Day: dezembro 16, 2020
Vitruvius: Filosofia e desigualdade - A festa brasileira em Rouen em 1550
Luiz Philippe Torelly
“Nos tempos antigos, os homens não conheciam as doenças, o sofrimento ou a morte. Não havia brigas. Todos eram felizes. Naquele tempo, os Espíritos da floresta viviam junto com os homens.” Relato dos índios guianenses (1).
Algumas coincidências acabam por nos fazer crer em sincronicidade e em como situações históricas de um passado remoto podem ressurgir, naturalmente, sob outras circunstâncias e roupagem. Esse é o caso do presente texto.
Fico sempre à procura de “novidades”, especialmente de relatos de viagens ou acontecimentos inusitados que fujam à regra da história dos vencedores e das grandes datas, que possam como uma lupa desvendar o particular (2). Foi assim que me deparei com um opúsculo de título curioso, Uma festa brasileira celebrada em Ruão em 1550. Foi amor à primeira vista. De autoria de Ferdinand Denis e publicado em 1850, relata um acontecimento na história da França e do Brasil, com profundas raízes na filosofia e no imaginário da desigualdade que sempre determinou as relações entre a maioria dos homens.
Tal fato foi inicialmente relatado na denominada Narrativa da suntuosa entrada, atribuída a Maurice Sève, publicada em Rouen em 1551. O texto registra a “entrada” (3) realizada em homenagem ao rei de França Henrique II e à rainha Catarina de Médicis, em 1550. As “entradas” eram celebrações, muitas vezes de caráter teatral ou religioso, em homenagem a acontecimentos ou personalidades de que se utilizava a realeza para exibir seu poderio e riqueza: a antiga fórmula do pão e circo. Frequentes no ancien régime francês, essas efemérides ocorreram até o século XIX, como na repatriação dos restos mortais de Napoleão Bonaparte ou no enterro de Victor Hugo, que atraiu mais de um milhão de parisienses.
O episódio de Rouen se tornou célebre e chegou aos nossos dias graças ao texto de Montaigne Os canibais, parte de seu livro Os ensaios. A festa teve um aspecto inusitado e grandiloquente por suas proporções e riqueza de detalhes. Envolvia a representação em grande escala de um cenário brasileiro, com fauna e flora originais, inclusive, onde trezentos homens, dentre eles cinquenta indígenas, simulavam um confronto entre tupinambás e tabajaras, com a vitória dos primeiros. Sua significância advém do ensaio de Montaigne e de sua influência sobre as ideias de Jean Jacques Rousseau, da Revolução Francesa de 1789 e das origens do socialismo, especialmente da luta de classes e da crítica ao fundamento da propriedade privada. Importante mencionar A utopia, de Thomas Morus, obra que antecede em algumas décadas a de Montaigne, como uma das fontes primeiras dessas formulações. Parte desse acontecimento perenizou-se em gravuras e na pedra, nos baixos relevos na Igreja de Saint-Jacques em Dieppe.
Em 1580, Montaigne publica a 1ª edição de Os ensaios, na qual está incluído aquele intitulado Os canibais. Nele retrata uma sociedade edênica e, num imaginário diálogo com Platão, afirma:
“É uma nação em que não há nenhuma espécie de comércio, nenhum conhecimento das letras, nenhuma ciência dos números, nenhum termo para magistrado nem para superior político, nenhuma prática de subordinação, de riqueza ou de pobreza, nem contratos nem sucessões, nem partilhas, nem ocupações além do ócio, nenhum respeito ao parentesco exceto o respeito mútuo, nem vestimentas, nem agricultura, nem metal, nem uso de vinho ou de trigo. As próprias palavras que significam mentira, traição, dissimulação, avareza, inveja, difamação, perdão são desconhecidas” (4).
Nosso autor relata em sua obra que tais informações sobre os indígenas brasileiros, no caso os tupinambás, teriam lhe sido narradas por um homem que havia morado no Novo Mundo por dez ou doze anos. Tudo indica que ele teve acesso, entre outras, às obras Singularidades da França Antártica, do abade e cosmógrafo André Thevet (5), e Viagem à terra do Brasil, do pastor Jean de Léry.
Importante destacar que as obras citadas lhe eram contemporâneas e seus autores, um católico e outro calvinista, se encontravam em lados opostos na guerra religiosa que incendiava a França do século 16. Tal guerra culminaria com a tristemente famosa Noite de São Bartolomeu de 1572, que desencadeou escaramuças em todo o país, ceifando milhares de vidas. Os franceses, desde o início do século 16, estiveram em contato com os indígenas na costa brasileira, com o objetivo de extrair o pau-brasil, a primeira riqueza a atrair navegantes e corsários. A tentativa de fundar a França Antárticana Baía da Guanabara e adjacências a partir de 1555 foi uma iniciativa que tinha por objetivo o estabelecimento de uma colônia permanente. A empreitada foi frustrada, pois, além da dura oposição militar dos portugueses, foi envolvida em lutas religiosas entre calvinistas e católicos, o que comprometeu seriamente sua unidade militar, favorecendo a vitória lusa.
Desde as primeiras viagens às Américas, os índios foram levados para além-mar, na condição de escravos ou troféus exóticos da “terra dos papagaios”. Um dos casos mais célebres foi o de Catharina Paraguassu, que se casou na cidade francesa de Saint-Malo, em 1528, com Diogo Álvares, o famoso Caramuru, náufrago português que morava entre os índios onde hoje se localiza a cidade de Salvador, na Bahia. Há farta mitologia sobre o casal, tido como a primeira união entre brancos e índios no país. Outro caso emblemático foi o de Essomericq, levado para a França pelo capitão Binot Paulmier, em 1504, do qual adotou o nome de família. Essomericqradicou-se no país e casou-se com uma natural. Ambientou-se de tal forma que um seu bisneto, o abade Jean de Paulmier, tornou-se cônego da Catedral de Lisieux. Nesse contexto é que foram levados para Rouen os cinquenta indígenas participantes da citada festa brasileira. A festa em si não é tratada por Montaigne, apenas o diálogo entre os índios e o rei Henrique II, ápice e corolário de seu ensaio que entraria para a história da filosofia.
A “entrada” à qual me referi foi um acontecimento que procurava reproduzir para os franceses o modo de viver dos indígenas, classificados pelo senso comum de “bárbaros” ou “selvagens” por seus hábitos e costumes. Guardadas as devidas proporções, promoveu uma espécie de escola de samba a evoluir um enredo. Na época já existiam numerosas descrições de seres e plantas do Novo Mundo, alguns monstruosos, que mesclavam fantasia e realidade, com origem em mitos e lendas da Antiguidade e do Medievo.
Dois deles se tornaram particularmente famosos: a ipupiara, cabeça e focinho de cão, seios femininos, mãos e braços humanos e patas de ave de rapina e as famosas amazonas, mulheres guerreiras de seios desnudos, já mencionadas desde Alexandre, o Grande.
Deixo a cargo do leitor a consulta a duas obras que descrevem com pormenores o acontecimento, por não ser esse o objetivo primeiro dessas anotações. A primeira delas é a de Ferdinand Denis, já citada. A segunda é o excepcional livro de Afonso Arinos de Melo Franco, O índio brasileiro e a Revolução Francesa,publicado em 1937 (6). Arinos realizou ampla e profunda pesquisa sobre a influência do índio brasileiro nas ideias do Iluminismo e da teoria da bondade natural, especialmente sobre Diderot e Rousseau e seus desdobramentos no ideário da Revolução Francesa. Livro de juventude, escrito aos 32 anos, figura como uma das obras mais importantes produzidas no país na primeira metade do século 20, malgrado sua ótica conservadora ao desenvolvimento de teorias calcadas no conceito de bondade natural dos indígenas, como por exemplo o marxismo, especialmente em sua crítica à propriedade privada.
Vários pensadores e filósofos antecederam Rousseau na formulação dos princípios da bondade natural e do mito do bom selvagem. Dentre eles, Thomas Morus, Erasmo de Roterdã, Montaigne e Diderot, apenas para citar os mais notórios. No entanto, coube a ele, especialmente em seus dois discursos – Sobre as ciências e as artes e Sobre as origens da desigualdade –, a síntese das ideias políticas que duas décadas depois influenciariam a Revolução Francesa, tendo como dístico os famosos princípios Igualdade, Liberdade e Fraternidade. Mais tarde, duas outras obras se somam às primeiras para consolidar sua doutrina política e filosófica: Do contrato social, sobre os paradigmas políticos que podem reconduzir o homem ao seu estado natural e assegurar a soberania política da vontade coletiva, e Emílio, no qual formula uma proposta pedagógica coerente com suas concepções.
Em várias passagens do Discurso sobre as origens da desigualdade, Rousseau qualifica o conceito de bondade natural. Selecionamos uma delas5 para, inclusive, destacar as similitudes com a citação de Montaigne:
“Ora, nada é mais meigo do que o homem em seu estado primitivo, quando, colocado pela natureza a igual distância da estupidez dos brutos e das luzes da sociedade civil, e compelido tanto pelo instinto quanto pela razão a defender-se do mal que o ameaça, é impedido pela piedade natural de fazer mal a alguém sem ser a isso levado por alguma coisa ou mesmo depois de ser atingido por algum mal. Porque, segundo o axioma do sábio Locke, não haveria afronta se não houvesse a propriedade” (7).
Pode-se dizer que as duas passagens fazem parte do mesmo discurso. Daí a longevidade das obras desses dois autores cuja influência sobre a filosofia, a literatura, a antropologia e a etnografia atravessou os séculos e alcançou os nossos dias. Registre-se que ambos se valeram dos relatos de Thevet, Léry e Staden, que, embora naturalmente se surpreendessem com os casos de canibalismo e outras práticas dos indígenas, reconheceram suas inúmeras qualidades e virtudes, como na seguinte passagem de Jean de Léry: “O que disse é apenas para mostrar que não merecemos louvor por condená-los austeramente, só porque sem pudor andam desnudos, pois os excedemos no vício oposto, no da superficialidade de vestuário” (8). O indígena se transfigura em selvagem, bárbaro, preguiçoso à medida que avança a colonização, quando passa a conviver com os portugueses e com aqueles, muitas vezes seus descendentes (mamelucos), que querem destruir seu mundo, subjugá-lo, subverter seus usos e costumes e roubar suas terras, como ainda vemos no Brasil de hoje.
A crítica, especialmente às ideias de Rousseau, advém em parte de seu comportamento exótico e de sua vida pessoal, dissociada de suas concepções, e de suas denúncias aos valores e instituições da civilização ocidental. Marilena Chauí, na introdução à edição brasileira do livro Do contrato social, nos esclarece:
“Se os abusos do estado social civilizado não o colocassem abaixo da vida primitiva, o homem deveria bendizer sem cessar o instante feliz que o arrancou para sempre da animalidade e fez de um ser estúpido e limitado uma criatura inteligente. O propósito visado por Rousseau é combater os abusos e não repudiar os mais altos valores humanos” (9).
O achado do livro deFerdinand Denis me levou a outros, guiado por um magnetismo em que o acaso e a curiosidade têm certa participação. Montaigne nos deu a chave da relevância do episódio e de sua oportunidade na atualidade brasileira. Ao final da festa, o rei convidou três dos indígenas para uma conversa. Falou-lhes por muito tempo sobre as excelências da cidade de Rouen e da festa em si. Perguntou-lhes, então, do que mais tinham gostado. Eles responderam em primeiro lugar que achavam estranho que tantos homens fortes e armados obedecessem a uma criança e que não escolhessem entre eles um igual para comandante Em segundo lugar, mostraram seu espanto e indignação em ver que, enquanto alguns estavam abarrotados de todas as comodidades e tinham mesa farta, outros estivessem pelas ruas da cidade reduzidos à fome e à pobreza. Concluíram com essas palavras o seu diálogo com o rei: “e achavam estranho como essas metades daqui, necessitadas, podiam suportar tal injustiça, que não pegassem os outros pela goela ou ateassem fogo em suas casas” (10).
Decorridos 466 anos da Festa Brasileirae 227 da Revolução Francesa, infelizmente ainda remanescem a desigualdade, a pobreza, a violência, o etnocentrismo, apesar da criação de instituições aparentemente democráticas, esforço permanente desde a Renascença e o Iluminismo. Estudos recentes realizados na Itália, abarcando o período de 1427 a 2011, e na Inglaterra, de 1170 a 2012, a partir de censos e declarações de renda entre outras fontes, concluíram que os sobrenomes dos mais ricos e dos mais pobres não haviam se alterado. Guardadas possíveis imprecisões e distorções, esses estudos constituem indicativo de que o dinheiro não mudou de mãos, a par de avanços na educação e na saúde e na proteção ao trabalho. Gregory Clark e Neil Cummins, da London School of Economics, revelam que as universidades mais famosas do país, como Oxford e Cambridge, são quase que exclusivas dos mais ricos, mantendo uma elevada seletividade mesmo com ampliação das possibilidades de acesso. Segundo Neil Cummin:
“Essa correlação é inalterada ao longo dos séculos. Ainda mais notável é a falta de um sinal de qualquer declínio na persistência de status social durante períodos de mudanças institucionais, como a Revolução Industrial do século XVIII, a disseminação da escolarização universal no final do século XIX (no Brasil só a atingimos na 2ª década do século XXI), ou a ascensão do estado socialdemocrata no século XX” (11).
Thomas Piketty, em seu livro O capital no século XXI, lançado em 2014, causou furor, e às vezes críticas azedas, ao constatar a progressão da desigualdade. Ele analisa em profundidade a dinâmica de acumulação do capital e sua evolução em longo prazo, bem como a distribuição da renda entre o capital e o trabalho, em um período de três séculos, em vinte países. Na introdução de seu livro, afirma:
“O crescimento econômico moderno e a difusão do conhecimento tornaram possível evitar o apocalipse marxista, mas não modificaram as estruturas profundas do capital e da desigualdade – ou pelo menos não tanto quanto se imaginava nas décadas otimistas pós-Segunda Guerra Mundial. Quando a taxa de remuneração do capital ultrapassa a taxa de crescimento da produção e da renda, como ocorreu no século XIX e parece provável que volte a ocorrer no século XXI (caso brasileiro), o capitalismo produz automaticamente desigualdades insustentáveis, arbitrárias, que ameaçam de maneira radical os valores da meritocracia sobre os quais se fundam nossas sociedades democráticas” (12).
É exatamente isso o que está acontecendo no Brasil. Há sério risco de desmonte da política de recuperação dos salários, de ampliação dos direitos trabalhistas e dos benefícios sociais que, entre 2001 e 2013, reduziu o percentual de brasileiros que vivem em extrema pobreza de 10% para 4%. Mais: 25 milhões de pessoas saíram da pobreza extrema ou moderada no mesmo período. Saímos do malfadado mapa mundial da fome. É o que diz o relatório de abril de 2015 do insuspeito Banco Mundial, Prosperidade compartilhada e erradicação da pobreza na América Latina e Caribe (13). Refletindo sobre a crise política, institucional e moral na qual o país está imerso – na ineficácia e porque não falar na anomia de suas instituições, na instabilidade da economia, nos milhões de empregos perdidos, no retrocesso das conquistas sociais e políticas das últimas décadas, na corrupção e impunidade, exclamo: ainda temos muito a aprender com a bondade natural e o “bom selvagem”!
Notas
(1) Registro de Lévi-Strauss sobre relato de índios guianenses. In LÉVI-STRAUSS, Claude. O cru e o cozido. São Paulo, Cosac Naify, 2010, p. 320.
(2) DENIS, Ferdinand. Uma festa brasileira celebrada em Ruão em 1550. Brasília: Senado Federal, 2011, p. 38. Ver também JONES, Colin. Paris, biografia de uma cidade. 5 ed. Porto Alegre: L&PM, 2013, p.129-130.
(3) MONTAIGNE, Michel. Os ensaios: uma seleção. São Paulo: Companhia das Letras, 2010, 146.
(4) FRANCO, Afonso Arinos de Melo. O índio brasileiro e a Revolução Francesa: as origens brasileiras da teoria da bondade natural. 2 ed. Rio de Janeiro: J. Olympio; Brasília: INL, 1976, 48.
(5) ROUSSEAU, Jean-Jacques. Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens. São Paulo: Nova Cultural, 2000, p. 93, volume II.
(6) LÉRY, Jean de. Viagem à terra do Brasil. Belo Horizonte: Itatiaia, 2007, p. 121.
(7) CHAUÍ, Marilena. Introdução a Rousseau. In: Coleção Os Pensadores – Rousseau, volume I. São Paulo: Nova Cultural, 2000, p. 13.
(8) MONTAIGNE, Michel. Os ensaios: uma seleção. São Paulo: Companhia das Letras, 2010, p.157.
(9) CLARK, Gregory e CUMMINS, Neil. Desigualdade: estudos sobre as famílias ricas mostram que os pobres são os mesmo de sempre. Disponível em: www.diariodocentrodomundo.com.br. Acesso em 14 jul. 2016.
(10) PIKETTY, Thomas. O capital no século XXI. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2014.
(11) CLARK, Gregory; CUMMINS, Neil. Apud DONATO, Mauro. Desigualdade: estudos sobre as famílias ricas mostram que os pobres são os mesmo de sempre. São Paulo, Diário do Centro do Mundo, 13 jul. 2016 <www.diariodocentrodomundo.com.br/desigualdade-estudos-sobre-as-familias-ricas-mostram-que-os-pobres-sao-os-mesmos-de-sempre-por-donato>. Acesso em 14 jul. 2016.
(12) PIKETTY, Thomas. O capital no século XXI. Rio de Janeiro, Intrínseca, 2014.
(13) CORD, Louise; GENONI, Maria Eugenia; RODRÍGUEZ-CASTELÁN, Carlos (org.). Shared Prosperity and Poverty Eradication in Latin America and the Caribbean. Washington, World Bank Group, 2015 <www.resbr.net.br/wp-content/uploads/2015/05/Shared.pdf>.
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sobre o autor
Luiz Philippe Peres Torelly é arquiteto e urbanista pela Universidade de Brasília em 1979. É especialista em gestão de políticas públicaspelo IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, e em Planejamento Urbano pela CAPES/CNDU. Cumpriu créditos do curso de mestrado em Planejamento Urbano pela Universidade de Brasília. Trabalhou em diversas instituições públicas voltadas para as questões habitacionais, urbanísticas, de planejamento urbano e regional e preservação do Patrimônio Cultural: Banco Nacional da Habitação, Conselho Nacional de Desenvolvimento Urbano, Caixa Econômica Federal, Instituto de Planejamento Territorial e Urbano do DF (diretor presidente), Secretaria de Habitação e Desenvolvimento Urbano do DF (secretário), Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (diretor de Promoção do Patrimônio Cultural 2007/2009 e diretor de articulação e fomento (2013/2016). Foi eleito o Arquiteto do Ano de 2015, na categoria setor público pela Federação Nacional dos Arquitetos.
Vera Magalhães: Boçalidade contagiosa
Mais que o vírus, é o comportamento indigno do presidente que se alastra
As pesquisas divulgadas no fim de semana pelo Datafolha pintam um cenário tão desanimador quanto a nossa absoluta ausência de estratégia para uma campanha de vacinação eficaz contra o novo coronavírus: elas mostram que boa parte da sociedade brasileira foi inoculada pela boçalidade de Jair Bolsonaro, e que ela se alastra por terrenos perigosos e dá a esse presidente, o pior da República, uma resiliência inacreditável num cenário de mortes e crise econômica.
O presidente, com seu comportamento indigno da cadeira que ocupa, voltou a dizer nesta terça-feira que não se vacinará contra o novo coronavírus.
Como tantas vezes tem feito nos últimos dois anos, novamente se comportou como um inconsequente, ao promover aglomerações na Ceagesp e instar uma criança a tirar a máscara para ser compreendida, e mostrou o ridículo de que é feito ao se enfurnar no meio da bandinha da Polícia Militar do Estado de São Paulo, numa pose ridícula de prefeito de Sucupira.
Esse tipo de postura se impregnou em setores da sociedade de forma mais deletéria do que poderíamos imaginar antes da pandemia. No Brasil, movimentos antivacina nunca tiveram grande aderência, mas com Bolsonaro até isso vai sendo corroído.
A pesquisa Datafolha mostra que são 22% os que dizem que não pretendem se vacinar. Eram 9% em agosto! Entre os que dizem confiar em Bolsonaro, esse índice vai a 33%. E os que dizem que não aceitariam se vacinar com imunizante chinês são 47%.
É impressionante a adesão de uma parcela imensa dos brasileiros à desinformação absoluta em relação às vacinas, praticada de forma deliberada e estudada pelo presidente e por seus asseclas.
Isso no momento em que o País já vive uma segunda onda de contágio pelo SarsCov2e não tem perspectiva de receber vacinas que não sejam a Coronavac, produzida pelo Butantã, pelo fato de Bolsonaro e seu ministro da Saúde, o inepto general Eduardo Pazuello, não terem feito seu trabalho.
Combinado com os outros dados da pesquisa, que mostram aprovação de 37% dos brasileiros a Bolsonaro e que 44% livram o presidente de culpa pela má condução do combate à pandemia, temos um cenário desolador em que vamos ficar no fim da fila da vacina sem que a população exija de forma altiva o seu direito a ser vacinada para que o País comece a superar a maior epidemia que o atingiu desde 1918!
Trata-se de uma corrosão muito rápida e profunda dos valores que guiam a vida em sociedade — entre os quais a constatação, que deveria ser óbvia, de que a vacinação é um direito, sim, mas também um dever de um indivíduo em relação à coletividade e à saúde pública.
A completa falta de preocupação de Bolsonaro com as mais de 181 mil mortes de brasileirose sua incapacidade de recomendar àqueles que governa qualquer conduta que não seja individualista, egoísta e baseada numa visão estreita e mesquinha de mundo vão moldando o pensamento de uma parcela do povo brasileiro à imagem e semelhança do capitão. E sua imagem é a de alguém que banaliza a vida.
Diante de tal estado de apatia combinada com cinismo cabe como último recurso contar com o funcionamento ainda que precário das instituições. Hoje o Supremo Tribunal Federal terá a chance de colocar nos trilhos o Plano Nacional de Imunizaçãoindigente divulgado pelo general Pazuello, e estabelecer regras para que sim, a vacinação (quando houver vacina) seja obrigatória para matrícula e frequência em escolas, viagens de avião, inscrição em concursos, frequência em academias de ginástica etc.
Porque só esperar o bom senso dos brasileiros, como mostram as pesquisas e as cenas de aglomeração em várias cidades e as promovidas pelo presidente, não será suficiente.
Rosângela Bittar: Depois da meia-noite
Rumo à reeleição, afloram os piores instintos políticos. A busca por adesões excita os currais
Para quem não está entendendo o sucesso da plataforma eleitoral antipovo do candidato Arthur Lira à presidência da Câmara, inclusive com o embarque da esquerda na caravana bolsonarista, aqui vai uma explicação. O deputado alagoano e suas costas quentes exploram muito bem, pois a conhecem profundamente, a oportunidade que o calendário oferece.
O tempo do Congresso se divide em dois. No primeiro, os dois anos iniciais do mandato, procuram-se realizar os avanços e as reformas. No segundo biênio, o bom senso dá lugar ao vale-tudo da renovação dos mandatos. Quando coincide com a campanha da reeleição também do presidente da República, a confluência de interesses chega ao paroxismo. É o que está se vendo neste momento.
Deputados e senadores só pensam em poder, emendas e cargos que os ajudem eleitoralmente. No Senado, os prazos são outros, pois o mandato é de oito anos, mas a essência é a mesma.
O ex-deputado e ex-ministro Roberto Brant, com sabedoria mineira, costumava comparar o que ali se passava com as diferentes etapas de uma festa: até a metade, os convidados mantêm a compostura e a elegância, conservam o glamour das novas ideias que trouxeram de casa. Mas, ao bater a meia-noite, tendem ao desespero. Jogam para o ar o que tinham de melhor e partem para o uso e o abuso.
Rumo à reeleição, afloram os piores instintos políticos. A busca por adesões excita os currais. Principalmente se quem vai exercer o poder o faz em nome do presidente da República.
Avanços políticos, alguns verdadeiramente civilizatórios, como foi a extinção do imposto sindical, voltam à mesa de negociação com cínica naturalidade. Celebrado no passado como novo sindicalismo, tal como Jair Bolsonaro foi celebrado como nova política, o malfadado imposto foi reprovado com amplo apoio popular. Para os que dele viviam, os chamados pelegos, a extinção teria sido a razão do enfraquecimento dos sindicatos. Raciocínio que é uma impostura. Sem ele, os sindicatos ganharam autenticidade. Ao associar-se ao projeto, a esquerda atinge o trabalhador em uma de suas mais difíceis conquistas.
Na cabala de votos, sobretudo do PT, o candidato bolsonarista se solidariza também com o período do uso da Petrobrás na montagem de um extenso esquema de corrupção. Acena com a facilitação da volta da candidatura Lula por intermédio da desmoralização da Operação Lava Jato, já abalada por certos equívocos dos principais condutores das investigações. Momento em que os extremos se encontram. Todos deliram na mesma farra eleitoral embora saibam que, Lula, candidato, nunca mais.
Incluiu-se na barganha temática um tranco na Lei da Ficha Limpa, outro avanço com apoio popular prestes a ser perdido. O candidato bolsonarista promete atenuar a lei, quem sabe, abrindo uma janela de fuga. As lacunas são conhecidas, entre elas uma das piores é o poder de juízes locais de fustigar os inimigos políticos com um peteleco jurídico, mas não é nesta circunstância que a discussão será justa e eficiente.
De posse da chave do cofre do governo nesta campanha, o candidato bolsonarista à presidência da Câmara promete reabastecê-lo de recursos, com a aprovação da também defenestrada CPMF. Uma regressão em proporções nunca vistas, camuflada pela infamante versão de que o único obstáculo ao absurdo imposto sobre transações era um capricho do atual presidente da Câmara. O fantasma da meia-noite da virada do mandato vestiu, com isso, sua máscara. A Câmara inteira era aliada da sociedade, contra o imposto. Não se sabe como será agora.
Se ficar a serviço deste projeto de poder, o Congresso deixa de ser proteção para ser ameaça. Pode-se prever o quadro de desequilíbrio que vem por aí. A economia, mal; a recuperação, incerta; o desemprego, subindo; o isolamento internacional, absoluto; o Congresso, servil. Para a sociedade, perplexa, nega-se até a vacina contra a morte.
Cristiano Romero: Não há dinheiro para o auxílio emergencial?
Subsídios a grupos consumiram 21,37% da receita em 2019
O país se aproxima de mais uma tragédia anunciada _ o fim do pagamento do auxílio emergencial _ e o que mais se ouve em Brasília é que faltam recursos para bancar a despesa. Diante da pandemia, cujo número de casos e mortes voltou a crescer, trata-se de viabilizar ajuda humanitária a pelo menos 23 milhões de pessoas que, daqui a duas semanas, não terão mais direito a receber um centavo do governo federal.
O governo federal, com a ajuda do Congresso Nacional, reagiu rapidamente à primeira onda da pandemia. O Banco Central foi célere na garantia de liquidez para o sistema financeiro e as grandes empresas. Já centenas de milhares de pequenas e médias firmas sucumbiram, principalmente no setor de serviços, porque a ajuda _ modesta _ demorou a chegar e beneficiou a poucos. Dentro e fora do governo isso foi visto _ e defendido _ como algo inevitável.
Na economia informal, onde atua cerca de metade da força de trabalho do país, a ajuda poderia ter evitado o que se vê neste momento nos grandes centros urbanos: o aumento exponencial dos moradores de rua, cidadãos que se afastam de suas família por vergonha (de não ter emprego) e que não depositam mais nenhuma esperança na própria vida nem no país onde nasceram. Chegar até os informais teria sido muito mais fácil se o Ministério da Economia tivesse acolhido proposta do BC de alcançar esse público por meio das empresas de maquininha.
Trabalhadores que atuam na informalidade correm enorme de risco de mergulhar na miséria absoluta quando sobrevêm crises como a atual. Eles se tornam vulneráveis de forma muito rápida, justamente, por não gozarem dos benefícios assegurados aos trabalhadores regidos pela CLT. A pandemia paralisou subitamente o comércio em geral e colocou nas ruas milhões de pessoas. Estas sequer conhecem seus direitos porque, em geral, morrem antes de completar 65 anos, idade que assegura a brasileiros em situação de indigência requerer do Estado um salário mínimo mensal por meio do programa Benefício de Prestação Continuada (BPC).
Os cidadãos que fazem das ruas sua morada em momentos como este são, aos olhos não das leis mas sim dos governantes, os invisíveis. Em São Paulo, os moradores de rua fazem parte da paisagem, para a maioria dos transeuntes, como se isso fosse obrigatório, uma espécie de lei da natureza que escolhe os mais fortes entre nós e almadiçoa os fracos, uma predestinação "social" de seres que, por "livre arbítrio", optaram por não estudar e, por essa razão, merecem estar ali, mais vulneráveis do qualquer um de nós à ação implacável do tempo e à violência que campeia nos grandes centros urbanos.
O titular desta coluna conversou com um mendigo que, empurrando uma carroça e acompanhado obedientemente por nove cachorros (a maioria, abandonada à própria sorte nas ruas, como seu "dono"), esperava na porta de uma restaurante caixas de papelão que asseguravam parte de seu sustento. Ele contou que seu destino mudou radicalmente após o advento do Plano Collor, em 1990. A indústria onde trabalhava, fabricante de tintas, não sobreviveu à recessão provocada pelo confisco.
Desempregado aos 26 anos, o rapaz, originário de Minas Gerais, tentou se recolocar no mercado de trabalho nos quatro anos seguintes. O que mais ouviu foi que não havia vagas e que ele já estava "velho" para ser contratado. Em 1994, o ano de lançamento do Plano Real, ele desistiu de procurar emprego e de morar de favor na casa de amigos e conhecidos. Tornou-se, então, habitante das ruas da então 3ª metrópole do mundo. Não deu mais notícia à família, afastou-se dos amigos, porque, para ele e a maioria dos trabalhadores, vergonhoso não é ganhar pouco, mas, não trabalhar.
Indagado sobre a existência do BPC, que a esta altura de sua vida poderia ser um alento para a sua sobrevivência, nosso entrevistado disse que nunca ouvira falar, duvidou de "tamanha bondade" do governo, mas, antes de assoviar para os cachorros e bater em retirada, fez uma pergunta: "Doutor, é preciso ter quantos anos para ganhar esse BP, como é que é mesmo, BPC?". "Sessenta e cinco." "Ah, doutor, eu tenho só 57", disse gargalhando o homem, cuja aparência remetia facilmemente a alguém com mais de 70 anos.
O auxílio emergencial destinado aos brasileiros em situação mais vulnerável nesta pandemia foi instituído em pouco tempo, embora caiba aqui observação: ao escolher o público do programa Bolsa Família (BF) _ cerca de 44 milhões de pessoas _ como o mais elegível, governo e parlamento agiram com um olhar mais na política do que no bem-estar da maioria. Os beneficiários do BF já recebiam seus pagamentos, ainda que a um valor (R$ 150 em média por pessoa) que realmente precisava ser reajustado.
O auxílio foi definido em R$ 600 para o período entre abril e agosto, e de R$ 300 de setembro a dezembro. Além do público do BF, outras 23 milhões de pessoas teriam acessado o auxílio. A partir de janeiro, o pessoal do BF volta a receber R$ 150 e os outros, nada.
Falta dinheiro? Leitor, quando lhe disserem isso, olhe os números do orçamento de perto. O que se vê é que, apenas no ano passado, a União deixou de arrecadar R$ 308 bilhões e, em 2020, R$ 320 bilhões em tributos e impostos federais (ver gráfico). Esta fortuna foi apropriada pelos grupos de interesse específico mais bem representados em Brasília, entre eles, a indústria automobilística, os grandes grupos privados de educação e saúde e as classes média e alta.
Fernando Exman: Ano se arrasta e já avança sobre 2021
Bolsonaro simplesmente não fará campanha em 2020 onde sua palavra não virar lei
Dois mil e vinte, o ano que insiste em não acabar, é perseverante e espaçoso. Já avança sobre o calendário de 2021, sem cerimônia. O Ano Novo começará com jeito de velho, com pouco dinheiro nos bolsos, sem saúde para dar e muito menos vender. Bastante do que poderia ter sido feito há meses ficou para a última hora, uma tradição da política nacional que poderia ter sido deixada de lado desta vez por causa da pandemia.
Bastaria bom senso da maioria das autoridades dos diversos Poderes. No entanto, em Brasília ainda se discute se a maior emergência sanitária dos últimos tempos é ou não uma justificativa plausível para a prorrogação dos trabalhos durante o recesso. Sem uma convocação, diversas tarefas urgentes serão redistribuídas entre as folhinhas de fevereiro, março e até abril. Pouco tempo depois, só se falará nas próximas eleições gerais.
Neste melancólico fim de ano legislativo, tudo indica que a disputa política e a desorganização do governo devem seguir travando a agenda de 2021. Está difícil de se prever, infelizmente, um grande esforço nacional voltado à construção de um plano de saída da crise.
O Orçamento, por exemplo, ganha forma num ritmo muito lento. Se no Brasil a peça orçamentária já era considerada uma obra de ficção, desprovida de previsibilidade a respeito de suas premissas e execução, o Orçamento de 2021 ainda não passa de um esboço de roteiro. Dificilmente será reestruturado antes das eleições para as presidências das mesas diretoras do Congresso, até porque o comando da Comissão Mista de Orçamento, objeto de disputa feroz entre os grupos que brigam pelo controle da Câmara, está em negociação. Diversos partidos querem ter o poder de conduzir o colegiado onde se debaterá o Orçamento do período pré-eleitoral.
Esperada para esta semana, a votação do projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias também depende de um melhor ambiente político. Isso porque a LDO é vista como um instrumento fundamental por quem deseja o mínimo de segurança jurídica para ordenar despesas e investimentos nos primeiros meses do próximo ano. Sua possível não aprovação, por outro lado, já começa a ser considerada no Legislativo como a oportunidade que a ala desenvolvimentista do Executivo tanto esperava para conseguir gastar mais. Mesmo que isso represente um risco ao governo e precise ser discutido depois, para evitar punições ou problemas com os órgãos de controle.
No Congresso, cresce a preocupação de que a inexistência da LDO, ou seja, a ausência de diretrizes e regras mínimas para o Orçamento de 2021, poderia até artificialmente criar uma brecha para a prorrogação do auxílio emergencial a partir de janeiro, quando está previsto o fim da ajuda do governo federal à parcela mais pobre da população.
É indiscutível o papel desempenhado pelo auxílio emergencial na manutenção da popularidade do presidente Jair Bolsonaro durante a pandemia. Parece ter colado o seu discurso de que o governo federal não pode ser responsabilizado pelo número de vítimas, que, inclusive, não para de crescer.
No fim de ano sempre há espaço para arrependimentos. Entre parlamentares independentes e da oposição, o incômodo se dá com a sensação de que o Legislativo poderia ter adotado ações mais objetivas para tentar responsabilizar o presidente, a despeito da falta de um clamor pela abertura de um processo de impeachment.
Bolsonaro continua relativamente popular e tem chances de ampliar esses níveis de aprovação, dependendo do desempenho da economia, o que lhe garantiria um lugar privilegiado na campanha à reeleição.
Dados coletados pelo governo sobre as insatisfações da população durante a pandemia também não geram preocupação entre auxiliares de Bolsonaro. Segundo um desses levantamentos, por exemplo, existe um número considerável de reclamações e denúncias relativas à concessão do auxílio emergencial, além de queixas sobre a adoção da medida que permitiu a redução de jornadas e salários no setor privado e acerca do tratamento dos passageiros das companhias aéreas.
Chegam à Controladoria-Geral da União (CGU) reclamações da atuação do Estado como um todo e em relação à suspensão das aulas presenciais. O governo recebe críticas sobre a demora na vacinação e o desrespeito às recomendações de distanciamento social, mas são poucas as denúncias de supostos desvios ou corrupção. Além disso, estas englobam os diversos entes da federação. O fato é que, até agora, a administração federal tem conseguido preservar sua imagem, enquanto a cada semana uma nova operação policial envolvendo a aplicação dos recursos para combater a covid-19 é realizada nos Estados.
Isso impõe à oposição e a parlamentares independentes uma estratégia que mescla uma postura defensiva com alternativas de ataque.
Na parte defensiva, a ideia é impedir que medidas heterodoxas prorroguem algum tipo de ajuda emergencial à margem das normas fiscais. Já o ataque se daria com a possível instalação, no ano que vem, de pelo menos uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para apontar responsabilidades no atraso na implementação do programa nacional de imunização, por exemplo. A ideia seria pelo menos desgastar o presidente.
A iniciativa ainda não tem muito apoio entre os governadores. Eles preferem que se gaste tempo e energia na discussão de propostas que busquem aumentar a capacidade de investimento, a oferta de crédito e impulsionem parcerias público-privadas (PPPs). Eles reclamam que falta diálogo com o Ministério da Economia e querem retomar o mais rápido possível as reuniões convocadas para tratar de temas positivos. Preferem que o Congresso não crie obstáculos para a reorganização da economia. Isso depende também, claro, do governo e de sua base. Caso contrário, 2021 ficará com a cara de 2020 durante muitos meses.
Elio Gaspari: Bolsonaro e Mourão mostram o caos
O general e o capitão tiveram posições diferentes, mas fazem parte do mesmo pandemônio
Pelos mais diversos motivos, 57 milhões de pessoas votaram em Jair Bolsonaro. O general da reserva Hamilton Mourão fez mais que isso, aceitando ser o seu vice-presidente. Hoje os dois mal se falam e não se ouvem.Mourão tinha grandes expectativas para si e para o governo. Nas suas palavras:-- Eu me vejo como um assessor qualificado do presidente, um homem próximo ali, junto dele, dentro do Planalto, ali do lado dele, nossas salas serão juntas. Não seremos duas figuras distantes, como já aconteceu, um para o lado e o outro para o outro lado. Aquelas reuniões que ocorrem ali, eu estarei presente.Ou ainda:-- Posso atender à necessidade de coordenar trabalhos que sejam interministeriais. Ele pode me delegar essa tarefa. Por exemplo, em projetos de infraestrutura, de parceria público-privada, coisas que a gente tenha algum conhecimento.
Deu em nada. Hoje, Mourão reconhece que "faz algum tempo" que não conversa em particular com Bolsonaro. Era apenas ilusão de um general ajudando a campanha do capitão. Mourão sempre soube onde se metia.
O grande Stanislaw Ponte Preta ensinou que o vice-presidente acorda mais cedo para ficar mais tempo sem fazer nada. Marco Maciel (vice de FHC) e José Alencar (vice de Lula) seguiram a lição, cada um à sua maneira.
Mourão agora revela que está "pronto para acompanhar Bolsonaro caso ele deseje e vá ser candidato em 2022, porque tudo é possível daqui para lá".
Tudo é possível, mas com recessão, uma pandemia e tanta maluquice solta por aí, o que o país menos precisa é de uma crise entre o presidente e seu vice. Michel Temer detonou Dilma Rousseff, mas sua origem e força política estavam no Congresso. Mourão veio da caserna e, como muitos militares, entrou numa campanha e caiu num governo que pouco tem a ver com o que esperava. O general Eduardo Pazuello não sabia o real tamanho da encrenca em que se meteria. Militar, ele é capaz de achar que manda em quem o ouve e obedece ao que determina o presidente. Melhor destino teve o paisano Nelson Teich, que aceitou o ministério da Saúde e foi-se embora 28 dias depois, salvando sua biografia de médico.Tudo é sempre possível, mas há o tudo indesejável. O capitão Bolsonaro governa criando conflitos.Sua última proeza foi a construção de uma briga sanitária que, se não for aplacada, caminha para um desfecho desfavorável ao Planalto no Supremo Tribunal Federal. Supremo esse no qual ele já achou que poderia "intervir".
O vice-presidente tornou-se um personagem secundário nessa usina de conflitos, mas é parte dela. Bolsonaro pode ter exagerado quando disse que "Mourão é mais tosco do que eu", mas os dois se conhecem melhor do que a maioria das pessoas que votou neles.
Em dois anos de coabitação palaciana, o general e o capitão tiveram algumas posições diferentes mas, no essencial, fazem parte do mesmo pandemônio. Bolsonaro não fez de Hamilton Mourão um "assessor qualificado" e o general deslizou para uma condição de eventual contraponto.
Como ensinou o poeta, no vasto mundo das confusões de Bolsonaro, se ele se chamasse Raimundo, seria uma rima, não seria uma solução.
Ruy Castro: Pazuello já merece uma biografia
Da gerência das cuecas do quartel à morte de, em breve, 200 mil brasileiros
Aos 57 anos, o general Eduardo Pazuello, militar de carreira e ministro da Saúde do governo Bolsonaro por carreirismo, nunca imaginou que, um dia, fosse merecer uma biografia. Oficiais da Intendência do Exército, como ele, não têm muitas ocasiões para usar a espada exceto no dia 7 de setembro. Sua função é prover o suprimento do quartel —aviar a merenda da tropa, supervisionar a lavagem das fardas, manter os mictórios em condições e cuidar da manutenção dos pára-quedas. E também vigiar os transportes de munição, cuidando para que não haja desvio de cartuchos pelo caminho.
Até há pouco, o único episódio na trajetória de Pazuello que poderia justificar uma referência foi quando, em 2005, ao dirigir o Depósito Central de Munição, em Brasília, puniu um soldado sob seu comando, obrigando-o a puxar uma carroça, atrelado a ela por arreios, como uma mula, e transportando um colega na presença dos companheiros. Pazuello era tenente-coronel, mas isso não turvou sua escalada ao generalato.
Ao ser convocado por Jair Bolsonaro para substituir um médico na direção do Ministério da Saúde no meio de uma pandemia, Pazuello tinha duas opções: recusar o convite, alegando incompetência para o cargo e certeza de comprometer a saúde nacional, ou aceitá-lo e ter de mentir, omitir-se e errar perversamente no combate ao vírus. Escolheu a segunda. Ou delirou, achando que daria conta da tarefa, ou dispôs-se a babar e se humilhar para servir ao capitão. Pelo que se vê, vale também a segunda hipótese.
Pazuello na saúde é mais absurdo do que um médico comandando a lavagem das cuecas do quartel. É mais letal. Recebeu o cargo com 15 mil mortos pela Covid e logo nos entregará 200 mil. É injusto chamá-lo de palerma, como fazem. Mais exato será cobrar sua cumplicidade no extermínio promovido por seu chefe.
Pazuello já merece uma biografia. A ser lida sob revolta e náuseas.
Bruno Boghossian: Bolsonaro pede que governo divulgue perigos de vacinas contra a Covid
Uso da máquina em campanha contra imunização aumenta responsabilidade por mortes na pandemia
Jair Bolsonaro trabalha para que o governo faça uma campanha oficial contra a vacinação do coronavírus. Em entrevista à Band, o presidente revelou ter pedido ao ministro da Saúde que comece "a mostrar o que seria a bula desse medicamento". Em vez de garantir um processo seguro, ele quer que as autoridades digam que a imunização é perigosa.
"Lá no meio dessa bula está escrito que a empresa não se responsabiliza por qualquer efeito colateral. Isso acende uma luz amarela. A gente começa a perguntar para o povo: você vai tomar essa vacina?", declarou.
Além de abastecer a desconfiança da população e alimentar teorias conspiratórias em discursos públicos, o presidente acionou também a máquina do governo em sua cruzada contra a imunização. Se alguém tinha dificuldades para enxergar a responsabilidade direta de Bolsonaro pelo morticínio na pandemia, não é preciso perder mais tempo.
Enquanto se empenha para desestimular a imunização, o presidente tenta empurrar medicamentos sem eficácia comprovada, como a cloroquina. "Eu não sou contra a vacina, mas sou plenamente favorável a esse tratamento preventivo que a gente tem no Brasil", afirmou, na entrevista desta terça-feira (15).
Bolsonaro também disse que o governo vai determinar que cada brasileiro assine um termo de responsabilidade ao receber o imunizante. Ele só não disse que é preciso fazer o mesmo para receber cloroquina. O texto alerta que o medicamento pode causar disfunção cardíaca e que não há provas de que ele funcione.
Quando a morte de um voluntário forçou a interrupção nos testes da Coronavac em São Paulo, o presidente comemorou: "Mais uma que Jair Bolsonaro ganha". Se as vacinas desenvolvidas até aqui se mostrarem seguras, cada cidadão que recusar o imunizante também poderá ser incluído em sua conta.
Desde agosto, o percentual de brasileiros que não querem se vacinar subiu de 9% para 22%. São 46 milhões de pessoas que podem sofrer com a doença ou espalhar o vírus.
Hélio Schwartsman: Como deve ser a fila da vacina?
Pode-se priorizar os mais vulneráveis ou buscar o máximo de proteção coletiva
A epidemiologia é uma ciência firmemente calcada na matemática, mas que não trabalha bem com a conceituação binária certo e errado. A razão do paradoxo é que é grande a interface entre epidemiologia e ética, e esta, apesar dos esforços de certas correntes filosóficas, resiste à matematização.
O problema fica escancarado agora, quando países definem os grupos prioritários para a vacinação contra a Covid-19. Existem duas lógicas a orientar as decisões. Pode-se tanto dar primazia aos mais vulneráveis como procurar extrair o máximo de proteção coletiva de cada dose aplicada. Nada impede a criação de um sistema híbrido, que combine as duas.
Pelo primeiro critério, ganham dianteira na fila idosos, portadores de doenças que agravam a Covid-19, populações institucionalizadas, indígenas etc. Pelo segundo, a prioridade deve ser dada a indivíduos que, mesmo sem correr grande risco pessoal, desempenham funções essenciais e lidam como muita gente, o que os torna elos importantes na cadeia de transmissão: profissionais de saúde, policiais, certos comerciários, motoristas de coletivos, entregadores etc.
Como tudo é novo com essa doença, estamos fazendo as escolhas meio no escuro. Se as vacinas previnem a infecção e não só quadros sintomáticos, teríamos um motivo adicional para enfatizar a segunda estratégia. Se elas não funcionam tão bem com idosos, um efeito esperado, a melhor forma de proteger essa população pode ser imunizando não o indivíduo diretamente, mas as pessoas que se relacionam com ele.
Para tornar tudo mais complicado, há o problema dos "free riders", a turma que quer furar fila. Critérios como idade são relativamente fáceis de controlar. Já os que dependem de autodeclaração (sou motoboy) podem gerar confusão.
Aqui não há certo e errado, mas escolhas diferentes. Só o que é definitivamente errado é menosprezar a vacinação, como fazem alguns governantes.
Bernardo Mello Franco: O ralo da educação
O Senado fechou ontem um ralo que ameaçava sugar R$ 12,8 bilhões por ano da educação pública. O dinheiro pertence ao Fundeb, o fundo de apoio ao ensino básico. Na quinta passada, a Câmara abriu um dreno para direcioná-lo a escolas filantrópicas, confessionais ou comunitárias.
O contrabando foi patrocinado pela bancada evangélica. Coube à deputada Soraya Santos propor a mudança no texto original do Fundeb. A alteração foi aprovada com aval do governo, interessado no apoio das igrejas.
O bolsonarismo prometia combater a doutrinação política nas salas de aula. Era conversa fiada para perseguir professores e abrir caminho à doutrinação religiosa. As igrejas já contam com a isenção de impostos. Com a emenda aprovada na Câmara, passariam a receber repasses dos cofres públicos, numa afronta à laicidade do Estado.
“Existe um empenho para ampliar as escolas confessionais no Brasil. Isso está ligado às eleições de 2022 e ao aumento da influência das igrejas na política”, observa a presidente-executiva do Todos pela Educação, Priscila Cruz.
Ontem senadores usaram termos menos diplomáticos para descrever a manobra da Câmara. Rose de Freitas falou em “armação vergonhosa”. Paulo Paim classificou a emenda como um “golpe sem precedentes contra a escola pública”.
O Senado também fechou o ralo que ameaçava drenar dinheiro para escolas ligadas ao Sistema S. Até o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, admitiu que os colegas foram “longe demais” ao aprovar a ideia. “Daqui a pouco você vai ter uma redução de recurso público para escola pública”, afirmou, numa conclusão de fazer inveja ao Conselheiro Acácio.
A pandemia aprofundou as desigualdades na educação brasileira. Enquanto as escolas particulares se organizaram para oferecer aulas remotas, as públicas sofreram com a falta de infraestrutura e com a paralisia do MEC. A pasta já teve três titulares desde junho. O atual, que deveria proteger o Fundeb do proselitismo religioso, é pastor da Igreja Presbiteriana.
Ricardo Noblat: Bolsonaro descumpre a Constituição que jurou respeitar
Comportamento criminoso
Jair Messias Bolsonaro tem o direito de comportar-se como um suicida diante da pandemia que matou mais de 182 mil pessoas no Brasil desde março último. A vida é sua e ele faz com ela o que quiser. Mas nem ele e nem ninguém tem o direito de pôr em risco a vida alheia por não dar valor à sua ou porque se julga imortal.
Direito à opinião todo mundo tem. Bolsonaro e seus devotos de raiz, por exemplo, acreditam que a Covid-19 é um vírus criado em laboratório e posto a circular pelo mundo para servir aos interesses geopolíticos da China. Direito a fatos ninguém tem. Fatos são verdades provadas, comprovadas e inquestionáveis.
Repete o presidente que sua saúde é de atleta. De fato, foi de atleta quando ele se destacava nos quartéis por correr a grande velocidade. Ganhou várias provas. Há registros no seu prontuário. Quanto a gozar ainda de saúde de atleta, não passa de opinião. Nunca mais deu provas disso. Foi vítima do coronavírus.
Somente ontem, em três ocasiões, protagonizou atos contra a vida – dos outros, diga-se. O primeiro ao reunir-se com milhares de produtores e de vendedores de frutas e legumes em São Paulo, quase todos sem máscaras, ele também. O segundo, outra vez sem máscara, ao visitar Sílvio Santos, um idoso de 90 anos de idade.
O terceiro foi o mais escandaloso. Bolsonaro aconselhou Eduardo Pazuello, doublé de general e de ministro da Saúde, a fazer uma campanha nacional de propaganda alertando os brasileiros para o perigo de se vacinarem. Desta vez não se referiu diretamente à vacina da China. Haveria perigo de morte em tomar qualquer uma.
Sua conduta não foi quase criminosa. Foi inteiramente criminosa. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), órgão técnico do governo agora contaminado pelo vírus ideológico, existe para testar e conferir a eficácia de remédios e de vacinas. Sem o seu aval, nenhum produto médico é liberado para uso em massa.
Desacreditar a Anvisa, e é isso o que está em curso, e tocar horror nas pessoas para que elas fujam de vacinas que estão sendo aplicadas largamente em outros países, é atentar contra a vida coletiva. Haverá crime maior do que esse? E logo praticado por um presidente que ao tomar posse jurou cumprir a Constituição?
Diz o artigo 5º do Capítulo 1 da Constituição em vigor: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”. Inviolabilidade do direito à vida!
O que isso significa? Que na atual legislação brasileira “o direito à vida é tido como o alicerce para a prerrogativa jurídica da pessoa, motivo pelo qual o Estado tem por dever resguardar a vida humana, desde a concepção até a morte. Diante de sua importância o direito à vida é uma cláusula pétrea.”
E o que é uma cláusula pétrea? “É um artigo da Constituição que não pode ser alterado. Pétrea é um adjetivo para aquilo que é como pedra, imutável e perpétuo. Uma cláusula pétrea é, portanto, um dispositivo do texto constitucional que é estabelecido como regra e que não pode sofrer nenhuma mudança.”
Por quanto tempo mais o país assistirá inerte o presidente da República afrontar a lei? Não se trata de opinião que ele desrespeita a vida, é um fato que se sucede à vista de todos e quase que diariamente. Se apesar disso nada acontece, a Constituição então serve para quê?
Merval Pereira: Estamos sem rumo
O Brasil está encarando uma segunda onda da COVID-19 sob a influência quase criminosa da postura do presidente Bolsonaro, que continua não usando máscara, cumprimentando seus admiradores como se não houvesse mais pandemia, provocando aglomerações sem respeitar o distanciamento social.
Além disso, não temos plano de vacinação nacional, e nem mesmo vacinas para uma tarefa tão gigantesca quanto a de vacinar um país de mais de 200 milhões de habitantes. Como o próprio presidente é contrário à vacina, agora ele inventou que o cidadão terá que assinar um termo de responsabilidade para ser vacinado, o que é um absurdo legal, pois a responsabilidade por ações de saúde pública como a vacinação em massa é do Governo Federal.
Assim como está acontecendo nos Estados Unidos, onde, depois do Thanksgiving, houve uma explosão de infecções pelo coronavírus e um crescimento exponencial do número de mortes, que pode chegar a 300 mil em breve, caminhamos para o mesmo precipício no Natal e no Réveillon.
O governo americano pelo menos tentou, mas não teve sucesso, segurar a massa de pessoas que tradicionalmente se deslocam para seus estados para comemorar com a família a festa nacional mais tradicional do país, como se fosse o Natal entre nós.
Mas o vírus ainda está em circulação, e causou um estrago entre os americanos. Estamos diante do mesmo panorama, e nas festas do Natal e do réveillon o temor é que haja uma explosão de casos. O ministério da Saúde se exime de qualquer ação de cunho nacional, alegando que o Supremo Tribunal Federal (STF) delegou aos Estados as políticas públicas relativas ao controle da pandemia.
Muitos prefeitos e governadores estão tentando controlar a disseminação do vírus proibindo festas no réveillon e reduzindo o horário de funcionamento dos bares e restaurantes. Alguns, como o prefeito de Belo Horizonte Alexandre Kalil, tomaram providências para impedir aglomerações no Natal e no Ano Novo, e governadores, como o petista Rui Costa, estão impondo uma série de restrições para evitar que o vírus se espalhe durante as festas de fim de ano.
Outros prefeitos, como o do Rio, Marcelo Crivella, no entanto, estão autorizando festas, como as nos quiosques das praias, e havia até mesmo a ideia de realizar shows na orla na noite do dia 31, com palanques para shows na praia, mas sem a presença de público. A irresponsabilidade foi cancelada, e haverá shows transmitidos por um sistema de plataformas digitais e um canal de televisão da Prefeitura.
A prefeitura do Rio tem que cair em si, cancelar as festas nos quiosques, e fechar a orla. Os quiosques já estão vendendo convites, e são centenas de pessoas em cada um deles. E para completar, o presidente da República dá um péssimo exemplo, aparecendo sem máscaras, cumprimentando todos. Num país como o nosso, o presidente, por pior que seja, tem uma imagem popular e, nas regiões menos favorecidas, as pessoas absorvem muito o que ele faz. Então é uma situação trágica.
Ainda os militares
A formatura dos novos delegados da Polícia Federal na segunda-feira trouxe mais uma vez a marca da politização das forças policiais, assim como já existe esse movimento nas Forças Armadas. Os novos integrantes da Polícia Federal, que é um órgão de Estado e tem autonomia, prestaram homenagens a Bolsonaro além do que seria razoável, aclamando-o com os gritos de “mito”, como nos tempos da campanha eleitoral.
O presidente Bolsonaro cultiva desde seu primeiro dia de governo as festas de formaturas das Forças Armadas, e das forças policiais auxiliares, as trata como se comícios fossem. A absorção de oficiais das três Armas no serviço público vem subindo, notadamente no Exército, que tem a maior parte dos 3144 militares em postos nos diversos escalões.
Bolsonaro tem o reconhecimento dos militares pelas melhorias que concedeu, e é também muito sujeito às suas reivindicações. Um exemplo claro é o tratamento preferencial que deu a eles na reforma da Previdência. No caso do decreto sobre o qual escrevi ontem, o presidente Bolsonaro revogou a alteração que fizera, cancelando as promoções por antiguidade, justamente por pressão de seus pares, contrariando a diretriz do ministério da Defesa, que gostaria que os últimos postos da carreira - coronéis do Exército e da Aeronáutica e Capitães de Mar e Guerra - só fossem atingidos por merecimento. será tão rápida’.