RPD || Paulo Baía: Agosto em chamas

Foto: Fotos Públicas
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Revelações da CPI da Pandemia, investigação das ameaças à democracia, fake news e ataques de Bolsonaro contra o sistema eleitoral eletrônico e o Tribunal Superior Eleitoral vão elevar a temperatura política durante todo o mês

A CPI da Covid-19, no Senado Federal, entra em nova etapa pós-recesso, vai-se movimentando e produzindo resultados políticos para o jogo em andamento. Certamente, a situação do governo Bolsonaro, e do próprio Bolsonaro, não tem complicações de natureza jurídica maiores até o presente momento. Entretanto, para ele e seu governo, temos alguns fatos relevantes no jogo político. O pedido de impeachment – que passou a ser chamado de superpedido de impeachment – assinado por vários partidos de diferentes oposições, além de muitas entidades da sociedade civil e parceiros de primeira hora de Jair Bolsonaro, como MBL, deputado Kataguiri e a deputada Joice Hasselman, é um energético na luta política, um ativador de oposições a Bolsonaro. 

 A abertura de inquérito de investigação contra Jair Bolsonaro, a partir dos dados da CPI que tratam do superfaturamento na compra da vacina indiana Covaxin, juntamente com os novos depoimentos temáticos na CPI, já no mês de agosto, elevará a temperatura política. 

Esse dado é um elemento importante. Não que o processo em si traga grandes novidades. Não traz! Tudo está aparente na CPI da Covid. Mas os senadores da CPI entraram no Supremo com uma queixa crime. E este, ao ser acionado, também acionou a PGR. Esta, no primeiro momento, disse que faria isso depois do encerramento da CPI. Mas, com a insistência de Rosa Weber, a PGR abriu, no dia 2 de julho, um pedido de investigação do Presidente da República. 

Mas por que isso dará trabalho a Jair Bolsonaro?  

O vice-Presidente Hamilton Mourão lembrou que pedidos semelhantes de abertura de inquérito ao Supremo pela PGR foram feitos em relação a outros presidentes sem maiores consequências. O que é verdade! Outros presidentes sofreram denúncias. 

O ex-Presidente Michel Temer, por exemplo, teve três pedidos de autorização para ser investigado encaminhados pelo Supremo à Câmara dos Deputados, o que lhe atravancou a pauta política e o levou a dedicar muitos meses de seus dois anos de mandato à sua defesa e à articulação para impedir que a Câmara dos Deputados aprovasse a referida autorização. Por quê? Porque se a maioria dos deputados aprovasse a investigação, o Presidente da República seria sumariamente afastado de seu mandado por 180 dias. No caso atual, os seis meses de uma possível investigação invadiriam 2022, com as eleições já em outubro. Esse elemento fez com que Jair Bolsonaro remontasse sua estratégia e passasse a jogar na retranca. 

Havia certa facilidade no jogo político de Jair Bolsonaro, até então. Ele não estava na retranca, estava praticamente sozinho em campo. No final de maio, no entanto, mesmo com uma pauta política limitada, as manifestações de rua abriram caminho para o megapedido de impeachment. Pouco a pouco, forças situadas à esquerda e outras de oposição ao governo Bolsonaro, foram engrossando a voz rouca das ruas, em 29 de maio, 19 de junho e 24 de julho e, por extensão, no Congresso Nacional também.  

Diante desses movimentos importantes, que pareciam encenar sincronização, Jair Bolsonaro, que estava jogando na retranca, avaliou ter de subordinar seu governo às forças políticas do Centrão, coordenadas por Arthur Lira, Presidente da Câmara; Rodrigo Pacheco, Presidente do Senado, e o senador Ciro Nogueira, novo Chefe da Casa Civil. 

Para sorte de Jair Bolsonaro, a Câmara dos Deputados é hoje presidida por Arthur Lira, e não Rodrigo Maia, que deu continuidade aos três pedidos de investigação interpostos contra Michel Temer. É assim que Lira ganha enorme relevância, mesmo que não possa, como nos pedidos de impeachment, escolher se colocará em pauta ou não os referidos pedidos. Por exemplo: terá de colocar em pauta o pedido do Supremo Tribunal Federal de autorização para a investigação de Jair Bolsonaro com o material produzido pela CPI da Pandemia.  

Ainda assim, o casamento com o Centrão constitui um presente de ouro, para quem precisa do Planalto para fazer prosperar os interesses não só deste grupo de políticos, mas também de prefeitos, governadores e parlamentares nos âmbitos federais e estaduais, com os quais queira se associar, sobretudo, nesse ano pré-eleitoral.  

Essa estratégia de jogar na retranca com contra-ataques já se estampou nas manifestações de 1o de agosto, quando Bolsonaro, mais uma vez, recorreu ao expediente de elidir a discussão de temas políticos importantes em favor de agendas estridentes como o “voto impresso auditável”. Tenta, assim, proteger seu governo em seus nichos de fidelizados e, ao mesmo tempo, ceder ao jogo agressivo do Centrão, com cuja eventual fidelidade de voto, poderá impedir a abertura de investigações, o que vale dizer, seu afastamento da presidência por 180 dias.  

Na minha visão, teremos três jogos ocorrendo paralelamente a partir desse mês de agosto e até final de setembro: (1) a CPI no Senado Federal produzindo seus efeitos no jogo político; (2) o jogo mais pesado, do campeonato principal, que será jogado na Câmara dos Deputados, com a reforma política eleitoral e o pedido de autorização de investigação de Jair Bolsonaro, quando for à pauta de julgamento dos deputados; e (3) a investigação das ameaças à democracia, fake News, turbinadas pela campanha de Jair Bolsonaro e os seus contra o sistema eleitoral eletrônico, o TSE e o ministro Luís Roberto Barroso, inquérito comandado pelo ministro Alexandre de Moraes no STF. 

As ameaças contra a democracia subiram de intensidade com a reação de Jair Bolsonaro ao discurso de Luiz Fux na reabertura do judiciário e à nota de todos os presidentes do TSE de 1988 para cá. 

Jair Bolsonaro está jogando na retranca e, como todo retranqueiro, faz contra-ataques com faltas e ruídos. 


Saiba mais sobre o autor

* Paulo Baía é sociólogo, cientista político e professor da UFRJ. 

** Artigo produzido para publicação na Revista Política Democrática Online de agosto (34ª edição), produzida e editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania.

*** As ideias e opiniões expressas nos artigos publicados na Revista Política Democrática Online são de exclusiva responsabilidade dos autores, não refletindo, necessariamente, as opiniões da Revista.

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