Adriana Fernandes: O ataque a Guedes

A austeridade fiscal definitivamente não é boa companhia para nenhum presidente da República.
Foto: José Cruz/Agência Brasil
Foto: José Cruz/Agência Brasil

A austeridade fiscal definitivamente não é boa companhia para nenhum presidente da República

Paulo Guedes está sob ataque na Esplanada dos Ministérios e fora dela. A novidade é que a pressão tem sido alimentada pelo Planalto. É o velho e conhecido “fogo amigo”, que já alvejou ministros poderosos da área econômica de governos passados.

Nas últimas semanas, a palavra que mais se ouve em Brasília é “entrega”. Guedes tem sido criticado pela demora em “entregar” a retomada da economia e a redução do desemprego. Sem falar da reforma tributária, que não sai e continua indefinida após a nova CPMF morrer por ordem do presidente Jair Bolsonaro.

A austeridade fiscal definitivamente não é boa companhia para nenhum presidente da República. Principalmente se o presidente, antes mesmo de terminar seu primeiro ano de governo, já se movimenta afrontosamente para garantir a reeleição.

A falta de dinheiro é ponto de partida para as investidas contra o ministro. Mas os ataques, que nascem como reação à política de aperto fiscal, têm nuances bem mais profundas.

A divisão no governo sobre mudar ou manter a regra do teto de gastos expôs claramente as contradições internas entre a agenda do ultraliberal ministro da Economia e a de assessores e ministros mais próximos do presidente, que ajudam a turbinar as intrigas. Eles já viram que, com o teto, o governo não deslancha na velocidade que querem.

O confronto subterrâneo entre os dois grupos vai desde embates na área de privatização de estatais (vide o desgaste com a Eletrobrás) à demora no perdão da dívida do mundo do agronegócio com a contribuição ao Funrural (promessa de Bolsonaro), e passa também pelos rumos do Minha Casa Minha Vida, pela política da Caixa para empréstimos a prefeituras e Estados aliados e pelo enfrentamento com o Judiciário. Só para começar a lista. O que os embates têm em comum é que eles se concentram na articulação errática do governo com o Congresso.

O negócio da tal articulação tem sido no varejo total. A cada aprovação de medidas, o governo é obrigado a reabrir a negociação e o cofre. Isso está custando muito dinheiro, e o confronto com a área econômica cresce.

Depois do teto, o mais recente ruído ocorreu com a proposta de desindexar o salário mínimo e as despesas vinculadas ao piso nacional. Na prática, o governo ficaria desobrigado a dar reajustes ao mínimo, mesmo que só para repor a inflação. Esse é um tema para lá de polêmico e que o time de Guedes pretendia enfrentar, mas foi abortado a mando de Bolsonaro.

Cabeças quase rolaram no Ministério da Economia por conta dos ruídos da semana passada em torno do assunto. Uma saída que, se concretizada, seria evidentemente contabilizada como mais um sinal de perda de autonomia do ministro, depois da queda do secretário especial da Receita Marcos Cintra. A saída do auxiliar do ministro chegou a ser interpretada como enfraquecimento de sua liderança.

Oriundo do baixo clero na Câmara, Bolsonaro tem obsessão em mostrar que é ele quem manda. Já bateu de frente com os militares e com o ministro da Justiça, Sérgio Moro. A demora da “entrega” serve bem a esse propósito. Como mostrou o Estado em reportagem recente, o presidente tem sim cobrado agilidade, mesmo que em público reforce o discurso de que está 100% alinhado com Guedes e que a culpa é da imprensa, que semeia discórdia.

Segundo auxiliares de Bolsonaro, o presidente se diz “agoniado” por estar “amarrado à política econômica”. E teme ver o “risco de o governo morrer por inanição”.

A equipe econômica, ao seu modo, tem se defendido da pressão com o argumento de que entregou muita coisa nesses nove meses de governo. A reforma da Previdência aprovada na Câmara mesmo em meio à desarticulação política, as mudanças no mercado de gás, as negociações internacionais para abertura de mercados, a queda dos juros, a liberação do FGTS, a redução do risco Brasil…

Um dos problemas de Guedes é que ele criou a expectativa de que haveria transformações muito rápidas. Além disso, colocou muitas propostas na mesa ao mesmo tempo sem estarem completamente fechadas. Está pagando o preço por isso. Soma-se a isso a desorganização elevada nos processos de comando na equipe econômica depois da criação do superministério da Economia. Muita arrumação a ser feita.

Para sair da linha de tiro do fogo amigo, o ministro precisa urgentemente frequentar mais o Planalto e falar mais para dentro do governo. Não pode sair de perto da órbita e dos ouvidos do presidente. Conselho que já lhe foi dado.

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