economia fraca

O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva apresenta seu indicado ao ministério da Fazenda, Fernando Haddad, no CCBB, sede do governo de transição - Pedro Ladeira/Folhapress

Lula assume com economia fraca, incerteza sobre inflação e recuperação menor do emprego

Folha de São Paulo*

Um cenário econômico que analistas costumam chamar de desafiador aguarda o novo governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 2023.

Para o próximo ano, as projeções indicam um crescimento menor do PIB (Produto Interno Bruto) brasileiro, que tende a desacelerar devido a uma combinação de fatores.

Juros altos, perda de ritmo da economia mundial, fim do estímulo da reabertura após as restrições na pandemia e endividamento das famílias fazem parte dessa lista.

Com o possível freio do PIB, a expectativa é de um desempenho morno para o mercado de trabalho, enquanto as previsões sinalizam inflação ainda pressionada no país.

É claro que esse cenário pode mudar —para melhor ou pior— a partir das decisões do próximo governo. Por ora, analistas aguardam mais sinalizações sobre a política econômica de Lula e suas diretrizes na área fiscal.

O temor de elevação de gastos durante a gestão petista já provocou ruídos no mercado financeiro e segue como motivo de alerta para parte dos economistas.

Outro ponto de atenção é o cenário externo, especialmente em relação ao rumo da política monetária nos EUA.

"O cenário para 2023 é de crescimento mais baixo do que neste ano", afirma Sergio Vale, economista-chefe da consultoria MB Associados. A MB projeta avanço de 0,5% para o PIB do próximo ano, após previsão de alta de 3% em 2022.

O especialista menciona que a agropecuária tende a colher uma "safra excelente" em 2023, mas o campo, sozinho, não deve garantir um avanço mais expressivo para a atividade econômica.

Com isso, a taxa de desemprego deve ficar "mais estabilizada", segundo o economista, após o ciclo de queda que levou o indicador a 8,3% no trimestre até outubro, o mais recente com dados disponíveis.

"O que traz a taxa de desemprego para baixo é o crescimento econômico. Então, é provável que ela fique rondando 8% ou 9%."

O economista Luca Mercadante, da Rio Bravo Investimentos, projeta taxa de desocupação entre 9% e 10% no próximo ano, com uma alta "gradual", e "não abrupta".

Mercadante também aponta que o efeito defasado dos juros elevados deve frear a atividade econômica em 2023.

A Rio Bravo estima avanço de 0,7% para o PIB no próximo ano, mas não descarta um aumento de até 1%, após uma alta prevista de 3,1% em 2022.

"A atividade econômica vai crescer, mas bem menos do que neste ano, principalmente pelo efeito da política monetária", afirma.

"Tem outros pontos que merecem destaque, como o bom desempenho da agropecuária. A safra de grãos vai ser muito boa no ano que vem. A gente também deve ter alguma resiliência do mercado de trabalho. O rendimento, que ficou mais alto, deve ter impacto na atividade", diz.

O C6 Bank prevê um resultado mais baixo para o PIB de 2023. A estimativa do banco é de estagnação da atividade econômica, com o indicador marcando 0%, após avanço de 2,8% em 2022.

"A gente já vê sinais de desaceleração", aponta a economista Claudia Moreno, do C6 Bank.

Ela avalia que a provável perda de fôlego pode ser atribuída a pelo menos três fatores: o fim do processo de reabertura da economia, a desaceleração global e o impacto dos juros altos.

O C6 Bank também projeta que a inflação oficial do Brasil, medida pelo IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), fechará o próximo ano em 5,9%, depois dos efeitos dos cortes tributários que devem levar o indicador para 5,6% em 2022.

Assim, 2023 marcaria o terceiro ano consecutivo de estouro da meta de inflação no país. "É um quadro de preços ainda pressionados", diz Moreno.

A Rio Bravo, por sua vez, prevê IPCA de 5,2% em 2023, depois de avanço de 6% estimado para 2022. A MB Associados projeta inflação de 5,3% no próximo ano, após alta de 6% em 2022.

Para esfriar a economia e tentar conter o aumento dos preços no país, o BC (Banco Central) elevou os juros básicos (Selic) a 13,75% ao ano. Analistas avaliam que a taxa só deve começar a cair a partir de meados de 2023.

O que pode atrasar o início dos cortes, diz Sergio Vale, da MB, é o risco fiscal. "O ponto-chave é entender qual será a regra fiscal a ser criada no primeiro semestre do ano que vem."

José Pena, economista-chefe da Porto Asset Management, está com uma projeção de crescimento mais otimista para 2023, de 1%, mas afirma que o número tende a ser revisto para baixo em breve. Essa possível revisão se deve a um nível de incerteza maior, no cenário interno e externo, em relação ao que se esperava há um ou dois meses.

O quadro atual é de risco de aumento das expectativas de inflação, com indicações de crescimento do gasto público para sustentar uma demanda que ainda é relativamente forte, em meio a uma baixa ociosidade, o que posterga o cenário de corte de juros.

O que pode ajudar a manter viva a expectativa de redução da taxa básica Selic em um futuro não tão distante seria uma reversão do ciclo de alta de juros no exterior, especialmente nos EUA, e a continuidade do processo de normalização das cadeias globais de suprimento.

"Se começar a se materializar uma perspectiva de que o Fed [banco central dos EUA] está prestes a acabar seu ciclo de alta, isso vai nos ajudar. Se o Fed surpreender com uma alta maior, isso vai punir ainda mais os ativos de risco mundo afora, os brasileiros entre eles", afirma Pena.

Texto publicado originalmente na Folha de São Paulo.