condenações

Marco Aurélio Nogueira: Virando a página para trás

Lula, de novo elegível, não tem um mar aberto a sua frente. Não joga o jogo sozinho

É difícil avaliar a repercussão e os desdobramentos da decisão de Edson Fachin que, de uma só vez, monocraticamente, considerou sem validade todas as condenações de Lula. O ministro considerou que a Vara Federal de Curitiba não era o foro adequado para julgar os processos do ex-presidente, remetendo-os à justiça do Distrito Federal.

É mais fácil pensar no que a motivou. Fachin sabia que seria derrotado na Segunda Turma, antecipou-se a ela e deve ter tentado esvaziar a provável suspeição de Sergio Moro, artífice das condenações. Se terá êxito nisso não se sabe. Depois que se decidiu liberar os áudios da Vaza-Jato a Lula, era só questão de tempo soltar as amarras do ex-presidente, fazendo com que os processos voltassem à estaca zero.

Tudo isso tem um preço: como fica a imagem do STF, órgão supremo que precisou de cinco anos para descobrir que tudo que havia sido endossado pelos tribunais inferiores não passava de erro, de farsa, de injustiça? Há um quê de desmoralização que não passa despercebido. Pior para a vida institucional do País, que fica sem retaguarda.

Também é fácil vislumbrar a espuma de ódio que esguichará da boca dos bolsonaristas. Não por medo ou raiva, mas sim porque verão no fato um instrumento de campanha eleitoral, que agora está definitivamente aberta. Sentir-se-ão turbinados, revitalizados. Vira-se uma página para trás, de volta a 2018, ao antipetismo e ao antilulismo que tanta força deu à eleição do capitão.

É uma boa notícia para Bolsonaro, pois agora, quando o governo se mostra mais perdido e atarantado do que nunca, com nuvens carregadas pela pandemia, pelas mortes, pelo desemprego, pelas dificuldades fiscais, foi jogada na mesa uma carta que pode justificar as seguidas omissões presidenciais: ele agora dirá que o velho “inimigo” de antes voltou ao ringue e precisa ser combatido. O mesmo trololó de antes, de sempre, com direito a um pouco mais de fúria contra o STF.

Do lado de lá, não dá para cravar que a notícia fará com que Lula se proclame imediatamente candidato. O ex-presidente poderá voltar a ser penalizado no médio prazo, a depender da velocidade com que trabalharem a Justiça do Distrito Federal e o Tribunal Regional da 1ª Região (TRF-1).

De certo mesmo é que a decisão de Fachin espirrará em outras eventuais candidaturas potenciais, tipo Ciro Gomes e Flávio Dino, que ficarão paralisados, na expectativa dos próximos lances.

Lula, porém, não tem um mar aberto a sua frente. Não joga o jogo sozinho. Volta ao jogo com a bandeira do “injustiçado” tremulando mais alto, o que é um trunfo importante. Mas sabe que não vencerá a eleição sem um vínculo com o centro, com o mercado, os bancos. Poderá subir o tom contra Bolsonaro, lançar feromônios para seduzir o povo que o adora, mas também precisará suavizar o discurso para atrair os moderados e oferecer a eles alguma perspectiva de poder.

Até mesmo algo diferente poderá acontecer: uma coalizão de centro-esquerda que faça direito as contas, avalie politicamente a correlação de forças e convença o ex-presidente a aderir a um tertius e a um programa que salve o País. Tudo está, afinal, para ser jogado e no tabuleiro não há peças irremovíveis, nem vitoriosos por antecipação.

*Marco Aurélio Nogueira, professor de Teoria Política da Unesp


Alon Feuerwerker: Lula ficha limpa, por enquanto

Sobre a decisão do ministro Edson Fachin de anular as duas condenações de Luiz Inácio Lula da Silva (tríplex e sítio) em Curitiba, o argumento dos advogados era de que as acusações nada tinham a ver com a Petrobras. E por que decidir só agora? Segundo Fachin, porque os advogados só apresentaram esse argumento em novembro.

Questões juridicas à parte, é preciso fixar que a decisão representa uma vitória política para Lula e o PT. É claro que Lula pode ainda ser condenado pela Justiça Federal do DF, e se a condenação for confirmada em segunda instância voltará a ficar inelegível. Mas a partir de agora o cenário é outro.

Fachin não anulou os atos instrutórios de ambos os processos. O juiz em Brasília poderá, se desejar, simplesmente decidir em cima de tudo o que foi preliminarmente produzido sob a supervisão de Sergio Moro em Curitiba. Mas é possível que os advogados de Lula argumentem que Moro tampouco deveria ser o juiz encarregado de tocar a instrução.

Por que Fachin fez o que fez? Uma hipótese é tentar evitar que a Lava Jato descesse pelo ralo junto com os processos de Lula se a Segunda Turma declarasse a suspeição de Moro. Mas a esta altura é menos relevante para o quadro político. O fato é que Lula está de volta ao palco. E isso tem efeitos imediatos, como mostrou hoje a queda da Bolsa.

Quem ganha e quem perde? Ganham Lula e o PT. Mas também em algum grau Jair Bolsonaro, que vem sob fogo cerrado dos segmentos políticos “ao centro”. Com Lula no cenário, certamente será revivido o argumento de que o atual presidente seria uma espécie de mal menor para esse grupo.

*Alon Feuerwerker é jornalista e analista político/FSB Comunicação