Desmatamento e pobreza caminham lado a lado na Amazônia, mostra pesquisa

Levantamento do Imazon mostra que municípios da região que mais desmatam apresentam piores condições de vida
Foto: Evaristo Sá/AFP/O Globo
Foto: Evaristo Sá/AFP/O Globo

Cleide Carvalho / O Globo

SÃO PAULO — O desmatamento e a extração ilegal de madeira e ouro condenam a Amazônia a uma economia pífia e à pobreza. Uma pesquisa do Imazon, que analisa o Índice de Progresso Social (IPS) nas 772 cidades da Amazônia Legal, revela que os municípios que mais desmatam são também o que apresentam as piores condições de vida da população. Enquanto o IPS do Brasil está em 63,29, os 20 municípios que mais destruíram a floresta nos últimos três anos apresentam um IPS médio de 52,38 — 21% menor que a média nacional e mais baixo também em relação ao da Amazônia (54,59).

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Criado em 2013 para analisar as condições sociais e ambientais de países, estados e municípios, o IPS gera uma nota de zero a 100. Quanto mais alto o resultado, melhor. Se a Amazônia fosse um país, estaria no patamar de países como Camboja e Nigéria. São avaliados 45 indicadores, que vão de mortalidade infantil e materna a condições de moradias e mortalidade por doenças circulatórias e respiratórias, por exemplo.

 Confira o Índice de Progresso Social (IPS) dos 772 municípios da Amazônia Legal

Localizado à beira da Transamazônica, o município paraense de Pacajá é um bom exemplo da situação. Entre 2018 e 2020 ficou em sétimo lugar entre os que mais destruíram a floresta. Acabou com o segundo pior IPS da Amazônia, de 44,34. Da lista dos 20 maiores desmatadores da Amazônia, seis ficaram com menos de 50 pontos no IPS: Portel (PA), Apuí (AM), Senador José Porfírio (PA), Novo Repartimento (PA), Uruará (PA) e Anapu (PA). Há ainda nesse patamar municípios como Jacareacanga (PA), conhecido pelo garimpo ilegal.

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Todos os estados da Amazônia estão abaixo da média nacional. Os indicadores piores são do Pará (52,94), que historicamente encabeça a lista dos desmatadores, e Roraima (52,37).

— Estamos desmatando sem gerar riqueza. Além de não gerar desenvolvimento, o desmatamento mantém a Amazônia num abraço mortal de pobreza — afirma Beto Veríssimo, co-fundador do Imazon e um dos líderes do estudo.

Veríssimo lembra que o município de São Félix do Xingu, no Pará, que foi o segundo que mais desmatou na Amazônia entre 2018 e 2020, emite mais carbono do que a cidade de São Paulo, que move a economia do país. A emissão de CO² é um dos indicadores do IPS.

Para ele, o desmatamento e as demais atividades ilegais na Amazônia só geram pobreza. Não compensam nem economicamente, nem socialmente. Altamira, também paraense, que ocupou o primeiro lugar no desmatamento no período de três anos, teve IPS de 53,95. São Félix do Xingu, 52,94. Os dois ficaram abaixo inclusive da média da Amazônia Legal.

Em 2020, a Amazônia respondeu por 52% das emissões de gases de efeito estufa do Brasil, mas gerou apenas 9% do PIB.

Para Veríssimo, a situação é vexatória e a região está no pior dos mundos, pois enfrenta triplo problema: crise ambiental, social e econômica. Os desmatamentos e a situação de ilegalidade, que gera violência, só afugentam investidores e ganham repercussão internacional.

— A Amazônia virou tóxica para investimentos. Está ficando uma terra sem lei, a lei não é respeitada — define.

Para atrair investimento, diz Veríssimo, é preciso predominar o estado de direito, o que não tem acontecido. Ao contrário, ciclo de degradação e pobreza faz com que a região não se desenvolva e crie poucas ilhas de razoável prosperidade.

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O baixo progresso social é medido também pelo acesso à telefonia e à banda larga de internet. Na situação atual, afirma o especialista, a Amazônia sequer consegue atrair mão de obra especializada e permanece numa posição incompatível com a importância que ela tem para o resto do mundo.

— O que trava é o descalabro ambiental. A Amazônia conviveu nas últimas quatro décadas com o desmatamento, que não entregou nem progresso social e nem desenvolvimento econômico – avalia.

Veríssimo afirma que a solução para a Amazônia é uma escolha política. Segundo ele, é preciso asfixiar a economia ilegal com medidas duras e abrir espaço para investimentos em alternativas como sistemas agroflorestais, restauração florestal e pecuária intensiva.

— A pauta de desenvolvimento não é cara. Mas antes é preciso tirar a Amazônia da UTI com uma terapia de choque contra o desmatamento — resume.

Em relação a 2018, última edição do IPS para a região, dos 772 municípios amazônicos avaliados quase metade (49%) teve redução na nota e 21% permaneceram estáveis.

Apenas 2% dos municípios da Amazônia têm IPS acima da média nacional. O grupo é formado por 15 cidades e cinco delas são capitais. Cuiabá (MT) encabeça a lista, seguida por Palmas (TO), com IPS de 74,42 e 70,23, pela ordem. Nessa lista estão também municípios que se tornaram polos regionais, como Rondonópólis e Primavera do Leste, por exemplo, ambas no Mato Grosso.

Sobre o Imazon
O Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) é um centro de pesquisa e desenvolvimento de projetos sem fins lucrativos fundado há 31 anos em Belém, no Pará. Com a missão de promover a conservação e o desenvolvimento sustentável na Amazônia, já publicou mais de 700 estudos em revistas científicas internacionais e mais de 100 livros e guias disponibilizados gratuitamente em www.imazon.org.br.

Sobre o Amazônia 2030
O projeto Amazônia 2030 é uma iniciativa conjunta do Instituto do Homem e do Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), Centro de Empreendedorismo da Amazônia, Climate Policy Initiative (CPI) e Departamento de Economia da PUC-Rio com objetivo de formular um plano de desenvolvimento sustentável para a Amazônia brasileira. Como resultado, o projeto almeja que a região conquiste melhores condições socioeconômicas com o uso sustentável dos recursos naturais em 2030.

Fonte: O Globo
https://oglobo.globo.com/brasil/desmatamento-pobreza-caminham-lado-lado-na-amazonia-mostra-pesquisa-25308209

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