Entrevista | Simone Tebet: ‘Não estou pensando em 2026, nem em cargos’

Em entrevista ao podcast "Dois+Um", emedebista também afirmou que eleitores estavam esperando o 'mínimo de propostas' do petista, por isso o segundo turno
Simone Tebet no Plenário do Senado | Moreira Mariz/Agência Senado
Simone Tebet no Plenário do Senado | Moreira Mariz/Agência Senado

O GLOBO

Horas depois de declarar apoio ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no segundo turno, a senadora Simone Tebet (MDB-MS), terceira colocada na disputa, afirmou, no podcast “Dois+Um”, do GLOBO, que o petista não entendeu que o eleitor estava esperando dele o “mínimo de propostas” para “temas básicos” como fome, miséria, desemprego, pauta econômica e social e segurança pública, e por isso “decidiu levar a eleição para o segundo turno”. Tebet também foi bem direta sobre a decisão: “Não estou pensando em 2026, nem em cargos.”

Na entrevista à CBN, a emedebista disse que a equipe da campanha de Lula presente no almoço de hoje na casa da ex-prefeita Marta Suplicy reconheceu que é preciso dar um sinal mais claro em relação à pauta econômica e se “posicionar mais ao centro”. A senadora disse ainda que não deseja cargos ou ministérios e que sua entrada na campanha depende do quanto Lula está disposto a incorporar o projeto de país que ela afirma sonhar.

Por quais razões a senhora tomou a decisão de apoiar Lula?

Pelo meu histórico, pela minha vida pública. Primeiro que não cabe a neutralidade num momento tão importante da História do Brasil. E, segundo, que não há escolha: reconheço (em Lula) um democrata que serve à Constituição Federal e respeita a Constituição. E não encontro no atual presidente da República alguém que eu entenda que vá cumprir a Constituição e defender os valores democráticos. Não há opção a não ser ter coragem. Não cabe voto branco neste momento. Não vale voto nulo. O que vale é escolhermos de acordo com a nossa consciência. Minha consciência de brasileira e a minha razão de democrata me trazem a apoiar e declarar meu voto ao atual candidato à Presidência da República Luiz Inácio Lula da Silva.

Como a senhora vê os apoios que foram quase incondicionais a Bolsonaro?

Os apoios que são dados são do jogo do campo democrático e da política. Só, lamentavelmente, quero dizer que eu não acredito que um lobo se transforme em cordeiro da noite para o dia. Eu conheci o presidente como senadora nesses três anos e meio. Eu vi o que foi feito e o que deixou de ser feito na CPI (da Covid). Lamentavelmente, quantos perderam as vidas porque ele não acreditou na pandemia, negou vacina no braço do povo brasileiro e atrasou a compra dessas vacinas em 45 dias? Só por isso já me impediria (de declarar voto em Bolsonaro) e acho que impede os grandes homens públicos do Brasil a aceitarem, de novo, apostar as suas fichas em nome de um candidato que flerta com o autoritarismo, não respeita as instituições democráticas e virou as costas para o povo brasileiro no momento em que o povo brasileiro mais precisava. Por saber de tantos retrocessos, saber que o que está em jogo são os avanços que a democracia tem condições de garantir ao povo brasileiro no futuro, que fiz a minha opção. É uma opção pela democracia, pela Constituição e por políticas públicas. Acredito que estou do lado certo da história e isso me basta.

O apoio da senhora consiste numa declaração de voto ou num compromisso de participação ativa na campanha?

O meu voto já está dado. Eu fiz um manifesto ao povo brasileiro dizendo que incondicionalmente, sem qualquer condição, o meu voto é pela democracia e pela Constituição. Eu não fiz um voto de adesão, eu fiz um voto de projetos para o país. Apresentei ao ex-presidente Lula, atual candidato, cinco propostas. Agora vão ser analisadas pela equipe econômica e do programa de governo. O meu voto o ex-presidente Lula já tem. Se vamos entrar na campanha, depende do quanto ele está disposto a incorporar um projeto de país que eu sonho. A bola está com a equipe de campanha do atual candidato Luiz Inácio Lula da Silva.

A senhora coloca a necessidade de uma âncora fiscal. Encontrou acolhida na proposta?

É preciso uma ancoragem fiscal. Qual vai ser? Não me interessa. Não me preocupa se vai ser teto de gastos, se vai ser a meta de superávit. O meu projeto é de país. Não estou aqui para impor nada, nem a minha vontade, até porque serei uma crítica construtiva do futuro governo se o presidente Lula ganhar as eleições. Quis deixar o mais amplo possível.

A senhora, uma vez acolhido esse conjunto de propostas, consideraria a hipótese de compor num eventual ministério do governo Lula?

A minha adesão é por projeto de país e eu quero estar no Brasil, servindo ao Brasil, nos próximos quatro anos onde quer que eu seja necessária. Eu não quero cargos, eu não quero ministério, quero ter liberdade para que depois, com uma ampla reflexão, as pessoas que me ajudaram possam dizer: “Simone, o melhor caminho é aqui.” Eu não sei qual é o papel, mas sei que tenho um papel hoje importante. Quero servir ao Brasil, não preciso de cargos, graças a Deus eu tenho profissão, então posso me dar ao luxo de andar o Brasil sem precisar de ministério ou cargo para precisar fazer aquilo que precisa ser feito. Há um Brasil a ser reconstruído e há um povo a ser novamente reunificado. Quero poder só fazer parte desse processo.

No almoço que a senhora e esses outros líderes tiveram na casa da ex-ministra e ex-senadora Marta Suplicy, ela ergueu um brinde e depois disse ao ex-presidente Lula: “Você agora não é mais o candidato do PT, da coligação. Você é candidato do Brasil”. A senhora entendeu isso como um recado pela necessidade de ampliar o palanque, as propostas, trazer mais clareza no que se pretende fazer? Isso é necessário?

Ele (Lula) não entendeu que o eleitor estava esperando dele o mínimo de propostas. O que fazer no futuro para temas básicos, como fome, miséria, desemprego, pauta econômica, educação, saúde, segurança pública. Faltaram pequenos pontos a serem colocados. Quando o ex-presidente Lula não apresentou, a população falou: preciso de mais tempo, então vou levar essa eleição para o segundo turno. Foi aí que nós desidratamos, eu e Ciro. Foi aí que houve uma movimentação do eleitor até acho que a favor do atual presidente e o jogo não acabou no primeiro tempo, ele foi para o segundo tempo, e agora é uma nova eleição. Então, sim, acho que é isso. Vi da equipe que estava ali (no almoço) um reconhecimento de que agora eles precisam apresentar propostas, eles estão prontos para apresentar, e esperou que estejam prontos para receber as nossas sugestões também.

Na conversa, houve algum aceno, alguma projeção de apresentação de um plano econômico, voltado para a classe média que está massacrada no Brasil?

Houve, sim, uma sinalização de que eles precisam sinalizar em relação à pauta econômica e à pauta de políticas públicas alguma coisa mais objetiva. A sensação que tive quando saí ali é que há, sim, o entendimento de que é preciso se posicionar mais ao centro e que o mundo mudou, a economia mudou, e é preciso evoluir em relação a esse sentido. Não cheguei a pregar uma economia liberal, como eu defendo, é óbvio, mas falei da importância da livre iniciativa, de se valorizar o agronegócio, ao mesmo tempo o meio ambiente, ou seja, um desenvolvimento sustentável.

A senhora pensa numa candidatura a presidente novamente, em 2026?

Eu aprendi na minha vida pública que a gente não vai para as eleições apenas para vencer, embora essa seja a prioridade absoluta. Mas para apresentar projetos, disseminar ideias, iluminar caminhos, para plantar a boa semente para uma colheita coletiva, foi o que coloquei no meu manifesto que eu mesma redigi nas 48 horas que tive sem dormir pela primeira vez desde que começou a campanha. A minha campanha foi muito tranquila, mas as últimas 48 horas foram muito difíceis, porque eu sabia e sei o que estava e está em jogo, e eu estou preparada para essa perda do capital político, se ela vier, porque é a minha verdade, a minha certeza. A democracia é algo muito maior do que cada um de nós que está em jogo. Diante de tudo isso, eu estou pronta para defender o Brasil, eu não estou pensando em 2026, nem em cargos. Acho que temos um longo caminho antes, eu quero servir ao Brasil. Há um Brasil para ser reconstruído, eu não sei onde eu me encaixo nisso, vocês me ajudem a me fazer útil dentro desse processo..

Dá para fazer um governo Lula com orçamento secreto e essa bancada ideológica que foi eleita? Como desarmar essas duas bombas-relógios?

Conheço bem o Congresso. Dá exatamente, pois dentro dessas bancadas fisiológicas nós temos os partidos de Centro que estão prontos, para numa análise crítica, num apoiamento crítico, avançar e dar os votos necessários para as reformas estruturantes e bons projetos do próximo presidente da República. O Congresso tem essa consciência, a responsabilidade, porque nós estamos no fundo do poço. Precisou ir para o fundo do poço para a gente agora tentar emergir com projeto que gere emprego e renda, garanta a dignidade, tire o Brasil do mapa da fome e miséria.

Senadora, sem falsa equivalência, no começo da campanha a senhora fez críticas duras ao candidato Lula, muitas vezes centradas em corrupção, que houve naquele período. Isso foi tratado na conversa? É um compromisso?

Sim. E, colocando na balança, corrupção por corrupção, a hora que abrirem a caixa preta do orçamento secreto, ela vai se mostrar infinitamente maior do que o petrolão, o que não isenta. Corrupção é corrupção. Quem rouba um, rouba 1 milhão. As duas coisas têm que ser rechaçadas. E eu coloquei (como compromisso) o ministério competente e ético. Eu deixei muito claro essa questão.

Acho que falta ao PT um mea-culpa de reconhecer que no seu governo houve corrupção?

Nesse ponto eu fui dura. E vou repetir, triste Brasil que tem que escolher entre dois grandes escândalos: escândalo do mensalão e do petrolão do passado, (ou) o escândalo do “vacinaço”, da tentativa de superfaturar vacinas, do “ônibuzaço” no Ministério da Educação, e do orçamento secreto desse governo. Dizer que esse governo não tem indícios de corrupção? Por favor, é desconhecer o dia a dia da política brasileira e não ter capacidade de fazer a leitura certa através dos grandes veículos de comunicação. Mas isso a história dirá.

A senhora acha que os 51 milhões de votos dados a Bolsonaro mostram que o país normalizou o que aconteceu na pandemia?

Os retrocessos são tamanhos que o que mais me assusta como cidadã, como brasileira e como cristã, é o quanto o brasileiro conseguiu dos últimos três anos e meio normalizar os absurdos. Como a gente chegou ao ponto de normalizar tragédias, retrocessos. Ver uma criança na rua pedindo um prato de comida e virar o rosto, ver um negro ser espancado e achar que isso é natural. Normalizar as grosserias. Como nós podemos ir às nossas igrejas, fazer a leitura do evangelho e não conseguir pregar o evangelho na rua, nos nossos lares, nos nossos ambientes de trabalho?

O presidente fez muitas críticas à CPI da Covid, em que a senhora foi protagonista. Eu queria que a senhora fizesse um balanço dos efeitos da CPI, considerando que ela não prosperou em termos de denúncias formais, em grande parte devido ao procurador-geral da República. Qual o balanço que se faz agora?

Não com meu voto na recondução. Eu votei na primeira vez, dei um voto de confiança. E, na segunda vez, eu fui até indelicada e sequer o recebi no meu gabinete, porque já tinha visto nele traços de alguém tendencioso que estava ali para servir o presidente e não para servir como órgão de fiscalização e controle ao povo brasileiro.

A CPI cumpriu duas grandes missões: ajudou a colocar vacina no braço do povo brasileiro, portanto, salvar vidas; e, depois, como um grande inquérito concluiu que há denúncias gravíssimas de tentativa de corrupção. Isso a história vai contar e vai ficar claro a partir de primeiro de janeiro do ano que vem se o povo brasileiro escolher como presidente Lula, porque a partir daí nós teremos um outro procurador-geral da República, e as coisas se tornarão públicas.

Senadora, os apoios me parecem ter dois tipos: os apoios como o da senhora e o do PDT, que condicionam esse apoio a alguma assumpção de compromissos; e os apoios recebidos pelo Bolsonaro mais incondicionais, apoios que tem uma máquina pública por trás. Por que de Bolsonaro não se cobra esses compromissos? E o que essas máquinas podem fazer de diferença?

Sinceramente, acho que não vai fazer diferença nenhuma. O eleitor agora vai colocar a mão na consciência e decidir de acordo com o que ele acha que é mais importante para sua vida e para o Brasil. Ele está atento.O povo brasileiro sabe votar. Vota naquele menos pior dentro das circunstâncias. E ele não é tutelado. O voto é dele. É claro que um apoio meu pode fazer um eleitor meu refletir. Mas ninguém é dono do voto do eleitor.

E as pessoas estão colocando na balança: o porquê alguém está dando apoio e colocando propostas, e o outro está apoiando simplesmente por apoiar. O que está por trás? Está por trás discussão de cargos, de ministérios, de manutenção de benesses, de orçamento secreto? O eleitor está atento.

Reprodução do blog Democracia Política e novo Reformismo

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