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El País/Pública: Tribunais de contas, os permissivos fiscais expostos pela Lava Jato

Oito em dez dos responsáveis por fiscalizar no Brasil têm elo com políticos, diz Transparência Brasil. No último ano, pelo menos 13 conselheiros foram afastados por suspeitas de corrupção

Por Alice Maciel, da Agência Pública

“As minhas contas foram aprovadas pelo Tribunal de Contas do Estado.” Essa frase está na ponta da língua dos políticos investigados na Operação Lava Jato por fraudar licitações e superfaturar obras. E o argumento não é falso. Os ex-governadores Aécio Neves (PSDB), de Minas Gerais, Sérgio Cabral (MDB), do Rio de Janeiro, e Beto Richa (PSDB), do Paraná – investigados por suspeita de terem favorecido empresas em licitações –, tiveram as contas aprovadas nos tribunais de contas de seus estados, colocando em xeque a credibilidade dos órgãos de controle como mecanismo para coibir esquemas de corrupção.

O problema é que, entre os julgadores das suas movimentações financeiras, estavam aliados políticos. A ONG Transparência Brasil revelou, em estudo publicado no ano passado, que oito em cada dez conselheiros de contas do país exerceram mandatos eletivos ou altas funções em governos. A pesquisa, realizada em 2014 e atualizada em 2016, incluiu membros do Tribunal de Contas da União (TCU), dos 27 tribunais de contas dos estados e do Distrito Federal, e dos tribunais municipais. Existem quatro tribunais de contas do conjunto de municípios dos estados de Pará, Goiás, Ceará e Bahia, e Tribunais Municipais de contas nas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro.

O levantamento mostra que 23% dos 233 conselheiros e ministros respondem a processos ou já foram punidos na Justiça e até mesmo nos próprios tribunais de contas. Os supostos guardiões do dinheiro público são acusados de fraudar licitações, superfaturar obras e enriquecer ilicitamente. A mais comum acusação que recai sobre eles: improbidade administrativa.

Embora não tenha havido nenhuma investigação específica sobre elas, a Operação Lava Jato escancarou a participação dos integrantes dessas cortes estaduais, municipais e federal nos esquemas de desvio de dinheiro. No Rio de Janeiro, cinco conselheiros do TCE estão afastados, suspeitos de cobrar propina para fazer “vista grossa” de contratos do governo com empreiteiras.

Até fevereiro deste ano, o ex-ministro das cidades do governo de Dilma Rousseff Mário Negromonte (PP-BA) ocupava uma cadeira no conselho do Tribunal de Contas dos Municípios do Estado Bahia (TCM). Ele foi acusado de pedir propina de R$ 25 milhões para beneficiar empresas do setor de rastreamento de veículos quando era ministro. Indicado pelo ex-governador Jaques Wagner (PT-BA), em 2014, o conselheiro foi afastado depois que virou réu por corrupção passiva. O senador Agripino Maia (DEM-RN) teria influenciado a mudança de parecer do TCE do Rio Grande do Norte, favorecendo a OAS na construção do estádio Arena das Dunas para a Copa do Mundo de 2014, de acordo com denúncia da Procuradoria-Geral da República, acatada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). A operação atingiu também a cúpula do TCU. O filho do ministro Aroldo Cedraz (ex-deputado federal da Bahia pelo PFL, hoje DEM), o advogado Tiago Cedraz, passou a ser investigado em 2015 depois de o dono da empreiteira UTC Engenharia, Ricardo Pessoa, ter dito que o contratou para obter dados de difícil acesso na corte e para comprar uma decisão referente à usina nuclear Angra 3. Procurados pela reportagem da Pública, todos negam as acusações. (Leia o que dizem os citados)

Tudo dominado
Os tribunais de contas estaduais possuem sete conselheiros. Quatro são escolhidos pelo voto dos deputados; um, livremente pelo governador; e os outros dois, também pelo governador, mas têm de ser auditores e procuradores do Ministério Público de Contas.

Procurador do Ministério Público junto ao TCU e presidente da Associação Nacional do Ministério Público de Contas (Ampcon), Júlio Marcelo de Oliveira – conhecido por ser o autor da representação que levou à reprovação das contas de 2014 da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) por fraude fiscal –, alerta que, quanto mais tempo o mesmo grupo político permanece no poder de um estado, mais influência ele tem no tribunal de contas.

É o caso, por exemplo, de Minas Gerais. O PSDB permaneceu no governo por 12 anos, de janeiro de 2003 a janeiro de 2015. Todos os membros do órgão mineiro são ligados aos ex-governadores tucanos Aécio Neves e Antonio Anastasia: os ex-deputados Mauri Torres (PSDB), José Alves Viana (DEM), Wanderley Ávila (PSDB) e Sebastião Helvécio (PDT) foram indicados pela Assembleia Legislativa. Já os dois cargos técnicos, ocupados por Cláudio Terrão e Gilberto Pinto Dinis, foram nomeação de Anastasia.

O levantamento da ONG Transparência Brasil que avaliou a vida pregressa de todos os membros das cortes dos tribunais de contas na ativa em 2016 traz a informação de que, no grupo de conselheiros que jamais ocuparam cargo eletivo nem foram secretários de governo, 6% respondem a processo na Justiça. Já entre os conselheiros que são políticos profissionais, a porcentagem sobe para 27%.

Políticos que perderam o mandato, que estão achando difícil se reeleger, ou que querem aumentar o poder político da família, sendo substituídos na Assembleia pelo filho ou mulher, por exemplo, cobiçam as vagas de conselheiros de contas. Ali, recebem diversos benefícios, como foro privilegiado, cargo vitalício, salários altos – o salário-base é de R$ 30.471 –, além de gratificações e outras vantagens.

Juntos, os tribunais de contas custam mais de R$ 10 bilhões aos cofres públicos, de acordo com o procurador Júlio Marcelo de Oliveira. Os cargos de conselheiros são equivalentes aos dos desembargadores, e os ministros do TCU são equiparados pela Constituição Federal aos ministros do Supremo Tribunal de Justiça (STJ). Os membros dos órgãos de controle estão regidos pela Lei Orgânica da Magistratura. No entanto, ninguém os fiscaliza. “Os tribunais de contas não têm controle nenhum. Ninguém fiscaliza esses órgãos”, ressaltou Oliveira.

Em abril deste ano, vagou uma cadeira na corte de Minas, com a morte da conselheira Adriene Andrade, mulher do ex-senador Clésio Andrade (MDB). Ela preenchia a vaga de indicação livre do governador. Será a vez agora do atual gestor do estado, Fernando Pimentel (PT), indicar um nome. O líder do governo no Legislativo, deputado estadual Durval Ângelo, é o mais cotado a assumir o conselho, perpetuando a prática de aliados políticos fiscalizarem a prestação de contas de governadores.

Com interesses políticos predominando sobre interesses públicos, não faltam escândalos no currículo do TCE de Minas Gerais. Em 2002, o então presidente do órgão, José Ferraz, já falecido, foi apontado pelo Ministério Público do estado como um dos envolvidos em um incêndio criminoso que destruiu provas de investigações fiscais. Em 2008, três conselheiros, incluindo o presidente, foram indiciados por suspeita de envolvimento com uma organização criminosa acusada de ter desviado R$ 200 milhões em verbas do Fundo de Participação dos Municípios. O esquema foi revelado na Operação Pasárgada, que teve como alvo também membros da corte do Rio. Em 2015, o jornal Estado de Minas revelou que os conselheiros receberam, em dezembro de 2014, salários que ultrapassavam R$ 150 mil mensais.

O Ministério Público chegou a questionar na Justiça, em 2006, a indicação de Adriene Andrade ao conselho da corte de contas, com o argumento de que ela não possuía os requisitos para preencher a vaga. Ela era ré em processos sob a acusação de fraudar licitações e respondia a ações cíveis e inquéritos policiais por supostas irregularidades administrativas quando foi prefeita de Três Pontas, de 2001 a 2004. (Veja o que dizem os mencionados na reportagem)

Sociedade civil fica de fora do TCE
Para ser conselheiro do TCE de Minas, de acordo com artigo 78 da Constituição mineira, que foi inspirada na brasileira – na qual há os critérios destinados aos ministros do TCU –, é preciso ter “mais de trinta e cinco e menos de sessenta e cinco anos de idade; possuir idoneidade moral e reputação ilibada; notórios conhecimentos jurídicos, contábeis, econômicos, financeiros ou de administração pública; e ter mais de dez anos de exercício de função ou de efetiva atividade profissional que exijam os conhecimentos mencionados no inciso anterior”.

Doutor em contabilidade e finanças públicas, com mais de dez anos de serviço público, sendo quatro no TCE, o contador Alexandre Bossi encontrou na lei a possibilidade de fazer diferente: ocupar uma vaga de juiz de contas sendo um representante da sociedade civil. O desejo surgiu depois que ele trabalhou como auditor no tribunal mineiro. “Eu me sentia muito incomodado. Como auditor concursado, como técnico, você levanta várias coisas, faz inspeção na rua, visita municípios, faz um trabalho técnico de qualidade, com levantamento de irregularidades, de má gestão. Quando chega para votação política, no plenário, muitas vezes aquilo que a gente pesquisava, pegando o que a lei estipula em termos de punição, era deixado de lado. Achávamos, por exemplo, alguma irregularidade muito grande em uma estatal, aí, ao invés de aplicar multa, aplicava ressalva. Ou seja, não funcionava”, lembrou Bossi.

Em 2000, com a morte de um conselheiro indicado pela Assembleia, Bossi decidiu candidatar-se. O percurso, descobriu, não era tão simples como parecia. De acordo com o regimento interno do Legislativo mineiro, para entrar na disputa por uma vaga na corte de contas, é preciso ter o apoio de 20% dos deputados estaduais. “É feito para a sociedade não participar. É publicado no rodapé do Diário Oficial e, quando abre a vaga, só tem dez dias para fazer o registro”, avaliou.

Consultor do Legislativo desde 1993, ele tinha proximidade com os parlamentares e bateu na porta dos 77 gabinetes para conseguir os 16 votos necessários. Cada deputado pode apoiar até dois candidatos. “Os deputados falavam comigo: ‘Você tá doido? Já tenho compromisso com meu colega aqui, do partido tal’. Eu respondia: “Ô deputado, não diga isso. Diga que tem compromisso porque acredita que ele vai ser um bom fiscal, um bom auditor, mas não porque é seu amigo de partido”, lembrou. Bossi conseguiu o apoio e foi o primeiro representante da sociedade civil a disputar o cargo no país. Ele concorreu naquele ano com cinco deputados.

Na votação do plenário, Bossi precisaria de 39 votos, mas teve apenas um. Depois que experimentou a eleição pela primeira vez, o servidor público conseguiu entrar na disputa todas as outras cinco vezes em que vagaram cadeiras da Assembleia, em 2004, 2005, 2009, 2011 e 2012, sempre concorrendo com deputados. Ele até mesmo tentou ser o indicado do Aécio, em 2006. “Eu tentei falar com o governador, dizer pra ele para indicar uma pessoa com perfil técnico, mas o Aécio nem me recebeu. Foi o Anastasia, na época secretário de Estado, quem me atendeu”, contou. Naquele ano, Adriene Andrade foi a escolhida.

“Não vou me candidatar mais”, garantiu Bossi. “Eu fiquei de 2000 a 2012 mexendo com isso. É muito cansativo, eu paro a minha vida, mas isso não significa que eu desisti da luta”, explicou. Ele disse desconhecer casos de nomeações que não sejam políticas. “A sociedade civil organizada jamais conseguiu emplacar um nome. No caso da minha candidatura, eu tive a iniciativa, mas contei com o apoio de entidades como o Conselho Regional de Contabilidade e do Sindicato dos Servidores do Tribunal de Contas”. Para ele, é muito importante colocar os tribunais de contas, “órgãos desconhecidos da sociedade e tão importantes no combate à corrupção”, sempre na pauta de discussão. “Os diversos casos de desvio de dinheiro público que, com frequência, aparecem nas primeiras páginas dos jornais são prova de que os tribunais de contas não andam exercendo satisfatoriamente o seu papel fiscalizador”.

Aprovada pelo TCE-MG, cidade administrativa cai na mira da Lava Jato
Na mira da Operação Lava Jato, a Cidade Administrativa da capital mineira passou pelo crivo do Tribunal de Contas de Minas em 2007. As suspeitas reveladas nas investigações da Polícia Federal (PF) são de que o então governador Aécio Neves tenha recebido da Odebrecht R$ 5,2 milhões em propina para que a empresa faturasse a licitação. Os recursos teriam ido para sua campanha, de acordo com a delação do ex-executivo da empreiteira Benedicto Júnior. Sempre que questionado sobre as acusações, Aécio Neves diz que “o edital de licitação foi apresentado previamente ao Ministério Público Estadual e ao Tribunal de Contas do Estado”.

Inaugurada em 4 de março de 2010, dia em que o avô de Aécio, o ex-presidente Tancredo Neves, completaria 100 anos, a Cidade Administrativa é a obra mais cara da gestão do tucano. Ela custou R$ 1,2 bilhão aos cofres públicos. Apesar do alto investimento, salta aos olhos de quem frequenta o local a infraestrutura já decadente: pisos com rachaduras surgidas apenas três meses depois da inauguração , janelas proibidas de serem abertas – ficam lacradas – porque os vidros caem lá do alto e cheiro forte de esgoto nos jardins. Em 2015, um vendaval arrancou parte do teto do prédio.

Em fevereiro, Fernando Pimentel decidiu desativar o Palácio Tiradentes, um dos prédios da Cidade Administrativa, onde o governador despachava. De acordo com Pimentel, a medida trará uma economia de 40% nos gastos com insumos diversos, manutenção rotineira e com o consumo de água e energia. O PSDB rebateu a decisão do petista e garantiu que a centralização da estrutura governamental naquele espaço gerou uma economia de R$ 590 milhões aos cofres públicos entre 2011 e 2015.

Passados 17 anos do lançamento do edital da Cidade Administrativa, o TCE de Minas instaurou, em abril de 2017, um procedimento para investigar se houve fraude no contrato. A medida foi tomada depois que a Procuradoria-Geral da República abriu inquérito para averiguar a existência de crimes envolvendo Aécio Neves na obra. A iniciativa para a investigação partiu do Ministério Público de Contas.

A Pública entrou em contato com as assessorias de imprensa do senador Aécio Neves e do Tribunal de Contas de Minas, que não deram retorno.

Ministério Público
Além de atuarem como auxiliares dos tribunais de contas no controle e na fiscalização da execução do orçamento e dos atos de gestão dos recursos públicos, os membros do Ministério Público de Contas podem apresentar uma denúncia à corte de contas para que irregularidades sejam apuradas e os gestores, responsabilizados. Os pareceres dos procuradores de contas, servidores concursados com carreira de bacharel em direito, são opinativos. Ou seja, eles não têm o poder de vetar as decisões dos conselheiros, que podem acatar ou não suas recomendações, tendo apenas como ferramenta o recurso para que as decisões sejam revistas.

Nunca na história do TCE de Minas, por exemplo, houve reprovação das contas de um governador. Mesmo quando os procuradores de contas alertaram para problemas graves. Em 2013, o Ministério Público de Contas advertiu que o estado não cumpriu o mínimo constitucional para a educação, de 25% da receita, tendo aplicado apenas 23,91%. Isso não impediu, no entanto, que os conselheiros aprovassem as contas do ex-governador Antonio Anastasia, argumentando que o gestor havia cumprido os índices constitucionais.

13 conselheiros afastados em um ano
O descumprimento da aplicação mínima constitucional de 15% da receita para a saúde foi um dos principais argumentos dos conselheiros do TCE do Rio para a rejeição do balanço financeiro de 2016 do governador Luiz Fernando Pezão (MDB). A última vez que o TCE havia emitido parecer contrário às contas do estado fora em 2003. A decisão contrária a Pezão se deu em maio do ano passado. “O colegiado que deliberou pela rejeição das contas em 2016 foi integrado por conselheiros suplentes, tendo em vista o afastamento dos titulares por ordem judicial (IPL 1133/DF – Operação Quinto do Ouro). Note-se que em anos anteriores (2007-2015) o número de inconsistências foi até maior. Ainda assim as contas eram sistematicamente aprovadas com parecer favorável do TCE, numa evidente demonstração de que o controle era meramente formal e de que existia uma estratégia de proteção mútua entre os órgãos”, alertou o Ministério Público Federal (MPF) no documento que justifica a Operação Cadeia Velha, que revelou um esquema de corrupção na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro.

Apesar da recomendação do TCE, a Assembleia do Rio aprovou, em setembro de 2017, a movimentação financeira do governador. A população e os servidores do estado, que convivem com salários atrasados, foram proibidos de participar da votação. À época, o Legislativo fluminense justificou que a decisão foi tomada pela presidência, por recomendação da segurança da Casa, “amparada em informações de que poderia haver atos violentos nos protestos”. Dois meses depois da reunião, Pezão indicou para o conselho da corte Edson Albertassi (MDB), então presidente da Comissão de Orçamento, Finanças, Fiscalização Financeira e Controle da Alerj, que também tinha dado aval à sua prestação de contas.

“Os fatos, no entanto, demonstraram que a argumentação de Albertassi não passou de mera retórica para justificar a proteção ao governo cujas contas, se tivessem sido rejeitadas, poderiam levar à responsabilização pessoal do governador”, observaram os procuradores no documento. Ex-líder do governo na Assembleia, Albertassi foi preso na Operação Cadeia Velha, antes de assumir a vaga no TCE. Ainda de acordo com o MPF, “desde 2007 e durante toda a administração de Sérgio Cabral, houve razões de sobra para a reprovação das contas do governo, contudo, como o processo de fiscalização sempre esteve viciado, em momento algum o ex-governador esteve sob o risco de se ver submetido ao processo político de impedimento”.

Há suspeitas de que durante o governo de Cabral cinco dos sete conselheiros do tribunal – Aloysio Guedes, Domingos Brazão, Marco Antônio de Alencar, José Gomes Graciosa e José Maurício Nolasco – participaram de um esquema de cobrança de propina para fechar os olhos para os contratos entre empreiteiras e o governo. A Operação Quinto do Ouro, da PF, que revelou o esquema, teve como base a delação premiada do ex-presidente do TCE Jonas Lopes. Os cinco conselheiros foram presos temporariamente em 29 de março de 2017 e soltos em 7 de abril, mas seguem afastados de suas funções desde então. O TCE do Rio afirmou, por meio de nota, que não irá comentar sobre o assunto. A reportagem não conseguiu contato com a defesa dos conselheiros afastados.

No Mato Grosso também foram afastados cinco conselheiros. Eles são suspeitos de ter recebido R$ 53 milhões em propinas para não prejudicar o andamento das obras da Copa no estado. O esquema foi revelado em delação do ex-governador Silval Barbosa (MDB) durante a Operação Malebolge, da PF. Os conselheiros Valter Albano, Antônio Joaquim, José Carlos Novelli, Waldir Júlio Teis e Sérgio Ricardo de Almeida foram afastados em setembro do ano passado pelo STF. A Malebolge é uma sequência da Operação Ararath, que desde 2013 investiga um suposto esquema de lavagem de dinheiro público e crimes financeiros no Mato Grosso.

À reportagem, o TCE do Mato Grosso informou, por meio da assessoria de imprensa, que houve uma investigação interna em outubro de 2016. “A investigação foi conduzida por dois conselheiros substitutos e um procurador do Ministério Público de Contas, com conclusão em março de 2017”, observou o órgão. “Não chegou a nenhuma evidência de crime, mas mesmo assim a comissão responsável entendeu por bem encaminhar cópias dos autos para os Ministérios Públicos Federal e Estadual”, diz a nota.

Leia o que dizem os conselheiros

No Espírito Santo, o conselheiro José Antônio Almeida Pimentel foi acusado de receber dinheiro em troca de facilitação e favorecimento para a aprovação de processos perante a corte de contas do Estado. As investigações revelaram também que ele teria oferecido expertise e apoio técnico no direcionamento de processos licitatórios em diversos municípios capixabas. José Antônio é alvo da Operação Moeda de Troca, deflagrada em 2010, que apura fraudes em licitações de municípios no Espírito Santo. Ele saiu do cargo, por decisão do STJ, em junho do ano passado.

A defesa argumentou ao STF que a denúncia contra José Antônio Pimentel seria inepta, principalmente por ausência de justa causa relativa aos crimes de lavagem de dinheiro e organização criminosa. Os fatos imputados ao denunciado, de acordo com a defesa, não estariam especificados.

O conselheiro do TCE do Amapá José Júlio de Miranda Coelho foi igualmente afastado de suas funções em março de 2018 pelo STJ. Ele é acusado de ter cometido 62 vezes o crime de lavagem de dinheiro com uso de terceiros.

José Júlio tinha sido afastado em 2015 e voltou ao cargo em dezembro de 2017 por decisão do STF. Diante do novo processo de afastamento, a defesa de Coelho alegou que, diante da reintegração promovida pela Suprema Corte, não havia fato recente que justificasse o novo pedido de afastamento feito pelo Ministério Público Federal. Mas ele foi afastado mesmo assim.

Bom relacionamento e parentesco
A relação de cumplicidade entre o órgão de controle e seu controlado é um dos principais motivos da corrupção nos tribunais de contas, de acordo com o procurador Júlio Marcelo de Oliveira. “O político que ocupa a cadeira de conselheiro terá, na maioria dos casos, uma visão mais simpática ao seu grupo político. O desenho institucional atual é vulnerável à captura política”, acrescentou.

“É com muita tranquilidade e serenidade que eu afirmo que este governo do estado do Rio de Janeiro, com suas finanças públicas, seus controles públicos, faz uma nova era do estado. Nós que cuidamos das contas do estado sentimos claramente a mudança radical que houve na Secretaria de Fazenda”, afirmou o então presidente do TCE do Rio de Janeiro José Maurício Nolasco durante a abertura do IV Encontro do Conselho Nacional dos Órgãos de Controle Interno, que ocorreu em 2009. Anos depois, ele seria investigado na Operação Quinto do Ouro, já mencionada anteriormente.

“Da parte do Tribunal de Contas de Goiás e do nosso governo, o que tem ocorrido invariavelmente é uma relação harmônica, porque há, acima de tudo, uma identidade de propósitos”, afirmou o então governador de Goiás Marconi Perillo (PSDB) durante a inauguração de uma nova sede do TCE, em agosto de 2016. Perillo é acusado de ter formado uma aliança com o dono da construtora Delta, Fernando Cavendish, e com o bicheiro Carlinhos Cachoeira para receber vantagens indevidas em troca de contratos com o governo goiano que causaram prejuízos aos cofres públicos. Em nota enviada à imprensa quando denunciado ao STJ, em março de 2017, ele negou as acusações. Assim que deixou a vaga para disputar a reeleição, em abril, o governador que o substituiu, José Eliton (PSDB), indicou o cunhado de seu antecessor, Sérgio Cardoso, ao conselho do Tribunal de Contas dos Municípios do Estado de Goiás. (Veja a íntegra da nota do TCE-GO)

O levantamento da ONG Transparência Brasil mostrou também que 32% dos conselheiros têm relações de parentesco com políticos. “As relações são diversas e demonstram, em alguns casos, laços com figuras influentes na política local há diversas gerações. Em um caso, o poder remonta ao período imperial: o clã político cearense Paula Pessoa, ao qual pertence o conselheiro Luís Alexandre Albuquerque Figueiredo de Paula Pessoa, do TCE do Ceará, conta com oito gerações de políticos influentes. O conselheiro, além de ter de pai, irmão e sobrinho na política subnacional, tem como antepassado um senador do Império”, observou a ONG no estudo. (Veja o que dizem os mencionados na reportagem).

O movimento #MudaTC, criado pela entidade presidida pelo procurador junto ao TCU, Júlio Marcelo de Oliveira, a Ampcon, a Confederação Nacional das Carreiras Típicas de Estado (Conacate) e a Federação Nacional das Entidades dos Servidores dos Tribunais de Contas do Brasil (Fenastc), depois do escândalo no TCE do Rio, apoia a aprovação da PEC 329/2013, que está pronta para ir a plenário.

Entre os principais pontos está a mudança na composição dos tribunais de contas, proibindo indicações políticas. O projeto prevê também que os conselheiros sejam fiscalizados pelo Conselho Nacional de Justiça, assim como todos os juízes, desembargadores e ministros do STF e do STJ.

Já a Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon) defende que seja criado um Conselho Nacional dos Tribunais de Contas para fiscalizar as cortes de contas. Em relação à composição dos tribunais, o presidente da entidade, Fábio Nogueira, explica que a associação não é contra a indicação de políticos à vaga. “Nós não temos nenhum preconceito contra aqueles que vêm do Parlamento. O que nós precisamos é ter cautela nas indicações”, defendeu.

A proposta de mudanças da Atricon está na PEC 22/2017. Ela foi formulada e sugerida pela entidade e apresentada pelo senador Cássio Cunha (PSDB-PB). O projeto assegura a maior parte dos assentos aos membros das carreiras técnicas – cinco no TCU e quatro nos outros tribunais. E prevê o fim das indicações livres do chefe do Executivo e a redução das indicações do Legislativo, fixando critérios como quarentena de três anos afastado de mandato eletivo, não ter sido condenado judicialmente nem ter tido contas reprovadas.

Além disso, a PEC determina que os conselheiros deverão ter graduação e experiências nas áreas jurídica, contábil, econômica e financeira ou de administração pública. Atualmente, apesar de a Constituição exigir “notórios conhecimentos jurídicos, contábeis, econômicos, financeiros ou de administração pública”, há conselheiros de diversas áreas e sem ensino superior nas cadeiras de tribunais de contas estaduais. De acordo com estudo do perfil desses tribunais publicado em 2014 pelo contador Alexandre Bossi, que também é professor do Centro Universitário UNA em Belo Horizonte, esse grupo chega a 23% dos conselheiros. A pesquisa dele abrangeu o TCU, os 26 tribunais estaduais e o do Distrito Federal.

Atualização em 15/06: Depois da publicação, a assessoria de imprensa do Tribunal de Contas do Estado de Goiás entrou em contato com a reportagem da Pública afirmando que o governador do estado, José Eliton, indicou Sérgio Cardoso, cunhado do ex-governador Marconi Perillo, para o Tribunal de Contas dos Municípios e não para o Tribunal de Contas do Estado, conforme a Pública havia informado anteriormente. Sérgio Cardoso não analisará as contas referentes ao mandato do ex-governador. A informação foi corrigida.


El País: Bomba da dívida mundial ameaça explodir

Um nível de endividamento jamais visto desde a Segunda Guerra Mundial ameaça inocular o veneno da próxima crise

Por Davi Fernández, do El País

Você e eu estamos sentados em uma montanha de dívida pública e privada. A cota para cada habitante do planeta é de 21.866 euros, ou 95.554 reais. Uma bola de neve gigantesca e voraz. A fatura total chega a 164 trilhões de dólares (608 trilhões de reais), quantia equivalente a 225% do PIB mundial. Viver a crédito foi a saída natural da crise financeira. Os empréstimos permitiram cobrir os desequilíbrios das contas públicas e reanimar o crescimento. Mas convém não ultrapassar determinadas linhas vermelhas. Um nível de endividamento jamais visto desde a Segunda Guerra Mundial é uma bomba-relógio que pode explodir a qualquer momento. Argentina e Itália são dois exemplos recentes de como ressuscitam facilmente os fantasmas mal enterrados.

“Os altos níveis de dívida e os elevados déficits públicos são um motivo de preocupação”, adverte o Fundo Monetário Internacional (FMI) em seu último Monitor Fiscal. As nações com um grande endividamento, lembra esse organismo, são mais vulneráveis a um endurecimento das condições globais de financiamento, que poderiam dificultar o acesso aos mercados e colocar pressão sobre a economia. “A experiência demonstra que os países podem sofrer notáveis e inesperados choques em sua proporção entre dívida e PIB, o que aumenta a possibilidade de haver problemas em cadeia”, concluem esses especialistas.

A China é o país que mais contribuiu para o aumento do volume total na última década. Mas não é o único. As economias desenvolvidas devem o equivalente a 105% de seu PIB em média. Para as nações emergentes, a proporção já é de 50%, uma fronteira ultrapassada pela última vez nos anos oitenta, o que causou uma grave crise em muitas delas. “Por enquanto, o crescimento global é robusto, o desemprego está diminuindo e as taxas de juros continuam baixas. Todo isso faz com que o aumento da dívida seja manejável, mas se houvesse uma desaceleração inesperada ou um rápido aumento do preço do dinheiro, esta situação agradável se apagaria instantaneamente”, afirma Pierre Bose, estrategista do Credit Suisse.

O crédito cria um vício extremo. Por isso, o maior risco é a grande velocidade com a qual se chegou ao nível atual. Mais de um terço das economias avançadas, por exemplo, devem no mínimo o equivalente a 85% do tamanho de sua economia, três vezes mais do que no ano 2000. Os Governos, ao pisar no acelerador do crédito, resistiram à recessão, mas poderiam estar hipotecando o futuro econômico de seus países. “Com o tempo, a dívida deixa de estimular a atividade. Cada vez se necessita de mais acúmulo de empréstimos para gerar um ponto percentual adicional no PIB. O crescimento impulsionado pela dívida pode ser divertido no início, mas simplesmente traz para o presente o consumo futuro, do qual sentiremos falta depois”, diz Alfredo Álvarez-Pickman, economista-chefe do Key Capital Investment.

Momento delicado
A bolha chega, além disso, em um momento muito delicado. A Reserva Federal dos EUA começou a reduzir seu saldo − já não compra títulos públicos e amortiza os que tem no vencimento −, medida que vem acompanhada por aumentos das taxas de juros. O Banco Central Europeu (BCE) continua comprando dívida soberana, mas planeja fechar a torneira em setembro e seguir o caminho de seu homólogo americano. O plano traçado pelos dois organismos prevê um endurecimento monetário progressivo e moderado. Para que se materialize, é preciso que se cumpra a outra parte da equação: que os preços continuem sob controle. “A inflação tem sido modesta, mas se voltasse de forma súbita colocaria os bancos centrais em uma encruzilhada. Teriam de decidir entre deixar que os preços continuassem subindo, algo que vai contra sua natureza, ou elevar os juros para combatê-la, o que encareceria a carga de juros de Estados, empresas e famílias”, ressalta Bart Hordijk, analista do Money Europe.

Este ano marca o décimo aniversário da quebra do Lehman Brothers, tiro de largada da crise financeira que foi o prelúdio da Grande Recessão. No mercado, começa a se espalhar a teoria de que já não há ciclos econômicos, e sim ciclos de crédito, e que por isso convém não perder de vista o contador da dívida. Alguns especialistas, entretanto, recomendam prudência, pondo os dados em perspectiva. “Os níveis atuais de endividamento são autofinanciados e baratos. Essa é uma diferença importante em relação à situação da dívida global e da economia uma década atrás”, aponta Stéphane Monier, diretor de investimentos do banco Lombard Odier.

A economia mundial já vive um longo período de crescimento. Embora ninguém preveja uma mudança de tendência por enquanto, a ideia de que poderíamos estar nas últimas fases do ciclo ganha força. Quando chegasse a temida desaceleração econômica, o melhor que poderia acontecer a um governo seria ter margem para aumentar os gastos públicos, reduzir impostos e baixar os juros. Essas ferramentas contracíclicas, no entanto, são agora uma quimera. Por isso, instituições como o FMI estão pedindo aos países que construam, por meio da redução do déficit, um colchão para quando os maus tempos chegarem. “Os governos têm pouca margem fiscal devido à situação atual da dívida. Além disso, do ponto de vista monetário, os bancos centrais iniciaram o caminho do endurecimento. Devido à ausência desses estabilizadores tradicionais, a próxima recessão será mais pronunciada do que em ocasiões anteriores”, alertam os especialistas da Carmignac.

Como os problemas nunca vêm sozinhos, à elevada dívida pública é preciso somar a também delicada situação do endividamento privado, que dobrou em uma década e já alcança 120% do PIB mundial. “O endividamento das famílias é um problema principalmente quando é o resultado de um boom no mercado imobiliário”, explica Stefan Hofrichter, economista-chefe da Allianz GI. “Chama a atenção o fato de que o aumento da dívida privada se deva em grande medida à evolução dessa dívida em países pouco afetados pela crise financeira, como Canadá, Suécia, Noruega, Austrália, China, Brasil, Turquia e Índia. Muitos deles são precisamente os que tiveram o maior aumento nos preços da moradia dos últimos dois anos”, acrescenta Hofrichter.

Os riscos de uma dívida alta têm tradicionalmente pairado sobre as economias mais fracas. Essa tendência não mudou, mas foi reforçada pelo maior endividamento atual e pelas mudanças em sua composição durante os últimos anos. O primeiro perigo para o bloco emergente é de refinanciamento, já que ganharam peso os empréstimos não vinculados a concessões, cujos prazos de vencimento são mais curtos. Esses países também são mais sensíveis à retirada de fluxos de financiamento porque os investidores estrangeiros são os principais compradores. Além disso, são nações muito mais expostas à variação das taxas de câmbio: um terço da dívida dos países em desenvolvimento é denominado em moeda estrangeira, peso que aumenta para dois terços no caso daqueles de menor renda. “A natureza do problema da dívida não mudou. É um problema que afeta mais o mundo emergente do que o desenvolvido, porque a confiança do mercado em sua capacidade de pagamento é menor e, além disso, a situação pode mudar bruscamente, como vimos recentemente com o título argentino com prazo de 100 anos”, explica Agnieszka Gehringer, analista do Instituto Flossbach von Storch.

Mas a dívida dos países emergentes não é a única que causa preocupação. As atenções começam a se voltar para a maior economia do mundo. O aumento dos gastos em 150 bilhões de dólares (156 bilhões de reais) − 0,7% do PIB − por ano durante os próximos dois anos e a redução de impostos aprovada pelo Governo Trump levarão o déficit orçamentário dos EUA para mais de 1 trilhão de dólares (3,7 trilhões de reais), mais de 5% do PIB. Essa situação e também as maiores necessidades de financiamento farão com que a proporção da dívida em relação ao PIB seja de 117% em 2023, segundo cálculos do FMI. “No curto prazo, essas medidas serão positivas para os investidores, já que permitirão que o mercado continue em alta enquanto os EUA continuarem puxando a economia mundial. No entanto, a dívida pode se transformar em um assunto a ser acompanhado de perto quando a atividade do país se desacelerar e a proporção de endividamento subir mais do que o previsto”, indica Susan Joho, economista do Julius Baer.

Velhos fantasmas
A crise da dívida europeia colocou o euro contra as cordas há seis anos. Desde então, os esforços orçamentários dos governos e a atitude decidida do BCE baixaram a tensão e provocaram certa convergência dos títulos públicos, que pouco a pouco recuperaram seu status de ativos quase livres de risco, permitindo aos países financiar a recuperação com dívida barata. No entanto, os riscos não desapareceram, como se pôde comprovar nas últimas semanas com a disparada do prêmio de risco italiano devido à encruzilhada política em que se encontra o país. “Se a economia se desacelerar antes que se consiga melhorar as contas públicas, não está descartada a possibilidade de aumento dos custos de financiamento para as nações europeias mais endividadas. Reviver uma situação parecida com a de 2012 é possível se o mercado puser ênfase na sustentabilidade fiscal”, ressalta Chris Iggo, responsável por renda fixa na Axa Investment Managers.

A maioria dos especialistas consultados aponta as políticas monetárias muito frouxas como o principal motor do aumento da dívida pública no mundo. “Quando os bancos centrais reduzem as taxas de juros a níveis extremos, seu único objetivo é incentivar o mundo a pedir emprestado”, recorda Álvarez-Pickman. Ao mesmo tempo, a promoção dessas medidas heterodoxas causou uma mudança na percepção que se tem sobre o crédito. “Houve mudanças estruturais e de conduta na dinâmica do endividamento. Tomar emprestado passou a ser algo mais aceito culturalmente devido às políticas governamentais orientadas a injetar mais dinheiro na economia”, assinala um especialista da Brandywine Global, filial da gestora de ativos Legg Mason.

Outro fator-chave na hora de explicar o maior endividamento é a demografia. “Os países desenvolvidos enfrentam o envelhecimento de suas populações. Cada vez há mais aposentados do que pessoas ativas, e isso significa menores receitas fiscais. Quando um governo arrecada menos, mas seus compromissos de gastos são maiores, uma solução fácil para o problema é a emissão de mais dívida”, afirma Christopher Gannatti, diretor de análise da WisdomTree. Nesse sentido, a proporção da dívida em relação ao PIB é consideravelmente mais alta quando se incluem os compromissos de gastos com aposentadorias e saúde. Nesse caso, o endividamento médio nos países avançados quase dobra, chegando a 204% do PIB, e nos emergentes ele dispara para 120%.

Soluções
O que se pode fazer para reduzir os níveis de dívida? A geração de um crescimento maior e sustentado é uma das possíveis soluções, já que ao aumentar o tamanho da economia se dilui em parte o peso dos empréstimos sobre ela. “O crescimento é o principal assassino da dívida. A melhora da atividade, isto sim, deveria vir pelo lado da oferta. Este tipo de crescimento se obtém com reformas, reformas e mais reformas. Um exemplo concreto é a melhora no acesso à educação e em sua qualidade. Ter pessoas mais bem formadas significa aumentar a produtividade no futuro”, sustenta Witold Bahrke, responsável por estratégia macroeconômica da Nordea AM.

Outra receita básica, mas difícil de levar a cabo, é não gastar mais do que se arrecada. O controle do déficit público é fundamental para livrar as economias de seu vício em dívida. “Os governos, as famílias e as empresas simplesmente têm de deixar de gastar além de suas possibilidades. Nesse sentido, temos o exemplo de Austrália e Suécia, que adotaram medidas prudenciais para evitar o superaquecimento de seus mercados imobiliários”, comenta o especialista da Brandywine. O equilíbrio orçamentário também é considerado crucial por Pierre Bose, do Credit Suisse: “No curto prazo, é improvável que haja quedas nos gastos públicos e impostos mais altos, já que o crescimento em muitas economias ainda é fraco. No entanto, há muito poucos países que estejam gerando superávit”.

Tanto as reformas estruturais como as decisões que acarretam mudanças nas políticas de gastos exigem vontade política. Esse é o maior obstáculo que os especialistas veem para apostar nelas como uma receita factível para reduzir o alto endividamento. “Se os governos reduzissem seus gastos, haveria uma necessidade menor de emitir nova dívida. Levando em conta alguns resultados eleitorais recentes e o atual clima político, é cada vez mais evidente que é muito difícil pôr em prática essa abordagem do problema”, reconhece Christopher Gannatti, da WisdomTree.

Outra medida tradicional para reduzir o montante da dívida é gerando inflação. A maioria dos empréstimos é feita em termos nominais. Portanto, um aumento dos preços ajudaria a reduzir o endividamento. Neste caso, porém, há vários problemas. O primeiro é que, como se viu depois de anos de injeções multimilionárias na economia, gerar inflação já não é tão simples. Além disso, com o Índice de Preços ao Consumidor ocorre o mesmo que com o jogo do sete e meio (em que os jogadores tentam somar esse total com as cartas ou chegar o mais perto possível, mas não podem ultrapassá-lo): convém não ficar aquém nem passar da meta. Uma escalada desenfreada pode forçar aumentos das taxas de juros mais rápidos que o desejável. E, finalmente, não serve qualquer aumento de preços. “Uma inflação maior só é útil se resulta de um aumento dos salários. Se for assim, haverá maior demanda e crescerão tanto o PIB nominal como a arrecadação fiscal. Por outro lado, se essa inflação for produto apenas de fatores externos, como a energia, não ajudará muito se o que se pretende é reduzir o peso da dívida”, explica Azad Zangana, economista da Schroders.


El País: Facebook confirma que rastreia até os movimentos do seu mouse

Empresa de Mark Zuckerberg usa técnicas que permitem acompanhar os movimentos do cursor na tela do seu computador

Em um documento enviado ao Senado dos Estados Unidos, o Facebook responde ponto por ponto às perguntas feitas pelos parlamentares. São 228 páginas em que a empresa expõe a maneira como age em relação aos dados dos seus usuários. Um dos aspectos mais polêmicos é o da coleta de informações.

Aqui a empresa de Mark Zuckerberg lista em vários trechos do documento como reúne dados concretos sobre os dispositivos do usuário e que uso faz dessas informações. No computador, um dos parâmetros mais chamativos que o Facebook monitora são os movimentos do mouse. Tradicionalmente, esse tipo de rastreamento, conhecido como mouse tracking, serve para indicar como os usuários se comportam dentro de uma plataforma de software, reunindo dados que permitam melhorar a interface.

No computador, o Facebook controla os movimentos do cursor do mouse e também se uma janela está aberta em primeiro ou segundo plano. A companhia acrescenta entre parênteses que esse tipo de informação “pode ajudar a distinguir humanos de robôs”. Também observa que toda a informação colhida de um usuário através dos múltiplos dispositivos que ele usa, como computadores, smartphones e TVs conectadas, é cruzada para “ajudar a proporcionar a mesma experiência personalizada onde quer que as pessoas usem o Facebook”.

O documento não esclarece se a rede social se vale dos movimentos do mouse para algo além de distinguir entre humanos e robôs, embora tampouco afirme que o utilize exclusivamente para essa finalidade. No passado, o Facebook foi acusado de testar métodos que usavam o mouse tracking para determinar não só em quais anúncios o usuário clica como também em quais pontos da tela ele se detém, e durante quanto tempo.

Informações desse tipo são relevantes porque o lugar onde o cursor se detém muitas vezes coincide com o ponto no qual focamos nossa atenção, segundo os especialistas em mouse tracking.

Dados sobre bateria, armazenamento e operadora
No memorando enviado ao Senado dos EUA – e que a revista Business Insider foi o primeiro veículo de comunicação a examinar –, o Facebook também enumera a informação que reúne sobre os atributos do aparelho que usuário utiliza. Isso inclui o sistema operacional, as versões de hardware e software, o nível de bateria e a capacidade de armazenamento disponível. Do mesmo modo, sabe qual navegador e os tipos e nomes dos aplicativos instalados e de arquivos guardados.

A companhia também tem a capacidade de acessar o sinal Bluetooth e de rastrear informação sobre os pontos de acesso wi-fi próximos, as torres de telecomunicações ou outros dispositivos emissores de sinal, como os beacons.

O nome da operadora de telefonia celular de um usuário e o seu provedor de Internet são outros dados que a rede social conhece. Neste item relativo à conexão, o Facebook também detecta “o número de telefone, o endereço IP, a velocidade de conexão e, em alguns casos, informações a respeito dos dispositivos que estão próximos ou em sua mesma rede, com o que podemos fazer coisas como ajudar a enviar um vídeo do celular para a televisão”.

Informações sobre a localização por GPS, assim como acesso à câmera e à galeria de fotos, são outros dos aspectos, já amplamente conhecidos, que a companhia enumera no documento. Mas ela deixa claro, diante de várias perguntas ao longo do texto, que “não usa o microfone do celular dos usuários ou qualquer outro método para extrair áudio” a fim de influenciar os anúncios que são apresentados ou para determinar o que aparece no feed de notícias do usuário.


El País: Mais pobres podem levar até 9 gerações para atingir renda média no Brasil

Na comparação com 30 países, Brasil empata na segunda pior colocação com a África do Sul. Em estudo, OCDE sugere melhorar gasto público, principalmente nas áreas de educação e saúde

Por Rodolfo Borges e Silvia Ayuso, do El País

Uma família brasileira pode levar até nove gerações para deixar a faixa dos 10% mais pobres e chegar à de renda média do país, segundo estudo sobre mobilidade social elaborado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Nesse quesito, o Brasil só fica na frente da Colômbia e empata com a África do Sul numa lista de 30 países analisados pelo estudo O elevador social está quebrado? Como promover mobilidade social, divulgado nesta sexta-feira. Na Colômbia, são necessárias 11 gerações para que uma família alcance a renda média nacional. A organização destaca que o estudo é ilustrativo e que não deve ser levado ao pé da letra.

A percepção do brasileiro, de acordo com pesquisa da Oxfam mencionada no estudo, endossa o cenário: seis em dez cidadãos pensam que esforço não é o bastante para um pessoa que nasceu pobre alcançar uma situação de vida confortável. De acordo com o levantamento da OCDE, 35% dos filhos de pais posicionados no um quinto mais pobre do Brasil terminam a vida nesse mesmo estrato social. Além disso, apenas 7% deles chegarão a figurar entre os 20% mais ricos.


Por outro lado, 43% dos filhos com pais mais ricos seguirão com o mesmo nível de renda, enquanto apenas 7% deles têm chance de piorar de vida. Para se ter uma ideia da situação brasileira, a média da OCDE indica que apenas 31% do um quarto mais pobres seguem da mesma forma, enquanto 17% se elevam ao um quarto mais rico. A mobilidade social é maior em países como Estados Unidos e muito maior nos países nórdicos.

E como se acelera o elevador social no Brasil? Não há receitas milagrosas, mas algumas pistas. A OCDE sugere ao Brasil melhorar o gasto público, principalmente nas áreas de educação — com mais investimento no ensino básico — e saúde — alocando recursos para os tratamento mais importantes e para as pessoas quem mais precisem. A formação de desempregados por meio do Pronatec também é destacada pelo organismo internacional, assim como a redistribuição de renda por meio de reformas que extingam isenções e o aumento do gasto social em programas para auxiliar os cidadãos mais vulneráveis.

Apesar dos números ruins, segundo a mesma pesquisa os brasileiros que já conseguiram subir na escala social têm menos risco de piorar de vida na comparação com habitantes de países emergentes como China, África do Sul e Indonésia. E por que todos esses dados importam? Porque saber se uma geração vive melhor ou pior do que seus pais não é só uma percepção ou uma curiosidade. Também é um fator econômico chave, segundo a OCDE.

O estudo investiga o impacto de "eventos gatilhos" — como mudanças no mercado de trabalho, divórcio ou parto — na mobilidade da renda. O emprego é o principal determinante da trajetória de renda individual, mas, em vários países, "as mudanças relacionadas à família também podem desempenhar um papel muito importante". "Em particular, as mulheres são mais gravemente afetadas do que os homens por perdas de renda após o divórcio", diz o estudo. Uma rede de transferências sociais é um fator crucial para evitar a mobilidade descendente, segundo a OCDE, enquanto a mobilidade ascendente resulta principalmente da dinâmica do mercado de trabalho.

Produtividade
O conceito de mobilidade social influi na produtividade econômica de um país e na qualidade de vida de seus cidadãos. E também tem fortes implicações políticas: um alto risco de cair na escala da mobilidade e a perda de status social que isso implica não só reduz a satisfação pessoal, mas também “mina a coesão social e a sensação das pessoas de que sua voz conta, especialmente entre pessoas de rendimentos médios e baixos”. Isso, por sua vez, “reduz a confiança no sistema sociopolítico, com potenciais consequências negativas na participação democrática”. E isso, adverte o organismo com sede em Paris, “reforça os extremismos políticos ou o populismo”.


El País: O cerco legal às manifestações como um duro legado de 2013

Estudo da Artigo 19 mostra articulação entre Executivo, Legislativo e Sistema de Justiça para restringir o direito de protesto e contabiliza quase 70 projetos de lei que criminalizam manifestantes

Por Felipe Betin, do El País

No dia 13 de junho de 2013, quando estava fazendo a cobertura de um protesto contra o aumento da tarifa do transporte público, em São Paulo, o fotojornalista Sérgio Silva levou um tiro de bala de borracha que fez com que perdesse o olho esquerdo. "Para mim, falar de 2013 é sempre lembrar dessa noite de dor", diz. Hoje, cinco anos depois de umas jornadas de protestos conhecidas simplesmente como Junho de 2013, a repressão e a criminalização de manifestações não apenas continuam, colocando a vida de milhares de pessoas como Sérgio em risco, como se aprimoraram.

É o que diz um amplo estudo da Artigo 19, uma ONG internacional de direitos humanos que vem acompanhando desde então o que vem sendo feito em termos de legislação para dificultar e reprimir manifestações protestos e a articulação do Executivo, Legislativo e Sistema de Justiça para "para consolidar um ambiente de criminalização e restrição ao direito de protesto", explicou nesta segunda-feira Camila Marques, advogada e coordenadora do Centro de Referência Legal da Artigo 19, durante a apresentação da pesquisa, na sede da Defensoria Pública de São Paulo.

A organização contabilizou ao menos 70 projetos de lei no Congresso Nacional relacionados ao direito de se manifestar, mas apenas dois deles são positivos por tentarem criar salvaguardas para manifestantes e limitar a violência policia. Os demais podem ser divididos em três grupos: os que querem criar novos crimes para enquadrar manifestantes e movimentos sociais, tais como o de "vandalismo e de terrorismo", além da proibição do "bloqueio de vias e do uso de máscaras"; outros projetos tentam alterar os crimes já existentes, aumentando a pena para delitos de "incêndio e resistência quando acontecem em protestos sociais"; por fim, há também os projetos que visam "criar algum tipo de restrição e de regulamentação ao direito de manifestantes", como burocracias, ritos e procedimentos para dificultar o aviso prévio de atos a serem realizados.

Entre as lei aprovadas se destaca a de antiterrorismo, sancionada pela ex-presidenta Dilma Rousseff (PT) às vésperas dos Jogos Olímpicos de 2016 no Rio de Janeiro. "A gente tem uma lei que tem conceitos extremamente vagos, genéricos e que traz penas altíssimas. Quem vai decidir e compreender o que é provocar pânico e terror social? Sabemos que quem vai aplicar essa lei são os membros de Sistema de Justiça, marcado no Brasil por uma ação criminalizadora e repressora", argumenta Marques. Outra legislação citada pela advogada da Artigo 19 é a que proibia bandeiras e cartazes que não fossem manifestações "festivas e amigáveis" nos espaços dos jogos da Copa do Mundo de 2014 e das Olimpíadas de 2016. "O que é isso e quem vai decidir o que é festivo e amigável?", questiona ela, que ainda fala em legislações municipais e estaduais antivandalismo e que proíbem o uso de máscaras, por exemplo.

A organização também argumenta que, desde Junho de 2013, "marcado por uma total brutalidade e violência do Estado", as polícias militares dos Estados aprimoraram seus armamentos e sofisticaram suas táticas de repressão, com canhões sônicos, blindados israelenses, trajes Robocop, veículos com canhões de água, além do uso contínuo e indiscriminado de balas de borracha, bombas de efeito moral, cassetetes e spray de pimenta. Essa parte do estudo é baseada principalmente em percepções colhidas nas ruas, nos locais de protesto. Segundo argumenta a ONG, falta transparência por parte das autoridades, que não fornecem dados sobre as operações realizadas em protestos, as normas que disciplinam o uso da força em manifestações ou números relacionados ao orçamento destinado à compra de equipamentos e à repressão de protestos. Presente na apresentação do estudo, o defensor público Rafael Lessa falou sobre uma ação civil pública que pede a regulamentação do uso da força policial em protestos em São Paulo, com o objetivo de que a PM "atuasse de acordo com parâmetros internacionais". Entre os vários pedidos, estava a proibição do uso de balas de borracha e a apresentação de um plano de atuação da polícia em protestos. O Tribunal de Justiça chegou a aceitar o pedido, mas o Estado recorreu ao presidente do Tribunal, que então suspendeu a ação.

A pesquisa da Artigo 19 também fala que consolidou-se a prática de policiais acompanharem manifestações sem estarem identificados. Ações de vigilância também se sofisticaram, com a infiltração de policiais, filmagem de manifestantes, investigação nas redes sociais, quebra de sigilo das comunicações... Muitas dessas ações, lembra a ONG, são coordenadas entre Exército, Polícias e a Agência Brasileira de Inteligência (ABIN). Um dos casos lembrados é o do militar do Exército Willian Pina Botelho, conhecido como Balta. A partir das redes sociais, ele conseguiu se infiltrar em um grupo de jovens de São Paulo que planejam se manifestar contra o presidente Michel Temer, em 2016. Na ocasião, 21 manifestantes chegaram a ser presos e 18 deles respondem pelos crimes de associação criminosa e corrupção de menores.

No total, 849 pessoas foram detidas arbitrariamente em São Paulo e no Rio de Janeiro entre janeiro de 2014 e junho 2015 durante 740 protestos. Sete pessoas morreram. Já entre agosto de 2015 e dezembro de 2016, foram 1.244 detenções arbitrárias em todo o país, segundo a Artigo 19. A ONG lembra que, durante o processo de impeachment de Dilma Rousseff, as maiores manifestações foram realizadas pelos partidários do afastamento e não houve qualquer incidente, o que indica uma repressão e criminalização seletiva por parte das autoridades. "Eu movi um processo contra o Estado pedindo uma indenização por dano moral e dano físico. Mas o juiz em primeira instância entendeu que eu não cabia um pedido de indenização por acreditar que seria minha a responsabilidade por estar numa manifestação como jornalista portando uma câmera fotográfica", lembra o fotógrafo Sérgio Silva, uma das vítimas da violência policial em junho de 2013. "Ele nega a indenização e, por outro lado, me condena. Afirma que era minha a responsabilidade por estar na linha de tiro da polícia".

 


El País: O voto das mulheres, um muro contra a candidatura Bolsonaro

Quatro em cada dez eleitoras ainda não sabe em quem vai votar. Sem Lula, número de indecisos chega a recorde

Por  Talita Bedinelli, do El País

Se as eleições presidenciais ocorressem agora, quatro em cada dez mulheres do país não teriam um candidato, segundo a pesquisa Datafolha divulgada no último domingo. O resultado repete o visto pelo levantamento telefônico do DataPoder360, a divisão de pesquisas do site Poder360, em cenários que não consideraram o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, preferido entre elas. Enquanto até 42% das entrevistadas pela pesquisa afirmam que votariam branco, nulo ou se declaram indecisas, a taxa atual destes não votos entre os homens é de 25%. As mulheres, principal força eleitoral do país, estão mais indecisas ou desprezam mais os atuais nomes disponíveis neste momento da disputa do que os homens. E quais seriam os motivos que levam a essa diferença entre elas e eles?

A tendência de indecisão entre as eleitoras meses antes da votação não é novidade e se repete em todos os pleitos. E isso não significa que se manterá tão alta até o momento em que elas chegarem às urnas, apontam estudos sobre o comportamento eleitoral das mulheres. As eleitoras demoram mais para escolher candidatos e costumam decidir de olho nas propostas, especialmente as que abordam serviços públicos, algo que se torna evidente apenas após o início da campanha na TV.

No atual estado da corrida eleitoral, elas são decisivas para desenhar o panorama: de um lado, puxam para cima - em nível recorde - o número de eleitores que não escolhem ninguém se Lula não estiver no páreo; do outro, erguem um muro que, até agora, impede que o candidato de extrema direita Jair Bolsonaro avance na dianteira sem ele.

Condenado em segunda instância, Lula pode ter sua candidatura impugnada pelas regras da Lei da Ficha Limpa, mas quando seu nome é testado nas pesquisas a maior proporção de suas intenções de voto está entre as mulheres —31% delas afirmam querer votar nele; entre os homens, a taxa é de 29%. Por isso, na ausência de Lula a taxa de não voto aumenta. "Lula tem uma variável fundamental que é o Bolsa Família", afirma Maurício Moura, presidente do Idea Big Data, que coordenou diversas campanhas no Brasil e no exterior. Um estudo das Nações Unidas do ano passado apontou que o programa de transferência de renda favorece a autonomia das mulheres beneficiárias, que se sentem menos dependentes dos parceiros ao adquirir uma fonte regular de renda —o pagamento é feito preferencialmente a elas. Também exige a frequência das crianças à escola e a vacinação. A luta está em quem vai convencer esta eleitora de merece o voto que seria de Lula. Marina Silva é quem mais cresce dentre as mulheres que declaram votos na ausência de Lula (até 17% sem Lula ante 11% com ele).

Sem o petista, Marina se aproxima de Bolsonaro, que desponta em primeiro nas pesquisas na ausência do ex-presidente. Entre as mulheres, o deputado está em clara desvantagem. Tem entre as eleitoras uma preferência muito mais baixa que entre os eleitores. Se até 27% dos homens afirmam que pretendem votar nele, entre as mulheres este número cai para até 12%, segundo o Datafolha. Bolsonaro precisa conquistar os votos delas pra poder crescer, algo complicado para um candidato que fez declarações machistas polêmicas, especialmente em um momento de fortalecimento dos movimentos feministas. Em abril do ano passado, ele afirmou que "fraquejou" ao ter o quinto filho e, por isso, ela nasceu mulher, o que causou revolta nas redes sociais. Ele também causou indignação ao chamar a deputada Maria do Rosário de "vagabunda" e afirmar: "jamais iria estuprar você porque você não merece".

Esperar para ver
Seja como for, parece faltar ainda algumas semanas até que o quadro mude de maneira significativa. "As mulheres esperam chegar a informação que lhes interessa. Geralmente, elas são mais cuidadosas na escolha", diz a socióloga Fátima Pacheco Jordão, que em 2010 realizou um estudo sobre o poder do voto feminino para o Instituto Patrícia Galvão, ONG da qual é conselheira. Em sua pesquisa, ela apontou que entre as eleitoras o voto costuma ser mais consciente e consistente e as mulheres ficam na expectativa de propostas que afetem diretamente a vida da população, como as relacionadas à saúde, educação, desemprego e segurança. E, enquanto elas são mais sensíveis a políticas públicas, eles demonstram mais interesse por assuntos ligados ao jogo de poder, como as escolhas partidárias, por exemplo. Por isso, os homens geralmente têm mais certeza de seus votos nesta etapa da corrida eleitoral, quando as decisões políticas estão sendo tomadas.

Lúcia Avelar, pesquisadora associada do Centro de Estudos de Opinião Pública (Cesop) da Unicamp, pondera que os dados globais das pesquisas de opinião não mostram as diferenças que existem entre as mulheres dentro dos diversos estratos, como renda, escolaridade e região do país, por exemplo. Mas ela concorda que, em geral, as mulheres costumam decidir mais tarde. "Elas são muito mais conhecedoras dos serviços públicos e sociais", explica. Para ela, entretanto, a elite política não dá tanta importância a essa parcela de votantes, que representa 52,5% do eleitorado brasileiro, de acordo com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). "Eles acham, erroneamente, que a mulher acompanha o voto do companheiro. Há um conservadorismo pesado que cega um pouco os políticos. Eles começam a acordar agora para a importância de dar uma atenção especial para elas", ressalta.

"É impossível se passar por uma campanha sem que exista um cluster que seja feminino. Alguma tática de comunicação para esse grupo é necessária", diz Moura, do Idea Big Data. Ele reconhece, entretanto, que a atenção dada às campanhas para o voto das mulheres ainda é desproporcional ao tamanho delas no eleitorado. "A questão é que existem muito mais candidatos homens do que mulheres e, por isso, as campanhas já partem de uma lógica inicial masculina. Essa força ainda é subestimada em relação ao tamanho do eleitorado porque a lógica da política ainda é masculina", ressalta. Para ele, o problema se corrige com o aumento de candidatas mulheres no processo.

"Eu não escolhi meu candidato e acho que não vou votar em ninguém. Prefiro assistir aos debates, que ajudam quando a gente não conhece muito os nomes", conta a analista de sistemas Fabiana Guimarães Zinhani, 30. O mesmo afirma a manicure Maria Mônica da Conceição, 62. "Na verdade, nem sei quem disputa, além do [ex-governador] Geraldo Alckmin". Para ambas, o atual cenário de candidatos, que se mostra mais pulverizado e com nomes menos conhecidos, faz com que a escolha seja ainda mais difícil do que nos anos anteriores. E o voto delas ainda mais importante, explica Pacheco Jordão. "Neste contexto, o peso de cada voto é maior e [diante das muitas opções] elas provavelmente vão demorar ainda mais para escolher", diz. "Em decisões apertadas como as que temos tido, quem acaba decidindo a eleição é a mulher", explica a socióloga.


Eliane Brum: Caminhoneiro, o novo velho protagonista do Brasil

Identidade, gênero e luta de classes no protesto que parou o país e pode apontar para uma versão brasileira do eleitor de Donald Trump nas eleições

O Brasil que parou o Brasil por 11 dias reivindica um lugar que perdeu e um tempo que já não existe. Neste sentido, não poderia estar mais distante dos protagonistas dos protestos de 2013. Se uma parcela significativa estava ali como autônomos, avulsos, os caminhoneiros são unidos por uma identidade muito particular, cujo papel não deve ser reduzido. As rodas dos caminhões já giram em falso há muito. Aqueles que interromperam o abastecimento do país são também homens encurralados num mundo que já não compreendem. As máquinas estacionadas nas rodovias são a potência que restou, mas essa potência já não pertence a esse século.

O homem que trancou as rodovias tem idade média de 44 anos, está acima do peso, é sedentário, tem baixa escolaridade, trabalha mais de 11 horas por dia, tem remuneração mensal média de menos de quatro mil reais e acredita que sua renda está em queda. Quase metade dos caminhoneiros estava endividada. A maioria acreditava que a diminuição da demanda era causada pela crise econômica e, mesmo antes da mudança da política de preços da Petrobras, 46% já apontava o preço do combustível como um dos grandes problemas. Este é o perfil revelado por uma pesquisa realizada pela Confederação Nacional dos Transportes (CNT) em 2016. É improvável que algo substantivo tenha mudado em dois anos. É provável, porém, que a queda do número de fretes e da renda, assim como as dificuldades, tenham se ampliado com a instabilidade do país. E certamente o aumento do diesel pesou.

A relação entre a paralisação dos caminhoneiros e o apelo por intervenção militar revela conexões simbólicas profundas

É importante compreender quem é esse novo velho protagonista que parou o país em maio de 2018, assim como perceber o quanto há de protagonismo real nesse personagem. Durante boa parte da segunda metade do século 20, com mais ênfase na ditadura civil-militar (1964-1985), o caminhoneiro tornou-se um personagem importante da propaganda nacionalista de um Brasil em busca do progresso e do futuro. Ao longo das últimas décadas, esse mesmo personagem testemunhou essa imagem se dissolver e, junto com ela, perdeu não só renda, mas também espaço simbólico.

A propaganda da ditadura era marcada por grandes caminhões desbravando as novas estradas abertas no país, algumas delas míticas como a Transamazônica. Basta folhear as revistas da época para alcançar o que era ser um caminhoneiro no imaginário do país dos anos setenta, a serviço de um governo opressor que manipulava tanto nacionalismo como ufanismo. A relação entre a paralisação pela redução do valor do diesel e o apelo por intervenção militar, a qual uma parte dos caminhoneiros aderiu, revela conexões simbólicas mais profundas, fundamentais para compreender o que foi esse momento.

A imagem que se consolidou também como autoimagem era a do caminhoneiro como um desbravador do Brasil. Afinal, era preciso atribuir valor de heroísmo à profissão, para convencer pais de família a enfrentar por semanas estradas terríveis e cheias de perigos na boleia de um caminhão. Não um desbravador qualquer, mas um que avançava conduzindo grandes máquinas e empurrava o país sobre rodas enormes. Ser caminhoneiro era também ser potente. Potente no sentido masculino e arcaico do termo. Essa marca de testosterona, essa marca de gênero do movimento precisa ser levada em conta nas análises.

O caminhoneiro esteve, e ainda está, ligado a três valores: ao transporte da riqueza do país, ao espírito de aventura e ao empreendedorismo, representado pela meta de comprar seu próprio caminhão. Cada família de classe média baixa tinha pelo menos um parente caminhoneiro, especialmente nas cidades do interior e nos subúrbios das grandes cidades. Apenas como exemplo: Maria, a irmã mais querida de Luiz Inácio Lula da Silva, era esposa e mãe de caminhoneiros bastante orgulhosos da profissão, moradores dos bairros menos nobres de São Bernardo do Campo, no ABC Paulista.

No Rio Grande do Sul, um dos polos de caminhoneiros do Brasil, parte deles é descendente de imigrantes europeus. Se transportar as mercadorias da terra não era tão valorizado quanto possuir a terra, o bem mais cobiçado que seus antepassados vieram buscar no Novo Mundo, ser caminhoneiro era, e ainda é, considerado uma profissão digna, “de homem”, e muitas vezes passava de pai para filho, com clãs de caminhoneiros preparando o churrasco de domingo enquanto as mulheres se dividiam entre a maionese de batata e o pudim de leite da sobremesa.

Num estado que mitificou a figura do gaúcho como o errante dos caminhos, de coração valente e alma livre, o caminhoneiro era o mais próximo de um cavaleiro moderno das estradas. Muitos deles eram filhos de pequenos agricultores que perderam a terra durante o processo de mecanização da agricultura ou que não tinham terra suficiente quando os filhos cresciam e constituíam sua própria família. Em vez das raízes plantadas no chão, esses herdeiros da vontade de vencer na vida e de ter um lugar no país carregavam o produto da terra para outros cantos do mundo. Como os antigos tropeiros que os caminhões foram tornando mais e mais obsoletos.

São muitas as místicas criadas em torno do caminhoneiro para, o mais rapidamente possível, atribuir tradição à profissão num país que escolheu a estrada como principal meio de transporte de bens e de pessoas. Pelo Brasil afora há canções e histórias de caminhoneiros. E muitos devem lembrar da série Carga Pesada, da TV Globo. Ao contar as aventuras de uma dupla de caminhoneiros pelo país, Pedro e Bino, interpretados por Antônio Fagundes e Stênio Garcia, a série fez muito sucesso entre 1979 e 1981. Depois, entre 2003 e 2007, foi reeditada. Era a realização na dramaturgia do brasileiro pobre, mas trabalhador, empreendedor e sonhador, lutando contra um Brasil muitas vezes corrompido e corruptor.

Entre o autônomo e o autômato, a luta de classes é espertamente borrada

O caminhoneiro como “guerreiro das estradas” é um personagem do Brasil. Mas de um Brasil que já não é. E este é o ponto. Nos últimos vários anos, tornou-se cada vez mais difícil manter essa autoimagem. A força dessa simbologia, cevada por tantas décadas, já não era capaz de dar sentido a uma vida que se precarizava de forma acelerada. De empreendedor do asfalto o caminhoneiro passou a ser o trabalhador autônomo, que pouco ou nada tem de “autônomo”, como bem demonstrado em artigo de Vitor Araújo Filgueiras e José Dari Krein.

A palavra, convertida em mais um termo falsificador no Brasil, ganhou um sentido ainda mais perverso após a reforma trabalhista de 2017, que tornou a carne dos trabalhadores mais barata e liberou os desmandos sobre seu corpo. De autônomo a autômato, a luta de classes vai sendo encoberta, tendo como ápice essa paralisação apoiada – ou em parte articulada – por patrões.

Como os trabalhadores de muitas categorias profissionais, o caminhoneiro também foi se descobrindo sem direitos, explorado por uma jornada exaustiva, pressionado a entregar mercadorias em tempo curto demais, estressado pelo tráfego intenso e pelas estradas péssimas, ameaçado por assaltos cada vez mais violentos, com cada vez menos poder para negociar o valor dos fretes, muitas vezes trabalhando para um só transportador, mas sem direitos de empregado porque “autônomo”.

E, para completar, testemunhando a crescente ruína do seu corpo pelo excesso de horas sentado na boleia do caminhão e pela comida gordurosa da beira da estrada. Muito trabalho, pouco dinheiro, nenhum glamour. Também não é um dado qualquer que uma das principais queixas dos caminhoneiros, no campo da saúde, é a espinha que se “quebra” ou é “quebrada”, expressada pelas dores e problemas na coluna vertebral.

Também no lado de fora a propaganda ruía. O caminhoneiro é cada vez mais visto como um irresponsável que provoca acidentes, tanto quanto como um drogado que toma rebites para poder dirigir um número maior de horas e cumprir o horário dos fretes. O combate à prostituição juvenil nas estradas o generalizou também como um explorador sexual que usa as viagens para fazer sexo com meninas. Ao chegar ao fim de uma jornada extenuante, muitas vezes ainda é tratado com preconceito e descaso e recebe menos do que o prometido, sem nenhum poder de barganha em tempos de crise, porque há um outro que aceitará as piores condições para poder garantir algum sustento para a família. Longe de casa por semanas, esse mesmo caminhoneiro nem sempre consegue manter o lugar de chefe de família ao voltar, no contexto de crescente protagonismo das mulheres, hoje mais escolarizadas que os homens.

Em busca da potência perdida, o caminhoneiro confrontou um governo sem potência alguma

É também este o homem que se insurgiu parando o país. E encontrou sua potência perdida ao se confrontar com um governo sem potência alguma, dedicado a gastar suas escassas energias para manter-se no Planalto enquanto concede o que tem e o que não tem a todos que o chantageiam. Michel Temer (MDB) e seu ministério, parte dele suspeita ou já denunciada por corrupção, entregaram tudo e também a cabeça do presidente da Petrobras, que se não renunciasse cairia de qualquer modo. Para piorar, Temer chamou de novo as Forças Armadas para botar ordem na casa que sabe governar sem legitimidade. Não apenas uma parcela da população se infantiliza, como também o presidente.

Parte dos caminhoneiros sequer percebeu que fazia o jogo dos patrões que apoiaram a paralisação. Parte deles mostrou-se incapaz de enxergar que mais uma vez os donos das transportadoras botaram o corpo dos mais frágeis na linha de frente. Enquanto eram estimulados a pintar o corpo para a guerra, os caminhoneiros mais uma vez lutaram pelos interesses de seus opressores, os mesmos que deixaram para os trabalhadores precarizados a conta para pagar também dos dias sem trabalho em nome do protesto. Essa nuance do movimento não é tudo, mas parte importante da complexidade do quadro.

Quem perdeu, mais uma vez, de todos os lados, foi a maioria da população. Mas, mesmo assim, a maioria da população, como a pesquisa do Datafolha mostrou, apoiou a paralisação dos caminhoneiros. Mesmo sendo afetada pelo desabastecimento nos supermercados, nos hospitais, nos postos de gasolina, mesmo sem ônibus para chegar ao trabalho ou às escolas, a maioria dos brasileiros apoiou a paralisação dos caminhoneiros.

Em parte, é possível que a maioria da população acredite que já paga a conta, todas as contas, de qualquer modo. Em parte, é catártico diante da contenção cotidiana numa vida ruim e numa vida que não para de piorar. A vontade reprimida e tão humana de romper com todas as amarras e ter seu dia de foda-se. Ou apoiar o dia de foda-se do outro com quem se sente identificado. Não há nada mais perigoso do que aquele que não tem nada a perder. O Brasil está vivendo um momento em que cada vez mais gente tem cada vez menos a perder. E cada vez menos motivos para conter seu ódio e sua fúria.

Que Brasil os caminhoneiros mobilizaram? Me parece haver vários, incluindo uma parte da esquerda que acreditou ser possível embarcar no movimento, adicionando a ele sentidos que não tinha, como a categoria sindicalizada dos petroleiros. Ou a esquerda que acreditava ser uma traição não apoiar qualquer paralisação. E também uma parte da extrema-direita, esta mais bem sucedida, que buscou instrumentalizar a raiva dos caminhoneiros. Depois recuou, mas certamente foi beneficiada. As forças que agiram nessa paralisação ainda precisam ser expostas com mais clareza.

Me interessa particularmente esse Brasil espontâneo, sem sindicato nem clube, identificado com os caminhoneiros porque também se sente ferrado de todas as maneiras. Esse Brasil que se descobre sem perspectiva de melhorar a renda. Ou, um sentimento mais desestabilizador, sem perspectiva de deter a sua queda. Um Brasil que se sente sem lugar. E que compartilha da enorme nostalgia do que não foi, mas acreditava que pudesse ter sido. Ou que merecia ter sido. Uma nostalgia do passado que nunca houve, este que existiu apenas como possibilidade não realizada. Mas que chegou mais perto de se realizar na primeira década deste século, nos anos de Lula, hoje na cadeia e possivelmente impedido de disputar a próxima eleição.

Pelo conteúdo das manifestações, Lula não é um “herói injustiçado” para a maioria dos caminhoneiros, mas mais um “político corrupto”, o substantivo e o adjetivo hoje quase um sinônimo para uma parcela dos brasileiros. A paralisação dos caminhoneiros prova, de forma contundente, que a democracia já não responde aos anseios de melhora de vida. Mais do que um clamor por intervenção militar, o movimento revelou a profundidade da crise da democracia que se alarga no mundo, mas ganha tons singulares no Brasil.

Não tenho pesquisa para apoiar minha hipótese. Espero que alguém a esteja fazendo. Mas minha percepção através de conversas é de que os caminhoneiros mobilizaram uma grande parcela de brasileiros que se sente impotente – e se sente impotente em mais de um sentido. Como os caminhoneiros, são trabalhadores de corpos precarizados e arruinados, pessoas exauridas, exaustas e com medo.

“Pai, faça alguma coisa antes que eu tenha que mijar sentado”

Chamo atenção, mais uma vez, para as questões de sexo e de gênero. Os caminhoneiros são 99,8% homens, e as imagens dessa paralisação exacerbam testosterona. São raras as referências a homossexuais, transexuais e transgêneros nessa categoria de trabalhadores. As redes sociais e os grupos de WhatsApp mostraram que a maior parte dos protagonistas ativos eram homens supostamente ansiosos para voltar para suas famílias de modelo tradicional, das quais estariam separados pela paralisação. “Sentiram saudades de casa e da família, que rezava e pedia para que voltassem logo e bem”, escreveu em 3 de junho o presidente da Confederação Nacional dos Transportadores Autônomos (CNTA), Diumar Bueno, em artigo publicado na Folha de S.Paulo.

Acredito existir algo para se compreender nessa masculinidade ameaçada pelo crescimento do protagonismo das mulheres e das pessoas LGBTs. Ameaçado, por um lado, pela perda da renda e pela precarização do trabalho, e, por outro, pela mudança dos costumes, esse homem “comum” sente-se encurralado num país que piora a cada dia. É quase previsível que uma parte desse sentimento seja canalizada para um pedido de ordem ao Exército, a instituição que representa a testosterona em estado bruto. Tipo: “Pai, faça alguma coisa antes que eu tenha que mijar sentado”.

É menos um anseio pela volta da ditadura – e mais um desejo de viver num mundo cujos códigos possa reconhecer, num momento em que se sente empobrecido, desprestigiado, sem lugar e sem perspectivas, e com as rodas atoladas em areia movediça. Essa parcela de brasileiros, que vai muito além dos caminhoneiros, mas que se sentiu representada por eles, pode criar uma versão brasileira, e por isso particular, do eleitor de Donald Trump nas eleições de 2018. Uma parcela de brasileiros que secretamente se sente impotente, de várias maneiras.

A corrupção é o guarda-chuva que permite a quem o ostenta nem precisar explicar, muito menos precisar entender o que o move de fato

A corrupção, a bandeira mais uma vez desfraldada por apoiadores da paralisação e por parte dos caminhoneiros ao longo dos dias, é um guarda-chuva que protege aquele que gosta de se apresentar como “cidadão de bem” de seus objetivos mais mesquinhos e egoístas. É fácil ser contra a corrupção. Nunca se ouviu alguém dizer que é a favor da corrupção. A corrupção é o guarda-chuva que permite a quem o ostenta não precisar explicar, muito menos precisar entender o que o move de fato, o que sempre é muito confortável.

Ao constatarmos que a maioria dos brasileiros se corrompe um pouco por dia, no que se refere às pequenas infrações, como tirar vantagem de alguma coisa, roubar no peso ou no troco, é possível desconfiar que não é a corrupção que move tanto ódio, mas um profundo descontentamento com a corrosão do cotidiano e o sentimento de impotência. Quando alguém diz que é contra a corrupção, talvez esteja gritando contra o fato de sua vida ser tão difícil e tão aquém de seus melhores esforços, no caso dos mais pobres. Ou, no caso de quem lamenta os privilégios perdidos, contra a crença de que sua vida não está à altura do que considera merecer por posição de classe.

A corrupção, no caso dessa paralisação, foi definitiva apenas no fato de o governo Temer comprometer ainda mais o investimento em saúde e educação, decisão que atinge os mais pobres de forma explícita. E fez isso justamente por temer perder o governo e ser despachado para a cadeia por... corrupção. Não é um dado lógico, uma escolha inescapável, a de cortar justamente em áreas como saúde e educação, ciência e tecnologia; cortar recursos no campo do saneamento básico, da reforma agrária e da regularização fundiária na Amazônia; na esfera do incentivo à agricultura familiar e do desenvolvimento da agricultura orgânica e de baixo carbono; no âmbito da demarcação de terras indígenas, do desenvolvimento sustentável, da oferta de água, da fiscalização ambiental e da prevenção de desastres; nas áreas das políticas públicas sobre drogas e do combate à violência contra a mulher; no setor do trabalho, do emprego e da saúde do trabalhador. Entre outros.

A escolha do que cortar e de como manejar o preço do diesel não é lógica, mas ideológica

A escolha do que cortar e de como manejar o preço do diesel não é lógica, mas ideológica, e está a serviço de um projeto de ocupação e perpetuação de poder. Os caminhoneiros são acusados de terem chantageado o governo, em especial pela parte que toca aos donos de transportadoras, suspeitos de terem promovido um locaute – greve de patrões, portanto ilegal. Mas o governo Temer, cada vez mais fraco e desmoralizado é, ao mesmo tempo, alinhado e chantageado de forma permanente por grupos com maior poder de pressão, como os ruralistas e os donos de planos de saúde.

Em 2013, Lula, Dilma Rousseff e o PT descobriram que perderam as ruas. Em 2018, as direitas que articularam o impeachment de Dilma Rousseff descobriram o que foi dito ao PT anos antes: quem acredita que controla as ruas é um idiota. Suspeito que muita gente que apoiou o impeachment em 2016, incluindo parte da imprensa, hoje esteja bastante arrependida com os rumos que o país tomou. Mas ainda sem grandeza ética para assumir seus erros publicamente. Não é só o PT que precisa fazer autocrítica, obviamente.

A irresponsabilidade de tirar do poder uma presidente ruim, mas eleita, sem base legal para isso, alargou a convicção de que o voto vale pouco no Brasil e que os resultados das eleições, caso sejam insatisfatórios para grupos de poder, podem ser alterados. Os ecos dessa violência contra a democracia se farão sentir por décadas e foram determinantes para essa paralisação que, à certa altura, acreditou poder derrubar o governo.

Se o sentimento de revolta contra a corrosão da vida moveu 2013 e move 2018, talvez seja só isso o que existe em comum. A luta original do Movimento Passe Livre (MPL), detonador das manifestações de junho de 2013, era pela ocupação do espaço público pelas pessoas. O desejo era de retomar a cidade para quem nela vive. Em 2013, caminhando sobre as próprias pernas, uma multidão descobriu uma cidade impossível de alcançar pela janela dos carros e ônibus.

A luta dos caminhoneiros de maio de 2018 é por um Brasil que já não pode ser, embora ainda será por muito tempo. O transporte ferroviário e fluvial é pífio, apesar das dimensões continentais do país e do fato de o Brasil ter o privilégio de alguns dos maiores rios do mundo correrem no seu território. As rodas dos caminhões que hoje giram em falso dizem muito sobre as escolhas do passado e do presente.

A poluição de São Paulo foi reduzida à metade durante a paralisação

A luta de 2013 era para liberar o fluxo, a de 2018 para interromper o fluxo. Não há maior símbolo dessa diferença do que a imagem agressiva dos caminhões num planeta em que é preciso reduzir as emissões de CO2. Isso se nossa espécie quiser continuar vivendo num mundo ruim, mas ainda possível. Uma das constatações mais importantes na paralisação dos caminhoneiros, ainda que pouco mencionada, foi a redução da contaminação de São Paulo: no sétimo dia do movimento, a poluição foi reduzida pela metade. Segundo matéria da Agência Fapesp, a qualidade do ar na capital paulista tornou-se “boa” em todas as estações de medição e para todos os poluentes analisados, algo muito difícil de ser registrado.

A luta de 2013 era a das capitais, a de 2018 é a dos Brasis do interior e dos subúrbios das grandes cidades. A luta de 2013 era pelo futuro, a de 2018 é pelo futuro do passado. Escutar a todos é obrigatório. E votar em outubro se torna cada dia mais importante para a defesa da democracia num país em que ela foi corrompida. Sem a democracia, nem as ruas teriam falado em 2013, nem apoiadores – ou manipuladores – da paralisação dos caminhoneiros poderiam gritar para que o tio da farda bote ordem na casa. Essa democracia imperfeita, falha e seguidamente injusta ainda é o melhor que temos.

* Eliane Brum é escritora, repórter e documentarista. Autora dos livros de não ficção Coluna Prestes - o Avesso da Lenda, A Vida Que Ninguém vê, O Olho da Rua, A Menina Quebrada, Meus Desacontecimentos, e do romance Uma Duas. Site: desacontecimentos.com Email: elianebrum.coluna@gmail.com Twitter: @brumelianebrum/ Facebook: @brumelianebrum


El País: A corrida contra o relógio dos partidos de centro para enfrentar Bolsonaro e Ciro

Intelectuais e parlamentares de sete legendas discutem alternativas aos extremos para a presidência

Por Afonso Benites, do El País

Não depende do que que as próximas pesquisas eleitorais apontarem. Seja qual for o resultado, ao menos sete partidos de centro-esquerda e centro-direita terão uma luta inglória até o fim de junho: desistir de suas candidaturas próprias ao Planalto e definir apoio a algum nome viável. O mais difícil nessa equação não seria a desistência em si, mas, sim, a escolha de um candidato competitivo. Com exceção de Jair Bolsonaro (PSL, que tem até 25%) e Ciro Gomes (PDT, que chega aos 12%), nenhum outro concorrente atingiu os dois dígitos nas pesquisas eleitorais - nem mesmo nos cenários pesquisados sem Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que dificilmente terá sua candidatura aceita por estar preso e condenado em segunda instância por corrupção.

O cálculo feito por um grupo de 32 deputados, senadores, cientistas políticos e intelectuais é o de que a difusão de candidaturas só beneficia o que eles caracterizaram como extremos: Bolsonaro, pela extrema direita, e Ciro, pela esquerda. “Se não nos unirmos, teremos de escolher entre a catástrofe e o desastre. A catástrofe é o Bolsonaro. O desastre, o Ciro”, criticou o senador Cristóvam Buarque (PPS-DF), um dos articuladores do movimento denominado Polo Democrático e Reformista. Segundo esse parlamentar, o grupo busca um candidato que seja “responsável fiscalmente, progressista socialmente e democrata politicamente”. Nenhum dos que lideram as pesquisas, em sua opinião, tem essas três características. Esse é o segundo momento dessa discussão. O primeiro, ocorreu em abril, como registrou o EL PAÍS.

Assim que o novo manifesto do grupo foi lançado, o primeiro sinal que se deu foi o de que o documento seria um apoio ao nome de Geraldo Alckmin (PSDB) para a presidência. Mas três políticos procurados pela reportagem negaram esse fato. E foram além: analisaram que quando o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) topou encabeçar o movimento, acabou enfraquecendo ainda mais a campanha de Alckmin.

Cardoso chegou até a cogitar um apoio à Marina Silva (REDE). Mas ao disputar sua terceira eleição presidencial consecutiva, Marina disse que não foi procurada por ninguém e que continuará sendo independente. “Desde 2010 que, em consonância com o desejo de mudança que perpassa diversos setores da sociedade brasileira, venho fazendo o esforço de quebrar a polarização que levou o país a essa grave crise”, disse.

E, sem o tucano, qual seria o candidato? Eis a questão. “É um processo que ainda vai decantar”, explica o deputado federal por Minas Gerais e secretário nacional do PSDB, Marcus Pestana. A sua análise coincide com o que vem sendo discutido por dezenas de especialistas. Com tantos candidatos (hoje há entre 14 e 19 pretensos concorrentes ao Planalto), quem chegar aos 15% ou 16% de votos válidos estará no segundo turno.

É algo parecido com o que ocorreu em 1989, quando o primeiro colocado, Fernando Collor (então no PRN), teve 30%, e o segundo, Lula (PT), atingiu 17%. “Tínhamos cinco candidatos de uma mesma ideologia. O melhor colocado deles foi Mário Covas, com 11%. Os outros, juntos, somaram 12%. Se estivéssemos unidos, estaríamos no segundo turno”, afirmou Pestana.

Essa corrida contra o relógio é fundamental para os políticos desse grupo. Entre 20 de julho e 5 de agosto, ocorrem as convenções que escolherão os candidatos. Antes, disso, contudo, os acordos já têm de estar selados. Desde que apresentaram o manifesto na terça-feira passada, outros 20 deputados e senadores se comprometeram a assiná-lo. Se o ritmo de adesões não aumentar, dificilmente terão sucesso. “Trouxemos o assunto para o debate. Agora, depende do diálogo entre os candidatos. É óbvio que todo candidato acha que vai ganhar. Mas eles têm de pensar mais no país que neles mesmos”, completou Pestana.

Uma das parlamentares que analisaram o documento, mas não foram convidadas a se juntar ao grupo, a senadora Simone Tebet (MDB-MS) diz concordar com a tese defendida por seus colegas. No entanto, acha que a teoria é mais real do que a prática, neste momento. “Não consigo visualizar na prática nenhum possível pré-candidato desistindo num ato talvez até de desprendimento em busca de uma alternativa única de centro”, afirmou Tebet, que é a líder de seu partido no Senado.

Conforme ela, o MDB dificilmente abrirá mão da candidatura do ex-presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, ao menos por enquanto. “Ele nos mostrou pesquisas qualitativas que nos animaram. Mas temos de esperar as próximas semanas”.

Líder do Governo na Câmara e um dos caciques do PP, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) também diz que a proposta de unificação é interessante. Mas chega tarde. “Teremos uma campanha curta. Se começarmos a discutir nome agora, vamos acabar escolhendo alguém que ainda terá de se firmar. O tempo está findando”. Ribeiro diz ainda que, naturalmente, os partidos retirarão as candidaturas para evitar derrotas acachapantes nas urnas. “O próprio dia a dia vai forçar os próprios partidos a se posicionarem”.

Enquanto não há definição, os defensores de um enxugamento nas candidaturas se deparam com uma onda que pode atrapalhar seus planos. No PSD, uma pré-candidatura que era dúvida está se consolidando, a do ex-ministro Guilherme Afif Domingos. Seu empecilho seria o presidente da legenda, o ministro das Comunicações, Gilberto Kassab, que prefere um acordo com Geraldo Alckmin. No PR, o empresário Josué Alencar, filho do ex-vice-presidente José Alencar, tenta se apresentar como uma alternativa.

Além disso, entre os emedebistas, voltou a se especular o nome de Nelson Jobim como concorrente. Ex-presidente do Supremo Tribunal Federal, ex-deputado federal, ex-ministro da Justiça e da Defesa, Jobim é apontado como um político experiente que poderia costurar alianças importantes. Mas nem ele mesmo ainda demonstrou interesse na disputa. As próximas semanas, serão cruciais para saber o número aproximado de concorrentes ao principal cargo da República brasileira.


El País: Petrobras, uma gigante convalescente no centro do furacão eleitoral

Nova crise apanha a maior companhia brasileira em uma rota de recuperação. Temer diz que não vai mudar política de preços, mas pressão segue. Pré-candidatos se posicionam sobre tema

Por Maria Rossi, do El País

Dias antes de deixar a presidência da Petrobras, Pedro Parente autorizou um novo reajuste no preço da gasolina na quarta-feira. Era a continuidade de uma política instituída em julho do ano passado, de oscilação dos valores dos combustíveis de acordo com o mercado internacional. Foi também um teste. O aumento apenas três dias depois que o Governo Michel Temer determinara o congelamento do diesel por 60 dias, pressionado pelos caminhoneiros, era também uma pergunta: ele continuaria tendo carta branca de Temer para seguir sem interferências políticas com as regras para os demais combustíveis ou elas teriam ficado politicamente insustentáveis?

A resposta que Parente se deu veio nesta sexta, quando ele entregou sua carta de demissão e se descreveu como um "empecilho" para as discussões dos rumos da Petrobras e da política de preços, fazendo as ações caírem quase 15% em apenas um dia - se somando às demais quedas durante os dez dias de paralisação dos caminhoneiros. Tudo isso mergulha a empresa, a maior companhia do Brasil e que se começava a se despedir de quatro anos de maus resultados, em um mar de incertezas capaz de contaminar até a lenta recuperação econômica do país a apenas quatro meses das eleições presidenciais.

Parente deixou a Petrobras e, junto, reforçou incertezas no mercado que não devem ir embora tão cedo. O Conselho de Administração da estatal nomeou como CEO interino Ivan Monteiro, diretor-executivo da Área Financeira e de Relacionamento com Investidores da estatal. Momentos depois, Michel Temer, representando o Estado que é o acionista majoritário da Petrobras, fez um pronunciamento em Brasília para dizer que Monteiro era seu escolhido para permanecer no cargo, numa corrida para tentar minimizar a saída de Parente o quanto antes. Mais: apesar de já ter mudado na ponta a política para o diesel e de ter feito declarações dúbias a respeito, Temer fez questão de repetir publicamente que a política de preços flutuantes dos demais combustíveis está mantida.

Monteiro, a princípio, preenche os requisitos exigidos pelo antecessor. Em sua carta de demissão, enviada ao presidente Temer nesta sexta-feira, Parente havia pedido: “Permita-me, senhor presidente, registrar a minha sugestão de que, para continuar com essa histórica contribuição para a empresa – que foi nesse momento gerida sem qualquer intervenção política – vossa excelência se apoie nas regras corporativas, que tanto foram aperfeiçoadas nesses dois anos”, escreveu. Ivan Monteiro chegou à empresa em 2015, junto com o então presidente Aldemir Bendine, agora preso pela Operação Lava Jato. Parente quando chegou à estatal em 2016 decidiu mantê-lo no cargo estratégico, no que foi lido como um endosso do perfil técnico dele.

Pressão política segue
Apesar das declarações e da unção de Monteiro, as dúvidas permanecem porque a pressão para mudar o esquema do preço da gasolina segue vindo de todos os lados - em Brasília, do PT ao PSDB e ao presidente do Senado - e nas ruas. A principal crítica, que foi um dos estopins da greve dos caminhoneiros, é a grande oscilação e a falta de previsibilidade. Desde julho de 2017, o valor nas refinarias varia de acordo com o preço do barril e do dólar, uma inédita transmissão da cotação internacional. Se já causava desconforto, o problema explodiu de vez entre abril e maio, quando o preço do barril do petróleo voltou a subir, chegando agora a quase 80 dólares, algo que não ocorria há mais de três anos.

"A apropriação da Petrobras levou-a a exagerar na dose. Quando você se excede na dose, o remédio pode virar veneno. Os reajustes diários, desorganizando o dia a dia, gerou insatisfação", disse o senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES), em debate no Senado com o ministro da Fazenda, Eduardo Guardia, na terça. "A Petrobras foi arrogante, indiferente às circunstâncias", disse. Do outro lado, na bancada do PT, a senadora Fátima Bezerra (PT-RN), dizia que “a política de preços adotada pelo governo Temer e pela gestão de Pedro Parente à frente da Petrobras não desprezou somente a realidade do transporte de cargas em nosso país, como também a realidade de milhões de brasileiros, que dependem da gasolina para se locomover e do gás de cozinha, para cozinhas os alimentos que as famílias consomem”. A imprensa dá conta que a insatisfação com a Petrobras abrange até pessoas muito próximas de Temer, como o ministro das Minas e Energia, Wellington Moreira Franco.

“A política de preço é importante, mas não dá para saber agora se o Governo vai manter”, avalia o economista André Perfeito. Ele frisa que a nova crise na estatal apenas coroa a má fase da economia e do próprio Governo. “O Banco Central não cortou a Selic na última reunião, a Eletrobras deixou de ser privatizada... Tudo isso em conjunto gera um mal-estar”, diz o economista. “A demissão de Parente vem para coroar esse momento. Se fosse só ele, estava até que tudo bem”.

A greve dos caminhoneiros foi tão devastadora e o peso da Petrobras é tamanho na economia brasileira que é difícil que os dois fatores não abalem o resultado do PIB brasileiro, como também o câmbio e até as eleições, prevê o economista. Isso em um momento em que a Petrobras surfava em uma boa onda, pela primeira vez em quase quatro anos. No último dia 10, a companhia havia retomado o posto da maior empresa brasileira de capital aberto, em meio à valorização das suas ações, fruto da alta nos preços do petróleo, e da divulgação do crescimento do lucro no primeiro trimestre deste ano.

No meio do furacão eleitoral
Seja como for, qualquer decisão de Temer sobre a Petrobras tem data de validade: dezembro de 2018. As decisões de maior longo prazo vão ficar nas mãos do próximo presidente. Assim como em 2014, mais uma vez a Petrobras está no olho do furacão destas eleições. Se naquela época, a estatal era o alvo dos presidenciáveis depois dos casos de corrupção desvendados pela Operação Lava Jato, agora a empresa tenta se reerguer tomando decisões impopulares. E os presidenciáveis sabem muito bem disso. Logo após a demissão de Parente, Geraldo Alckmin (PSDB), publicou em sua conta no Twitter que "precisamos definir uma política de preços de combustíveis que, preservando a empresa, proteja os consumidores". Considerando que o ex-presidente da Petrobras é um quadro próximo dos tucanos (foi ministro da Casa Civil de Fernando Henrique Cardoso) e que Alckmin é o que representa a defesa de uma bandeira econômica liberal na disputa, a crítica toma ainda mais relevância.

Em vídeo publicado no Facebook, o pré-candidato Ciro Gomes, do esquerdista PDT, diz que não basta apenas que Pedro Parente saia da Petrobras. "É preciso exigir que a política de preços que ele impôs seja trocada", diz ele, lembrando do aumento da gasolina nesta semana "no meio dessa crise".

Jair Bolsonaro (PSL), que lidera as pesquisas e normalmente não entra no debate sobre economia, não se pronunciou sobre a crise na estatal, mas já havia criticado a política de preços durante a greve dos caminhoneiros. Já o ex-ministro da Fazenda e pré-candidato do Governo à presidência, Henrique Meirelles (MDB), não se pronunciou sobre a crise na Petrobras, mas vem reforçando seu discurso debruçado sobre as reformas, que daria continuidade ao Governo Temer. "O caminho que defendo todos conhecem: reformas que tornem o país mais justo e produtivo e gestão de qualidade", disse ele, na quarta-feira, na mesma rede social.

André Perfeito pondera, porém, que a conduta de Meirelles não deve lhe render frutos. “O conjunto de coisas que vem acontecendo aponta para uma demanda da população menos pró-mercado”, diz Perfeito. “E os candidatos vão ter que se ligar nisso. Aqueles que pegarem as bandeiras da reforma vão queimar as mãos”.

 


El País: Cortes em saúde e educação ajudarão a pagar diesel mais barato para caminhoneiros

Programas voltados para a juventude e de combate a violência de gênero também sofrerão cortes. Governo Temer também arrecadará mais impostos de diversos setores 

Por Felipe Betim, do El País

O presidente Michel Temer (MDB) cedeu às demandas dos caminhoneiros em greve ao anunciar uma redução de 46 centavos no preço do diesel, o congelamento da tarifa por dois meses, entre outros pontos e, nesta sexta-feira, as autoridades finalmente comemoraram não haver mais pontos de protesto ligados à paralisação que deixou o país e o Governo à beira do colapso. Mas Temer e a Petrobras, que até segunda-feira já havia perdido 126 bilhões em valor de mercado, uma queda de 34,6% na cotação de suas ações, não são os únicos derrotados pela greve.

Na disputa pelo colchão curto do Orçamento, que já amarga redução em investimentos e em atendimento médico e educacional, o Planalto resolveu pulverizar as perdas, de preferência a serem absorvidas por grupos menos organizados e menos fortes politicamente, para evitar mais resistência. Atender aos grevistas custará aos cofres públicos aproximadamente 13,5 bilhões de reais — 9,6 bilhões em subsídios e mais 4 bilhões na redução das alíquotas do Cide e PIS/COFINS do óleo diesel. Para isso, o mandatário anunciou uma série de medidas que preveem uma maior arrecadação de impostos de determinados setores e cortes que somam 3,4 bilhões de reais. Programas sociais e políticas públicas, especialmente as voltadas para saúde e educação, estão entre os afetados.

Na pasta da Educação, o corte será de 55,1 milhões de reais, destinados inicialmente para a concessão de bolsas do Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento das Instituições de Ensino Superior (Proies). Também haverá, segundo informou o jornal Folha de S. Paulo, um corte de 135 milhões de um programa destinado para o fortalecimento do Sistema Único de Saúde (SUS). Políticas públicas voltadas para a juventude, repressão e prevenção ao tráfico de drogas e enfrentamento à violência contra as mulheres também sofrerão cortes em seus orçamentos.

Além das políticas e programas sociais listados acima, o Governo prevê um corte de 368,9 milhões em programas de transporte terrestre do Ministério dos Transporte que envolvem 40 obras. O policiamento ostensivo em rodovias federais também perdeu 1,5 milhão, apesar de que umas das queixas dos caminhoneiros, segundo os relatos ouvidos pelo EL PAÍS, era que falta segurança nas estradas.

Outras áreas também tiveram recursos cortados. A reserva para capitalização de empresas estatais federais é a que perde o maior volume de recursos, 1,667 bilhão. A reserva de contingência da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional teve um corte 979,297 milhões. O Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação também saiu perdendo, com um corte de 21,75 milhões de seu já dilacerado orçamento.

No setor rural, também afetado pelo Bolsa Caminhoneiro, o Programa de Reforma Agrária teve um corte 30,779 milhões; o Programa de Assistência Técnica e Extensão Rural Para Agricultura Familiar perdeu 5,443 milhões; a Defesa Agropecuária também contará com 2,996 milhões menos; por fim, Pesquisa e Inovações para a Agropecuária perdem outros 2,729 milhões.

Maior arrecadação de impostos

Para fechar a conta, Temer também elevou a arrecadação de impostosprovenientes de alguns setores. A principal medida diz respeito ao Reintegra, um programa de incentivo fiscal voltado aos exportadores de produtos industrializados em que o Governo devolve parte dos tributos pagos por eles. Um decreto presidencial reduziu de 2% para míseros 0,1% o tamanho desta devolução. Com isso, o governo arrecadará até o final do ano 2,27 bilhões de reais. A previsão, caso não haja mais mudanças, é de que o percentual de devolução seja de 3%, como era até 2014.

O Governo também aumentará sua arrecadação a partir da reoneração da folha de pagamento de alguns setores. Isso porque a Câmara votou um projeto de lei em que previa que 28 áreas estariam isentas dessa reoneração, mas Temer vetou a isenção para 11 desses setores, como empresas estratégicas de defesa, empresas de transporte aéreo de carga e de passageiros regular, empresas de serviços auxiliares ao transporte aéreo de carga e de passageiros regular, empresas de manutenção e reparação de aeronaves, empresas de manutenção e reparação de embarcações e as empresas do comércio varejista de calçados e artigos de viagem. Outros 17 setores, como o de calçados, construção civil, fabricação de veículos, transporte rodoviário e indústria têxtil, mantiveram o benefício.

O Governo ainda revogou, a partir de uma medida provisória, incentivos fiscais a produtos destinados a centrais petroquímicas, garantindo assim mais recursos. Também reduziu a alíquota do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) de 20% para 4% sobre os concentrados de refrigerantes. Essa medida fará com que os fabricantes gerem menos créditos para abaterem impostos, o que permitirá um ganho de 740 milhões para o Governo até o fim do ano.

Outras duas medidas provisórias trataram da concessão de subsídio à comercialização de óleo diesel e, finalmente, da abertura de um crédito extraordinário para os ministérios de Minas e Energia, que leva 9,5 bilhões; e de Defesa, que fica com 80 milhões para operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO), nas quais o Exército é acionado.


Juan Arias: A perigosa miragem de uma solução militar para a crise do Brasil

Com todas as suas limitações, a democracia ainda é a única possibilidade para que um povo possa conviver com o melhor de seus valores

Embora não exista o perigo de querer solucionar a crise política e social do Brasil com a intervenção militar, negada pelo exército, é verdade que essa tentação começa a aparecer em alguns círculos como uma perigosa miragem capaz de condicionar as próximas eleições presidenciais. Acabamos de ver isso no momento mais agudo da greve dos caminhoneiros, na qual se ouviram vivas ao ditador chileno Pinochet e apelos por um governo militar.

Minha amiga Telma, que trabalha com cultura, me conta consternada: “Juan, estão gritando que eu vá embora para Cuba, que sou comunista por defender que a greve dos caminhoneiros pode favorecer o ultradireitista Bolsonaro.” Outro amigo meu, Antonio, aposentado da Petrobras que sabe que sofri a longa ditadura militar franquista na Espanha, confidencia: “Juan, não se iluda, só os militares podem salvar o Brasil, fechando esse Congresso corrupto e assumindo o comando do país.”

Qualquer brasileiro medianamente informado sobre a história deveria, no entanto, saber que, com todos os seus defeitos, ninguém ainda encontrou uma fórmula melhor do que a democracia para que uma sociedade viva em harmonia no tocante a suas liberdades e direitos. Custa-me, por isso, imaginar que um intelectual ou artista, qualquer que seja sua tendência política, possa apostar nos militares para tirar o país da crise, porque se sabe que nenhuma solução autoritária produz bem-estar, convivência e respeito às diferenças. E, no entanto, essas mesmas pessoas que consideramos iluminadas e formadoras de opinião parecem cair na armadilha de apoiar ou alimentar movimentos populares de protesto que, ainda que possam parecer uma forma legítima de pressionar o poder e defender os direitos dos trabalhadores, podem se transformar em um bumerangue em momentos históricos de confusão ideológica como o que o Brasil está vivendo.

A história ensina que, em muitas experiências de cunho fascista, não poucos intelectuais e artistas acabaram colaborando explícita ou implicitamente sob pretexto de defender os oprimidos. A miragem das soluções totalitárias contra as arbitrariedades dos governantes das democracias acabou apoiando totalitarismos e regimes militares que chegaram ao poder não com o voto, mas pela imposição das armas. Já tivemos isso na Alemanha de Hitler, na Itália de Mussolini e na Espanha de Franco, para falar apenas da Europa.

No momento em que escrevo esta coluna ainda não é possível fazer um balanço do que representou, politicamente, a greve dos caminhoneiros no Brasil, à qual parece querer seguir a dos petroleiros e, quem sabe, também a de outras categorias que poderiam sair às ruas “contra tudo e contra todos”, que é a fórmula mais perigosa para impedir uma solução dialogada que faça justiça aos abusos que podem ter sido o estopim das manifestações.

Quem viveu e sofreu por muitos anos um regime totalitário sabe que, com todas as suas limitações, a democracia ainda é a única possibilidade para que um povo possa conviver com o melhor de seus valores. Quem, por exemplo, hoje pode gritar nas estradas contra o governo para defender o que considera seus direitos, ignora que não poderia fazê-lo sob nenhum regime totalitário sem pôr em perigo sua própria vida.

Na política, na família ou em qualquer relacionamento humano, nada é capaz de substituir o diálogo se não se quiser viver no inferno da incomunicabilidade. Nunca a força imposta pelas armas fez a Humanidade crescer no melhor que possui, como sua possibilidade de viver em liberdade sem a tirania dos muros, nem os de Berlim nem os do México, emblema, ambos, dos crimes contra a liberdade e a convivência democrática.


El País: Caminhoneiros dobram a aposta, ganham adeptos e amplificam pedidos por “intervenção militar”

Grevistas estacionados na rodovia Régis Bittencourt, um dos mais de 500 pontos pelo país ainda mobilizados, não aceitaram a proposta do Governo Temer. Pedem que o litro do diesel valha 2,50 reais e que valor fique congelado por um ano

Não é só por 46 centavos. O presidente Michel Temer(MDB) bem que tentou aplacar a ira dos caminhoneiros em greve ao fazer importantes concessões à categoria, mas pelo menos um grupo expressivo deles não se mostra satisfeitos: agora eles querem mais. Mais de 500 pontos de mobilização permanciam ativos na segunda, desafiando o Planalto e a estabilização da rotinas das cidades. No quilômetro 281 da rodovia Régis Bittencourt, em Embu das Artes, São Paulo, a paralisação entrou nesta segunda-feira em seu oitavo dia com a exigência de que o preço do litro do combustível abaixe ainda mais e gire em torno de 2,50 reais, no máximo 3 reais, e que seu valor fique congelado por pelo menos um ano — e não os 60 dias propostos pelo Governo. "O Temer está blefando, até agora não tem nada oficial. O acordo tem que ser aceito por aqui, se não não dá", diz Marcio de Faria.

"O país está numa situação tão difícil que nas mãos de quem está não dá mais. A corrupção está enojando o povo brasileiro. É tentar a sorte porque do jeito que está não dá mais. Infelizmente tem que partir para o pior", lamenta Daniela Camila Dias Duarte, de 37 anos e operadora de máquinas em uma indústria de embalagem farmacêutica da região. Álvaro Neto, também 37 anos, andou sete quilômetros a pé com sua filha de 13 anos nesta segunda para apoiar os caminhoneiros. "Mas, além de tudo, temos a esperança que alguém do Exército tome uma decisão de tomar conta do país. Já não é só o diesel e o pedágio, é a questão política. Temos a esperança de que um coronel abrace a causa, afaste os três Poderes e toque o país", explica este mecânico. Ele, que leva uma bandeira do país e um cartaz pedindo intervenção, explica não ter vivido a ditadura militar. "Mas dizem que o país era diferente em termos de educação, de saúde. Aquilo não foi uma uma ditadura, foram governos militares".

A manicure Andreia Ferreira, 33 anos, vem frequentando a mobilização dos caminhoneiros desde a última quarta-feira com sua mãe e suas irmãs. Vieram apoiar as pautas da categoria? "Não, a nossa. Essa luta é de todo brasileiro. Tudo é caro hoje. Com um salário mínimo, não se paga nada. E eles, os caminhoneiros, estão aqui por nós também", diz ela. O problema do país "estamos numa situação em que o imposto acaba com tudo", explica. "Tudo é muito caro. A gente não vive como poderia viver, porque nosso dinheiro é tão pouco e vai todo para imposto. O que você faz com um salário mínimo? Você vai no mercado e não consegue fazer uma compra decente. Se o imposto não melhora a educação e saúde, então serve para quê? É melhor cortar logo", defende. Sua mãe, Sirlene Ferreira, de 54 anos, diz que está acostumada a participar de manifestações desde os tempos da ditadura militar, quando fazia parte de um sindicato e era petista. Conta que inclusive foi presa. Apesar disso, defende a intervenção militar para tirar Temer do poder antes do fim do ano. E porque acredita que dessa vez vai ser diferente. "O povo brasileiro mudou, está informado, e não vai deixar que seja uma ditadura como antes. Essa intervenção vai ser do modo que o povo quer", explica a aposentada, que foi eleitora de Lula nas eleições em que participou. "Ele tinha tudo na mão para mudar esse país. Todos os que estão na manifestação hoje estiveram com Lula", aposta.

Congelamento maior

Enquanto isso, longas filas de caminhões continuam ocupando os dois sentidos da Régis Bittencourt. Mas, ao contrário da última sexta-feira, os veículos estavam estacionados no acostamento e em uma faixa, deixando duas faixas livres para a circulação em ambos os sentidos. Sem bloqueios, o trânsito fluía normalmente. Pessoas abarrotavam ônibus que passavam pelo local e aplaudiam os grevistas, apesar de terem se visto prejudicadas pela restrição transporte público nos últimos dias. Motoristas em carros e motocicletas continuam a buzinar em apoio. Na beira da estrada, não há sinais de que a população diminuiu seu apoio aos caminhoneiros. Cientes disso, os que ainda decidiram bater o pé e não aceitar o acordo proposto por Temer em cadeia nacional na tarde deste domingo. Em suma, o presidente propôs abaixar o preço do diesel em 46 centavos e mantê-lo congelado por 60 meses. Depois disso, os reajustes seriam mensais e não mais diários. Além disso, falou em em estabelecer uma tabela mínima de preço de frete e suspender a cobrança de eixo suspenso em todo o Brasil. Mas os caminhoneiros da Régis Bittencourt não só rechaçaram a proposta como alguns ainda falavam abertamente em interromper a greve apenas quando Temer deixasse o Governo, via renúncia ou via intervenção militar. O único político elogiado foi o governador de São Paulo Marcio França, que tomou a dianteira nas negociações com os grevistas no Estado.

A mobilização, com indícios sendo investigados pelas autoridades de ser um misto de locaute e greve em todo o país, é fragmentado e não tem lideranças claras. O WhatsApp e as informações (ou boatos) que circulam pela rede social servem de motor tanto para a paralisação como para os protestos que estão surgindo em decorrência dela. José Batista de Castro, de 53 anos, até elogiou algumas das ações de Temer que ficou sabendo. Mas, para ele, o congelamento dos preços durante 60 dias é pouco. "Depois disso vai reajustar tudo de novo. Por que não por mais tempo? Por que não reajusta de acordo com a inflação do Brasil? Por que a política de preço da Petrobras tem que ser aliada ao dólar? A gente não está de acordo com isso", diz ele. "O litro de diesel deveria valer no máximo três reais, mas o ideal seria menos. E esse preço tem que ficar congelado por um ano pelo menos", acrescenta.

Que o litro do diesel ainda custe três reais por litro ainda é muito para o bolso de Alvaro Mendes de Jesus, 50 anos. Ele, assim como vários outros, falam em 2,50 reais. No máximo 2,70. "A proposta do Governo está absolutamente equivocada. E depois dos 60 dias? Vai reajustar tudo de novo e vamos ter que parar tudo outra vez?", questiona esse caminhoneiro, que até a greve começar transportava ferro do Pará até Santa Catarina. "Queremos uma proposta justa e que abaixe o diesel na bomba", diz ele.

Os caminhoneiros também se mostraram favoráveis a uma intervenção militar, ainda que tenham ressalvas. José Batista espera que, caso ela ocorra, novas eleições sejam convocadas em breve. Mas existe um risco de uma nova ditadura? Depois de alguns segundos de silêncio, responde: "Com certeza é arriscado. Mas o pessoal está num beco sem saída com esse governo que está aí, né". Já Marcio de Faria, que pretende votar em Jair Bolsonaro para presidente nas eleições outubro, diz não acreditar que uma ditadura militar volte a vigorar no país. "A pauta da intervenção é do povo, que está vindo aqui e pedindo. O caminhoneiro está atrás de abaixar o combustível, e o povo está aproveitando a deixa para pedir a intervenção. É justo. A intenção é que haja intervenção e que novas eleições sejam convocadas", diz. Ao ser lembrado sobre o fato de que era essa a promessa em 1964, quando houve o golpe militar que resultou em uma ditadura de mais de 20 anos, Marcio responde: "Você está contente com o país em que está vivendo? Tem que ter alguma coisa. O Temer está destruindo o Brasil", explica ele. Já Álvaro Mendes diz que querer uma intervenção "desde que ajude a gente". E vai ajudar? Ele sorri e balança a cabeça para os lados.