Se tem algo que incomoda o ministro na aliança entre Bolsonaro com o Centrão é um avanço sobre os bancos públicos
Se tem alguma coisa que pode tirar o ministro da Economia, Paulo Guedes, do sério na aliança em construção do presidente Jair Bolsonaro com o Centrão é a tentativa de avanço sobre os bancos públicos: BNDES, Caixa e Banco do Brasil. Esse é o sinal.
O presidente já atropelou pontos importantes da agenda econômica do ministro, mas ao final os dois acabam sempre arrumando um jeito de acertar os ponteiros, numa relação simbiótica de patamar bem diferente daquela que havia entre Bolsonaro e Sergio Moro.
É só fazer uma retrospectiva dos embates em torno das empresas retiradas do alvo do programa de privatização, a reforma administrativa, a autorização para lançamento do Pró-Brasil, o congelamento de salários dos servidores públicos e o atraso do presidente em vetar a lei do auxílio emergencial aos Estados e municípios. Isso só para citar a lista mais recente das disputas bolsonarianas com o seu ainda superministro.
Após a tensão de ontem, em Brasília, com a demissão do ministro da Saúde, Nelson Teich, Guedes fez discurso no Palácio do Planalto de completo apoio à estratégia do presidente, ao lado de outros três ministros. “O presidente é um homem determinado”, justificou. Em discurso alinhadíssimo, apelou: “Vamos subir em cadáveres para se aproveitar do governo?”
Guedes já havia participado da marcha empresarial de Bolsonaro ao Supremo Tribunal Federal (STF) e da polêmica videoconferência em que o presidente instigou a guerra dos empresários com os governadores. Ele também assinou a Medida Provisória (MP), considerada inconstitucional, e que isenta agentes públicos de serem responsabilizados por erros que cometerem durante o enfrentamento da pandemia da covid-19 ou de seus efeitos na economia do País.
“Tamo junto”. É o que diz o ministro sobre o presidente. Mesmo que o presidente esteja demorando (já passou uma semana) para vetar artigo da lei que permite reajustes de dois terços dos servidores públicos. Guedes cobra e Bolsonaro dá tempo para governadores e prefeitos darem os reajustes. Mas ele estava lá no Palácio.
Como revelou o Estadão, foi tudo acertado com o governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha, para o reajuste dos salários de policiais. Guedes chiou? Não. A assessores, diz que o acerto dos reajuste já havia feito há seis meses. E a espera continua.
Guedes já aceitou indicações políticas para cargos do seu gigantesco ministério e deverá aceitar outros. Os indicadores dos cargos terão que cuidar dos seus indicados. Numa espécie de porteira fechada às avessas. Eles que respondam pelos seus erros.
Mas não mexam no quintal mais importante do seu jardim. É o que ministro chama de “principais ferramentas” para a sua política econômica. Essas ele não abre mão, como ocorreu na reação ao Plano Pró-Brasil, lançado a sua revelia e momento em que chegou a pensar se valia a pena continuar no governo. É mexer no que ela acha que está no caminho certo.
A blindagem dos bancos públicos é central para a equipe econômica. Tem gente de olho também na secretaria especial que representava o antigo ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Por isso, as notícias recentes de divisão do Ministério da Economia.
Como a divisão do ministério, os bancos também estão na mira do Centrão.
É onde tem o poder da concessão do crédito e onde o teto de gasto não é uma restrição. Basta decisão política. Explico: as capitalizações de empresas estatais estão fora do teto. É um espaço de cobiça para 2021, quando o Orçamento de Guerra não estará mais em vigor, assim como a licença para gastar com dinheiro do Orçamento.
A Caixa é o principal alvo. Ainda mais agora que é a responsável pela distribuição do auxílio emergencial de R$ 600 para a população de baixa renda e os trabalhadores informais atingidos pela covid-19. Uma arma eleitoral e de prestígio tão poderosa que dificilmente o ministro e sua equipe conseguirão acabar com o benefício no prazo determinado.
Se antecipando, o Ministério da Economia começou a desenhar uma reforma na política social para depois da pandemia, já que não conseguirá manter os R$ 600 para tanta gente, mas sabe que terá que dar uma resposta nessa área. Imprescindível para o momento. Um embate que pode ajudar a reverter gastos tributários ineficientes, injustos, e subsídios para setores específicos que não se justificam num cenário em que a população vai sair mais pobre ainda da pandemia.
*É jornalista