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4   AS RESERVAS INTERNACIONAIS E O AJUSTE FISCAL- JOSÉ LUIS OREIRO           REVISTA POLÍTICA DEMOCRÁTICA


        As reservas internacionais e o



        ajuste fiscal (Paulo Guedes)





          Segundo matéria divulgada na grande   Guedes não pretende usar as reservas   Mas a declaração do futuro  tsar  da
        imprensa no último dia 30 de outubro,   internacionais para reduzir a dívida  economia tem dois aspectos que me
        o economista indicado pelo presidente   pública, até porque o indicador relevan-  soam  bastante  preocupantes.  Em  pri-
        eleito ao cargo czar da economia brasilei-  te para medir a solvência fiscal é a dívi-  meiro lugar, sua fala sugere a introdução
        ra, Paulo Guedes, desmentiu a intenção,   da líquida, não a dívida bruta. Como a  de um “teto” para a taxa de câmbio,
        anteriormente noticiada pela grande   dívida líquida é igual à dívida bruta sub-  o qual seria de R$ 5 por dólar. Se essa
        imprensa, de usar as reservas internacio-  traída dos ativos financeiros de proprie-  interpretação for verdadeira, então o
        nais  para  reduzir  o  tamanho  da  dívida   dade do setor público, entre os quais  futuro ministro da economia planeja
        pública. Na declaração dada à imprensa,   se encontram as reservas internacio-  abandonar o regime de câmbio flutuan-
        Paulo Guedes afirmou que apenas usa-  nais, segue-se que a venda das reservas  te, um dos pilares do assim chamado tri-
        ria as reservas internacionais no caso de   internacionais não mudaria um centavo  pé  macroeconômico.  Num  regime  de
        ataque especulativo que levasse o dólar   sequer da dívida líquida, mas reduziria  câmbio flutuante, o Banco Central não
        atingir patamar de R$ 5.            a liquidez internacional à disposição do  possui meta para a taxa de câmbio, dei-
          O aspecto positivo dessa retificação   setor público.                 xando-a flutuar ao sabor das variações
        por parte do futuro superministro da   Além disso, como deve ser de conhe-  da oferta e da demanda por dólar. Em
        economia é que deixa claro que Paulo   cimento do futuro hiperministro da eco-  momentos  de  stress  cambial,  contudo,
                                            nomia, o custo  de carregamento das  o Banco Central pode fazer intervenções
      Foto: Ascom/Banco Central             rencial entre a taxa de juros doméstica  de reduzir a volatilidade cambial, mas
                                            reservas internacionais é igual ao dife-
                                                                                no mercado de câmbio com o objetivo
                                            e a taxa de juros internacional subtraído  sem interferir na tendência da taxa de
                                            (somado) do ganho (perda) esperada  câmbio. Da minha parte, eu gostaria
                                            de capital sobre as reservas internacio-
                                                                                de ver algum tipo de administração da
                                            nais. Dessa forma, se a expectativa é de  taxa de câmbio, no sentido de reverter
                                            depreciação futura da taxa de câmbio  a tendência à sobrevalorização da taxa
                                            – como parece indicar a fala do ultra-  de câmbio, verificada desde 2005, a qual
                                            ministro da economia ao apontar um  tem tido efeitos nefastos sobre a compe-
                                            dólar cotado a R$ 5 em algum momen-  titividade da indústria de transformação.
                                            to  no  futuro,  o  custo  de carregamen-  Nesse caso, contudo, o correto a fazer
                                            to  pode-se  tornar  negativo,  indicando  seria instituir um “piso” ao invés de um
                                            assim um benefício esperado positivo  “teto” para a taxa de câmbio.
                                            para o setor público, caso ocorra ata-  O segundo aspecto que me soa pre-
                                            que especulativo. Esse benefício espera-  ocupante é a ideia de que as reservas
                                            do, caso seja efetivado, será creditado,  internacionais devem ser usadas duran-
                                            como  disposto  em  lei,  na conta  única  te um ataque especulativo. O problema
                                            da União no final do semestre referente  com essa ideia é que ela transformaria o
                                            ao ganho de capital sobre as reservas,  sistema de câmbio flutuante num siste-
                                            contribuindo, assim, para o ajuste fiscal,  ma de câmbio fixo no exato momento
                                            ao viabilizar o atendimento da “regra  em que o ataque especulativo estiver
                                            de ouro”. Diga-se de passagem que foi  ocorrendo, fornecendo, assim, a liqui-
                                            esse expediente que permitiu ao gover-  dez necessária para os especuladores
                                            no do presidente Michel Temer cumprir  retirarem suas aplicações do Brasil sem
                                            a regra de ouro em 2018, sem ter de  risco de perda de capital. Seria o equiva-
          Banco Central:  Se não for feita nenhuma inter-  fazer novo contingenciamento de gas-  lente a abrir uma avenida de oito pistas
          venção no mercado de câmbio, avaliam os eco-  tos ou pedir um waiver ao Congresso  para a saída de capitais do Brasil.
          nomistas, o fluxo de saída de capitais do país vai   Nacional, sob pena de incorrer em cri-  Esse ponto merece esclarecimento
          ser reduzido gradualmente
                                            me de responsabilidade.             maior. A grande vantagem do regime
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