Cora Rónai: Pagando para ver

O Facebook, que começou como plataforma de engajamento, cada vez mais se transforma num canal pago
Foto: Reprodução/Google
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O Facebook, que começou como plataforma de engajamento, cada vez mais se transforma num canal pago

O ano de 2012 foi decisivo para muitas empresas que apostaram no Facebook como plataforma de comunicação: uma mudança no algoritmo reduziu drasticamente o alcance das suas páginas, que passou para apenas 16% da comunidade de fãs. Outras mudanças ocorreram no ano seguinte. Em 2014, de acordo com um estudo da Social@Ogilvy, o alcance orgânico ficou numa média de 6%, sendo que nas páginas mais movimentadas, com mais de 500 mil curtidas, ele caiu para pífios 2%. “Alcance orgânico” é uma forma elegante de dizer quanta gente pode ser alcançada gratuitamente por um post. Em outras palavras, uma publicação feita numa fanpage com meio milhão de seguidores não será vista por mais do que dez mil pessoas, e olhe lá.

Em abril, Kurt Gessler, editor de mídia digital do “Chicago Tribune”, observou, num artigo postado na plataforma Medium, que nunca os posts do jornal tinham chegado a tão poucos leitores. Àquela altura, o “Tribune” tinha cerca de 500 mil fãs, dos quais algo entre 25 mil e 50 mil viam as suas publicações: em dezembro de 2016, apenas oito dos seus posts haviam tido menos de 10 mil visualizações. Em janeiro, porém, esse número saltou para 80. Em fevereiro, 159. E em março, nada menos do que 242 posts entraram na conta — ainda que a quantidade de seguidores do jornal no Facebook estivesse crescendo.

A moral da história parece ser simples: quer mais alcance? Pague por ele.

O Facebook, é claro, nega isso, e atribui a queda do alcance orgânico à 1) existência de mais conteúdo, e 2) uma otimização do feed de notícias, que mostraria aos usuários apenas o que é considerado mais relevante para eles. Os argumentos, no entanto, não sensibilizam especialistas em comunicação e marketing, que continuam discutindo o assunto, e já trabalham com a hipótese de alcance orgânico zero.

O pior é que essa estagnação está indo além das das fanpages, e começa a chegar aos perfis pessoais. Notei isso pessoalmente há dois ou três meses. Minha conta, que recebia cerca de mil novos seguidores por mês, consistentemente, empacou, embora o conteúdo continue o mesmo. Outros amigos, que também têm páginas muito movimentadas, notaram a mesma coisa. Nossas páginas não têm sido mostradas para além do seu núcleo básico e, frequentemente, nem isso, já que gente que sempre via os nossos posts deixou de ver, e amigos têm perguntado por que deixamos de postar, apesar das várias publicações diárias. Fiz um post sobre isso e a reação foi enorme. Todo mundo tem a mesma percepção, seja em relação aos seus próprios perfis, seja em relação a perfis seguidos.

Ou seja, a rede, que começou como uma extraordinária plataforma de criação de comunidades e de engajamento, cada vez mais se transforma num canal pago, caminho seguro para deixar de ter qualquer relevância.

O mais irônico é que, na sua página para a imprensa, o Facebook começa a retrospectiva do ano afirmando que, em 2017, anunciou sua nova missão de “dar às pessoas o poder de criar comunidades e aproximar o mundo”.

Me engana que eu gosto.

 

 

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