Fernando Exman: Meio ambiente na árida pauta legislativa

Governo busca fato positivo, mas desmate ilegal cresce.
Foto: Isac Nóbrega/PR
Foto: Isac Nóbrega/PR

Governo busca fato positivo, mas desmate ilegal cresce

Primeiro os deputados conquistaram o protagonismo com o Orçamento impositivo e uma agenda de reformas econômicas. Deram, na sequência, impulso a medidas emergenciais de combate aos efeitos da pandemia, por exemplo com a adoção do Orçamento de guerra, e aprimoraram diversos dispositivos enviados pelo presidente Jair Bolsonaro para tentar irrigar a economia com crédito. Logo avançaram nas discussões sobre questões sociais e asseguraram a prorrogação do Fundeb, o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação, a despeito das resistências da equipe econômica. Agora, o risco do governo é ficar a reboque da agenda ambiental da Câmara.

A administração Jair Bolsonaro tenta sair da defensiva, desde que passou a ser alvo de duras cobranças de países aliados, parceiros comerciais, empresários e investidores.

A má notícia, para o Palácio do Planalto e o Ministério do Meio Ambiente, é que a reversão das péssimas expectativas em relação aos resultados de suas ações para conter o desmatamento ilegal só se dará com a apresentação de dados positivos e confiáveis. No entanto, as estimativas de autoridades que acompanham de perto o assunto não são animadoras.

Espera-se que os dados de desmatamento de 2020 superem os observados no ano passado, quando satélites do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) captaram sinais de derrubadas na Amazônia em áreas que ultrapassaram 9 mil quilômetros quadrados. Um aumento de aproximadamente 85% em relação a 2018.

Segundo essas fontes, deve haver uma desaceleração neste ano e os números não serão tão ruins quanto os projetados num primeiro momento, mas certamente apontarão crescimento do desmate ilegal. Tudo indica que as autoridades do governo não conseguirão apresentar o balanço de dezembro com sorriso no rosto.

Existe, por outro lado, uma mudança conjuntural tanto na visão de setores do governo quanto no Congresso. A bancada ruralista, que muitas vezes interditou a tramitação de propostas advogadas pelos ambientalistas, percebeu que o tema é vital para os negócios de seus representados.

Parlamentares com boas conexões no meio empresarial e no mercado financeiro decidiram se mobilizar. Todos se deram conta de que investidores – nacionais e estrangeiros – exigem uma safra de boas notícias para poderem recolocar o país como destino preferencial em seus portfólios.

O governo tem o que apresentar, mas, para seu desassossego, parece não ter mais audiência. O ministério lançou um programa de pagamento por serviços ambientais e quer estimular o mercado de crédito de carbono.

A Operação Verde Brasil 2 ocorre desde maio e seu mais recente balanço contabiliza a apreensão de 28 mil metros cúbicos de madeira, 93 tratores, 85 máquinas de mineração, 259 embarcações e 174 veículos. Os equipamentos, segundo o vice-presidente Hamilton Mourão, presidente do Conselho da Amazônia, serão destinados para as prefeituras da região. Foram aplicados cerca de R$ 407 milhões em multas.

Essas medidas, embora no caminho correto, foram adotadas tardiamente. E setores do governo permanecem apostando no enfrentamento.

O próprio presidente da República responsabiliza a Câmara por parte do fracasso da sua agenda para o setor. Sempre que pode, lembra: os deputados não votaram a medida provisória que tratava da regularização fundiária, uma proposta considerada fundamental pelo governo para reduzir as ilegalidades na Amazônia e responsabilizar empresas e proprietários por queimadas e derrubadas ilegais. A Câmara tentará votar um projeto de lei com teor semelhante.

No Palácio do Planalto, existe a visão de que está em curso um complô internacional contra a autoridade do Brasil sobre a Amazônia, uma ação orquestrada visando consolidar a imagem de que a região está abandonada e o governo não consegue cuidar da floresta.

Acredita-se que isso se deve, em parte, às sinalizações de que os recursos federais e as verbas obtidas no exterior devem ser destinados prioritariamente às ações de repressão e controle – e não para projetos conduzidos por organizações não governamentais (ONGs).

Com o Congresso entrando para valer no debate, certamente visões antagônicas ganharão mais peso. Os governadores e as bancadas amazônidas serão mais ativos. Isso faz parte do embate democrático e a base aliada terá que mostrar força.

Entre as duas Casas do Legislativo, a Câmara dos Deputados novamente largou na frente. Já está construindo uma ponte com o setor privado e, além de um projeto sobre regularização fundiária, tentará aprovar um marco regulatório para o licenciamento ambiental. Pode entrar também no radar uma proposta com diretrizes para a proteção do bioma marinho.

No Senado, o presidente Davi Alcolumbre (DEM), do Amapá, tem interesse direto nas discussões por ser de um Estado da região e também defende a priorização da regularização fundiária.

Diante do fato de que a agenda ambiental passou a fazer parte das áridas relações entre o Executivo e o Legislativo, um bom começo seria os dois Poderes evitarem a armadilha de transformar essa pauta em um novo fator gerador de fricções institucionais. Espera-se, por exemplo, que o Congresso aprove rapidamente o projeto de lei de abertura de crédito suplementar em favor da Operação Verde Brasil 2, por meio do qual o governo pretende destinar R$ 410 milhões ao Ministério da Defesa.

Nesse mesmo sentido, embora seja uma iniciativa legítima do Parlamento, a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar o trabalho das agências e das autoridades federais ambientais certamente fomentaria novos atritos. Essa possibilidade não é vista hoje como algo exequível, mas não é descartada por parlamentares influentes no caso de o governo não atacar de maneira satisfatória o problema do desmatamento ilegal.

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