O candidato do PSL, se eleito, desmoralizaria a direita por uma geração inteira
Fernando Haddad (PT) encontrou sua voz, e, se você leu minha coluna da semana passada, deve imaginar que ela me soou bem. Jair Bolsonaro (PSL), por sua vez, não tem mais o atestado médico para esconder a sua.
Em sua entrevista ao Jornal Nacional na segunda-feira passada (8), Haddad deu os sinais certos. Anunciou que o PT deixou de lado a proposta de nova Constituinte, adotou um discurso moderado, deixou claro que Dirceu não participará de seu governo (o que era óbvio) e, o que passou despercebido, descreveu a proposta do PT como “social-democrata”.
Esse ponto é muito importante: o PT sempre foi reconhecido por todos os grandes partidos social-democratas do mundo como um igual, mas nunca admitiu esse parentesco muito claramente.
O PT pertence à mesma família dos movimentos de esquerda moderados do Chile, do Uruguai e da Costa Rica. É importante sinalizar isso.
Mas a sinalização mais clara de que o PT está falando sério no segundo turno foi o encontro de Haddad com Joaquim Barbosa, que, admito, nem eu esperava que acontecesse.
Pensem bem no peso disso: Barbosa foi indicado por Lula para o STF (Supremo Tribunal Federal), mas mandou para a cadeia grande parte da direção do PT. O PT passou anos gritando que o julgamento foi uma farsa, e que todos os condenados eram inocentes.
O gesto de Haddad foi importante. É difícil imaginar outro petista fazendo a mesma coisa nos últimos anos.
E pensem também no tamanho da aversão que Bolsonaro inspira em Joaquim Barbosa para que o ex-ministro tenha aceitado discutir com o PT.
Ao mesmo tempo em que faz os gestos necessários ao centro, Haddad bate em Bolsonaro em defesa dos pobres. Afinal, o programa de Paulo Guedes parece algo que João Santana inventaria para atribuir falsamente a um adversário de Dilma em 2014.
Vale lembrar, o PT não bateu em Bolsonaro no primeiro turno. Essa briga pelos pobres começa agora.
Por sua vez, Bolsonaro não tem mais a desculpa do atentado para se esconder do eleitorado. E isso é muito ruim para ele.
Graças à facada de 6 de setembro, Bolsonaro passou o primeiro turno escondido, apresentado como o antipetista genérico. Cada eleitor que não gosta do PT projetou nele suas próprias aspirações.
Agora vai ficar cada vez mais claro que Bolsonaro não é o antipetista genérico, é a caricatura que os petistas fazem do antipetismo.
Não, o DEM não é fascista. Bolsonaro é —pesquise o entusiasmo que os grupos de extrema direita têm por sua candidatura. O PSDB não quer que os pobres se explodam. Bolsonaro quer, como mostrei na última coluna do primeiro turno. Os evangélicos não são homofóbicos e preconceituosos. Bolsonaro é —há um vídeo dele dizendo que se orgulha de ser homofóbico. Ser de direita não faz de você um defensor da ditadura —mas Bolsonaro não defende só os governos da ditadura, defende os torturadores da ditadura individualmente. Seu livro de cabeceira são as memórias de Brilhante Ustra.
E esse é o ponto que a direita civilizada e os antipetistas de bom senso (que devem ser a maioria dos antipetistas) precisam levar em conta: Bolsonaro, se eleito, desmoralizaria a direita por uma geração inteira.
O petismo de Haddad não é exatamente aquele a que você se opõe. E o antipetismo de Bolsonaro, definitivamente, não é o seu.
*Celso Rocha de Barros, servidor federal, é doutor em sociologia pela Universidade de Oxford (Inglaterra).