Bolsonaro
Elio Gaspari: O caminho do vexame em Glasgow
Se o Itamaraty cuidar, ele será evitado
Elio Gaspari / O Globo
Faltam três dias para a ida de Jair Bolsonaro à reunião do G-20 de Roma e mais um para o começo, no domingo, da reunião da ONU sobre mudanças climáticas, a COP-26. Se a conduta das delegações brasileiras for conduzida por profissionais do Itamaraty, será possível evitar que o Brasil saia satanizado de Glasgow. Se a orientação sair da copa do presidente Bolsonaro, arma-se um vexame. Essa preocupação é legítima quando se sabe que, em setembro, a copa do Alvorada deu o tom do discurso pedestre do capitão na abertura da Assembleia Geral da ONU.
A entrega da chefia da delegação brasileira ao ministro Joaquim Leite, do Meio Ambiente, foi um mau sinal. Não só pelo currículo e pela falta de experiência dele em assembleias internacionais, mas também pelo desconhecimento dos antecedentes históricos da encrenca em que se meteu. Ele disse que a proposta da Comissão Europeia de criar uma taxa de carbono sobre produtos importados seria “uma forma de proteger as indústrias europeias de concorrentes estrangeiros que não cumprem os mesmos padrões de redução das emissões de gases de efeito estufa”.
Traduzindo: os europeus usam a proteção ao meio ambiente para proteger suas economias. Essa ideia é compartilhada pelo ministro da Economia, doutor Paulo Guedes. Vá lá que haja um fator econômico na querela. Mesmo assim, acreditar que a preocupação mundial com o clima seja um joguinho de papeleiros “revela um despreparo enorme”, para usar uma expressão do próprio Guedes detonando a fantasia de um Plano Marshall diante da Covid-19.
O pelotão palaciano viajou no tempo para escorregar numa casca de banana do século XIX. Quando o Império defendia a escravidão e o contrabando negreiro, argumentava, quase em surdina, que o abolicionismo era um ardil dos ingleses para proteger sua produção. Em benefício da elite da época, esse argumento nunca foi vocalizado por ministros. O Barão de Penedo, embaixador em Londres, nunca disse essas tolices por lá.
Passou o tempo e, novamente em surdina, a ditadura dizia que a política de defesa dos direitos humanos do presidente Jimmy Carter era uma nova face do imperialismo americano.
Omitiam-se dois fatos essenciais: o Império assentava-se na escravidão, e a ditadura amparava-se na tortura. Hoje, tenta-se embaralhar a questão climática reciclando a ignorância. É perda de tempo porque, salvo na cabeça dos agrotrogloditas, as queimadas da Amazônia estão na agenda do mundo.
Se o Brasil for para a reunião do G-20 de Roma e para Glasgow oferecendo um vago projeto verde, falando em protecionismo e cobrando recursos dos países ricos, pagará um mico. Em situações semelhantes, defendendo posições escalafobéticas, a diplomacia brasileira soube deixar o país fora da vitrine. Foi assim quando defendeu a insana política de reserva de mercado na informática, aquela que proibia a importação de computadores. Depois de um surto nacionalista, deixou o Acordo Nuclear com a Alemanha ir para a sepultura sem muxoxos.
Um presidente que não toma vacina e divulga a mentira de que ela provoca reações letais pode ser um ícone para seus convertidos, mas suas ideias em relação ao meio ambiente não são produto de exportação.
Fonte: O Globo
https://oglobo.globo.com/opiniao/o-caminho-do-vexame-em-glasgow-1-25252788
“Estatal que só me dá dor de cabeça”, diz Bolsonaro sobre Petrobras
Presidente já manifestou interesse em privatizar a empresa e disse que não pode interferir na petroleira
Mariana Costa / Metrópoles
O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) disse, na manhã desta quarta-feira (27/10), em entrevista à TV Jovem Pan, que a Petrobras é uma estatal que só dá dor de cabeça. O chefe do Executivo já manifestou intenção de privatizar a empresa pública, mas o ministro de Minas e Energia, almirante Bento Albuquerque, garantiu que não existe qualquer estudo no governo federal sobre o assunto.
“Alguns acham que a culpa é minha, alguns acham que eu posso interferir na Petrobras. Eu vou responder processo, o presidente da Petrobras vai acabar sendo preso. É uma estatal que, com todo respeito, só me dá dor de cabeça. Nós vamos partir pra uma maneira de quebrarmos mais monopólio, até botar no radar da privatização”, disse o mandatário do país.
Na segunda-feira (25/10), a Petrobras anunciou mais um aumento no preço da gasolina e do diesel nas refinarias. Foi a segunda alta em menos de um mês. Com 15 reajustes no valor do litro da gasolina (11 para cima e quatro para baixo), o combustível acumula alta de 73,4% apenas neste ano. O preço médio de venda passou, a partir de terça-feira (26/10), de R$ 2,98 para R$ 3,19, alta de 7,04%.
O presidente já deu outras declarações no sentido de privatizar a estatal. A mais recente foi na segunda-feira, quando disse que a paciência do povo se esgotou. Na ocasião, assinalou que não é possível achar uma solução para o problema em menos de três anos.
“São problemas que não se resolvem em três anos. Agora, o povo tá com a paciência lá em baixo, a paciência dele praticamente se esgotou, e vai para as críticas, das mais absurdas possíveis. Lamento, peço a Deus que preservemos nosso maior bem, que ainda é a liberdade”, disse o titular do Palácio do Planalto.
Fonte: Metrópoles
https://www.metropoles.com/brasil/politica-brasil/estatal-que-so-me-da-dor-de-cabeca-diz-bolsonaro-sobre-petrobras
Trump divulga mensagem de apoio a Bolsonaro
Ex-presidente americano tece elogios a seu "grande amigo" e diz que Brasil tem sorte de ter Bolsonaro
DW Brasil
O ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump divulgou uma mensagem de apoio ao presidente brasileiro Jair Bolsonaro, a quem tece vários elogios e chama de "grande amigo".
O comunicado de apenas cinco frases, intitulado "Endosso ao presidente Jair Bolsonaro", não deixa claro o motivo de ser divulgado agora, mas veio no mesmo dia em que senadores votavam o relatório final da CPI da Pandemia, que tem Bolsonaro como um dos alvos.
Também na terça-feira (26/10), o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) iniciou um julgamento que pode levar à cassação da chapa presidencial de Bolsonaro e do vice Hamilton Mourão.
"O presidente Jair Bolsonaro e eu nos tornamos grandes amigos ao longo dos últimos anos", inicia a mensagem de Trump, de quem Bolsonaro sempre foi um fã declarado. "Ele luta muito por, e ama, o povo do Brasil – como eu faço pelo povo dos Estados Unidos", continua.
"O Brasil tem sorte de ter um homem como Jair Bolsonaro trabalhando por ele. Ele é um grande presidente e nunca vai decepcionar o povo de seu grande país!", conclui o ex-presidente.
O comunicado não menciona a CPI da Pandemia, tampouco o julgamento no TSE. O tribunal avalia se Bolsonaro e Mourão cometeram os crimes de abuso de poder e uso indevido dos meios de comunicação social para a realização de disparos em massa de mensagens durante a campanha eleitoral de 2018. Três ministros já votaram, todos contra a cassação da chapa.
Por sua vez, o relatório final da CPI foi aprovado na noite de terça-feira, por sete votos a quatro, e pede o indiciamento do presidente por sete crimes comuns, além de crimes de responsabilidade e contra a humanidade por sua gestão da pandemia.
O relatório pede ainda o banimento de Bolsonaro das redes sociais, após ele usar uma live para fazer declarações que associaram falsamente as vacinas contra covid-19 ao risco de desenvolver aids.
A live repleta de mentiras acabou sendo excluída pelo Facebook, Instagram e YouTube. A última plataforma também suspendeu a conta do presidente por sete dias. Não é a primeira vez que o presidente tem conteúdo apagado pelas redes ao longo da pandemia. No ano passado, ele teve publicações com conteúdo falso suprimidas pelo Twitter e Facebook.
Alinhamento com Trump
Assim como Bolsonaro, Trump também usava as redes sistematicamente para espalhar mentiras e ataques enquanto presidente americano. No início do ano, Twitter, Facebook e YouTube acabaram banindo o republicano após ele estimular a invasão do Capitólio, a sede do Congresso do país, uma ação que resultou na morte de cinco pessoas. Ele segue banido.
Quando Trump estava no poder, Bolsonaro implementou um alinhamento sem ressalvas com o governo do republicano e demorou a admitir a derrota dele nas eleições americanas de 2020, afirmando – sem provas – que o atual presidente, Joe Biden, só ganhou o pleito por causa de fraudes.
O líder brasileiro foi o último chefe de Estado do G20 a reconhecer a vitória eleitoral de Biden, depois de até mesmo adversários dos EUA, como o russo Vladimir Putin.
Fonte: DW Brasil
https://www.dw.com/pt-br/trump-divulga-mensagem-de-apoio-a-bolsonaro/a-59637030
CPI da Covid quer que Bolsonaro seja banido das redes sociais
Presidente usa redes sistematicamente para espalhar mentiras. Relatório da CPI o apontou como líder de rede de fake news
DW Brasil
Pedido ocorre após presidente usar live para espalhar mentira que relaciona vacinas à aids. Donald Trump perdeu contas em redes sociais no início do ano após estimular invasão do Capitólio.
O relator da CPI da Covid, senador Renan Calheiros (MDB-AL), quer que o presidente Jair Bolsonaro seja banido das redes sociais. O pedido deve ser incluindo no relatório final do colegiado, que vai ser votado nesta terça-feira (26/10).
A medida é apoiada pela maioria dos membros da CPI e deve incluir um pedido de medida cautelar nesse sentido a ser encaminhada ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, responsável pelo inquérito das fake news, que já investiga uma rede bolsonarista de disseminação de mentiras.
O pedido da CPI ocorre quatro dias depois de Bolsonaro usar uma live para fazer declarações que associaram falsamente as vacinas contra covid-19 ao risco de desenvolver aids. Essa foi apenas a última de dezenas de declarações mentirosas do presidente em relação aos imunizantes.
A live repleta de mentiras de Bolsonaro acabou sendo excluída pelo Facebook, Instagram e YouTube. A última plataforma tambémsuspendeu a conta do presidente por sete dias. Não é a primeira vez que o presidente tem conteúdo apagado pelas redes ao longo da pandemia. No ano passado, ele já teve publicações com conteúdo falso suprimidas pelo Twitter e Facebook.
"Bolsonaro reincide a cada dia, faz questão de cometer os mesmos crimes. Não muda. Só porque a CPI se encaminha para a reta final, ele acha que vai voltar a falar sozinho de novo nas redes sociais. Essa última declaração, sobre vacina e aids, agrava ainda mais as circunstâncias dele", disse o senador Renan Calheiros ao jornal O Estado de S. Paulo.
"Vou fazer um registro duro no relatório da CPI e estamos, adicionalmente, entrando com ação cautelar junto ao STF para bani-lo das redes", completou.
No início do ano, Twitter, Facebook e YouTube baniram Donald Trump após o ex-presidente americano estimular a invasão do Capitólio, a sede do Congresso do país, uma ação que resultou na morte de cinco pessoas. Assim como Bolsonaro, Trump usava as redes sistematicamente para espalhar mentiras e ataques.
Na semana passada, o relatório da CPI da Pandemia imputou nove crimes a Bolsonaro, inclusive o de "incitação ao crime" por espalhar sistematicamente notícias falsas e incitar o desrespeito às medidas contra a pandemia. O relatório também apontou que Bolsonaro comanda uma rede de fake news com a participação de seus filhos e blogueiros bolsonaristas.
Mentira sobre aids
No vídeo da última quinta-feira, Bolsonaro leu um texto afirmando que vacinados com as duas doses contra a covid-19 estariam desenvolvendo a "síndrome da imunodeficiência adquirida" - o nome oficial da aids - "mais rápido do que o previsto" e que tal conclusão era supostamente apoiada em "relatórios oficiais do governo do Reino Unido".
No entanto, não há estudos do governo do Reino Unido que mencionam tal risco. Entidades médicas e cientistas imediatamente desmentiram o presidente em redes sociais.
A notícia falsa citada por Bolsonaro foi publicada originalmente pelos sites Stylo Urbano e Coletividade Evolutiva, este último um site antivacinas que já veiculou fake news ao longo da pandemia. Os dois sites se basearam numa página em inglês conhecida por espalhar teorias conspiratórias.
O site Aos Fatos apontou que os textos divulgados por Stylo Urbano e Coletividade Evolutiva inseriram de maneira fraudulenta uma tabela que não existia em documentos oficiais das autoridades sanitárias do Reino Unido.
Bolsonaro parece ter se dado conta na live sobre o potencial de sanções das redes sociais e se limitou a ler apenas o título e recomendar aos espectadores a procurarem ler o material. "Não vou ler porque posso ter problemas com minha live."
Na segunda-feira, Bolsonaro ainda tentou justificar suas declarações com novas mentiras, afirmando que elas constavam numa matéria da revista Exame. No entanto, a matéria da revista, publicada em outubro de 2020, a que o presidente se referiu não tem nada a ver com as falas mentirosas feitas durante a live da semana passada.
Método de fake news
Não é a primeira vez que Bolsonaro menciona estudos inexistentes para embasar sua agenda negacionista. Em fevereiro, ele mencionou um "estudo de uma universidade alemã" para afirmar que o uso de máscaras são "prejudiciais a crianças". No entanto, como a DW Brasil revelou, o tal "estudo" não passava de uma mera enquete online altamente distorcida. Da mesma forma, a notícia havia sido divulgada inicialmente por ativistas negacionistas antes de chegar ao presidente.
Bolsonaro tem feito declarações contra vacinas desde o ano passado. Num dos casos mais notórios, ele comemorou publicamente uma suspensão temporária de testes sobre a eficácia da Coronavac. Ele também continua se recusando a tomar qualquer vacina contra a covid-19. É o único líder de um país do G20 que ainda não o fez.
Mesmo a estratégia de usar material falsificado e depois tentar minimizar a má repercussão citando de maneira distorcida um texto legítimo não é nova.
Em junho, Bolsonaro divulgou um documento mentiroso e fraudulento que apontava "em torno de 50% dos óbitos por covid no ano passado não foram por covid". Bolsonaro disse que o documento havia sido elaborado pelo Tribunal de Contas da União (TCU), o que não era verdade.
Mais tarde, quando a falsificação foi apontada, o presidente e seus apoiadores passaram a divulgar um relatório verdadeiro porém antigo do TCU que levantava a hipótese de risco de supernotificação de casos da doença - mas era só um alerta, não significando que isso tenha ocorrido.
Repúdio
A Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) foi um dos grupos que desmentiu a fala de Bolsonaro que associou vacinas à aids. Em nota, a entidade repudiou "toda e qualquer notícia falsa que circule e faça menção a esta associação inexistente". A nota foi endossada pela Associação Médica Brasileira (AMB).
No Twitter, a epidemiologista Denise Garrett, do Instituto de Vacinas Sabin (EUA), reiterou que nenhuma das vacinas para covid-19 aprovadas pela Food and Drug Administration (FDA) e pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) causam HIV. Ela também chamou Bolsonaro de "inescrupuloso", "mentiroso" e "criminoso".
Fonte: DW Brasil
https://www.dw.com/pt-br/cpi-quer-que-bolsonaro-seja-banido-das-redes-sociais/a-59627208
Live de Bolsonaro com fake news sobre aids e a vacina da covid é excluída
É a primeira vez que o Facebook e o Instagram tiram do ar conteúdos das lives semanais do presidente
Cássia Miranda / O Estado de S.Paulo
Em ação inédita, o Facebook e o Instagram retiraram do ar neste domingo, 24, a live da última quinta-feira, 21, do presidente Jair Bolsonaro. Na transmissão, o chefe do Executivo disse que pessoas que tomaram duas doses da vacina contra o novo coronavírus no Reino Unido estão desenvolvendo aids. A afirmação, que é mentirosa, foi desmentida por cientistas de todo o mundo e publicada em um site inglês conhecido por espalhar teorias da conspiração.
O vídeo de Bolsonaro infringiu a política da empresa em relação à vacina da covid-19. “O Facebook está apoiando o trabalho da comunidade global de saúde pública para manter as pessoas seguras e informadas durante esta crise. Nosso objetivo é garantir que todos tenham acesso a informações precisas, removendo conteúdo prejudicial e apoiando pesquisadores de saúde com dados e ferramentas”, diz mensagem na página da companhia sobre a atuação da gigante da tecnologia durante a pandemia.
Ambas as redes sociais têm como política a responsabilidade de “reduzir a disseminação de notícias falsas”. O Facebook afirma estar empenhado “em criar uma comunidade mais bem informada e em reduzir a disseminação de notícias falsas”, enquanto o Instagram diz trabalhar “com verificadores de fatos independentes no mundo todo que analisam conteúdo em mais de 60 idiomas”.
Na manhã desta segunda-feira, 25, a live continuava disponível no canal do YouTube de Bolsonaro. Procurada, a plataforma não respondeu até a publicação desta matéria se pretende impor alguma sanção ao vídeo do presidente.
Esta é a primeira vez que a companhia de Mark Zuckerberg tira do ar uma live semanal de Bolsonaro. Anteriormente, o Facebook só tinha removido uma publicação do presidente feita em março de 2020 em que ele citava o uso de cloroquina para o tratamento da covid-19 e defendia o fim do isolamento social.
Bolsonaro ainda não se manifestou sobre a exclusão do vídeo.
Fake news sobre aids e vacina é antiga
A fake news que relaciona vacinas com o desenvolvimento da aids já era conhecida, tanto que a Organização Mundial de Saúde (OMS) reforçou a importância de portadores de HIV serem imunizados contra a covid-19. Como mostrou o Estadão, a propagação da mentira no momento em que o Brasil atinge mais da metade de sua população com a vacinação completa gerou revolta e críticas entre cientistas e políticos.
Por meio de nota, o Comitê de HIV/aids da Sociedade Brasileira de Infectologia afirmou que não se conhece nenhuma relação entre qualquer vacina contra a covid-19 e o desenvolvimento de síndrome da imunodeficiência adquirida, e repudiou "toda e qualquer notícia falsa que circule e faça menção a esta associação inexistente". O comitê da SBI também reforçou que pessoas que vivem com HIV/aids devem ser completamente vacinadas para a doença, e destacou que a dose de reforço (terceira dose) é indicada para quem recebeu a segunda dose há mais de 28 dias.
A assessoria da Presidência da República foi procurada por e-mail para comentar o episódio, mas não se manifestou até a publicação desta matéria. O espaço segue aberto.
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Fonte: O Estado de S. Paulo
https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,facebook-e-instagram-excluem-live-de-bolsonaro-com-fake-news-sobre-aids-e-a-vacina-da-covid,70003879214
Janio de Freitas: CPI da Covid é exemplo de atuação a Ministério Público e Judiciário
Já Rodrigo Pacheco não emitiu nem uma palavra de apoio aos trabalhos ou de aplauso aos resultados
Janio de Freitas / Folha de S. Paulo
A descrença na punição dos indiciados na CPI da Covid, pelo visto, bem próxima da unanimidade, é um julgamento de tudo o que se junta no sentido comum de "Justiça brasileira".
Também desacreditado por parte volumosa da opinião geral, o desempenho da CPI excedeu até o admitido pelos mais confiantes.
O fundo da realidade volta à tona, porém. A criminalidade constada aliados por covardia ou por patifaria.
A CPI traz mais do que a comprovação de um sistema de criminalidade quadrilheira, voltado para o ganho de fortunas e mais poder político com a provocação da doença e de mortes em massa.
Nas entranhas desses crimes comprovados, está a demonstração, também, da responsabilidade precedente dos que criaram as condições institucionais e políticas para a degradação dramática do país e, nela, a tragédia criminal exposta e interrompida pela CPI.
Nada na monstruosidade levada ao poder surgiu do acaso ou não correspondeu à índole do bolsonarismo militar e civil.
Muito dessa propensão foi pressentido e trazido à memória pública com exaustão, lembrados os antecedentes pessoais e factuais.
Também por isso as surpresas com a pandemia não incluíram a conduta do poder bolsonarista, que então prosseguiu, em maior grau, a concepção patológica de país traduzida na liberação de armas, nas restrições à ciência, na voracidade destrutiva.
A CPI proporciona ainda um exemplo ao Ministério Público e ao Judiciário.
Cumpriu um propósito de extrema dificuldade, porque contrário a um poder ameaçador e desatinado, e o fez com respeito aos preceitos legais e direitos. Sem a corrupção institucional própria do lavajatismo.
É necessário não esquecer a contribuição, para o êxito incomum da CPI, de senadores como Omar Aziz, que impôs o bom senso e a determinação com sua simpática informalidade. E Randolfe Rodrigues, autor da proposta de CPI e impulsionador permanente do trabalho produtivo.
Tasso Jereissati foi importante, com o empenho para aprovação e composição promissora da comissão, além de dirimir impasses --tudo isso, apesar da cara de cloroquina do seu PSDB chamado a definir-se contra o poder bolsonarista.
O polêmico Renan Calheiros foi, como sempre, muito decidido e eficiente. Otto Alencar e Humberto Costa, médicos, foram decisivos muitas vezes. E houve vários outros, mesmo não integrantes do grupo efetivo, como Simone Tebet.
Presidente do Senado, Rodrigo Pacheco não deve ficar esquecido. Filia-se ao PSD com o projeto de candidatar-se à Presidência, de carona no êxito da CPI.
Contrário à investigação da criminalidade do governo e de bolsonaristas na pandemia, sumiu com o projeto aprovado para criação da CPI.
Foi preciso que o Supremo o obrigasse a cumprir as formalidades de instalação. E não emitiu nem uma palavra de apoio aos trabalhos ou de aplauso aos resultados.
A descrença em punições não precisa de explicação. Oferece mais uma desmoralização das afirmações de que "as instituições estão funcionando" no país do governo criminoso e da descrença nos tribunais superiores.
Sem solução
Inesperada, a derrota na Câmara do projeto que passaria ao Congresso atribuições dos promotores e procuradores, sem com isso atacar o essencial, evitou mais uma falsa solução.
Mudar a natureza de procuradores e promotores é impossível, um Dallagnol será sempre o que é. Logo, o necessário é o acompanhamento honesto do que se passa no Ministério Público, e mesmo no Judiciário.
Tarefa básica que os conselhos dessas instituições não fazem, funcionando sobretudo no acobertamento dos faltosos.
Eis uma norma há anos adotada pelo Conselho Nacional do Ministério Público: mesmo que determinada pelas regras penais, a demissão do faltoso só deve ocorrer se há reincidência.
Do contrário, a pena será apenas de suspensão temporária da atividade e dos vencimentos. Uma discreta indecência.
O necessário é fazer com que os conselhos sejam leais às suas finalidades.
O que o Congresso pode conseguir com a criação de um sistema de vigilância público-parlamentar. Até algo assim, os conselhos do Ministério Público e da Magistratura continuam como motivo de descrença extensiva nessas instituições.
Fonte: Folha de S. Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/colunas/janiodefreitas/2021/10/conselhos-de-ministerio-publico-e-judiciario-sao-motivo-de-descrenca-extensiva.shtml
Dorrit Harazim: Vísceras expostas
Cabe agora ao Ministério Público e à Justiça responder aos pedidos de indiciamento
Dorrit Harazim / O Globo
O simples fato de a CPI da Covid ter existido e resistido, apesar da tropa de choque bolsonarista e da contrariedade do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, já foi notável. Duplamente admirável foi o empenho da maioria de seus integrantes em trabalhar como gente grande, com decência e benefício claro para a sociedade. Conseguiram dar algum compasso moral a um Brasil que, de resto, está à deriva e expuseram as vísceras de Jair Bolsonaro, cujo método de governo se assenta num amplo leque de tipificações penais.
Nada a festejar, porém. Não pode haver conforto para povo algum que tem na chefia da nação um presidente indiciado por crime contra a humanidade — no caso, contra sua própria gente. É igualmente trevoso para a história de qualquer nação ver seu presidente indiciado por mais outros oito crimes. É tudo de um horror abissal, por ser factual. E por quase ter ficado enterrado nos porões do governo, não fosse o dever cumprido pela maioria na CPI.
Cabe agora ao Ministério Público e à Justiça responder aos pedidos de indiciamento. E dar uma resposta adulta para a gargalhada com que o filho Zero Um do presidente, senador Flávio Bolsonaro, pretendeu desdenhar o documento histórico. O aspecto mais chulé da vida nacional anda esquisito — num curto espaço de tempo somos informados de que o presidente chora escondido no banheiro e de que o Marcola do PCC, líder da maior facção criminosa do país, está deprimido na prisão.
Mas são problemas reais que deixam em torvelinho 213 milhões de brasileiros. A fome de comer pelanca, o caos social, a extrema direita sem freios, os solavancos na economia, a emergência ambiental, a incerteza quanto a liberdades, a degradação geral da vida em sociedade — tudo isso entrou em marcha acelerada sob o comando errático de um só homem, Jair Bolsonaro. Que ninguém se engane — armados de fé e, se preciso, munidos de armas, seus seguidores mais extremados nunca lhe faltarão no pacto de morte contra o Estado Democrático de Direito.
Talvez o presidente e o relator da CPI da Covid, senadores Omar Aziz e Renan Calheiros, já tenham se arrependido de ter votado pela recondução de Augusto Aras ao cargo de procurador-geral da República. Nos Estados Unidos, o então presidente Donald Trump sobreviveu a dois processos de impeachment porque os senadores do Partido Republicano cerraram fileiras. Acreditaram estar fazendo política. Na realidade, fizeram história trevosa ao deixar o caminho aberto para Trump e sua vertente nacionalista voltarem ao poder — seja na reconquista da maioria na Câmara e no Senado em 2022, seja com Trump de volta à Casa Branca em 2024.
Não se trata de alarmismo. Nesta semana, Steve Bannon, o já notório cérebro de uma internacional fascistoide que inclui o Brasil, desafiou abertamente o Poder Legislativo dos EUA. Simplesmente recusou-se a depor perante a comissão de inquérito que investiga sua atuação na invasão do Capitólio de 6 de janeiro último, quando milicianos trumpistas pretendiam impedir a certificação da vitória eleitoral de Joe Biden em 2020. Parece pouco? Para padrões da bicentenária democracia americana, não é. Ao deboche público das instituições, arrostado por Bannon, vem somar-se uma acelerada limitação do direito ao voto em vários estados decisivos do país. E esse desmonte é obra de governadores mais leais a Trump que àquilo que os Estados Unidos de melhor deram ao mundo: o voto universal e livre.
Por toda parte, pipocam candidatos a clones de Trump, que Steve Bannon vai arrebanhando e formatando em rede. Alguns ainda são meros aspirantes a um poder menor, como a figura midiática do argentino Javier Milei, candidato a uma vaga no Congresso nas eleições do próximo mês. Admirador declarado de Trump e Bolsonaro, tem fala carismática e propostas de soluções simples para problemas complexos, como manda o manual populista. Outros visam mais alto logo de cara. Na França está em curso a ascensão meteórica e inesperada do polemista Éric Zemmour, apresentador do canal conservador CNews , que parece querer disputar a corrida presidencial. Situado à extrema direita de Marine Le Pen, Zemmour também é admirador declarado de Trump, alerta contra o “declínio da França”, ataca a imigração, o islamismo e o resto da cartilha democrática.
Sem falar no governo a cada dia mais fechado da Polônia, primeiro a desdenhar de peito aberto as convenções democráticas da União Europeia. Na sexta-feira, a ainda chanceler da Alemanha, Angela Merkel, recebeu uma ovação sincera dessa mesma União Europeia. Foi recebida pelo rei Philippe da Bélgica (a sede da EU é em Bruxelas), homenageada com peças de Mozart e Beethoven em concerto de gala e saudada com frases como “a senhora foi um compasso”, “as próximas cúpulas sem Angela Merkel serão como Paris sem a Torre Eiffel”. No caso, não eram exagero — por 16 anos ela foi âncora. Sem ela, a Europa e o mundo com Trumps e Bolsonaros se tornarão ainda mais sombrios.
Fonte: O Globo
https://blogs.oglobo.globo.com/opiniao/post/visceras-expostas.html
Vinicius Torres Freire: Furo no teto já não basta para pagar Auxílio Brasil, bondades e emendas
A questão é saber qual vai ser a mumunha que vão inventar para bancar aumento ainda maior da despesa
Vinicius Torres Freire / Folha de S. Paulo
A gambiarra para aumentar as despesas do governo federal em 2022 não deve ser suficiente para pagar a conta do pacote eleitoral previsto por Jair Bolsonaro, pelo centrão e por outros planos do Congresso. Pelo que está na emenda constitucional até agora, o aumento de gastos possível será de R$ 94,1 bilhões, somados o teto mais alto e o calote provisório, digamos, dos precatórios. A emenda ainda precisa ser votada na Câmara e no Senado. Há um acordão geral, entre quase todos os partidos e os comandos das duas casas, para aprovar o pacote.
Mas não vai dar para todo mundo.
Vai faltar ainda mais dinheiro se deputados e senadores decidirem dar alguma ajuda às pessoas que vão deixar de receber o auxílio emergencial e não vão entrar no novo Bolsa Família, o "Auxílio Brasil". Na manhã de sexta-feira (22), ouvia-se de gente do Congresso que era preciso arrumar algum auxílio para parte dos cerca de 18 milhões de pessoas que devem ficar sem nada. A conta ainda vai aumentar. Há quem diga, de resto, que o novo espaço fiscal não chega a R$ 94,1 bilhões. Pior ainda.
Assim, provavelmente não vai dar para pagar:
1) o "Auxílio Brasil", que vai custar R$ 46,7 bilhões além do que estava orçado para o Bolsa Família. É o custo de pagar R$ 400 por mês a 17 milhões de pessoas;
2) o aumento de despesa imprevista pelo Orçamento enviado pelo governo ao Congresso, aquela que vai aumentar porque a inflação vai ser maior do que estimada, o que eleva gastos com benefícios atrelados ao valor do salário mínimo, como os da Previdência. Deve ser um custo extra de quase R$ 20 bilhões, no mínimo de R$ 18 bilhões;
3) o aumento de despesas que está no forno: Vale Gás, Bolsa Caminhoneiro, a prorrogação do desconto de impostos sobre a folha salarial de empresas (a chamada "desoneração"). Nada disso ainda foi aprovado ou mesmo planejado (caso do auxílio para caminhoneiros autônomos). Pelas contas ainda imprecisas de agora, o custo deve ser de uns R$ 14 bilhões;
Sobra então algo em torno de R$ 14 bilhões a R$ 15 bilhões. Mas a conta não acabou.
Pelo que se ouvia no Congresso até faz pouco, não é dinheiro suficiente para bancar o aumento do valor daquelas emendas parlamentares paroquiais que ora estão sob controle dos líderes do centrão, em particular de Arthur Lira (PP-AL), o presidente da Câmara, premiê informal de Bolsonaro. A conversa do centrão era arrumar pelo menos uns R$ 18 bilhões. A depender do destino que se dê a uns certos gastos do governo (como investimento em obras), dá para baixar essa conta (prejudicando, claro, investimentos maiores, que dariam lugar a gastos mais paroquiais).
O limite de gastos federais vai aumentar porque Bolsonaro e centrão combinaram de mudar a regra de reajuste dessas despesas. É uma gambiarra, uma mudança na indexação, na correção monetária, desse limite, do "teto" de gastos. Vai haver mais "espaço" para gastos também porque parte da dívida já orçada com precatórios não será paga, uma moratória que vai ressuscitar os esqueletos fiscais (dívidas mais ou menos escondidas na contabilidade, que se acumulam e acabam por assombrar algum governo).
A questão aqui é saber qual vai ser a mumunha que vão inventar para pagar aumento ainda maior da despesa, além daquilo que seria permitido pela gambiarra. Inventar maneira nova de reajustar o valor do "teto" vai ser difícil. Inventar uma despesa extra-teto aumentado causará escândalo adicional.
Convém lembrar que, se o Congresso inventar um novo jeitinho, por meio de emenda constitucional, Bolsonaro não poderá vetar a nova despesa (mesmo que quisesse).
As próximas semanas ainda serão animadas.
Fonte: Folha de S. Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/colunas/viniciustorres/2021/10/furo-no-teto-ja-nao-basta-para-pagar-auxilio-bondades-e-aluguel-do-centrao.shtml
Bruno Boghossian: A conexão operacional entre bolsonaristas e os golpistas de Trump
A um ano da eleição, apoiadores do presidente estreitam laços com estrategistas e redes de direita
Bruno Boghossian / Folha de S. Paulo
A Polícia Federal mapeou conexões do bolsonarista Allan dos Santos nos EUA. Num pedido de prisão, investigadores apontaram que ele manteve contato com Owen Shroyer, que participou da invasão do Capitólio em janeiro, quando golpistas tentaram melar a eleição americana num ataque que provocou cinco mortes.
A ligação entre os dois não foi citada por acaso. Shroyer é apresentador do Infowars, canal de ultradireita que divulga teorias da conspiração e deu palanque livre para as acusações falsas de fraude que Donald Trump repetia para inflamar seus apoiadores após perder a eleição. No Brasil, o roteiro pode se repetir no ano que vem, com apoio externo.
Os bolsonaristas que ainda sonham com uma manobra para contestar o resultado da próxima eleição presidencial se inspiravam na estratégia trumpista. Mas há cada vez mais evidências de que está em desenvolvimento uma conexão operacional e financeira entre brasileiros e golpistas americanos.
Steve Bannon, ex-extrategista de Trump, se tornou uma espécie de conselheiro de Eduardo Bolsonaro. O americano já disse que a disputa brasileira é "a segunda mais importante do mundo" e considera a reeleição do presidente uma plataforma para reerguer um bloco internacional de extrema direita. Sua especialidade é a desinformação política.
A um ano da eleição, os bolsonaristas estreitam laços e buscam apoio operacional de redes sociais de direita que podem distribuir conteúdo radical, fora do alcance da Justiça brasileira. Eduardo se aproximou de Jason Miller, ex-porta-voz de Trump que fundou a Gettr, e o deputado Luiz Philippe de Orleans e Bragança se tornou o diretor financeiro da Truth Social, plataforma lançada pelo ex-presidente americano.
Ainda que Jair Bolsonaro tenha interrompido a campanha de ataque às urnas para evitar uma punição dos tribunais, ninguém duvida que o presidente e sua base vão tentar tumultuar a campanha e contestar o resultado da corrida de 2022 com o apoio dessa rede internacional.
Fonte: Folha de S. Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/colunas/bruno-boghossian/2021/10/a-conexao-operacional-entre-bolsonaristas-e-os-golpistas-de-trump.shtml
Elio Gaspari: Os frentistas abandonaram o Posto Ipiranga
Quase todos saíram, por terem percebido que estavam perdendo tempo, ou queimando biografias
Elio Gaspari / O Globo
Num governo que já explodiu a meta da inflação, o ministro Paulo Guedes adoçou sua adesão ao estouro do teto de gastos falando difícil, com uma azeitona em inglês:
“Estamos buscando a formatação final dos R$ 400, fazendo a sincronização dos ajustes das despesas obrigatórias, dos salários e do teto ou pedindo um waiver.” Na gíria do carteado, a tradução dessa palavra é “estia”. O jogador que tem menos habilidade pede uma estia ao outro.
Quanto à sincronização, Guedes conseguiu a demissão sincronizada de quatro colaboradores. Desde a posse do Posto Ipiranga, 19 frentistas já pediram o boné. Quase todos, por terem percebido que estavam perdendo tempo, ou queimando biografias. Na Prevent Senior, diriam que elas caminhavam para uma “alta celestial”.
Guedes parece ter subestimado a saída do secretário do Tesouro, Mansueto Almeida, em julho do ano passado. Mesmo antes da posse, Mansueto mostrou ao czar que uma parte de suas promessas era fantasia. O economista havia passado com brilho pelo Massachusetts Institute of Technology e conhecia as mumunhas de Brasília. Ao ir embora, mostrou que entendia muito de política.
A última debandada da ekipekonômika mostrou que Guedes não entendeu onde se meteu. Nenhum deles foi-se embora porque Guedes sofreu derrotas políticas, mas porque tendo-as sofrido, meteu-se numa aventura injetando cloroquina na sofrida economia nacional. Guedes encantou-se ao ver que as portas se abrem sozinhas para deixar o excelentíssimo senhor ministro passar, e por essa porta 19 se foram.
‘Oito Dias de Maio’, um grande livro
Saiu nos Estados Unidos um grande livro. É “Eight Days in May: The Final Collapse of the Third Reich”, do historiador alemão Volker Ullrich, conhecido pela sua biografia de Adolf Hitler. Ele conta com maestria os dias que foram do suicídio do Fuhrer (30 de abril de 1945) à rendição do alto comando alemão em Reims (7 de maio).
A sabedoria convencional sugere que entre um fato e outro pouco de relevante aconteceu, além do inexorável triunfo das Tropas Aliadas. Com um olhar alemão, Ullrich mostra um painel de dramas, ruínas e ambições. Nele, sobressai a figura do almirante Karl Dönitz, um nazistão a quem Hitler passou o governo do Reich. Seu comportamento, com o pelotão de militares e civis que o rodeava, é uma aula sobre a psicologia do poder, mesmo quando ele só existe na forma de delírio patológico.
O almirante tinha uma ideia: continuar a guerra na frente do Leste, sem combinar com os russos que já estavam em Berlim. No dia 5 de maio, ele compôs ministério e entregou ao economista Otto Ohlendorf a tarefa de planejar a reconstrução do país. (Como oficial da tropa da SS, ele se envolveu na morte de 90 mil pessoas na frente russa).
Nesse dia, a fotógrafa americana Lee Miller posava com o torso nu na banheira do apartamento de Hitler em Munique, e um general alemão chegava ao QG dos Aliados levando a proposta de paz em separado. Não foi recebido pelo comandante americano Dwight Eisenhower: rendição incondicional ou nada. Quando ele relatou a Dönitz o resultado da gestão, o almirante indignou-se e considerou a posição de Eisenhower “inaceitável”. Pouco depois entendeu que inaceitável era sua ideia e, às 2h41m da madrugada do dia 7, os alemães assinaram a capitulação.
No dia 9, os russos já tinham identificado os restos de Hitler a partir de sua arcada dentária. Dönitz, contudo, ainda não sabia se deveria renunciar. Seu chanceler argumentava que a rendição fora das tropas, não do governo. O almirante concordou e foi ao rádio: “Nós não temos do que nos envergonhar. Nesses seis anos, o que o Exército conseguiu combatendo e a população, resistindo, foi um fato inédito na História do mundo, um heroísmo sem precedentes.”
No dia 23, seu governo foi extinto, e ele foi preso. Passou dez anos na cadeia e morreu em 1980. Nunca disse uma palavra contra Hitler nem a favor dos judeus. Os dois comandantes do Exército alemão foram enforcados em 1946, e seu ministro da Fazenda foi executado na Alemanha em 1951 pelo que havia feito na Rússia.
Boa ideia
Aos poucos, a Petrobras está retomando o fornecimento de combustível de aviões e helicópteros.
Não há razão para que existam intermediários para abastecer com combustível da Petrobras voos de bases da empresa para plataformas da própria companhia.
Posto Ipiranga
De uma víbora:
“O Posto Ipiranga de Jair Bolsonaro virou uma daquelas casas pelas quais, segundo o escritor Guimarães Rosa, homens sérios entravam, mas por elas não passavam.”
Mailson disse tudo
O ex-ministro Mailson da Nóbrega disse tudo:
“Parece um grande manicômio.”
A privataria avança no parque
A Urbia, empresa que se tornou concessionária do Parque do Ibirapuera, privatizado pela fúria liberal do então prefeito e hoje governador João Doria, decidiu abrir uma interessante discussão. Quer arrecadar uma tarifa a empresas e treinadores que cobram pela prática de atividades esportivas no seu espaço.
Essa tarifa renderia de R$ 100 mil a R$ 200 mil mensais à empresa. Querem cobrar de 3% a 5% do que pagam os alunos; até as árvores sabem que essa conta vai para o bolso dos alunos.
Há empresas que se apropriam de pequenos espaços para suas atividades. Nesses casos, a ideia faz sentido. A girafa aparecerá quando se quiser cobrar a um treinador que acompanha clientes numa corrida ou numa sessão de ginástica sem demarcar espaço.
Se o doutor João Doria sair candidato pelo PSDB poderá explicar o alcance de suas privatizações durante a campanha.
Bolsonaro no Congresso
Um leitor de folhas de chá acredita que se Jair Bolsonaro perceber que não terá chances de vitória na eleição presidencial procurará abrigo numa disputa para o Senado, ou mesmo para a Câmara.
Se isso acontecer, o recuo do capitão nada terá a ver com apreço pelo Legislativo. Será uma busca de imunidade.
Príncipe William
Faz tempo que não se ouve uma coisa inteligente vinda da Casa de Windsor. A rainha Elizabeth não fala. Seu falecido marido foi um campeão de impropriedades, e seu filho Charles falava com plantas.
O sinal de vida veio do príncipe William, que criticou os milionários que torram fortunas para ir ao espaço enquanto as coisas na Terra vão mal.
As aventuras espaciais de Elon Musk e Jeff Bezos, bem como o quadro de Banksy parcialmente triturado que foi arrematado num leilão por US$ 25,4 milhões serão marcos das maluquices de uma época.
No século passado, o fotógrafo Philippe Halsman ganhou notoriedade com a “jumpology”, algo como “pulologia”. As celebridades eram fotografadas enquanto pulavam. Até o Duque e a Duquesa de Windsor participaram dessa palhaçada, rendendo uma bela imagem.
Anos depois, a televisão italiana criou o programa de bobagens “Mondo Cane”. Num de seus episódios, um artista tocava uma peça de Beethoven dando tapas na cara de suas vítimas.
Fonte: O Globo
https://oglobo.globo.com/politica/os-frentistas-abandonaram-posto-ipiranga-25249228
Eliane Catanhede: Quanto mais golpeia a economia, mais Bolsonaro abre a trilha da terceira via
Quanto mais troca a responsabilidade fiscal pelo Centrão, o presidente afugenta o setor produtivo, bancos, agronegócio, grandes executivos e economistas
Eliane Catanhede / O Estado de S. Paulo
Ao incinerar os princípios básicos da macroeconomia em favor dos interesses rasteiros da micropolítica, o presidente Jair Bolsonaro não percebe que faz mais o jogo do Centrão do que dele próprio e que trabalha contra a sua reeleição. Furar o teto de gastos não vai salvá-lo, vai afundá-lo de vez.
De um lado, Bolsonaro não entrega reformas, privatizações e neoliberalismo. De outro, atua contra a meta de inflação, os juros baixos, a responsabilidade fiscal e social. Não constrói nada e destrói o que já existe; não respeita nem demite Paulo Guedes, uma alma penada.
Na economia, o governo não tem ministro, plano de voo e o que mostrar, sem passado, presente e futuro. Na política, está nas mãos de quem desdenha da economia, do social e do próprio destino de Bolsonaro, fazendo da fraqueza dele a sua força. O principal efeito pode ser justamente eleitoral.
Quanto mais troca a responsabilidade fiscal pelo Centrão, mais Bolsonaro afugenta o setor produtivo, bancos, agronegócio, grandes executivos e economistas. E mais abre caminho para uma terceira via. O senador Rodrigo Pacheco e o ex-juiz Sérgio Moro vão se filiar, um ao PSD, na próxima quarta, o outro ao Podemos, em 10 de novembro.
Pacheco e PSD têm muito a ganhar e nada a perder. Ele, que faz 45 anos em 3/11, tem duas plataformas: a presidência do Senado, onde marca posição pró-democracia e criou uma barreira às audácias da Câmara e de Bolsonaro, e Minas, onde a debacle do PSDB e do PT fez emergir o PSD – mesma sigla (não partido...) de Juscelino Kubitschek, símbolo de político.
Seja ao fim candidato a presidente, vice ou nada, Pacheco lucra com a visibilidade e tem seu mandato no Senado garantido por mais quatro anos. E o PSD de Gilberto Kassab ganha tempo e moeda de troca, enquanto conversa com Lula e espera o quadro eleitoral decantar.
Quanto a Moro, ele perdeu parte do que tinha – na direita e no centro – e não ganhou o que não tinha – a esquerda. O X da questão é o Estado da filiação. Se for ao Podemos do Paraná, a candidatura à Presidência seria a única opção, porque Álvaro Dias é o dono da única vaga do partido ao Senado. Já se for ao de São Paulo, Moro estará de olho no Senado.
Na raia da terceira via, há duas certezas, o veterano Ciro Gomes (PDT) e um nome do PSDB a ser lançado em novembro, além de várias incógnitas, como o neófito Datena, do União Brasil. O mais relevante é que há clamor e trilhas abertas. Bolsonaro ajuda muito, a golpes de incompetência política, econômica, social e administrativa. Lula prefere concorrer com ele, mas não vai ser tão fácil.
Fonte: O Estado de S. Paulo
https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,quanto-mais-golpeia-a-economia-mais-bolsonaro-abre-a-trilha-da-terceira-via,70003878055
Míriam Leitão: Mentiras fiscais desviam o foco
Os mais otimistas estão prevendo que o PIB brasileiro suba 1%
Míriam Leitão / O Globo
O governo terminou a semana com o presidente Bolsonaro acusado de nove crimes, e o Ministério da Economia com um desfalque de parte da equipe. Os dois eventos estão ligados. Bolsonaro, acuado pela CPI e pela perda de popularidade, anunciou elevação do benefício social, ainda inexistente, mas para isso foi preciso atropelar as regras fiscais. A reação foi a saída de quatro secretários da equipe econômica. Depois disso, o presidente visitou o Ministério da Economia, disse que o ministro tem sua confiança, e Paulo Guedes ficou no cargo.
A confusão feita pelo governo nos últimos dias vai impactar o país por muitos anos. Os juros vão subir mais para compensar a incerteza da política fiscal. O país crescerá pouco no ano que vem e os economistas já falam em estagflação. Enquanto isso o mundo estará crescendo forte.
– O mundo vai crescer 4,9% em 2022, será uma das maiores distâncias entre o Brasil e o mundo em quatro décadas — diz o economista-chefe de um dos maiores bancos do país.
Os mais otimistas estão prevendo que o PIB brasileiro suba 1%. Mas muitos economistas de bancos e consultorias estão reduzindo para números próximos de zero.
Fazer o orçamento será um exercício de adivinhação depois da mudança feita essa semana. O teto de gastos será corrigido pelo índice de janeiro a dezembro, em vez de ser pela inflação de doze meses até junho. Ou seja, o orçamento será enviado ao Congresso sem que se saiba a inflação do ano e, portanto, sem o valor do teto de gastos. Será votado também sem a definição do valor do teto. Só em janeiro do ano em que o Orçamento estará sendo executado é que se saberá qual foi a inflação de janeiro e dezembro.
–O espaço do teto era corrigido pelo IPCA de 12 meses acumulado até junho. Por que? Porque o orçamento precisa ser enviado em 31 de agosto ao Congresso com a previsão de despesas dentro do teto. A Secretaria de Orçamento precisa desses números e de tempo para preparar. Fizeram isso por conveniência, porque agora há um ganho — explicou uma fonte que já preparou as contas para o orçamento.
Outra consequência dos eventos dessa semana, e que se estenderá para os próximos anos, é a mudança nos precatórios. São dívidas que tramitaram na Justiça. Não são meteoros, ao contrário do que disse Guedes. A solução poderia ter sido outra, que não a de dar um calote em parte dos credores.
—É falacioso o argumento de que não há como pagar os precatórios. O governo não soube gerenciar o problema. Uma das maiores dívidas era com o Fundef, que poderia ter tido uma boa negociação. Havia um erro da AGU de R$ 30 bilhões e o governo foi alertado sobre isso bem antes. Bastava negociar com os estados. Nada foi feito porque os “beneficiários” seriam governos da oposição — explicou um ex-integrante do governo.
Por onde se olhe há gambiarras e casuísmos. O governo deixará de pagar dívidas que poderia ter negociado e vai criar uma dívida paralela, para ser paga em 10 anos, e que pode virar uma bola de neve. A mudança do prazo do índice que corrige o teto de gastos é uma manobra oportunista. Até meses atrás, o governo comemorava o descasamento dos índices porque haveria uma folga fiscal. E é isso que Paulo Guedes disse que havia “R$ 30 bi a R$ 40 bi que eram nossos e sumiram”. Se a inflação caísse fortemente no segundo semestre, o teto seria corrigido pela inflação de 12 meses até junho e, então, as despesas subiriam menos porque o INPC seria menor. Só que a realidade não respeitou as previsões e a inflação subiu nesse segundo semestre comendo a “folga fiscal”. Será mudada a periodicidade do índice que corrige o teto porque agora dá vantagem ao governo. Mas isso vai criar um problema permanente na formulação do orçamento.
E tudo isso foi feito para ajudar os pobres? Não. Tudo isso é feito para parecer que está ajudando os pobres, mas para garantir na prática que continuam altas as emendas parlamentares inventadas no governo Bolsonaro, e conhecidas com o nome de RP9. E, desta forma, o governo possa continuar comprando apoio no Congresso.
Foi uma semana de mentiras, desrespeito às leis fiscais e muita demagogia para tentar desviar a atenção do fato de que o presidente Jair Bolsonaro foi acusado de cometer nove crimes, entre eles o crime contra a humanidade.
Fonte: O Globo
https://blogs.oglobo.globo.com/miriam-leitao/post/mentiras-fiscais-desviam-o-foco.html