Ele fará um ar indignado, posará de injustiçado, culpará os inimigos e a mídia e irá para casa curtir mil e um recursos durante 20 anos. Até seu caso voltar à origem: o próprio Supremo.

O Brasil precisa mesmo rever o foro, mas não achem que será rápido, fácil, muito menos uma festa.


Eliane Cantanhêde: Minas já foi Minas

Dilma, Aécio, Pimentel... não se fazem mais políticos mineiros como antigamente

Minas Gerais é um dos três principais Estados da Federação e tinha fama de ser, historicamente, o maior celeiro de políticos matreiros e competentes do País, as tais “raposas políticas”. Porém, se o Rio vive um caos e a eleição presidencial é uma grande interrogação, a situação de Minas não é nenhuma maravilha e a campanha no Estado é igualmente incerta.

Terceira maior economia do País, segunda maior população e segundo maior eleitorado (quase 11% do total), Minas continua sendo definidor de eleições presidenciais, mas seus principais partidos estão machucados e seus mais lustrosos líderes políticos andam em maus lençóis, devendo muitas explicações à Justiça, à Assembleia, à opinião pública.

Diferentemente de São Paulo e Rio, Minas aparece pouco na grande mídia e, em 2014, as análises políticas partiam de duas premissas: Dilma Rousseff ganharia no Nordeste e Aécio Neves levaria fácil em Minas, mas ele perdeu no primeiro e segundo turnos no seu Estado e seu candidato ao governo, Pimenta da Veiga, sofreu derrota fragorosa.
Para arrematar, a aposta de Aécio perdeu feio, dois anos depois, para a prefeitura de Belo Horizonte.

De outro lado, Dilma ganhou no Nordeste e em Minas, seu Estado de origem, apesar de ser gaúcha por adoção, e seu ex-ministro, conselheiro e amigo Fernando Pimentel levou o governo e assim dividiu o “Triângulo das Bermudas” pelos três principais partidos: São Paulo manteve o PSDB, Rio continuou com o agora MDB (apesar de tudo...) e Minas foi do PSDB para o PT.

A guerra entre PT e PSDB é particularmente encarniçada em Minas, mas o resultado é que quem levou a prefeitura da capital em 2016 foi o empresário e dirigente desportivo Alexandre Kalil, do insignificante PHS, que se tornou o mais lustroso “outsider” da eleição no País, apresentando-se como apolítico e apartidário.

Kalil é, assim, o maior exemplo de que em Minas não se fazem mais políticos como antigamente, ou como Afonso Arinos, Milton Campos, Gustavo Capanema, Juscelino Kubitschek, Tancredo Neves e Itamar Franco, que tinham lá suas idiossincrasias, mas com imensa liderança ou matreirice política.

Os ex-governadores e ex-presidentes do PSDB Eduardo Azeredo e Aécio Neves estão mal, um com o pé na prisão, o outro réu no Supremo. E a Assembleia Legislativa acaba de acatar o pedido de impeachment do petista Fernando Pimentel, candidato à reeleição contra o ex-governador tucano Antonio Anastasia, caçado a laço pelo presidenciável Geraldo Alckmin. A contragosto, ele cedeu.

E por que tanto empenho do PSDB por Anastasia? O PT reina no Nordeste, o Rio virou a casa da mãe Joana, Álvaro Dias capitaliza o desencanto com Aécio no Sul e Jair Bolsonaro embrenhou-se pelo Centro-Oeste. Alckmin só terá chance se, além de recuperar São Paulo, conquistar Minas – algo que nem Aécio conseguiu.

Como complicador tanto para tucanos quanto para petistas, Dilma Rousseff resolveu aproveitar o jeitinho do Senado, que lhe cassou o mandato, mas manteve a elegibilidade, e quer disputar o Senado por Minas, apesar de alternar residência entre Rio e Porto Alegre. Se tende a tirar votos do PSDB, ela já entra rachando a aliança entre PT e MDB.

Depois do impeachment de Dilma e do colapso político de Aécio, os dois mineiros do segundo turno de 2014, sobra como consolo para Minas ser ainda o Estado mais cobiçado na escolha de vices. O empresário Josué Gomes da Silva é o melhor exemplo. De um Estado-chave, dono de uma das maiores fortunas do Brasil e filho do vice de Lula, José Alencar, ele se filiou a um partido, o PR, e tem tudo para ser o vice ideal e salvar a imagem da política mineira em outubro. Só falta o principal: querer.


Eliane Cantanhêde: Acórdão ou acordão?

Suspense: só com acórdão ficará claro até onde a Segunda Turma quer chegar

Há uma final de campeonato entre dois times de ministros do Supremo Tribunal Federal: um que joga com a defesa do ex-presidente Lula, preso em Curitiba; outro, com o juiz Sérgio Moro e a força-tarefa da Lava Jato. Ora o decano Celso de Melo desempata para um lado, ora a ministra Rosa Weber desempata para o outro, mas os times estão equilibrados.

Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli levantaram a bola e os (muitos, aliás) advogados de Lula cortaram. Os três ministros mudaram seus votos de apenas meses atrás e retiraram do juiz Sérgio Moro trechos das delações premiadas da Odebrecht que citam Lula. Ato contínuo, os advogados pediram a Moro que enviasse os processos contra Lula para a Justiça em São Paulo.

No pedido, que nem sequer aguardou a publicação do acórdão da Segunda Turma, a defesa requer a “imediata remessa” dos autos processuais quanto ao sítio de Atibaia, fala em “incompetência desse Juízo” (a Vara de Moro) e provoca: “A menos que se queira desafiar a autoridade da decisão proferida pelo Supremo”.

Essa tentativa de retirar de Moro os inquéritos contra Lula deixa um rastro de dúvidas sobre a amplitude e as intenções da decisão da Segunda Turma e até a suspeita de uma grande jogada: tirar os trechos da delação da Odebrecht, depois o sítio e o Instituto Lula e, por fim, requerer a nulidade da própria condenação a 12 anos e 1 mês pelo triplex do Guarujá.

O time adversário está mudo, não indiferente. Os demais, a presidente Cármen Lúcia e os vencidos na Segunda Turma, Celso de Melo e Edson Fachin, não se manifestaram a favor ou contra a decisão sobre as referências da Odebrecht a Lula, mas há troca de impressões, até de pareceres. Como a procuradora-geral Raquel Dodge e como nós, meros mortais, também eles não captaram até onde Gilmar, Lewandowski e Toffoli querem chegar.

Pelo time de Moro, falou o próprio Moro. Em despacho em que diz aguardar a publicação do acórdão “para avaliar a extensão do julgado”, o juiz afirma que a investigação sobre o sítio de Atibaia começou muito antes das delações da Odebrecht, com base em outras provas. E frisa que, no voto do relator Toffoli na Segunda Turma, “não há uma referência direta” ao processo do sítio nem “alguma determinação expressa” sobre sua competência para julgar essa ação.

Assistindo de camarote ao campeonato, o Ministério Público Federal engrossa a torcida do time Moro-ministros perplexos do STF. Em petição para manter os autos em Curitiba, condena a decisão da Segunda Turma e “o lamentável tumulto processual” causado pela remessa de trechos das delações da empreiteira para São Paulo.

Quanto a Raquel Dodge: ela já disse e repetiu que aguarda o acórdão de Toffoli para decidir se entra ou não com recurso contra a decisão da turma e qual é exatamente o recurso cabível nesse caso. Moro, demais ministros do Supremo, advogados, imprensa e sociedade também aguardam o acórdão e a reação de Dodge.

É assim que o mundo político e jurídico, sacudido por tantos lances e emoções, está com a respiração suspensa à espera do acórdão (atenção: acórdão, não acordão) da Segunda Turma revelando qual a real dimensão da surpreendente decisão que favorece Lula e esvazia Moro.

Logo, o foco está em Dias Toffoli, que assumiu audaciosamente a linha de frente do seu time e será o próximo presidente do Supremo a partir de setembro. Após seu acórdão da decisão da Segunda Turma, todos os recursos irão para ele, não mais para Edson Fachin, que é o relator da Lava Jato e do time adversário. E, depois de setembro, Toffoli terá, nada mais, nada menos, o controle da pauta do Supremo. Seja o que Deus quiser.


Eliane Cantanhêde: Ao deus-dará

Alckmin está espremido entre Joaquim, a novidade, e Bolsonaro, que bate no teto

Todo dia aparece um presidenciável novo, Henrique Meirelles, João Amoêdo, Flávio Rocha, Guilherme Boulos, Manuela d’Ávila... Mas nenhum deles embaralhou o tabuleiro da eleição como o recém-chegado Joaquim Barbosa. O foco está nele.

Mas, afinal, que apito Joaquim toca? Ele é de esquerda, direita ou centro? Está preparado para combater a crise fiscal? Na verdade, ninguém sabe, ele continua calado, longe da campanha e contando com uma aura que anima amplos setores da classe média escolarizada e pode vir a encantar a baixa renda.

O PSB, já tão rachado, tem de correr atrás de recursos, tempo de TV e palanques estaduais. A questão é saber de onde virão esses reforços, já que Joaquim não é político, nunca teve partido nem fez campanha e não se sabe o que pensa. Esses fatores atraem eleitores, mas afastam aliados políticos.

A história de Joaquim é tão emocionante quanto a de Lula, de menino negro que saiu de um lar modesto, estudou, passou em concursos de ponta e virou ministro e presidente do Supremo. Mas que chance ele tem de levar o apoio do PT e de Lula? Joaquim presidiu a fase final do julgamento do mensalão, que expôs as entranhas do governo Lula e levou o mito petista José Dirceu à prisão.

Para o eleitorado, Joaquim é um símbolo do combate à corrupção e abriu caminho para o juiz Sérgio Moro e a Lava Jato. Para o PT, que um dia monopolizou a bandeira da ética na política, ele é o algoz do partido. Sem o PT, ele não levaria, ou não levará, PCdoB, PSOL e os aliados MST e MTST. E quem à direita ou ao centro lhe daria base e sustentação?

A direita está com Bolsonaro, que bateu no teto de 17% no Datafolha, e o centro vai de mal a pior, com muitos nomes lançados e nenhum convincente. Basta olhar para Geraldo Alckmin: governador do principal Estado, candidato de um dos três maiores partidos, com recall da eleição de 2006, mas não sai do lugar. Ou não empolga.

Como é possível que Alckmin, com todos esses fatores a seu favor, esteja embolado com Joaquim, que nem assumiu ainda a candidatura? E com Ciro Gomes, que já começou com “pescotapas” antes mesmo de entrar na campanha? E os espaços de crescimento para o tucano parecem bloqueados.

No Norte, Alckmin enfrenta uma resistência ao PSDB que vem desde as sistemáticas críticas tucanas à Zona Franca de Manaus. No Nordeste, bate de frente numa muralha petista que não cede nem com a prisão de Lula. No máximo, o eleitor subiu no muro e os índices de brancos e nulos dispararam para em torno de 35%.

E as regiões mais simpáticas e acessíveis ao PSDB não são mais as mesmas. No Sul, o paranaense Álvaro Dias, ex-tucano, capitaliza a decepção com Aécio Neves, que deve se tornar réu hoje no STF. No Centro-Oeste, Bolsonaro tem não apenas intenção de votos como até um exército voluntário financiando e distribuindo outdoors e adesivos de carros. Uma campanha de geração espontânea.

Resta a Alckmin o Sudeste, onde Joaquim vai crescer. Rio é bagunça. São Paulo, que deu 66% de aprovação ao tucano em 2006, agora dá 36%. E Minas derrotou o mineiro Aécio no primeiro e no segundo turnos de 2014 e é outro Estado onde Bolsonaro chegou para ficar. Ou seja, Alckmin está espremido entre Bolsonaro e Joaquim. E, se não for ele, quem capitaneará o “centro”? Até agora, ninguém sabe, ninguém viu.

Odebrecht. Em mensagem à coluna, a defesa de Marcelo Odebrecht nega que ele tenha dito que transformou a empreiteira em “banco de operações estruturadas”. Sim, mas é o que se deduziu quando ele disse ao juiz Sérgio Moro que a Odebrecht mantinha uma conta exclusiva para Lula. Quem mantém conta para cliente não é banco?

 


Eliane Cantanhêde: Sempre pode piorar

Seja quem for o futuro presidente, vai ficar nas mãos do balcão e do Centrão

O que está ruim sempre pode piorar, e essa máxima se adapta à perfeição às eleições para o Congresso em outubro. Enquanto o número de presidenciáveis cresce vertiginosamente, o maior perigo ganha corpo em outra frente, a eleição de deputados e senadores, com o risco real de os Estados despejarem em Brasília os tipos mais estranhos – e mais gulosos das verbas e benesses públicas.

Sem financiamento privado oficial e com financiamento público restrito, os partidos maiores, PT, MDB e PSDB, tendem a investir o máximo nos seus candidatos ao Planalto, mas os do Centrão, como PP, PSD e PR, se concentram em fazer bancada no Congresso e ganham o reforço do DEM, o partido que mais cresce.

O que significa? Qualquer que seja o futuro presidente da República a partir de janeiro de 2019 vai ficar ainda mais nas mãos do Centrão, que já pinta, borda e cobra caro faz tempo e se tornou praticamente dono do Congresso após as duas denúncias da PGR de Rodrigo Janot contra o presidente Michel Temer.

Os recursos oficiais são curtos e, se os partidos maiores dão preferência aos seus candidatos a presidente e vice, vai sobrar pouco para os que disputam a Câmara e o Senado. Mas PP, PSD, PR e possivelmente o DEM não lançarão nomes ao Planalto e vão gastar tudo para ter votos no Congresso e força para ameaçar o governo e cobrar cada vez mais caro para aprovar uma emenda constitucional, uma medida provisória, um projeto de interesse do Planalto.

O presidente pode ser do PT ou Bolsonaro, Alckmin, Meirelles, Ciro, Marina, Álvaro Dias, Joaquim Barbosa, Aldo Rebelo, Amoêdo, Flávio Rocha, ou até mesmo os indecisos Rodrigo Maia, Manuela D’Ávila e Guilherme Boulos, com um pé fora da campanha, mas o resultado será um só: terá que negociar voto a voto com o Centrão.

Temer, que é Temer – presidiu a Câmara três vezes, passou a vida no Congresso e tem interlocução do PT ao PSDB – consome a maior parte do seu tempo e de sua energia política envolvido por chantagens. E um Bolsonaro, num lado da Praça dos Três Poderes, com o Centrão, no outro? Já imaginou?

Parlamentares experientes e conscientes estão preocupados. O desastre está se armando, e com um agravante: o novo governo vai assumir o rombo das contas públicas, que exige responsabilidade para anunciar e articular medidas não populares – ou populistas –, como reforma da Previdência e cortes de gastos, sem descartar o fantasma das crises fiscais: aumento de impostos.

Haverá intensa negociação para corrigir excessos e omissões, garantir direitos da maioria e limar privilégios da minoria, inclusive estatal. Os políticos e os técnicos terão de conversar, concordar, discordar, ora ganhar, ora perder, mas, a cada legislatura, a representação vai deteriorando e os métodos vão piorando. Daí o sucesso do “é dando que se recebe”, da farra de cargos e emendas parlamentares. Em vez de negociação, balcão de compra e venda.

Nesse ambiente, leva vantagem quem domina os métodos e não tem pruridos para tirar proveito deles. Quem, senão o Centrão, que tem vencido todas, já aumentou suas bancadas na “janela partidária” (de mudança de siglas) e vem aí com tudo em outubro? Para assombrar o novo governo e piorar ainda mais o que já está tão ruim.

Como dizia o deputado Ulysses Guimarães: “Qual o pior Congresso? Sempre será o próximo”. Da campanha de Tiririca: “Pior do que está não fica”. Ulysses acertou, Tiririca errou. Sempre pode piorar, e a gente nem falou aqui no financiamento de candidatos “por fora”, pelas igrejas e até organizações criminosas. A Lava Jato ainda vai ter muito trabalho.

Guerra
Questão crucial na Síria: por que Assad usou, ou usaria, armas químicas contra seu próprio povo, logo agora que ele já tem o controle do país?


Eliane Cantanhêde: Cartada final do STF

Ministros discutem solução engenhosa e complexa contra a prisão de Lula

Avançam as articulações de ministros do Supremo para, em tratativas com a defesa do ex-presidente Lula, acabar com a prisão após condenação em segunda instância e mudar os rumos da Lava Jato. Como a presidente Cármen Lúcia mantém firmemente sua palavra de não colocar a questão em pauta, a solução que emerge é criativa e sofisticada.

Habeas corpus (HC) só pode ser posto “em pauta” pela presidência ou “em mesa” por um deles, o que já não é usual, mas embargos de declaração em liminares podem ir ao plenário e os ministros foram buscar uma liminar de outubro de 2016 para ancorar toda a estratégia: justamente a liminar que permitiu a prisão após a segunda instância, confirmada pelo plenário em dezembro daquele ano por 6 a 5.

A defesa de Lula descobriu, e soprou aos ouvidos de ministros, que o acórdão da liminar nunca tinha sido publicado e isso abria uma brecha para a revisão. Ora, ora, o acórdão acaba de ser publicado agora, em 7 de março, abrindo prazo de cinco dias úteis para a apresentação de recursos. E, ora, ora, o Instituto Ibero Americano de Direito Público entrou com embargo de declaração no último dia do prazo, 14 de março, quarta-feira passada.

Um embargo de declaração numa liminar de um ano e meio atrás, que gerou dois meses depois uma decisão em plenário? Tudo soa muito estranho, muito nebuloso, mas faz um sentido enorme para aqueles que articulam o fim da prisão em segunda instância não apenas para Lula, mas para todos os poderosos que estão ou estarão no mesmo caso.

Lembram que escrevi, neste espaço, que havia um acordão dentro do Supremo para combinar o fim da prisão em segunda instância e do foro privilegiado? A base é uma equação: quem é contra Lula salva a pele dele para salvar a de todos os demais; quem é a favor de Lula salva a pele de todos os demais para salvar a de Lula.

Houve uma sequência de tentativas que acabaram batendo num muro intransponível: a opinião pública, que não consegue digerir a mudança de uma decisão – que já passou por três julgamentos no STF – com o objetivo óbvio, gritante, de evitar que Lula vá para a cadeia.

A primeira tentativa foi convencer Cármen Lúcia de por o habeas corpus preventivo de Lula em pauta, mas ela declarou que mudar uma jurisprudência para beneficiar um réu seria “apequenar” o Supremo. Depois, veio a sugestão de levar ao plenário os HCs de outros condenados, não especificamente Lula, mas ela divulgou a pauta de abril sem incluir a questão.

A terceira tentativa foi escalar um dos outros dez ministros para, driblando a decisão da presidente, colocar a questão em mesa e forçar a revisão. Mas quem? Gilmar Mendes já tinha o seu papel definido no script: inverter o voto e o resultado. O relator da Lava Jato, Edson Fachin, foi categórico ao dizer que não aprovava mais um julgamento sobre o mesmo assunto. Lewandowski, Marco Aurélio e Toffoli avisaram que não entrariam nessa bola dividida.

Criou-se até uma torcida para o decano Celso de Melo assumir o papel e foi aí que surgiu a solução – atribuída a Sepúlveda Pertence, ex-STF e atual advogado de Lula – de publicar a liminar de 2016, gerar um embargo de declaração e levá-lo ao plenário, criando a oportunidade para Gilmar Mendes mudar o seu voto e acabar com a prisão após a segunda instância.

Cármen Lúcia foi chamada para uma reunião na próxima terça-feira, provavelmente para discutir a ideia de, em vez da segunda instância, o plenário autorizar o cumprimento da pena após condenação no Superior Tribunal de Justiça (STJ). A prisão de Lula seria adiada por muitos meses, caso mantida; os presos após a segunda instância entrariam com HC; os futuros condenados respirariam aliviados. E a Lava Jato? O que fez, fez; o que não fez, só fará em parte.