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Diversidade cultural | Imagem: Lightspring/Shutterstock

Nas entrelinhas: Os Brasis que vão às urnas com Lula e Bolsonaro no segundo turno

Luiz Carlos Azedo | Nas entrelinhas | Correio Braziliense

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o presidente Jair Bolsonaro (PL), que disputarão o segundo turno das eleições no dia 30 de outubro, alcançaram 48,43% e 43,20% dos votos no primeiro turno, respectivamente. Lula venceu em 14 estados; e Bolsonaro, em 12, além do Distrito Federal. Esse resultado revela uma profunda divisão do país, que também ocorreu em eleições anteriores.

O petista ficou com a maioria dos votos em todos os estados do Nordeste, enquanto Bolsonaro teve maior adesão em todos os estados do Sul e Centro-Oeste. As regiões Sudeste e Norte ficaram divididas. No Sudeste, Lula venceu em Minas Gerais, mas perdeu nos outros três estados. No Norte, quatro estados ficaram com o ex-presidente; e três, com o atual, entre os quais o Pará.

Há muitas leituras para essa divisão entre os Brasis meridional e o setentrional, principalmente o Nordeste. Uma delas é a de que o Brasil moderno apoia Bolsonaro, enquanto o atraso está firme com Lula e não abre. Esse tipo de interpretação já se traduziu numa guerra suja de memes nas redes sociais, na qual o preconceito contra os nordestinos revela uma xenofobia estranha e perigosa para a coesão social e a unidade nacional.

Xenofobia é a hostilidade e o ódio contra pessoas por elas serem estrangeiras ou por serem enxergadas como estrangeiras, como às vezes acontece com os nordestinos no Sul do país. Esse sentimento já foi muito comum no Rio de Janeiro, contra os “paraíbas”, e em São Paulo, em relação aos “baianos”, como eram chamados de forma generalizada, durante o processo de urbanização e industrialização do país, que atraiu para essas metrópoles grande número de migrantes, que fugiam da miséria, da fome e da seca do Nordeste. Em Brasília, a expressão “candango”, que era pejorativa em relação aos que trabalharam na construção da nova capital, porém, virou sinônimo de brasiliense.

Autor de Casa Grande & Senzala, o sociólogo Gilberto Freyre foi muito contestado por estabelecer como padrão para a formação do patriarcado brasileiro a composição étnica do Nordeste brasileiro, principalmente de Pernambuco. Em resposta, na conferência “Continente e ilha”, apresentou sua tese de que nos desenvolveríamos social e culturalmente em ilhas, e essas ilhas, em arquipélagos, ou numa enorme ilha-continente. Segundo Freyre, na América Portuguesa haveria uma base cultural lusitana e cristã que nos daria unidade, e, por consequência, seria a chave da brasilidade.

“Desculturização”

Freyre destacou que o “processo sociológico de povoamento” do Sul do país, a partir de Porto Alegre, se desdobrou em dois sentidos: no de ilha e no de continente. Ressaltou, ainda, as contribuições italianas e alemãs à cultura nacional, que chamou de “valores neobrasileiros”, mas que só ganham espaço na medida em que são assimilados pela cultura nacional. Quanto a isso, chamou atenção para o “pangermanismo”, que representaria uma ameaça real, que viria a ser duramente combatida por Getúlio Vargas após o Brasil entrar na guerra contra o Eixo.

Os sentimentos de continente e de ilha seriam antagonismos constitutivos do Brasil e estariam em equilíbrio, uma vez que o contrário disso nos sujeitaria “(…) a uma verdadeira guerra civil, na sua psicologia social e dentro de sua cultura”. É mais ou menos o que está ocorrendo neste momento de radicalização política.

Por outro lado, essa xenofobia reflete um processo regressivo de “desculturização”, que outro genial intérprete do Brasil, Darcy Ribeiro, atribuiu à crueldade, à rigidez e ao autoritarismo com que se deu a associação entre negros, índios e brancos no processo de colonização e que se reproduz em razão do nosso deficit educacional e atraso cultural, inclusive das elites econômicas.

Segundo Darcy Ribeiro, foi dentro dos cenários regionais que a busca de si mesmo se fez necessária para se iniciar o nosso processo civilizatório. A “humanidade” renasceria da extinção de povos, com suas línguas e culturas próprias e singulares, a partir do surgimento de macroetnias maiores e mais abrangentes. Darcy registra a existência dos Brasis “crioulo”, “caboclo”, “sertanejo”, “caipira” e “sulino”, facilmente identificados, por exemplo, na nossa cultura popular, mas que também têm expressão na forma como se faz política nas diferentes regiões do país.

De certa forma, Lula e Bolsonaro se identificam com maior ou menor facilidade com cada um desses Brasis. Ou seja, a divisão política e ideológica do país tem uma dimensão antropológica que precisa ser levada em conta para que possa ser superada, condição para a construção de qualquer projeto de futuro em bases democráticas e que busca a superação de nossas desigualdades e iniquidades sociais.

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Adesismo e derrota na federação PSDB Cidadania | Imagem: reprodução

Nas entrelinhas: Adesismo e derrota na federação PSDB-Cidadania

Luiz Carlos Azedo | Nas entrelinhas | Correio Braziliense

A coligação PSDB-Cidadania elegeu 18 deputados, de uma bancada de 29 parlamentares. Os tucanos eram 22, agora são 13. Os “cidadânios”, digamos assim, eram sete, e agora são cinco. A coligação foi feita para consolidar a hegemonia interna dos deputados paulistas de ambas as legendas, em torno da candidatura à reeleição do governador Rodrigo Garcia, que não chegou ao segundo turno. À época, o candidato do PSDB era o governador João Doria, candidato à Presidência, mas havia uma conspiração armada para defenestrá-lo tão logo se desincompatibilizasse do cargo para disputar a eleição.

No começo, Doria não acreditou que isso poderia ocorrer, mas levou um xeque-mate tão logo Garcia assumiu controle pleno do Palácio dos Bandeirantes. O vice que assumira o governo fazia a política municipalista, enquanto Doria se digladiava com o presidente Jair Bolsonaro (PL) durante a pandemia, diga-se de passagem, em defesa da causa mais justa naquele momento: a política de distanciamento social e a corrida para produção de vacinas.

O governador foi vitorioso do ponto de vista da política sanitária, mas a superexposição aumentou sua taxa de rejeição no plano eleitoral. Garcia era um articulador suave, que conquistou o apoio da maioria dos prefeitos e da bancada tucana. Conduziu com competência a operação de cerco e aniquilamento de seu padrinho político no partido.

O PSDB não queria Doria como candidato, ou melhor, não queria ter candidato algum à Presidência. Isso seria um estorvo para a maioria da sua bancada federal, que estava grudada como bigode no Centrão, ou seja, na boca do Orçamento Secreto, mas do lado de fora do governo Bolsonaro.

A federação com o Cidadania facilitava a montagem das chapas proporcionais e trazia um aliado para disputa contra Doria. A preferência do Cidadania era o governador gaúcho Eduardo Leite, que jogou a toalha na disputa com Doria, ao perceber que os paulistas também não queriam que fosse candidato. Para o Cidadania, a federação resolveria suas dificuldades para ultrapassar a cláusula de barreira e poderia garantir a sobrevivência do partido, que sucedeu o antigo PPS (ex-PCB).

A salvação da lavoura foi a candidatura de Simone Tebet (MDB), um dos raros produtos da alta política dessas eleições, que sobreviveu a todos os assédios para que retirasse seu nome da disputa. O presidente do Cidadania, Roberto Freire, obsessivo articulador de uma alternativa de centro democrático à polarização Lula x Bolsonaro, e o deputado Baleia Rossi, presidente do MDB, que bancou a candidatura, foram os artífices dessa empreitada. Simone fez uma bela campanha, apesar de “cristianizada” pelo MDB e pelo PSDB. O Cidadania investiu em sua candidatura, mesmo sem possibilidade de ir ao segundo turno, vislumbrando que seria uma aposta para o futuro, ou seja, para 2026.

O que deu errado? O maquiavelismo provinciano de Garcia e seus aliados, que não contavam com a força do presidente Jair Bolsonaro (PL) na alavancagem da candidatura de Tarcísio de Freitas (Republicanos), que virou o primeiro turno como franco favorito. Garcia ainda tentou desbancá-lo, fazendo pilhérias com o fato de o adversário não ser paulista e sequer saber onde ficava a seção eleitoral na qual votou. Mas não contava com o desgaste da longa permanência do PSDB no poder e das defecções que legenda sofreu desde quando Doria passou a controlar seu diretório regional. A mais importante foi a do ex-governador Geraldo Alckmin, que virou vice de Lula, mas houve outras, como a do ex-senador Aloysio Nunes Ferreira.

Troca-troca

O fato de o PT tratar Garcia como inimigo principal foi um equívoco grave, porque deixou Tarcísio solto e acabou empurrando toda a base do governador paulista para o colo do candidato que encarnava a polarização nacional. Isso criou as condições para que Garcia anunciasse apoio a Bolsonaro no segundo turno, para horror dos tucanos históricos, que estão vendo a legenda se transformar num partido meramente fisiológico. Com todos os seus defeitos, Doria tinha uma proposta programática social-liberal. Já o grupo liderado por Garcia não tem proposta alguma.

Liderado por Roberto Freire, o Cidadania tenta resistir ao arrastão bolsonarista em São Paulo, mas o líder da bancada na Câmara, Alex Manente, que se elegeu com grande votação, fez questão de marcar posição e anunciou que a bancada ficaria neutra na disputa nacional. A maioria apoiará a reeleição do presidente da República nos estados.

Entretanto, a legislação permite a troca de legendas dentro da federação, sem perda de mandato. Os dois partidos teriam mais nitidez se fizessem um troca-troca: quem apoia Lula no segundo turno fica ou vai para o Cidadania, quem apoia Bolsonaro permanece ou muda para o PSDB. Ou vice-versa. Seria mais coerente.

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Trabalho de Sísifo | Imagem: reprodução/Kleber Sales/Correio Braziliense

Nas entrelinhas: Ciro carrega pedra como Sísifo

Luiz Carlos Azedo | Nas entrelinhas | Correio Braziliense

Candidato à Presidência da República pela quarta vez, Ciro Gomes nos lembra O Mito de Sísifo, o mais esperto dos mortais segundo a mitologia grega. Ex-prefeito de Fortaleza, ex-governador do Ceará, ex-ministro da Fazenda do governo Itamar Franco e da Integração Nacional do governo Lula, ex-deputado estadual e federal, é um dos políticos mais experientes do país, com reconhecida capacidade administrativa. Concorreu à Presidência em 1998 e 2002 pelo antigo PPS; e, em 2018, pelo PDT, mesma legenda que o abriga neste ano.

“Os deuses condenaram Sísifo a rolar incessantemente uma rocha até o alto de uma montanha, de onde tornava a cair por seu próprio peso. Pensaram (os deuses), com certa razão, que não há castigo mais terrível que o trabalho inútil e sem esperança”, escreveu o filósofo existencialista franco-argelino Albert Camus (1913-1960), ao explicar a condição humana no livro O Mito de Sísifo, publicado em 1942, em plena Segunda Guerra Mundial.

Enfurecido com os golpes que Sísifo aplicava contra os deuses, Zeus mandou Tânato, a deusa da morte, levá-lo ao mundo subterrâneo. Sísifo a presenteou com um colar e elogiou sua beleza. Na verdade, o ornamento era uma coleira, com a qual aprisionou Tânato. Deus dos mortos, Hades libertou Tânato e mandou-a novamente atrás de Sísifo. Antes de ser levado até Hades, Sísifo pediu à sua esposa, Mérope, que não enterrasse seu corpo. Quando encontrou o deus dos mortos, disse que precisava voltar pra casa, para ordenar à esposa que o enterrasse. Assim, enganou a morte pela segunda vez. Zeus e Hades consideraram Sísifo um revoltado e o sentenciaram à punição eterna: levar uma pedra ao alto da montanha e vê-la rolar, para novamente carregá-la até o alto, em um esforço sem fim.

Camus escolheu Sísifo por sua audácia diante da morte. Sua revolta consciente era negar os deuses e aceitar seu destino. Sua liberdade era encarar o absurdo sem nostalgia, salto ou apelo. Sua grandeza foi viver conhecendo todos os riscos. “Esse mito só é trágico porque seu herói é consciente. O que seria sua pena se a esperança de triunfar o sustentasse a cada passo?”, indaga Camus.

Emparedado

“O operário de hoje trabalha todos os dias de sua vida nas mesmas tarefas, e esse destino não é menos absurdo. Mas só é trágico nos raros momentos em que ele se torna consciente. Sísifo, proletário dos deuses, impotente e revoltado, conhece toda a extensão de sua miserável condição: pensa nela durante a descida. A clarividência que deveria ser o seu tormento consuma, ao mesmo tempo, sua vitória. Não há destino que não possa ser superado com o desprezo”, ensina Camus.

Em 1998, Ciro rompeu com o então presidente Fernando Henrique Cardoso por causa da emenda da reeleição e deixou o PSDB. Explicitou divergências sobre a venda do patrimônio público, as dívidas interna e externa e valorização artificial do real. Seu programa de governo previa a redução drástica dos juros e a adoção de um câmbio flutuante. FHC foi reeleito no primeiro turno, com 53% dos votos, e Ciro ficou em terceiro, com cerca de 10% dos votos.

Com apoio de Leonel Brizola, em 2002 conseguiu formar uma frente com o PPS, PTB e PDT. Seu principal adversário era o tucano José Serra. Suas posições sobre a renegociação da dívida externa assustaram o setor financeiro, mas foi uma declaração infeliz sobre a atriz Patrícia Pillar, sua companheira na época, que pôs sua campanha a perder. No primeiro turno Lula venceu com 46% dos votos, Serra ficou em segundo com 23%, Garotinho em terceiro com 18% e Ciro Gomes em quarto com 12%.

Na campanha de 2018, Ciro disse que “quem estava sangrando o Brasil eram os brasileiros endinheirados”. Defendeu a renegociação e o alongamento da dívida interna, e a redução das taxas de juros. Prometeu limpar o nome de devedores no Serviço de Proteção ao Crédito (SPC). Com 13,3 milhões de votos(12,47%), foi o terceiro colocado na eleição presidencial. Ciro, novamente, é candidato; de novo, foi emparedado por Lula. Realiza um esforço de Sísifo. Caiu de 9% para 6%% nas intenções de voto.

https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-ciro-carrega-pedra-como-sisifo/

Em defesa da democracia estampado na bandeira do Brasil | Foto: ThalesAntonio/Shutterstock

Movimentos populares voltam às ruas nesta quinta em defesa da democracia

Nicolau Soares*, Brasil de Fato

Nesta quinta-feira (11), as ruas de ao menos 19 capitais serão palco de manifestações pela democracia, em defesa de eleições livres e contra a violência política. Inicialmente convocados pelos movimentos populares, sociais e sindicais organizados na campanha "Fora, Bolsonaro" para o dia 6, os atos foram adiados para acontecerem na mesma data da leitura da "Carta às brasileiras e aos brasileiros em defesa do Estado democrático de Direito", que já recebeu mais de 800 mil assinaturas até aqui.

"A campanha vem realizando, desde que Bolsonaro assumiu, atos em defesa da democracia, para pressionar pela questão da vacinação, denunciando a fome, o desemprego. E agora, voltamos às ruas contra a escalada do autoritarismo, da ameaça de não respeitar as eleições, ou seja, não respeitar a soberania popular do voto, anunciando ao mundo naquela reunião com os embaixadores que a urna eletrônica não é segura", afirma Raimundo Bonfim, coordenador da Central de Movimentos Populares (CMP) e um dos organizadores da campanha, que inclui as Frentes Brasil Popular e Povo Sem Medo, além de dezenas de entidades.

A organização da campanha já tem 22 atos confirmados em 19 estados, número que deve crescer até a quinta-feira. Em São Paulo, a manifestação pública acontece a partir das 17h, no vão livre do Masp, na Avenida Paulista. No Rio de Janeiro, o ato acontece na Candelária, região central da cidade, a partir das 16h.

Também está previsto ato em Brasília, em frete ao Congresso Nacional, a partir das 15h. Em Salvador, será realizada uma passeata saindo da praça do Campo Grande às 9h.

Ações simultâneas

A data marca o lançamento oficial do manifesto elaborada por ex-alunos e professores da Faculdade de Direito da USP, que acontecerá às 11h30, no Salão Nobre da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, em São Paulo.

Clique aqui para ler na íntegra e assinar o documento.

Mais cedo, às 9h30, será feita a leitura do manifesto Em Defesa da Democracia e da Justiça, de iniciativa da Fiesp e subscrito por 107 entidades de diversos setores, como a Febraban e organizações ligadas ao agronegócio. O documento já foi publicado em alguns dos maiores jornais do Brasil na semana passada.

A diversidade de setores mostra um amplo arco de forças na defesa da democracia, o que é comemorado por Raimundo. "Isso é importante, nós saudamos essa iniciativa puxada pela Faculdade de Direito da USP e por setores empresariais, mas nós achamos que o elemento rua é fundamental nessa luta em defesa da democracia para o povo brasileiro", afirma, ressaltando as diferenças entre os grupos.

"Nós defendemos a democracia, mas defendemos a democracia com direitos. Com políticas públicas. Não existe democracia com racismo, com desemprego, com fome, com miséria. Estaremos nas ruas fazendo a defesa da democracia, da soberania popular do voto, mas também levando a nossa pauta de denúncia, do desemprego, das más condições de vida do povo brasileiro", conclui.

Veja abaixo a lista de atos confirmados até aqui:

AL: 

Maceió: Praça Centenário, 8h 

AM:  

Manaus: Praça da Saudade, 15h 

BA: 

Salvador: Praça do Campo Grande, 9h 

CE: 

Fortaleza: Praça da Bandeira, 9h 

DF: 

Brasília: Congresso Nacional, 15h 

ES: 

Vitória: Praça Costa Pereira, 10h 

GO:  

Goiânia: Praça Universitária, 17h 

MA: 

São Luís: Praça Deodoro, 16h 

MG: 

Belo Horizonte, Praça Afonso Arinos, 17h 

MS:

Campo Grande: Câmara Municipal, 10h. 

PB:

João Pessoa: Lyceu Paraibano, 14h 

PE: 

Recife: Rua da Aurora, 15h 

PI:

Teresina: Praça Rio Branco, 8h30 

PR: 

Curitiba: Praça Santos Andrade, 18h30 

 RJ: 

Rio de Janeiro: Candelária, 16h 

RN:

Natal: Midway, 14h30 

SC:  

Florianópolis: Praça da Alfândega, 17h 

SE:  

Aracaju: Praça Getúlio Vargas. Bairro São José, 15h. 

SP: 

Santos: Praça dos Andradas, 10h 

São Paulo: MASP, 17h 

Ribeirão Preto: Esplanada do Teatro Pedro II, 17h

*Texto publicado originalmente em Brasil de Fato. Título editado.


Supremo Tribunal Federal à noite DF | Imagem: rafastockbr/Shutterstock

Nas entrelinhas: Uma Rosa no comando do STF (e o espinho)

Luiz Carlos Azedo | Nas entrelinhas | Correio Braziliense

Não, esse texto não tem nada a ver com o velho samba de Nelson Cavaquinho, em cuja a alegoria poética o espinho quer apenas passar com sua dor, jamais machucar a flor. Estamos tratando da eleição da ministra Rosa Weber para a Presidência do Supremo Tribunal Federal (STF), ontem, para liderar a Corte de 12 de setembro até outubro de 2023, quando se aposentará compulsoriamente, ao completar 75 anos. Assumirá no lugar do ministro Luiz Fux, em pleno curso do processo eleitoral, tendo como vice-presidente Luís Roberto Barroso, um dos alvos preferidos dos ataques do presidente Jair Bolsonaro (PL) ao Supremo.

Não, esse texto não tem nada a ver com o velho samba de Nelson Cavaquinho, em cuja a alegoria poética o espinho quer apenas passar com sua dor, jamais machucar a flor. Estamos tratando da eleição da ministra Rosa Weber para a Presidência do Supremo Tribunal Federal (STF), ontem, para liderar a Corte de 12 de setembro até outubro de 2023, quando se aposentará compulsoriamente, ao completar 75 anos. Assumirá no lugar do ministro Luiz Fux, em pleno curso do processo eleitoral, tendo como vice-presidente Luís Roberto Barroso, um dos alvos preferidos dos ataques do presidente Jair Bolsonaro (PL) ao Supremo.

Como magistrada, é uma rosa de ferro, acostumada a tomar decisões difíceis. Na segunda-feira, por exemplo, enviou para a Procuradoria-Geral da República (PGR) um pedido de investigação de Bolsonaro por ter feito ataques ao sistema eleitoral, sem provas, durante encontro com embaixadores estrangeiros.

Deu sequência à ação na qual parlamentares da oposição questionam a conduta do presidente por abuso de poder econômico, improbidade administrativa e crime contra o Estado democrático de Direito. Houve forte reação da opinião pública e das chancelarias estrangeiras aos ataques que Bolsonaro fez ao sistema eleitoral brasileiro, principalmente à urna eletrônica, à Justiça Eleitoral e aos ministros Edson Fachin, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), e Alexandre de Moraes, que assume o comando da Corte durante as eleições.

Apesar de pôr mais lenha na fogueira das tensões entre Bolsonaro, o espinho, e o Supremo, essa foi uma decisão de praxe, pois cabe à PGR decidir se pede a instauração de apurações formais contra autoridades com foro privilegiado, o que é muito improvável. O procurador-geral da República, Augusto Aras, é um aliado quase incondicional de Bolsonaro. Provavelmente, a PGR pedirá o arquivamento do caso, como vem fazendo sistematicamente em assuntos que envolvem o presidente. Nos bastidores, Aras é uma das autoridades que mais se queixam da atuação do Supremo, que teria usurpado atribuições do Executivo e do Legislativo, segundo afirma nos bastidores da Praça dos Três Poderes.

Gaúcha de Porto Alegre, Rosa Weber tomou posse na Suprema Corte em 2011, depois de ter sido indicada pela então presidente Dilma Rousseff. Presidiu o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de 2018 a 2020, ou seja, durante a eleição de Bolsonaro. Fez carreira na Justiça do Trabalho, na qual ingressou em 1976, como juíza substituta no Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (Rio Grande do Sul). Em 1981, foi promovida ao cargo de juíza-presidente, que exerceu sucessivamente nas Juntas de Conciliação e Julgamento de Ijuí, Santa Maria, Vacaria, Lajeado, Canoas e Porto Alegre.

Judicialização

Pela própria trajetória como magistrada, Rosa é protagonista de um fenômeno polêmico, que vem sendo muito questionado e também estudado no Brasil: a judicialização da política, a partir de uma concepção formal sobre as atribuições e relações entre os poderes. O debate político, porém, deu à expressão, cujo sentido é normativo, um caráter pejorativo.

A rigor, há dois modelos em discussão. No primeiro, trata-se de uma República constitucional com predomínio das instâncias eleitorais-majoritárias de representação, na qual o Judiciário é voltado à aplicação da lei aos casos individuais e com limitada interferência nas decisões legislativas e governamentais. É mais ou menos nesse campo que se posicionam Bolsonaro, os militares que ocupam o Palácio do Planalto, os políticos do Centrão que dão sustentação ao governo e Aras.

O outro modelo consagra a cooperação e complementariedade entre os poderes nas decisões políticas, com base na Constituição de 1988, que deu ao Estado brasileiro as características de uma democracia ampliada, com maior participação da sociedade civil nas agências governamentais. Nesse modelo, o Judiciário tem o papel de formular os valores compartilhados e servir de canal de expressão para grupos minoritários cujos direitos não são levados em conta pela representação da maioria.

Nesse contexto, ao longo dos últimos 20 anos, o Supremo emergiu como poder moderador na relação entre os poderes Executivo e Judiciário e entre o Estado e sociedade, ocupando espaços na definição de políticas públicas e na garantia de direitos sociais, sempre que o Executivo os contrariava ou o Legislativo se omitia, como nos casos do aborto, das terras indígenas, das relações homoafetivas etc.

A existência da Justiça Trabalhista e da Justiça Eleitoral, que antecedem a Constituição de 1988, já era expressão dessa tendência, que ganhou mais vigor a partir da democratização do país. São inúmeros os temas nos quais o STF é demandado em ações diretas de inconstitucionalidade (Adins) para garantir direitos de entes federados ou dos cidadãos em sua relação com o Estado. Rosa tende a reafirmar essa tendência à frente do Supremo, até por uma questão de coerência doutrinária e trajetória pessoal na magistratura.

https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-uma-rosa-no-comando-do-stf-e-o-espinho/

Brasil vive 'mistura tóxica de ódio pessoal e polarização política'

Leandro Prazeres*, BBC news Brasil

Nem mesmo a experiência de quem acompanha a política e as eleições na América Latina há mais de 30 anos foi suficiente para evitar o espanto que o professor americano Scott Mainwaring sentiu ao saber da morte de Marcelo Arruda, um membro do PT morto a tiros por um apoiador do presidente Jair Bolsonaro (PL).

"É um fato grave, não lembro de nada parecido no Brasil", disse à BBC News Brasil.

Scott Mainwaring é um dos maiores especialistas do mundo em política, democracias e ditaduras na América Latina. Ele já morou em países como a Argentina e o Brasil (onde fez pesquisa de campo para o seu doutorado) e fala português fluentemente. Nestes países, ele investigou a redemocratização na região e viu como, em alguns casos, esse processo envolveu casos de violência política.

Mainwaring foi professor na Universidade de Harvard, da qual é um membro associado. Em 2019, ele foi apontado como um dos 50 cientistas políticos mais citados em trabalhos acadêmicos do mundo. Atualmente, é professor de Ciências Políticas da Universidade de Notre Dame.

O americano é autor de dezenas de livros sobre a política da América Latina, entre eles: Decay and Collapse (Sistemas Partidários na América Latina: Institucionalização, Decadência e Colapso), Democracies and Dictatorships in Latin America: Emergence, Survival and Fall (Democracias e Ditaduras na América Latina: Surgimento, Sobrevivência e Queda), e Party Systems in Latin America: Institutionalization (Sistemas partidários na América Latina: Institucionalização).

É com essa experiência que ele analisa, com preocupação, a escalada de violência às vésperas das eleições deste ano no Brasil.

Em entrevista à BBC News Brasil, Mainwaring diz que a morte de Marcelo Arruda é resultado da "relação tóxica" entre a violência e poder político presente no país.

Segundo ele, o Brasil, assim como os Estados Unidos, vive um ambiente de "ódio pessoal e polarização política".

Para o professor, a polarização no Brasil não vai desaparecer e os principais pré-candidatos à Presidência da República, Jair Bolsonaro e Luiz Inácio Lula da Silva (PT), precisam condenar atos de violência.

"Você não pode reduzir a zero a possibilidade de um cara desequilibrado atacar a outra pessoa. Mas a mensagem das lideranças é muito importante", disse o professor.

Confira os principais trechos da entrevista:

Scott Mainwaring
Scott Mainwaring é um dos principais pesquisadores do mundo sobre política, democracia e ditaduras na América Latina

BBC News Brasil - Nas últimas semanas, ocorreram alguns incidentes violentos no Brasil relacionados à campanha política. O último foi o assassinato de um membro do Partido dos Trabalhadores (PT) praticado por um apoiador do presidente Jair Bolsonaro. E isso lança algum tipo de alerta sobre o que está ocorrendo no Brasil?

Scott Mainwaring - Certamente. Não pode ter espaço para esse tipo de violência política. É um ato de criminalidade comum e, além disso, é um tipo de ato que atinge a democracia.

BBC News Brasil - Que sinal a morte de alguém nessas circunstâncias manda para a comunidade internacional?

Mainwaring - Para mim, é mais um indicador de uma relação tóxica entre violência e poder político. Como fato isolado, não acho preocupante. O que é preocupante é quando você combina isso com outros incidentes de violência.

Marcelo Arruda
Marcelo Arruda foi morto quando comemorava seus 50 anos numa festa com decoração do PT e imagens de Lula

Mainwaring - Me refiro a outros incidentes de violência. Estou pensando na relação da política com as milícias, com o crime organizado, nos assassinatos de candidatos a prefeitos, vereador. Quando você combina tudo isso, aí, sim, é preocupante.

BBC News Brasil - Considerando o histórico político do Brasil, quão grave é a morte de um militante político por um oposicionista?

Mainwaring - É um fato grave. Não lembro de acontecimentos parecidos no Brasil. Isso lembra, por exemplo, os brownshirts (camisas marrons) da Alemanha nos anos 1920 e começo dos 1930. Atinge de forma profunda a democracia.

[Nota: "camisas marrons" era o nome pelo qual ficaram conhecidos os primeiros integrantes de uma organização paramilitar nazista fundada por Adolf Hitler em 1921]

BBC News Brasil - O senhor mencionou os camisas marrons. Na sua avaliação, esse episódio lembra a Alemanha pré-nazismo ou a Alemanha nazista?

Mainwaring - Não quero exagerar. Na Alemanha pré-nazista isso era comum. Tanto os nazistas como os comunistas tinham milícias muito grandes, inclusive maiores que o Exército alemão naquela época. Mas vai nesse sentido. Vai nessa direção.

BBC News Brasil - Quais foram os fatores que levaram o Brasil a esse nível de animosidade que resultou, por exemplo, na morte desse membro do Partido dos Trabalhadores?

Mainwaring - Desde 2014, o Brasil sofre um processo muito grave de polarização política. E isso se acentua pela presença das mídias sociais, que exacerba a polarização política e cria uma animosidade. Elas levam essa polarização para um processo de animosidade, de ódio. É possível ter um processo de polarização que não se baseia em ódios pessoais. Mas no Brasil de hoje, como também nos Estados Unidos, você tem essa mistura tóxica de ódio pessoal e polarização política.

Bolsonaro
Em ato de campanha em 2018, Bolsonaro defendeu fuzilar a 'petralhada'

BBC News Brasil - Considerando essa escalada de violência, o Sr. acredita que o Brasil poderia ser palco de algo semelhante à invasão do Capitólio, nos Estados Unidos, caso um candidato não aceite o resultado das eleições?

Mainwaring - É um risco.

BBC News Brasil - É um risco alto, médio, baixo? Como o senhor classificaria?

Mainwaring - Não acho que seja grande, mas eu diria que é médio. O fato de Bolsonaro denunciar os mecanismos eleitorais brasileiros e dar sinais de que pode não aceitar o resultado caso ele perca as eleições, é aí que reside o maior risco. Isso, para a democracia, é muito grave.

BBC News Brasil - O Brasil tem sido descrito por especialistas como um dos países da terceira onda de democratização onde os fundamentos e funcionamento da democracia iam relativamente bem. Esses episódios violentos mais recentes indicam uma deterioração da democracia brasileira?

Mainwaring - Sem dúvida. A democracia brasileira entre 1985 e 2012 ou 2014, realmente, tinha muitos aspectos altamente positivos. Acho que a degradação da democracia brasileira nos últimos cinco ou seis anos é real.

A eleição de um presidente com perfil tão autoritário como o Bolsonaro é um sinal em si mesmo.

Quando você elege um presidente iliberal, com traços muito autoritários, isso já representa um perigo para a democracia.

Os problemas antecediam a eleição de Bolsonaro, como a corrupção, os problemas econômicos, o aumento da violência e a perda de credibilidade, por um lado, do PT, e por outro do establishment ao centro e à direita.

Bolsonaro
Bolsonaro já falou em 'fuzilar' petistas e usar 'granadinha' para matar Lula e políticos opositores

BBC News Brasil - Considerando a quantidade de armas circulando no Brasil, o Sr. teme que o país vá na direção de uma realidade em que atos de violência política sejam mais comuns? Há ambiente para uma deterioração ainda maior?

Mainwaring - Isso é possível e acho que não devíamos subestimar o quanto isso já aconteceu. O exemplo mais famoso é o assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL). Mas também já aumentou o número de assassinatos de candidatos a prefeito e vereador. Isso é grave e poderia se acentuar, mas não vejo como algo inevitável.

BBC News Brasil - O nível de polarização tende a piorar ou melhorar até as eleições?

Mainwaring - Acho que vai piorar, porque a campanha política vai ser, certamente, entre Lula e Bolsonaro. E 40% do país tem ódio do Lula e outros 40% têm ódio do Bolsonaro. A tendência provável de Lula não vai ser polarizar. Ele vai polarizar contra o Bolsonaro, mas não vai assumir posições radicais. Mas Bolsonaro sempre polariza e certamente ele vai pintar Lula como um diabo. Eu acho quase inevitável que a polarização se exacerbe nos próximos meses. Agora, depois da eleição é um momento de possível diminuição da polarização. Os dois candidatos vão ter que costurar alianças para governar o país.

BBC News Brasil - Qual é a responsabilidade de Lula nesse cenário de polarização?

Mainwaring - Acredito que o Lula poderia polarizar contra Bolsonaro, mas buscar o eleitor médio. Lula, provavelmente, vai se posicionar para ganhar o centro do Brasil. A probabilidade de ele ganhar aumenta se ele pode capturar o centro do país. Para mim, a estratégia mais óbvia do Lula seria lógico denunciar o Bolsonaro, polarizar contra ele, mas se posicionar como uma alternativa sensata, uma alternativa viável ou uma alternativa que no governo não vai ser radical, não vai polarizar.

BBC News Brasil - O presidente Bolsonaro tem sido acusado por alguns críticos de incentivar os seus apoiadores contra esquerdistas. Por outro lado, alguns dias atrás, o presidente Lula agradeceu a um membro do Partido dos Trabalhadores que atacou um manifestante antilula. Na sua avaliação, é justo dizer que Lula e Bolsonaro são igualmente responsáveis por esse ambiente de tensão que a gente vê no Brasil?

Mainwaring - Teria que estar no Brasil para fazer uma avaliação mais equilibrada sobre essa pergunta.

Luiz Inácio Lula da Silva
Lula parabenizou um ex-vereador do PT que agrediu um empresário em 2018 num protesto contra o ex-presidente

BBC News Brasil - O presidente Bolsonaro tem questionado, ainda que sem apresentar provas, a legitimidade do sistema eleitoral brasileiro. Os militares, que são muito próximos do presidente, têm colocado a integridade do sistema em dúvida. O senhor acredita que as Forças Armadas brasileiras vão aceitar o resultado das eleições se Bolsonaro perder?

Mainwaring - Se Lula ganha por uma vantagem razoável, acho que a tendência dos militares, neste caso, é aceitar o resultado. E se a eleição for muito apertada? Aí, digamos, teria mais espaço para os militares não aceitarem. Acho, de qualquer maneira, pouco provável que os militares não aceitem [o resultado]. Mas essa possibilidade aumenta se a eleição for extremamente apertada.

BBC News Brasil - O senhor é um dos principais especialistas em democracia, ditaduras e ditaduras militares na América Latina. Na sua avaliação, existe algum espaço para uma ruptura democrática no Brasil hoje?

Mainwaring - Para a ruptura clássica via golpe militar, acho que não há espaço. Desde o fim da Guerra Fria, a maneira mais frequente de a democracia se romper é pela via do que chamamos de "executive takeover". Seria, digamos, quando o presidente, ao longo do tempo, degrada a democracia a tal ponto que ela deixa de ser um regime democrático. Um exemplo clássico é a Venezuela pós-Hugo Chávez. Outro exemplo claro é a Nicarágua e o regime de Daniel Ortega. Mas poderíamos pegar um caso como a Hungria de Viktor Orbán. Esse risco eu acho que é real, especialmente se Bolsonaro ganhar de novo. O risco de ele procurar concentrar mais o poder... os ataques dele ao STF são um indicador nefasto. Agora, Bolsonaro não deverá ter uma maioria no Congresso e isso dificulta as coisas para ele.

BBC News Brasil - Nos últimos anos, houve um relaxamento das normas no Brasil em relação à compra de armas e alguns especialistas dizem hoje que o Brasil tem mais armas circulando hoje do que no passado. Considerando todo esse ambiente de tensão das nossas eleições, quão preocupante é termos uma eleição neste ambiente?

Mainwaring - Não sei quão preocupante isso é para a eleição. Acho que (assassinatos como o de Marcelo) são um episódio raro e que não se repetem muito. O que é mais preocupante em termos do aumento de número de armas é a prática quotidiana da democracia nas áreas pobres do Brasil como as favelas do Rio de Janeiro. É o controle que as milícias e as organizações criminosas exercem nessas áreas e na região amazônica. Eu diria que aí a democracia brasileira sofre muito e isso não é uma novidade.

BBC News Brasil - O senhor sente que há uma preocupação maior neste ano, fora do Brasil, em relação às eleições deste ano na comparação com outros anos?

Mainwaring - Certamente. A preocupação não é porque o sistema eleitoral seja frágil, mas é que um dos candidatos, Bolsonaro, poderia não aceitar o resultado.

BBC News Brasil - Existe, na sua avaliação, algum sinal de que essa tensão que existe hoje possa se dissipar depois das eleições? Ou esse nível de polarização é algo que veio para ficar e que vai demorar um tempo para desaparecer, se é que vai desaparecer?

Mainwaring - Se Lula ganhar, vai depender de como ele governará. A polarização não vai se dissipar. Não há nenhuma forma para que isso passe, mas poderia diminuir. E de quê maneira? Se o governo de Lula for exitoso, a tendência é diminuir a polarização. Por outro lado, se ele toma posições mais moderadas, isso ajudaria a diminuir a polarização. Por outro lado, se se repetem os casos de corrupção, se a economia não retomar um caminho mais positivo, se a violência não diminuir, aí a polarização provavelmente não vai diminuir.

BBC News Brasil - O Sr. mencionou que a morte de Marcelo Arruda é mais um indicador de uma relação tóxica entre violência e poder político. O que é exatamente os atores políticos podem ou deveriam fazer para que episódios como esses não acontecessem?

Mainwaring - Para os candidatos Bolsonaro e Lula, sobretudo porque são os únicos que têm uma chance viável, eles têm que denunciar essa violência. Isso é muito importante. Você não pode reduzir a zero a possibilidade de um cara desequilibrado atacar a outra pessoa. Mas a mensagem das lideranças é muito importante. Você tem que renunciar o uso da violência.

BBC News Brasil - Numa declaração, o presidente Bolsonaro disse o seguinte: "Vocês viram o que aconteceu ontem? Uma briga entre duas pessoas lá em Foz do Iguaçu? Bolsonaro isso não sei o que ela. Agora ninguém fala que o Adélio", que é a pessoa que o esfaqueou em 2018 e que foi filiado ao PSOL. Nas suas redes sociais, ele não chegou a lamentar a morte do Marcelo e acusou a esquerda de violenta. Esse tipo de declaração ajuda a acalmar os ânimos?

Mainwaring - Evidente que não. Agora, eu não sabia do incidente no qual o Lula aplaudiu a agressão de um petista contra um Bolsonaro. E isso também, no meu ver, é lamentável. Os dois têm que se pronunciar contra o uso da violência.

*Texto publicado orginalmente em BBC news Brasil. Título editado.


Simone Tebet | Foto: Agência Senado

Nas entrelinhas: Dobradinha de mulheres na terceira via

Luiz Carlos Azedo | Nas entrelinhas | Correio Braziliense

A chapa Simone Tebet, candidata do MDB à Presidência da República, com Mara Gabrilli (PSDB-SP) como sua vice, é alvissareira. Abre espaço para mais mulheres na política, agora com possibilidades financeiras, porque 30% do fundo eleitoral serão destinados a candidaturas de mulheres pelos partidos, que podem ser punidos se não o fizerem. Entretanto, Simone nem de longe tem as mesmas condições oferecidas à ex-presidente Dilma Rousseff, que se elegeu com apoio do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2010, no auge de sua popularidade, e se reelegeu em 2014, embora com dificuldades e uma oposição que viria apeá-la do poder, com o impeachment.

Mesmo assim, a sobrevivência da candidatura de Simone Tebet no MDB, um partido dominado por velhos caciques políticos regionais, e a indicação de Gabrilli para vice, pelo PSDB, uma senadora de grande prestígio em São Paulo, são obras de grande engenharia política. Nessa construção, destacaram-se a própria candidata, que não esmoreceu diante dos desafios; o presidente do MDB, deputado Baleia Rossi, que bancou sua candidatura até o fim; o presidente do PSDB, Bruno Araújo, que retirou do caminho o ex-governador de São Paulo João Doria, abdicando da candidatura própria; e o presidente do Cidadania, o veterano Roberto Freire, que apostou na aliança MDB-PSDB-Cidadania, inclusive removendo a candidatura própria do senador Alessandro Vieira (SE), então no Cidadania, quando a aliança com o MDB parecia impensável.

A escolha do nome de Mara Gabrilli para vice foi uma decisão estratégica. O PSDB de São Paulo não estava nem aí para Simone Tebet, mais empenhado na reeleição do governador Rodrigo Garcia, que enfrenta dois adversários poderosos: o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad (PT) e o ex-ministro de Infraestrutura Tarcísio de Freitas (Republicanos). A decisão foi tomada na cúpula da aliança, num encontro das duas senadoras com Baleia, Araújo e Freire. Segundo Tebet, a conversa entre as duas colegas de Senado foi decisiva:

“Eu tinha dúvida, Mara, se uma chapa 100% feminina seria aceita. Que bom que as [pesquisas] qualitativas mostraram que homens e mulheres estão prontos para votar nessa chapa. E quando fiz o convite para você, esperando que você fosse dizer ‘vou pensar um pouquinho, eu tenho algumas limitações’, Mara disse, na sua generosidade, ‘Simone, que honra. Como vai ser bom falar para o Brasil da nossa causa e da nossa luta'”, relata Tebet.

São Paulo

Psicóloga e publicitária de formação, Mara Gabrilli é tetraplégica. Como mulher, é um exemplo de superação, com atuação política muito focada na inclusão social, em especial dos deficientes físicos. Destacou-se muito como parlamentar combativa e competente, inicialmente na Câmara, onde enfrentou adversários poderosos, como o então presidente da Câmara, Eduardo Cunha (MDB-RJ), cuja saída do comando da Casa defendeu em plenário.

A escolha de Gabrilli agrega força à candidatura de Simone Tebet em São Paulo, o maior colégio eleitoral do Brasil, o que dificulta a sua cristianização pelo PSDB paulista e pelo prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB). Gabrilli já foi testada em disputa majoritária, em 2018, nadando contra a maré. O governador Rodrigo Garcia, do PSDB, e o prefeito da capital eram vices. A consolidação da candidatura de Simone, porém, enfrenta o desafio de uma eleição muito polarizada, na qual a narrativa do “voto útil” ganha muita força. O fato novo da escolha é a possibilidade de a chapa sair do ponto de inércia em que se encontra nas pesquisas e ganhar mais fôlego com apoio entre as mulheres e no eleitorado paulista. A conferir.

Casa de louças

Em ofício classificado como “urgentíssimo”, o ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, pediu ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) acesso ao código-fonte das urnas eletrônicas até 12 de agosto, em caráter de “urgência, urgentíssima”. O ofício é mais uma forma de pressão sobre o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), passa a impressão de que a Corte nega acesso aos técnicos das Forças Armadas ao sistema de segurança das urnas eletrônicas, o que não é verdade.

O código-fonte das urnas eletrônicas está à disposição do Ministério da Defesa há um ano. Nesse período, a Controladoria Geral da União (CGU), o Ministério Público Federal (MPF), o Senado e a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) já tiveram acesso ao mesmo. O PTB, de Roberto Jefferson, o está inspecionando nesta semana. Ainda neste mês está prevista a inspeção da Polícia Federal. A Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) também estão credenciadas para fazê-lo. PL e PV também.

https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-dobradinha-de-mulheres-na-terceira-via/

Luiz Fux discursando em palanque | Foto: Joa Souza/Shutterstock

Nas entrelinhas: Supremo volta do recesso fortalecido

Luiz Carlos Azedo | Nas entrelinhas | Correio Braziliense

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luiz Fux, no discurso de abertura do semestre, reverberou o fortalecimento da Corte em razão do maciço apoio que recebeu da sociedade civil, nos dois manifestos anunciados na semana passada, um liderado por juristas ligados à tradicional Faculdade de Direito do Largo do São Francisco, e o outro por empresários e banqueiros ligados à Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp) e à Federação Brasileira dos Bancos (Febraban), respectivamente. Ambos foram uma resposta aos ataques feitos pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) às urnas eletrônicas, à Justiça Eleitoral e ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em particular, aos ministros do STF Luís Roberto Barroso, Édson Fachin e Alexandre de Moraes — respectivamente ex, atual e futuro presidente da Corte eleitoral.

Fux reiterou que “nossa democracia conta com um dos sistemas eleitorais mais eficientes, confiáveis e modernos de todo o mundo” e “uma Justiça Eleitoral transparente, compreensível e aberta a todos aqueles que desejam contribuir positivamente para a lisura do prélio eleitoral”. O presidente do STF também condenou a violência nas eleições: “O Supremo Tribunal Federal anseia que todos os candidatos aos cargos eletivos respeitem os seus adversários, que, efetivamente, não são seus inimigos. Confia na civilidade dos debates e, principalmente, na paz que nos permita encerrar o ciclo de 2022 sem incidentes”, disse.

Na mesma sessão, o ministro Alexandre de Moraes, que presidirá o TSE durante as eleições de outubro, fez uma defesa enfática do atual sistema de votação: “Quem conhece as urnas eletrônicas, quem conhece o sistema de votação, se de boa-fé for, certamente vai verificar que nós podemos nos orgulhar do nosso sistema eleitoral”.

Entretanto, no mesmo dia de reabertura dos trabalhos da Corte, Bolsonaro exibiu os músculos, anunciando a indicação de dois ministros para o Superior Tribunal de Justiça (STJ) que não estavam entre os preferidos da maioria do Supremo: Paulo Sérgio Domingues, juiz do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3), que tem o apoio de Humberto Martins e da futura presidente do STJ, Maria Thereza de Assis Moura; e Messod Azulay Neto, juiz do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, indicado pelo senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), filho do presidente.

Queda de braços

Nos bastidores do Supremo, ontem, o mal-estar era grande. O preterido nas indicações foi o desembargador do Tribunal Regional Federal da Região (TRF-1) Ney Bello, cujo nome era articulado pelo ministro do STF Gilmar Mendes. Paulo Sérgio é ligado ao ministro Nunes Marques, aliado incondicional de Bolsonaro na Corte. Os dois nomes ainda precisam ser aprovados pelo Senado, o que deve ocorrer antes das eleições. Bello foi responsável pela decisão que tirou o ex-ministro da Educação Milton Ribeiro da cadeia, mas isso não adiantou muito.

Mesmo fortalecido, outro sinal de que o Supremo não terá vida fácil foi o pedido de arquivamento do inquérito que apura se Bolsonaro vazou dados sigilosos de uma investigação da Polícia Federal (PF) ainda não finalizada, feito ontem pelo Ministério Público Federal (MPF). A vice-procuradora-geral, Lindôra Araújo, braço direto do procurador-geral, Augusto Aras, no texto do pedido, acusou nominalmente Alexandre de Moraes de violar o sistema acusatório ao determinar novas medidas na apuração.

Lindôra saiu em defesa da atuação de Aras, ao pedir o encerramento da investigação. Segundo ela, seu chefe atuou de forma técnica, jurídica, isenta, sem intenção de “prejudicar ou beneficiar determinadas pessoas”. O inquérito foi aberto porque Bolsonaro, em agosto de 2021, divulgou nas redes sociais a íntegra de um inquérito da PF que apura um suposto ataque ao sistema interno do TSE, em 2018. Segundo a Corte, não houve risco às eleições.

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Bolsonaro discursa com semblante de raiva | Foto: NANCY AYUMI KUNIHIRO/Shutterstock

Nas entrelinhas: O establishment se mexe em defesa das urnas

Luiz Carlos Azedo | Nas entrelinhas | Correio Braziliense

O encontro do presidente Jair Bolsonaro com diplomatas estrangeiros para falar mal do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e levantar suspeitas de que haveria fraudes nas urnas eletrônicas virou uma espécie de “efeito borboleta”, uma variante da Teoria do Caos, que consiste em grandes acontecimentos provocados inicialmente por pequenas alterações. O conceito passou a ser usado quando certas escolhas provocam desastres, principalmente depois do filme Efeito Borboleta, lançado em 2004, pela dupla Eric Bress e J. Mackye Gruber.

Evan Treborn (Ashton Kutcher), um jovem de 20 e poucos anos, em luta contra as memórias traumáticas de sua infância, descobre uma técnica que pode levá-lo de volta ao passado e passa a alterar diversos acontecimentos, com objetivo de mudar para sempre o seu futuro. Porém, o “efeito borboleta” trará consequências inesperadas para sua vida e daqueles que estão ao seu redor. Na tentativa de ficar com a namorada, Kayleigh, cria realidades alternativas que não terminam como gostaria. Entretanto, o que nos interessa não é um “spoiler”, mas o fenômeno ligado à Teoria do Caos.

Em 1952, o escritor de ficção científica norte-americano Ray Bradbury publicou o conto O som do trovão, no qual um personagem pisa em uma borboleta, provocando graves consequências, inclusive a chegada de um líder fascista ao poder. Em 1961, o que era ficção virou realidade científica. O meteorologista norte-americano Edward Lorenz desenvolveu um modelo matemático para a previsão do tempo, processando dados como temperatura, umidade, pressão e direção do vento no seu computador. Depois de observar os resultados, repetiu a operação. Inesperadamente, a segunda previsão foi completamente diferente da primeira.

Quanto mais o modelo avançava no tempo, as diferenças entre os dois resultados se tornavam maiores. O computador de Lorenz havia arredondado os dados de algumas casas decimais. Para Lorenz, isso equivalia a dizer que o vento provocado pelo bater de asas de uma borboleta no Brasil poderia ocasionar um tornado no Texas, nos Estados Unidos. Assim nasceu a Teoria do Caos, com seu “efeito borboleta”. É mais ou menos o que conseguiu o presidente Jair Bolsonaro com o seu inusitado e espantoso ataque às urnas eletrônicas na reunião de presentantes de quase 70 países, que provocou a forte reação da sociedade civil.

Manifestos

O establishment jurídico e empresarial resolveu dar um basta aos ataques de Bolsonaro à democracia. Suprapartidariamente, saiu em defesa do Supremo Tribunal Federal (STF). A iniciativa partiu de ex-ministros da Corte, professores e estudantes da tradicional Faculdade de Direito do Largo do São Francisco (USP), com uma declaração que começou com três mil assinaturas e já soma mais de 300 mil signatários. Outro manifesto, organizado pela poderosa Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), mobilizou o grande empresariado nacional, inclusive a Febraban. Recebeu apoio da Central Única dos Trabalhadores (CUT), da Força Sindical e de outras centrais sindicais. Os principais banqueiros do país assinaram os dois manifestos, como pessoa física.

Enquanto o establishment se mexia, o governo divulgava dados positivos sobre a economia, entre os quais a redução do preço da gasolina, a geração de emprego e a distribuição do Auxílio Brasil. O ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, tentava minimizar a importância dos manifestos. Segundo ele, os banqueiros assinaram os documentos porque perderam R$ 40 bilhões com o PIX. O lucro dos bancos não condiz com essa tese. A adesão também é resultado da PEC das Eleições, que agrediu a institucionalidade da economia e a segurança jurídica.

Protagonista do rolo compressor governista montado no Congresso, com recursos das emendas secretas ao Orçamento da União (somam R$ 16,5 bilhões), o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), foi ao Twitter como se nada houvesse: “Má notícia para os pessimistas de plantão! Estamos na contramão do mundo, mas isso é bom! Inflação em baixa, PIB em alta”. Levou um banho de água fria com a divulgação do DataFolha de ontem. O pacote de bondades do governo ainda não mudou os humores dos eleitores. Na pesquisa estimulada, Lula (PT) tem 47% e Bolsonaro (PL), 29%; Ciro (PDT), 8%; Simone (MDB), 2%; Janones (Avante), Marçal (Pros)n e Vera Lúcia (PSTU) têm 1%. Branco/nulo/nenhum: 6%. Não sabe: 3% (4% na pesquisa anterior). Os demais candidatos não pontuaram. Lula venceria no primeiro turno.

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Simone Tebet em comissão especial do Impeachment | Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado

Nas entrelinhas: Simone Tebet completa a fila de largada da campanha

Luiz Carlos Azedo | Nas entrelinhas | Correio Braziliense

A confirmação da candidatura de Simone Tebet, ontem, pela convenção nacional do MDB e da coligação que a apoia, integrada pela federação PSDB-Cidadania, completou a fila de largada das eleições deste ano. O cenário mantém como tendência principal a polarização entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), com 44% das intenções de voto, e o presidente Jair Bolsonaro (PL), com 35%, segundo a pesquisa XP/Ipespe divulgada na segunda-feira. O que pode alterar esse quadro, ou consolidá-lo, será a propaganda eleitoral de rádio e tevê, que começa em 16 de agosto.

O ex-ministro Ciro Gomes (PDT), com 9%, a senadora Simone Tebet (MDB), com 4%, e André Janones (Avante), com 2%, são os candidatos mais bem posicionados para construir uma terceira via, alternativa muito difícil. Nenhum dos três, até agora, definiu o vice. Simone contava com o apoio do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), mas o tucano histórico, mais uma vez, movimenta-se em função da política do Ceará. A senadora Eliziane Gama (Cidadania-AM) pleiteia a vaga. Pablo Marçal (Pros) e Luiz Felipe d’Avila (Novo) têm 1%. Vera Lúcia (PSTU), Sofia Manzano (PCB), Luciano Bivar (União Brasil), Eymael (DC) e Leonardo Péricles (UP) completam a fila de largada, com menos de 1% cada.

Votos nulos ou que não votariam em nenhum dos candidatos somam 4%. Não sabem/não responderam representam apenas 2% dos entrevistados, o que indica um cenário de grande participação eleitoral. Ontem, o Datafolha divulgou uma pesquisa entre jovens eleitores, que confirmou o que já se previa: o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem a preferência no eleitorado adolescente e jovem nas 12 maiores capitais do país, com 51%. Jair Bolsonaro (PL) tem 20%. Depois, vem Ciro, com 12%. São jovens de São Paulo, Rio, Belo Horizonte, Salvador, Fortaleza, Recife, Porto Alegre, Curitiba, Goiânia, Brasília, Manaus e Belém. A margem de erro é de três pontos para mais ou para menos. A pesquisa eleitoral completa do DataFolha sobre as eleições presidenciais deve ser divulgada hoje.

Nenhuma grande alteração no quadro deve ocorrer até o horário eleitoral, pois a prioridade dos candidatos agora é a articulação dos palanques regionais, resolvendo conflitos e recolhendo náufragos das alianças. Como o registro das candidaturas deve ocorrer até 5 de agosto, muita água vai rolar ainda nos estados, e os candidatos terão de conciliar as articulações de campanha com a própria movimentação eleitoral. Lula passa a ter a segurança sob responsabilidade da Polícia Federal. Como ex-presidente, já tinha esse direito, mas, agora, o esquema será reforçado em razão dos riscos de atentado.

Regras do jogo

Bolsonaro passa à desvantagem de ter que se comportar de acordo com as regras eleitorais, ou seja, será tratado como os demais candidatos, estando sujeito a punições toda vez que sair das regras do jogo. Como está em guerra com o Supremo Tribunal Federal (STF), pode ser que queira esticar a corda, para passar por vítima e ilustrar a narrativa de que não existe imparcialidade da Corte. Entretanto, essa postura aumenta seu risco eleitoral, porque a opinião pública confia na Justiça Eleitoral, e isso gera grandes desgastes políticos.

Por exemplo, o manifesto em defesa do Estado de direito organizado por juristas e estudantes da tradicional Faculdade de Direito do Largo do São Francisco (USP), berço da elite política e jurídica paulista, com apoio de empresários, intelectuais e artistas, subscrito por três mil personalidades, em 24 horas obteve a adesão de mais de 100 mil representantes da sociedade civil. Entre os signatários estão os ex-ministros do STF Carlos Ayres Britto, Carlos Velloso, Celso de Mello, Cezar Peluso, Ellen Gracie, Eros Grau, Marco Aurélio Mello, Sepúlveda Pertence, Sydney Sanches, além de artistas, intelectuais, executivos, empresários e até banqueiros. É o tipo de fato político que pode impactar negativamente a candidatura de Bolsonaro em que ela é mais forte: os eleitores com renda acima de 10 salários mínimos.

No rastro do encontro com diplomatas no qual levantou suspeitas sobre a urna eletrônica e atacou a Justiça Eleitoral, Bolsonaro vive, também, a rebordosa da reação negativa da comunidade internacional. A mais importante foi o pronunciamento do secretário de Defesa dos Estados Unidos, Lloyd Austin, na terça-feira, durante a 15ª Conferência de Ministros da Defesa das Américas, em Brasília: “Os nossos países não estão ligados apenas pela geografia. Também somos atraídos pelos interesses e valores em comum, pelo nosso profundo respeito pelos direitos humanos e pela dignidade humana, pelo nosso compromisso com o Estado de direito e por nossa devoção à democracia”, disse.

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Nas entrelinhas Neoliberalismo | Imagem: reprodução/Correio Braziliense

Nas entrelinhas: Fracasso do Novo reflete o colapso do neoliberalismo

Luiz Carlos Azedo | Nas entrelinhas | Correio Braziliense

Candidato do Novo, Felipe d’Avila até agora não emplacou. Na última pesquisa do Ipespe, registrou 1% de intenções de votos. Com 58 anos, nascido em São Paulo, é cientista político, mestre em administração pública pela Universidade de Harvard. Fundou, em 2008, o Centro de Liderança Pública, uma organização sem fins lucrativos dedicada à formação de líderes políticos. Com 10 livros publicados, é o candidato da chamada “nova política”, mas não consegue sensibilizar os eleitores.

O Novo é um projeto político que antecedeu as manifestações de junho de 2013, uma explosão de insatisfeitos de todos os matizes, contra o governo Dilma Rousseff. Com a reeleição da petista, a movimentação espontânea foi sendo direcionada para a campanha do impeachment dela. Nesse processo, surgiram vários movimentos cívicos; a turma do Novo, porém, desde o primeiro momento, apostou na formação de um partido ideológico, sem concessões ao pragmatismo político. A política do Novo é o neoliberalismo.

A grande façanha do Novo em 2018, quando elegeu oito deputados federais e 12 deputados estaduais, foi a eleição do governador de Minas Gerais, Romeu Zema, que lidera as pesquisas sobre o pleito para o governo do estado como candidato à reeleição. Entretanto, não existe transferência de votos para Fernando d´Avila em Minas. Com palanque aberto, Zema enfrenta o ex-prefeito de Belo Horizonte Alexandre Kalil, aliado do ex-presidente Lula, que lidera as pesquisas para a Presidência em Minas. O governador mineiro trafega nas bases de Bolsonaro, mas mantém um posicionamento independente.

O Novo foi o único partido que votou contra a chamada PEC das eleições, que aprovou o Auxílio Brasil e os subsídios para caminhoneiros e taxistas. Mantém sua coerência em relação aos princípios e valores que levaram à fundação da legenda, a ponto de devolver os recursos dos fundos partidário e eleitoral. Essas bandeiras vão ao encontro do cidadão comum que tem ojeriza à política e aos políticos, mas não têm apelo eleitoral até agora.

A abertura econômica está entre as principais propostas de d’Ávila, que chove no molhado: “O Brasil precisa de um presidente capaz de vencer esse populismo que nos deixou com estagnação econômica há 20 anos, recorde de desemprego, aumento da miséria. A abertura econômica do Brasil é fundamental. Nenhum país do mundo ficou rico mantendo a sua economia fechada”. O candidato do Novo defende a “conciliação” do agronegócio com o meio ambiente, a descentralização do poder e o empoderamento do cidadão por meio da digitalização do governo. E empunha a bandeira da “pacificação”, ao criticar a polarização entre o ex-presidente Lula e o presidente Bolsonaro.

Quatro décadas

O discurso envelheceu. O neoliberalismo está sendo responsabilizado pelo aumento das desigualdades no mundo e das baixas taxas de crescimento. Segundo o economista Joseph Stiglitz, Nobel de Economia, a diminuição simultânea da confiança no neoliberalismo e na democracia não é coincidência, nem mera correlação. “O neoliberalismo minou a democracia durante 40 anos. A forma de globalização prescrita pelo neoliberalismo deixou indivíduos e sociedades inteiras incapazes de controlar uma parte importante de seu próprio destino”, argumenta.

Segundo Stiglitz, o sistema capitalista precisa ser reformado, porque fomenta um crescimento de desigualdades, destruição do meio ambiente, polarização de nossas sociedades e um permanente descontentamento, que não podem ser negados. “Precisamos de um novo contrato social, que espalhe solidariedade em nossas sociedades e pelas gerações. Isso significa um papel diferente para os governos, menos ajuda para as empresas e mais ajuda aos cidadãos que necessitam, impostos progressivos e, acima de tudo, reescrever as regras da economia”, argumenta o economista.

Esse cenário é corroborado até pela diretora-gerente do FMI, Kristalina Georgieva, segundo a qual o “o capitalismo está fazendo mais mal do que bem”. O FMI fala em “cultura da solidariedade” e “globalização da esperança”. Também fala em melhorar os sistemas globais do comércio, de controlar os fluxos de capitais pelos danos que podem causar e sobre a sustentabilidade da dívida. Trocando em miúdos, o projeto de d’Ávila está descolado da realidade do Brasil e do mundo.

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No meio do caminho tinha um Janones | Foto: reprodução/OTempo

Nas entrelinhas: No meio do caminho tem um Janones

Luiz Carlos Azedo | Nas entrelinhas | Correio Braziliense

O presidente Jair Bolsonaro vive o rescaldo da grande convenção de domingo que oficializou sua candidatura. Seu discurso no Maracanãzinho mirou aquilo que as pesquisas estão mostrando e seus marqueteiros também: (1) precisa do voto das mulheres, daí o discurso de Michelle, a primeira-dama, na convenção, dirigido ao mundo evangélico para chegar ao eleitorado feminino; (2) está em franca desvantagem junto à população de mais baixa renda, em que o ex-presidente Lula nada de braçadas, situação que tenta reverter prometendo manter o Auxílio Brasil no valor de R$ 600 após as eleições (apesar de a equipe econômica só conseguir garantir R$ 400 remanejando o Orçamento da União de 2023); e (3) sonha com os votos de classe média que recebeu em 2018 e está perdendo, por causa de seu radicalismo, principalmente nos estados do Sudeste. Jovens e o Nordeste são batalhas perdidas.

Acontece que Bolsonaro não se aguenta e fala o que realmente pensa, não o que as pesquisas qualitativas da equipe de campanha estão mostrando: na convenção, fugindo ao script, partiu novamente para cima do Supremo Tribunal Federal (STF) e das urnas eletrônicas, o que é um tiro no pé, porque reforça a imagem de candidato perdedor e a ideia de que prepara um golpe de Estado, ainda mais depois de ter feito uma nova convocação para mais uma manifestação contra o Supremo no 7 de Setembro.

O Dia da Independência pode ser um Rubicão. É aí que o papel do candidato a vice, general Braga Netto, precisa ser observado com atenção. Além de ser o responsável pelo programa de governo, que promete entregar nas próximas semanas, ascendeu à condição de articulador da campanha e está viajando aos estados. O ex-ministro da Defesa transita muito bem no universo de apoiadores de Bolsonaro, não esconde sua afinidade com as teses golpistas e é o mais preparado para cuidar, com outros militares, da mobilização da militância de campanha. Como todos sabem, Bolsonaro tem uma milícia política armada.

Ciro Gomes (PDT), Simone Tebet (cuja candidatura sofre um ataque da ala lulista do MDB, às vésperas da convenção para homologar seu nome) e André Janones (Avante), juntos, somam de 12% a 13%, o suficiente para levar a eleição ao segundo turno e manter Bolsonaro dois dígitos distante de Lula, caso a polarização entre ambos se mantenha. Mesmo que esse quadro não se altere a favor de uma terceira via, são candidaturas que têm um papel a cumprir no debate político e na negociação do segundo turno, porque forçariam um entendimento em direção ao centro. Entretanto, temos uma eleição com forte tendência de polarização, com 70% do eleitorado supostamente já definido, que pode registrar o voto útil tanto em favor de Bolsonaro como de Lula na reta final do primeiro turno.

Esse é um tipo de aposta incorporada à narrativa da frente de esquerda que apoia Lula, para vencer no primeiro turno, alimentada pelos arreganhos autoritários de Bolsonaro e da extrema direita que o apoia. Mas não existe eleição decidida de véspera, os 45 dias de campanha de rádio e televisão tanto podem abduzir completamente os candidatos de terceira via como provocar o contrário, com um dos três postulantes à terceira via se beneficiando do aumento da rejeição aos dois candidatos, em razão da pancadaria entre Lula e Bolsonaro.

David contra Golias

A candidatura do deputado André Janones à Presidência da República foi oficializada no sábado. A convenção foi em Belo Horizonte, com o grande Teatro do Minascentro lotado. Advogado, filho de uma empregada doméstica, Janones é um fenômeno das redes sociais, seu primeiro emprego foi como cobrador de ônibus. Nas pesquisas divulgadas ontem, figurava com 2% de intenções de votos; vem sendo assim, teimosamente. Ele é um fenômeno da antipolítica: em 2016, quando se candidatou à Prefeitura de Ituiutaba pelo PSC, perdeu; em 2018, surfou a greve dos caminhoneiros e foi o terceiro mais votado nas eleições para deputado federal em Minas. Disputa pela primeira vez a Presidência da República, é um David contra Golias.

Janones é uma pedra no caminho do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, porque a resiliência de seus eleitores pode inviabilizar uma vitória do petista no primeiro turno, somada aos votos de Ciro Gomes (PDT) e Simone Tebet (MDB). O candidato do Avante tem seu discurso na ponta da língua: “Só de eu poder dizer que nós temos de fato um projeto para o país, para mim, já fez tudo valer a pena. Hoje, nós temos um projeto que contempla todas as áreas: saúde, segurança, educação, agro… Todas as áreas e todos com a mesma mensagem, com o mesmo objetivo: a diminuição da desigualdade social no nosso país, a diminuição da distância entre os mais ricos e os mais pobres”, explica.

O deputado mineiro defende um programa de combate à pobreza, financiado por uma reforma tributária, para taxar lucros e dividendos, e criar um imposto sobre grandes fortunas, rever os atuais incentivos fiscais, sem sacrificar a classe média com mais tributação. Na convenção, André Janones defendeu a democracia; em entrevistas, já disse que não apoiará Bolsonaro, no segundo turno. O Avante tem oito deputados federais, 16 deputados estaduais, 82 prefeitos e 1.074 vereadores.

https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-no-meio-do-caminho-tem-um-janones/