wilson witzel

Bernardo Mello Franco: A aventura de Witzel

Terminou mal a aventura de Wilson Witzel, o Breve. O ex-juiz experimentou uma ascensão meteórica na política. Em poucas semanas, passou de candidato nanico a governador eleito do Rio. Depois de um ano e oito meses no poder, ele foi afastado sob suspeita de corrupção. Na sexta-feira, teve o mandato cassado em definitivo.

Witzel se tornou uma unanimidade ambulante. Em junho de 2020, a Assembleia Legislativa aprovou a abertura do processo de impeachment por 69 votos a 0. Em setembro, repetiu o placar para ejetá-lo da cadeira. Varrido do palácio, ele passou a ser julgado por um tribunal misto. Desembargadores e deputados também concordaram no veredicto: 10 a 0 a favor da cassação.

No início do ano, o governador havia sido derrotado em outra votação unânime. Por 13 a 0, os ministros do Superior Tribunal de Justiça aceitaram denúncia que o acusa de desvios na saúde. Numa inversão de papéis, o ex-juiz virou réu por corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

Witzel foi um fenômeno típico das eleições de 2018. Com discurso moralista, vestiu-se de verde e amarelo e surfou a onda conservadora que consagrou Jair Bolsonaro. No último debate na TV, ele demonizou a política e descreveu sua campanha como “uma luta do bem contra o mal”. “Sou um cidadão como você: indignado. Indignado com tanta corrupção”, bradou.

Deslumbrado com o poder, o ex-juiz nunca se preocupou em nomear bons secretários ou montar uma base de apoio na Assembleia. Também não disfarçou a intenção de usar o governo do Rio como um trampolim para concorrer ao Planalto. A soberba cobraria um preço alto. Quando caiu em desgraça, ele não encontrou ninguém para defendê-lo.

Apesar do isolamento, o governador manteve a empáfia até o fim. No dia da votação na Alerj, comparou-se a Tiradentes e Jesus Cristo. Na sexta-feira, descreveu o tribunal do impeachment como uma sucursal do Estado Islâmico. “Hoje não sou eu que sou cassado, é o Estado democrático de direito”, delirou.

O caso de Witzel evidencia o risco de entregar o poder a aventureiros. Sem passado na política, o ex-juiz se limitou a dizer que era diferente de tudo o que estava aí. A retórica seduziu quase cinco milhões de eleitores, que entregaram o Palácio Guanabara a um ilustre desconhecido.

Os desvios na saúde não são a única herança maldita do governador cassado. Ele deixa em seu lugar outro político sob investigação, que também foi alvo de buscas da PF. No fim de março, Cláudio Castro ofereceu mais um cartão de visitas. Dois dias depois de pedir que a população evitasse aglomerações, promoveu uma festa para celebrar o próprio aniversário.

Desde que assumiu o poder, o novo governador se comporta como um súdito da família Bolsonaro. Na ânsia de agradar o capitão, já chegou a desautorizar medidas de distanciamento social. Em entrevista à revista “Veja”, o dublê de político e cantor gospel explicou como foi parar na chapa de Witzel. “Virei vice porque não tinha outro”, admitiu.

Fonte:

O Globo

https://blogs.oglobo.globo.com/bernardo-mello-franco/post/aventura-de-witzel.html


Elio Gaspari: Cacaso previu a ‘nova política’

Dois anos depois da eleição de Wilson Witzel para o governo do Estado do Rio e passados quatro da vitória de Marcelo Crivella para a prefeitura da cidade, a “nova política” mostrou seu verdadeiro rosto

Dois anos depois da eleição de Wilson Witzel para o governo do Estado do Rio e passados quatro da vitória de Marcelo Crivella para a prefeitura da cidade, a “nova política” mostrou seu verdadeiro rosto. Como dizia o poeta Cacaso (1944-1987):

Ficou moderno o Brasil,

Ficou moderno o milagre

A água já não vira vinho,

Vira direto vinagre.

Witzel e Crivella teriam sido algo novo. Um perdeu o mandato e batalha pela liberdade. O outro está preso em casa. A água que viraria vinho nem vinagre virou, tornou-se apenas uma lama velha.

Witzel prometia tiros nas “cabecinhas”e Crivella oferecia lances místicos enquanto aninhava milicianos na prefeitura. Foram novos na empulhação. Ocupando os cargos, nem na roubalheira inovaram. Basta ver a onipresença do “Rei Arthur”, nas maracutaias da “nova política”. Ele era o donatário das comissões para fornecedores durante o mandarinato do “gestor” Sérgio Cabral.

Como disse o grande Príncipe de Salinas no romance “O Leopardo”, tudo isso não deveria poder durar, mas vai durar.

Cabral roubava criando ilusões modernistas, como o teleférico do Morro do Alemão, que continua parado. Witzel, que fez campanha na Baixada Fluminense amparado na lógica política dos bicheiros, atolou-se com velhas quadrilhas. Um era o falso moderno, o outro, o verdeiro atraso. Crivella recorreu a milicianos, coisa que Cabral nunca fez ostensivamente.

O único ingrediente de originalidade municipal, estadual e federal da “nova política” é a demofobia explícita. Ela demoniza a pobreza, nega a pandemia e vive em contubérnio com as milícias. O resultado disso está na sala dos brasileiros: vacinas contra a Covid, só no noticiário internacional.

Água vira vinagre quando se sabe que há mais de cem anos D. Pedro II fez questão de cumprir o isolamento social durante uma passagem por Portugal, e hoje o general-ministro da Saúde diz a parlamentares que não devem falar nisso.

Na madrugada de 17 de novembro de 1889, quando o imperador foi posto em um navio e desterrado para a Europa, ele disse: “Os senhores são uns doidos”.

Parecia que o doido era ele.

Ibaneis com Picciani

Ibaneis Rocha, governador de Brasília e empresário bem-sucedido, com um patrimônio declarado de R$ 94 milhões é também um destemido.

Em agosto ele arrendou a fazenda Monteverde, em Uberaba (MG), de propriedade do notável Jorge Picciani. O simples fato de fazer negócio com o ex-presidente da Assembleia do Rio indicaria um empresário audacioso. Como Picciani foi condenado a 21 anos de prisão e rala sua pena em prisão domiciliar, fazer negócio nesse mundo é coisa de gente muito corajosa. Ibaneis e Picciani pertencem ao mesmo partido, o MDB.

Os bens do poderoso Picciani estão bloqueados pela Justiça que lhe cobra R$ 91 milhões.

Onze em cada dez empresários correriam de um negócio desse tipo como o Tinhoso corre da cruz.

A Carta de Capistrano

A Fiocruz deu uma lição de Justiça aos ministros do Supremo Tribunal Federal e ao Superior Tribunal de Justiça (o da Cidadania). Ambos pediram reservas de vacinas para seus doutores, funcionários e colaboradores. O STF queria sete mil doses só para ele e para a turma do Conselho Nacional de Justiça.

O pedido foi feito sem que os ministros dos dois tribunais fossem consultados. Promotores do Ministério Público de São Paulo haviam tentado o mesmo golpe há algumas semanas.

A centenária instituição de defesa da saúde pública nacional respondeu aos doutores informando que não lhe cabe “atender a qualquer demanda específica por vacinas”.

Foram educados. O historiador Capistrano de Abreu, num lance indelicado e agressivo, defendeu uma revisão constitucional, pela qual a Carta teria apenas dois artigos:

Artigo 1º - Todo brasileiro deve ter vergonha na cara.

Artigo 2º - Revogam-se as disposições em contrário.

Precisa-se de padrinho

Quatro instituições de medicina privada, entre as quais duas guildas e duas operadoras, estão pedindo ao governador de São Paulo, João Doria, que lhes dê um mimo tributário, restabelecendo a isenção de ICMS que as beneficiava.

Durante a pandemia, São Paulo perdeu cerca de 10% da arrecadação desse imposto, noves fora 45 mil mortos. Já as operadoras de planos de saúde tentaram enfiar um aumento selvagem na clientela e recusaram-se a pagar pelos testes do coronavírus.

Entre janeiro e setembro deste ano uma só operadora lucrou US$ 13,2 bilhões, 30% acima do que conseguiu no mesmo período do ano anterior.

Os doutores fazem um apelo a Doria em nome da “vida”. A vida deles, em busca de um padrinho.

Casa de doidos

Para quem acha que o Palácio do Planalto é uma usina de crises, os aloprados que assessoram o presidente Donald Trump mostraram que sua Casa Branca tornou-se uma insuperável casa de doidos. Por quase uma semana circulou por lá a ideia de usar a pandemia para colocar os Estados Unidos sob lei marcial. Seriam suspensas garantias individuais e a posse do presidente eleito Joe Biden.

Aloprados de palácio são assim mesmo. Propõem maluquices, sabendo que quem corre o risco de sair do prédio numa camisa de força é o titular. Eles se garantem com palestras ou consultorias.

Alcolumbre tonto

O senador Davi Alcolumbre convenceu-se de que seu inferno astral foi produzido pelos acertos que supunha ter feito no Supremo Tribunal Federal. É exagero.

Se Macapá ficou sem energia e seu irmão perdeu a prefeitura, o Supremo nada teve a ver com isso.

No fundo, ele esperava que o Tribunal declarasse inconstitucional um dispositivo da Constituição. Na forma, Alcolumbre e seus aliados tinham feito as contas. No conteúdo, a dose era cavalar e a receita desandou.

Na mosca

Não importa o motivo que levou os ministros Marco Aurélio, Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Alexandre de Moraes a anunciar que continuarão trabalhando durante o recesso que vai até 6 de janeiro. Eles miraram no que viam e acertaram o que não viram.

Com as sessões virtuais, esse recesso é um mimo anacrônico.

A crônica dos litígios que aguardavam o recesso para cair no colo generoso do presidente-plantonista registra incríveis acrobacias às quais os quatro mosqueteiros podem ter dado um fim.

Salto alto

As administrações do governador João Doria e do prefeito de São Paulo, Bruno Covas, subiram em saltos altos.

Há algumas semanas um dos hierarcas de Doria disse numa entrevista que se a CoronaVac tivesse 50% de eficácia, estaria tudo bem. Quem entende do assunto sentiu cheiro de queimado. Passaram-se os dias e o grau de eficácia dessa vacina está no tabuleiro. Jogo jogado, pois tudo poderia estar sendo feito com a melhor das intenções.

Eis que nisso o governador quis tirar férias em Miami. Já o prefeito Bruno Covas, aumentou seu próprio salário e tungou a gratuidade no transporte público para idosos (nesse lance, em parceria com Doria).

Tucano quando sobe em salto alto é incapaz de descer dele até na hora do banho.


Maria Cristina Fernandes: Como os milicianos tomaram a República

Depois de "A República das Milícias", de Bruno Paes Manso, fica difícil acreditar que será possível mudar o Brasil em 2022 sem desalojar os justiceiros de seu berço político a partir das urnas de 15 de novembro

Bruno Paes Manso já estava na reta final de “A Guerra: A Ascensão do PCC e o Mundo do Crime no Brasil” (Todavia, 2018), livro que escreveu com Camila Nunes Dias, quando a vereadora carioca Marielle Franco foi morta, em março de 2018.

O livro, construído partir de entrevistas com autoridades penitenciárias e policiais, além de lideranças do PCC e de associações comunitárias, pretendia ser um alerta para os pressupostos da política de segurança pública que, na previsão dos autores, daria as cartas em Brasília com a estreia do ex-governador Geraldo Alckmin no Palácio do Planalto.

O livro se tornaria uma referência incontornável nos estudos sobre o crime organizado no Brasil. Mostrou como a política de encarceramento em massa de São Paulo, aliada aos arranjos que preservavam a capacidade de gerência da cúpula da organização criminosa, embasavam a prolongada trégua nos índices paulistas de homicídio.

Um mês depois de seu lançamento, porém, Bruno Paes Manso sentiu-se atropelado pela história. Vítima de um atentado em Juiz de Fora, o candidato do PSL, Jair Bolsonaro, acabaria catapultado à Presidência da República. Com a eleição de Bolsonaro, o autor concluíra que precisava começar a pensar em outro livro. Desta vez, para contar como a cultura da violência miliciana, travestida em apelo da lei e da ordem, havia se transformado na expectativa majoritária de redenção do eleitorado nacional.

O resultado, “A República das Milícias: dos Esquadrões da Morte à Era Bolsonaro” (Todavia, 2020), repete a fórmula de “A Guerra”, com entrevistas em profundidade com chefes da milícia e do tráfico, autoridades policiais, lideranças comunitárias, estudiosos de segurança pública e uma sensibilidade aguçada para distinguir a evolução que moldara as comunidades do Rio em contraposição àquelas da periferia de São Paulo, que percorre há mais de duas décadas como jornalista e pesquisador do Núcleo de Estudos da Violência da USP.

Até então, sua incursão de mais fôlego no Rio havia sido durante a cobertura que fizera, para “O Estado de S. Paulo”, da intervenção policial no Morro do Alemão durante o governo Sérgio Cabral, em 2007. Nas pesquisas para o livro foi descobrindo um clientelismo que, ao contrário daquele que observara em São Paulo, não havia enfrentado a concorrência do sindicalismo industrial ou das comunidades eclesiais de base da Igreja Católica. É ao entrar em Rio das Pedras, na zona Oeste do Rio, que o autor encontra a chave para entender o fenômeno exportado para o resto do Brasil com a eleição de 2018.

Fora da caixinha dos estereótipos, encontra uma comunidade em tudo diferente da Copacabana decadente em que costumava se hospedar. Vê uma comunidade barulhenta, jovem, com letreiros chamativos a anunciar de médicos a lojas de lingerie e restaurantes de sushi. A pujança mostrava o dinheiro posto em circulação pelas milícias, que, em parceria com a polícia, se tornara donas de parte dos negócios despojando receita do poder público e das grandes empresas de gás, luz, transporte e internet sem precisar desperdiçar com armamentos como nas favelas comandadas pelo tráfico.

A comunidade é parte da jurisdição do 18º Batalhão da Polícia Militar do Rio, o mesmo em que o sargento Fabrício Queiroz e o capitão Adriano da Nóbrega se conheceram. O livro reconstitui a ficha criminal que construíram juntos sob a proteção da família Bolsonaro e do Tribunal de Justiça do Rio.

Bruno Paes Manso descreve uma Rio das Pedras marcada pelo coronelismo dos imigrantes nordestinos, apesar de o primeiro chefe local se chamar Octacílio Bianchi e o maior beneficiário político da propagação de seu modelo de empreendedorismo ser um paulista de Eldorado que levou seus modos bandeirantes para a Presidência da República.

Foi 1964 que deu às comunidades milicianas seu DNA. Com o golpe, a violência e a tortura policial se aproximaram dos porões da ditadura e, juntos, enterraram a utopia de nação que o Rio encarnava, com a sofisticação da bossa nova e a genialidade do samba de morro. O livro escolhe o capitão do Exército Aílton Guimarães Jorge, cadete da Academia Militar das Agulhas Negras em 1962, como símbolo da aliança entre bicheiros e policiais endossada pelo regime.

Guimarães era protegido de oficiais envolvidos com o terrorismo de Estado que marcaria a derrocada do regime. Com o planejamento de explosões em Agulhas Negras e numa adutora da capital fluminense, o capitão Jair Bolsonaro se filiaria a esta linhagem. Com a abertura, a entrada do insubordinado capitão na política se daria pela legitimação dos crimes da polícia. “Em vez de lutar pela defesa da pátria, a polícia passou a matar além do limite em nome do ‘cidadão de bem’”, diz Bruno.

As milícias, porém, não se beneficiaram apenas da proteção e das condecorações dos Bolsonaro, mas da vista grossa que lhe fizeram todos os governantes do Rio, de Leonel Brizola a Moreira Franco, passando pelo ex-prefeito Cesar Maia, que fez de Rio das Pedras um curral de votos para a eleição do seu filho, Rodrigo, hoje presidente da Câmara dos Deputados.

Com as Unidades de Polícia Pacificadora, instaladas pelo ex-governador Sérgio Cabral, o tráfico foi expulso da zona sul, para limpar o cenário da Copa e da Olimpíada. Nesse período, também se espraiaram as associações entre traficantes e milicianos. Esta sociedade prosperou com o propósito de combater o Comando Vermelho, organização nascida no presídio de Ilha Grande do convívio entre presos comuns e políticos na década de 1970.

A explosão da violência causada por esses conflitos e a busca do governo Michel Temer por uma marca positiva levou à intervenção militar no Rio, marcada, logo no seu primeiro trimestre, pelo assassinato de Marielle Franco. Bruno Paes Manso levanta as hipóteses para o crime sem cravar em nenhuma delas - provocação aos militares para mostrar quem manda no Rio, reação às denúncias da vereadora contra a violência policial e retaliação ao então deputado estadual, hoje na Câmara dos Deputados, Marcelo Freixo. O deputado teve uma atuação desabrida na Assembleia Legislativa, da CPI das Milícias aos esquemas, comandados pelos caciques locais do MDB, de distribuição de propinas de empresários de transportes.

A única aposta do autor é no poder do jogo de dissimulações envolvidas, que passa até mesmo por telefonemas forjados entre suspeitos que se sabiam grampeados para incriminar inimigos. Foi a reação de um deles, Orlando Curicica, miliciano preso por homicídio e associação criminosa, que levou à prisão de Élcio Queiroz e Ronnie Lessa. A partir dos relatórios a que teve acesso, Bruno Paes Manso descreve as manobras contra a elucidação do crime que ruma para mil dias sem a prisão de seus mandantes.

A chegada ao Palácio da Guanabara de Wilson Witzel, outro paulista emigrado para o Rio pelo sonho de uma carreira nas Forças Armadas, reincorpora à polícia civil e militar, com status de secretarias, personagens afastados desde os governos Sérgio Cabral e Luiz Fernando Pezão.

A queda de Witzel, que, de aliado, virara desafeto da família Bolsonaro, e a posse do vice, Claudio Castro, promove alguns desses personagens. Alan Turnowski, por exemplo, passa de braço direito a secretário de Polícia Civil, com o apoio da família do presidente da República. Em outro depoimento de Curicica ao qual o repórter Allan de Abreu, da revista “Piauí”, teve acesso, Turnowski e o atual secretário da Polícia Militar, Rogério Figueredo, são detalhadamente acusados de ligação com as tiranias paramilitares que ocupam a cidade. Ambos negaram as imputações à revista.

O pacote de rearranjos acordados entre o novo governador do Rio e os Bolsonaro ainda passa pela substituição do procurador-geral do Ministério Público do Rio, José Eduardo Gussem, cujo mandato acaba em dezembro. É Gussem quem tem, em grande parte, garantido a autonomia da investigação do esquema de rachadinhas no antigo gabinete do senador Flávio Bolsonaro na Assembleia Legislativa do Rio. A negociação que está em jogo na substituição de Gussem por um nome de interesse da família presidencial passa pelo atendimento das demandas do governador em relação à Superintendência da Receita Federal e à Polícia Federal.

A presença de Castro no governo do Estado é a blindagem com a qual a família Bolsonaro conta como anteparo à ascensão do ex-prefeito Eduardo Paes (Democratas) ou da delegada Marta Rocha (PDT), que substituiu Turnowski na chefia da Polícia Civil, em 2011. Paes e Marta aparecem nas pesquisas como os mais cotados para o lugar do prefeito Marcelo Crivella (Republicanos), aliado do presidente. É cedo para dizer se a ascensão de um ou outro à Prefeitura levará o DEM ou o PDT, dois anos depois, ao Palácio da Guanabara. Os grupos políticos de ambos pagaram pedágio às milícias quando estiveram no poder, mas não exerceram o poder em nome delas.

Como mostrou o Mapa dos Grupos Armados do Rio, 57% da área da cidade está hoje sob domínio das milícias. Esse avanço se deu ao longo de um governo federal que flexibilizou o porte e afrouxou o controle de comercialização e sob administrações locais que lhes franquearam espaços.

A República das Milícias, retratada por Bruno Paes Manso, chegou ao poder com Bolsonaro, mas o extrapola. Está entranhada no dia a dia das comunidades, dos serviços de transporte público às licenças de construção, cujos despachantes, nas Câmaras de Vereadores e nas prefeituras, serão definidos pelas urnas em 15 de novembro. Depois de ler o livro, fica difícil acreditar que seja possível mudar o país em 2022 sem desalojar os justiceiros de seu berço político.


Míriam Leitão: Contas do Rio no meio do vendaval

O Rio entregou apenas um ofício com quatro páginas em vez de um relatório de prestação de contas ao conselho que acompanha o cumprimento do Regime de Recuperação Fiscal. O estado diz que cumpriu 80% do compromisso, mas não é assim que os técnicos avaliam. O acordo com o Rio está sendo resolvido politicamente? O vice-governador Cláudio Castro garante que não. O que ele explica é que os dados entregues agora foram apenas para negociar o adiamento, possibilidade aberta pela liminar do ministro Bruno Dantas do TCU, de manter o acordo enquanto se negocia.

— O que fizemos foi cumprir a liminar do TCU. A ideia do Rio a princípio era judicializar por entender que o regime é de seis anos, com renovação automática no meio. O Tesouro não pensava assim. Estava tudo preparado para entrar na Justiça, eu preferi exaurir toda a questão administrativa. A única questão política é que eu decidi não ir para o confronto, mas negociar — disse o governador.

Na Secretaria do Tesouro se fala que é de três anos, e que ao fim desse período só havia dois caminhos: rejeitar ou renovar. Mas de fato o TCU abriu uma terceira via, a de o estado permanecer no regime enquanto se negocia com o Conselho Fiscal. O governador Witzel foi afastado, o governador interino acabou indo a Brasília e quem marcou o encontro com o ministro Paulo Guedes foi o senador Flávio Bolsonaro.

— Não houve favorecimento político do Rio. Queria tranquilizar quem está com essa justa preocupação. A conversa foi técnica, com o ministro Paulo Guedes, com o Bruno Funchal e outros integrantes da equipe técnica que trata do assunto. O ministro teve que sair e eu fiquei lá tratando disso. Não é um arranjo político. O senador Flávio Bolsonaro foi o primeiro parlamentar do Rio que ligou oferecendo ajuda. Eu assumi mesmo na segunda-feira, sou governador interino, e o prazo era sábado (hoje), era urgente conversar sobre isso. E a decisão tomada foi a de continuar o diálogo técnico. Se ao final não houver acordo, podemos voltar à ideia da judicialização — disse Cláudio Castro.

O Rio deixou de pagar nesses três anos R$ 58 bilhões. A visão de quem acompanha as contas públicas do estado é de que muito pouco foi feito até agora. Esta semana mesmo a Alerj aprovou um projeto que concede benefícios fiscais ao comércio atacadista. A justificativa do governo é que outros estados, como o Espírito Santo, concederam esse benefício, e empresas estariam migrando do Rio.

Esse foi o sexto benefício fiscal concedido pelo governo do Rio em 2020. Em 2019, foram três, e em 2018 e 2017, um em cada ano. O governo também conseguiu autorização do Confaz — Conselho Nacional de Política Fazendária — para realizar um refis irrestrito, com anistia de multas e juros a crédito tributários até 31 de agosto.

A orientação do ministro Paulo Guedes é para que a decisão seja estritamente técnica. O temor é o de que o que for concedido ao Rio tenha que ser estendido a outros estados. Minas Gerais e Rio Grande do Sul estão na fila para entrar no RRF.

— O Rio Grande do Sul está também sem pagar a dívida desde o ano passado. Está numa situação melhor do que a nossa, porque não paga a dívida e não tem a mordaça do regime que nós temos. Aliás, neste momento da pandemia, ninguém paga e não tem que cumprir nenhum compromisso —disse Castro.

Caberá ao governador em exercício indicar o próximo procurador-geral de Justiça do Rio, o que pode afetar a condução das investigações contra o senador Flávio Bolsonaro nos esquemas de rachadinhas na Alerj e lavagem de dinheiro.

— O procurador-geral de Justiça tomará a decisão sobre a denúncia antes de haver a troca. Além disso, o PGJ só assina o trabalho que chega pronto do grupo de procuradores — diz o vice-governador.

Ontem, o Conselho do Regime de Recuperação Fiscal achou que as informações que recebeu do Rio foram poucas. Castro explica que essa não foi a prestação de contas, ela será feita ao longo do processo de negociação. O governo do Rio diz que fez um ajuste de R$ 21,2 bilhões dos R$ 26,6 bi previstos. E não fez mais em função do baixo crescimento do PIB nos últimos três anos, da crise no setor de petróleo, e da pandemia este ano. É bom que todos os dados sejam olhados com lupa.

Qualquer concessão ao Rio tem que ser muito bem explicada tecnicamente, para não se consolidar a impressão de um arranjo político.


Míriam Leitão: Sinais do Rio e da capital federal

O afastamento do governador Wilson Witzel, confirmado ontem pela Corte Especial do STJ, terá fortes consequências no cenário nacional. É bom que tenha havido uma decisão colegiada para acabar com o desconforto tão bem expresso no voto minoritário do ministro Napoleão Nunes Filho, diante do fato de que uma decisão monocrática, tomada antes do recebimento da denúncia, tirou o chefe do poder executivo estadual. Não há dúvida de que tudo precisa ser investigado em mais essa tortuosa história do Rio. Os indícios contra Witzel são fortes, mas é preciso entender os efeitos para além das fronteiras estaduais.

Na véspera do dia em que Wilson Witzel foi afastado do governo do Rio, o presidente Jair Bolsonaro entrou no plenário do Superior Tribunal de Justiça ao lado do ministro João Otávio Noronha, que até aquele momento era presidente do tribunal. É o protocolo, já que o presidente estava fisicamente na corte, mas antes de entrar no recinto Bolsonaro teve tempo de uma conversa presencial com o ministro, por quem já declarou ter sentido “amor à primeira vista”. Quem conhece bem a cultura e os códigos de Brasília acredita que Bolsonaro foi dormir naquele dia sabendo o que aconteceria na manhã seguinte no Rio, estado estratégico para neutralizar as muitas investigações de corrupção contra a sua família.

O ministro Benedito Gonçalves já havia assinado sua ordem, apenas não a tornara pública. Naquele dia, a presidência ainda era de Noronha. Revelar o fato ao presidente da República poderia ser apresentado como mais um favor. “Em Brasília, funciona assim: quem faz um favor desses está querendo dizer que pode fazer muitos outros”, diz uma autoridade que viu no movimento mais um ato da campanha de Noronha para o Supremo.

O governador em exercício Cláudio Castro já recebeu o telefonema do senador Flávio Bolsonaro prometendo ajuda na renovação do Regime de Recuperação Fiscal. O problema é que essa renovação deveria seguir critérios técnicos do Ministério da Economia.

A saída de Witzel eleva exponencialmente o controle da família Bolsonaro sobre os poderes do estado onde será decidido o destino de vários integrantes do clã. Como o próprio Bolsonaro disse ao então ministro Sergio Moro: “Você tem 27 superintendências, eu só quero uma.” Ter o controle da PF no Rio é bom, mas melhor ainda é dominar também o Ministério Público estadual e a Polícia Civil. O procurador Marcelo Rocha Monteiro, um dos cotados para comandar o MP, como O GLOBO mostrou, é fã do presidente e da família.

O estado é parte de uma quebra-cabeças nacional e integra o mesmo movimento de enfraquecimento interno das instituições de que falam os autores que mostram a forma atual de matar democracias. Elas morrem de hemorragia interna. E em múltiplos órgãos.

A manobra do presidente em relação à Procuradoria-Geral da República deu supercerto. O procurador Augusto Aras tem sido prestimoso em qualquer tema de interesse do governo. Todos os candidatos ao posto de ministro do STF estão prestando favores a Jair Bolsonaro, dono da caneta que nomeará a pessoa para ocupar a cadeira de Celso de Mello.

O decano ficará de licença médica até o dia 11. Só voltará após a posse de Luiz Fux. Tem feito falta na Segunda Turma onde, sem seu voto, os empates provocam estrago em questões decisivas. Quando Celso de Mello voltar, será muito prestigiado por Fux, que tem por ele sincera admiração, mas serão apenas por uns 50 dias. Celso faz aniversário no dia primeiro de novembro e precisa deixar o cargo dias antes. Se com Fux o STF tem chance de ter uma presidência que não emita tantos sinais ambíguos, sem Celso de Mello, e com um indicado por Bolsonaro, o STF enfrenta mais risco de errar.

Há um efeito a mais da pandemia piorando o ambiente em Brasília. As autoridades dos outros poderes que são simpáticas a Bolsonaro fazem reuniões presenciais. Os que guardam distância, por respeitar o distanciamento social, estão se conectando apenas por canais eletrônicos. Já a conversa olho no olho, a palavra no pé do ouvido só está ocorrendo de um lado, aquele que conspira contra o bom funcionamento das instituições brasileiras. No Brasil de hoje, quem não está preocupado com a democracia está mal informado ou não está lendo bem os sinais.


José Casado: O zagueiro do dinheiro vivo

Suas operações suspeitas ultrapassam R$ 1 bilhão

Ocupação: auxiliar de escritório. Remuneração: R$ 278.500 por mês. Isso significa R$ 3,3 milhões por ano de trabalho, e com direito a décimo terceiro salário.

Esse emprego existe mesmo. Está em Nova Iguaçu (RJ), lugar onde quatro em cada dez habitantes sobrevivem com até meio salário mínimo mensal (R$ 522).

Quem ganhou a posição foi Zé Carlos, zagueiro aposentado do Itaperuna F. C. Ele fez o gol dos sonhos de muitos na Associação de Ensino Superior (Sesni), mantenedora da Universidade Iguaçu (Unig). Cargo e remuneração do ex-jogador constam em documentos trabalhistas da associação, que se diz “filantrópica” e dedicada aos pobres.

O milionário auxiliar de escritório Zé Carlos na vida real é José Carlos de Melo, empresário que trafega entre os submundos da política carioca e das máfias da Baixada Fluminense, e até o mês passado controlava o caixa da Universidade Iguaçu.

Para o Ministério Público, ele foi o intermediário de estranhos negócios no governo Wilson Witzel. Suas operações suspeitas ultrapassam o “patamar de R$ 1 bilhão, grande parte em espécie”. Sua movimentação financeira supera a soma (R$ 950 milhões) das realizadas por 27 deputados e 545 assessores investigados por corrupção, rachadinhas e lavagem de dinheiro na Assembleia do Rio.

Ficou conhecido como o homem do dinheiro vivo. Patrocinou um mensalão carioca, pagando mesadas mensais a uma dezena de deputados estaduais —contou à polícia um ex-secretário do governo Witzel, que confessou ter recebido dele R$ 600 mil em dois pacotes. Até julho, Receita e Coaf haviam mapeado mais de 160 transações de Zé Carlos acima de R$ 100 mil. Todas em espécie, em agências bancárias de Nova Iguaçu e Itaperuna.

Facções se digladiam na luta pela hegemonia na Assembleia Legislativa. O prêmio é o lucro em facilidades contratuais no governo, estatais e prefeituras. No ex-zagueiro Zé Carlos, tem-se um retrato atualizado desses jogos de poder no submundo da “nova” política fluminense.


Merval Pereira: "Recesso democrático"

O afastamento do governador do Rio Wilson Witzel trouxe à tona uma discussão política da mais alta importância para a democracia brasileira, sobre a possibilidade de que o governo autoritário do presidente Bolsonaro esteja manobrando o Judiciário com o objetivo de controlá-lo politicamente.

Não seria a primeira vez que democracias aparentes camuflariam o autoritarismo em vigor. Considerar que o ministro Benedito Gonçalves, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), tenha tomado a decisão cautelar para se posicionar como candidato à próxima vaga do Supremo é uma desinformação, pois ele já tem idade superior ao limite de 65 anos para ser indicado para o STF.

Também a decisão não foi ilegal, pois o Supremo deu ao STJ o poder de determinar medidas cautelares contra governadores, sem que seja preciso ouvir a Assembléia. Não é provável, portanto, que o recurso da defesa do governador ao STF seja analisado antes da decisão do plenário do STJ, que tem reunião marcada amanhã para provavelmente avalizar a decisão de Benedito Gonçalves.

O que se tem criticado é o cuidado que ele poderia ter tido de esperar uma decisão do plenário que o fortaleceria, pois afastar um governador é assunto político delicado. Se, eventualmente, o presidente do STF, Dias Toffoli, resolver desautorizar o ministro do STJ, pode haver um choque entre instâncias judiciais.

De qualquer forma, a sobrevida política de Witzel seria curta, pois dificilmente ele escapará do impeachment na Assembléia Legislativa, que deverá estar concluído nas duas ou três próximas semanas.

O vice-governador Claudio Castro, que ontem anunciou com euforia subserviente um telefonema de apoio que recebeu do senador Flavio Bolsonaro, assume muito fragilizado, porque também é investigado, e é possível que, no decorrer da investigação, ele também seja afastado. A interferência do filho do presidente, embora seja representante do Rio de Janeiro no Senado, acrescenta mais dúvidas sobre se o afastamento do governador não beneficiará diretamente o clã Bolsonaro.

O governador interino Claudio Castro escolherá o próximo procurador-chefe do Ministério Público Estadual, que comanda as investigações sobre a “rachadinha” no gabinete de Flávio quando era deputado estadual, comandada pelo notório Queiroz.

Mesmo que queira, porém, será muito difícil que influencie os procuradores estaduais para que indiquem um colega bolsonarista para o cargo numa lista tríplice obrigatória, de onde sairá o escolhido.Todas essas teorias de conspiração surgem porque vivemos tempos estranhos, em que diversas vezes vimos tentativas de contornar os limites legais para impor a vontade do Executivo.

Decisões judiciais discutíveis que beneficiaram a família Bolsonaro foram tomadas, constatamos cotidianamente a disputa entre dois ou três candidatos à vaga do Supremo para ver qual agrada mais o presidente. Essa situação fez com que o ministro do Supremo e vice-presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) Edson Fachin se pronunciasse duas vezes nos últimos dias contra o que chamou de “processo autoritário”.

Sem se referir diretamente a Bolsonaro, o ministro citou o livro “Como as Democracias Morrem”, de Steven Levitsky e Daniel Ziblatt: “ (…) saber que é possível, sim, criar isso o que podemos chamar de endoautoritarismo, ou seja, manter-se um verniz democrático e, por dentro as instituições serem corroídas a tal ponto que o hospedeiro, que é a democracia, seja destruído pelo parasita, que é o autoritarismo”.

Fachin afirmou várias vezes que existe um “cavalo de Tróia” dentro da legalidade constitucional do Brasil, “que apresenta laços com milícias e organizações envolvidas com atividades ilícitas. Conduta de quem elogia ou se recusa a condenar ato de violência política no passado”.

Esse “recesso democrático” que estamos vivendo, de acordo com Fachin, também foi referido pelo ministro Luis Roberto Barroso, presidente do TSE e seu colega no Supremo, mas com uma visão mais otimista, embora diga que precisamos sempre ficar atentos: “Temos um presidente que defende a ditadura e a tortura, e ninguém defendeu solução diferente do respeito à liberdade constitucional. (…) A democracia brasileira tem sido bastante resiliente, embora constantemente atacada pelo próprio presidente”


Carlos Andreazza: O voto no lixo

A população fluminense elegeu um desconhecido

Quem se iludiu com o Wilson Witzel — a própria definição de estelionato eleitoral — iludiu-se não por falta de avisos. Era mais um gritante oportunista que usava a condição de juiz como chancela de autoridade moral superior para se alavancar; no caso, a cargo eletivo. O modelo desta suprema moralidade togada sendo, no Rio de Janeiro, Marcelo Bretas, aquele que tomou e tornou público, há três dias da eleição a governador, um depoimento sem provas — de um ex-secretário de Obras de Eduardo Paes — que interferiria no processo eleitoral e fulminaria de vez a candidatura do ex-prefeito.

Poucos reclamaram. Valia tudo, né? O justiçamento compensava. Afinal, não existiam santos; de modo que se justificava recorrer a atalhos para ceifar os que julgávamos corruptos. Era preciso mudar. Witzel foi o produto da mudança. Parabéns.

Encaixotada pela grande onda bolsonarista e afogada na correnteza antiliberal que criminalizara a atividade política, a população fluminense elegeu um desconhecido cuja fantasia de outsider combinava reacionarismo e lava-jatismo. Ninguém sabia quem era; e tampouco houve maiores preocupações sobre se teria competência para gerir um estado falido. Combatendo a corrupção — que ainda hoje se crê ser o maior problema do país —, tudo se resolveria.

Witzel vestia o espírito do tempo. Um autoritário — cujas ideias (sobre qualquer coisa que não a solução “mirar na cabecinha”) não eram conhecidas — alçado a governador porque batizado naquelas mesmas águas da antipolítica apregoada como nova política, que lavariam Bolsonaro. Witzel era o ex-juiz que renunciara à estabilidade para tomar o risco de consertar o Rio; não sem antes coadjuvar no comício da morte em que se quebraria placa com o nome de Marielle. Um braço forte, sem os vícios do sistema partidário (apesar de concorrer pelo partido do pastor Everaldo), intolerante com o crime organizado (embora fizesse campanha em área de milícia) e com a corrupção (mesmo próximo do empresário Mário Peixoto).

Tudo isso era público. Mas o desarranjo de nosso equilíbrio institucional — a profundidade da depressão política entre nós — convidava à aventura. A aventura ainda está no começo. Não mais, porém, para Witzel; vítima do jacobinismo que celebrou e sem o qual jamais teria chegado ao Guanabara. Vítima, sim, de uma aberração jurídica; infecção mais fraca, o ora governador afastado, da doença que necrosa a vida pública brasileira, afinal engolido — o ex-futuro presidente — pela moléstia de que tentou se descolar. Quis virar patologia à parte: já era.

Witzel é Witzel. Não há Witzel, contudo, que legitime afastamento preventivo de governante eleito assim como se deu contra Witzel. É inconstitucional. E inconstitucional seria qualquer que fosse o Witzel afastado — porque outros virão. Que não se tenha dúvida: outros virão, arrombada desde há muito a porteira da autocontenção judicial; o lava-jatismo presente como modus operandi mesmo onde a Lava-Jato é odiada. De forma que quem comemora essa canetada do ministro Benedito Gonçalves, do STJ, contra Witzel, mas reclamou dos atos personalistas de Alexandre de Moraes, bem menos graves, contra prerrogativas do presidente da República, que bote as barbas de molho. Essa lâmina, a gente só sabe a qual pescoço se destina na primeira descida. E não há estado de direito só quando é o nosso na reta.

É gravíssimo que se suspenda o exercício de mandato popular por meio de decisão monocrática, antes de o denunciado ser réu, e sem o aval do Legislativo — de resto quando em curso no Parlamento está um processo de impeachment contra o governador. Em que estado de degradação estará a separação entre Poderes quando um ministro de corte superior determina sozinho que um chefe do Executivo solte a caneta para cujo uso foi eleito?

A canetada monocrática pode revogar o voto?

Que tipo de cautelar é essa que impõe novo governante? E que grau de suspeição sobre o ato se pode levantar a propósito de tamanha interferência na dinâmica político-eleitoral de um estado? Afinal, como efeito, não será mais Witzel a indicar, por exemplo, o próximo procurador-geral de Justiça, essa figura-chave aos interesses de Flávio Bolsonaro na investigação por peculato contra si. E aí?

Essa zorra foi plantada pelo STF, convertido na própria matriz da insegurança jurídica no Brasil: uma corte constitucional cujas jurisprudências de ocasião — ditadas ao ritmo das circunstâncias — autorizaram que o Ministério Público se convertesse em polícia e que juízes país adentro criminalizassem a atividade política e, como justiceiros, avançassem sobre prerrogativas do Legislativo e do Executivo.

Aí está. Políticos — não importa quão vagabundos — escolhidos pelo eleitor, e com imunidades constitucionais previstas para protegê-los da sanha de interesses outros, de súbito trocados pela mão de um só magistrado. Aí está. Não mais sendo só do eleitor o direito de jogar o voto no lixo.


Juan Arias: O Brasil afunda tragicamente aos olhos do mundo como um novo Titanic político

País começa a ser um clássico no mundo de como morrem as democracias e de como suas instituições vão se deteriorando numa cadeia infernal

O que está acontecendo com o Brasil, que aparece aos olhos do mundo não como uma potência mundial, mas como um novo Titanic que cada dia vai rachando politicamente, com efeitos econômicos perversos que estão afogando os mais fracos?

A nova podridão que aparece no Rio de Janeiro, com novos e graves escândalos de corrupção política —que já envolvem quatro governadores consecutivos— e as ferozes intrigas de poder que vão surgindo, está colocando de joelhos um dos Estados mais importantes do país. Sua capital sempre foi uma vitrine mundial de beleza e um objeto de desejo do turismo global.

E tudo parece cada dia mais grave porque, das entranhas dos casos de corrupção, surge desta vez o roubo de dinheiro destinado à luta contra a epidemia. Mais do que uma onda de corrupção política e empresarial, tudo parece indicar que estamos diante de uma luta feroz com vistas às eleições presidenciais de 2022 e a uma possível reeleição de Bolsonaro.

Enquanto o chefe de Estado ameaça “dar porrada” na cara dos jornalistas que o interrogam sobre os supostos escândalos de sua família, em todo o país há uma luta entre os diferentes poderes, que agem cada dia mais pelas costas da sociedade em guerras internas.

Sempre foi dito que o Brasil, o quinto maior país do mundo, coração econômico da América Latina, estava destinado a exercer um papel importante entre as demais potências mundiais. Lá de fora olhavam com surpresa e admiração o desenvolvimento econômico e cultural do país, que foi ganhando a simpatia mundial.

Hoje o céu do astro brasileiro começa a escurecer. Parece mais um país abandonado à própria sorte, já que a corrupção e a pequenez de seus dirigentes evidenciam o câncer que o devora por dentro do poder, paralisando o ímpeto que começava a ter dentro e fora de suas fronteiras.

Em meio a essa guerra entre os poderes e às ameaças de golpes de Estado enquanto todas as instituições se deterioram, os graves e atávicos problemas que este país nunca soube resolver — como a violência, o racismo e a escandalosa distribuição de renda—, a cada sete horas uma mulher é assassinada. A maioria dessas mulheres são negras ou pardas.

O Brasil começa a ser um clássico no mundo de como morrem as democracias e de como suas instituições vão se deteriorando numa cadeia infernal.

E agora que o mundo inteiro está em emergência por causa da pandemia, e quando existe mais necessidade de que os poderes dos Estados sejam fortes e capazes de fazer frente à emergência, o Brasil vai afundando cada dia com a descoberta de novas tramas de poder e lutas internas.

Daí a urgência para que as forças da sociedade e da oposição —a um Governo cada vez mais atropelado pelas inoperâncias de seus governantes e suas mesquinhas ambições— sejam capazes de salvar um país cuja colaboração no xadrez mundial se torna cada dia mais importante dentro e fora do continente.

O Brasil não é outro país bananeiro da América do Sul. Tem vocação de influência na política global, cada vez mais envolvida no retrocesso dos valores de liberdade e defesa dos direitos humanos, no qual a pandemia está abrindo novas lacunas de exclusão.

O país precisa com urgência de uma Justiça menos politizada e de uma política menos judicializada, num cenário onde cada uma das instituições do Estado possa manter sua independência e agir para o bem de toda a comunidade. O que vemos hoje é um país cada vez mais sujeito a uma política com “p” minúsculo voltada a manter e ampliar seus privilégios, dando as costas a uma sociedade cada dia mais perplexa e desiludida.

Se um dia o mundo olhou até com inveja para o desenvolvimento econômico e social do Brasil, hoje o país corre o risco de se ver cada vez mais distante dos centros onde se forja o poder mundial. Uma mesa da qual o país se afasta devido à quebra de seus melhores valores, enquanto se desvanecem para os mais pobres as esperanças que os resgatavam de seu inferno de escravidões passadas.

Que os políticos e juízes, em vez de pensar em eleições e reeleições num puro jogo de poder, e em vez de trabalhar para conseguir mais privilégios que escandalizam as pessoas comuns, que têm que se sacrificar para poder comer, sejam capazes de uma renovação, algo que se torna mais urgente e vital cada dia que passa e a cada novo escândalo que surge de suas próprias entranhas.

O Brasil verdadeiro, o de suas tantas riquezas materiais e espirituais acumuladas através dos séculos, necessita hoje com urgência de novos líderes e estadistas que possam fazer renascer sua verdadeira identidade dos escombros de tanta indignidade institucional.


Eloísa Machado de Almeida: Decisão que afastou Witzel parece ter algo fora do lugar

Eleito em 2018, governador foi afastado do cargo por 180 dias em decisão de ministro do STJ

Ainda que o governador Wilson Witzel já tenha sido responsabilizado pelo Supremo Tribunal Federal pela condução de sua necropolítica durante a pandemia, com ordem para suspensão de operações policiais nas comunidades cariocas, que tenha contra si uma maioria sólida para um processo de impeachment e pululem indícios de corrupção com verbas de saúde, a decisão de seu afastamento preventivo como governador gerou desconforto.

A suspensão do exercício das funções públicas de Witzel por uma decisão monocrática de um ministro do Superior Tribunal de Justiça recolocou o tema sobre as imunidades constitucionais —e a forma com os tribunais a interpretam— no centro do debate jurídico e político do país.

A Constituição estabelece uma série de imunidades para detentores de cargos eletivos do Executivo e do Legislativo. São imunidades que procuram proteger a função relevante e representativa, impondo sobretudo limites mais severos à persecução criminal.

Parlamentares são invioláveis por suas palavras e votos, possuem foro por prerrogativa de função e não podem ser presos senão em flagrante de crime inafiançável, sendo tanto a prisão como o próprio processo criminal sujeitos à suspensão pelas Casas legislativas.

Para o cargo eletivo do Executivo, a Constituição é ainda mais exigente: a suspensão de mandato pela prática de crime comum se dá a partir de um duplo controle: a autorização prévia do Legislativo e o recebimento da denúncia pelo Judiciário.

As imunidades compõem uma série de controles judiciais e políticos que garantem não só estabilidade para o exercício da função como também reforçam a lógica da separação de Poderes. Mas não se trata apenas disso. A preservação do vínculo de representatividade entre eleitor e eleito é mais uma razão, talvez a maior delas, para a existência de imunidades a detentores de cargos eletivos.

A função é especialmente importante e protegida porque decorre de investidura vinda de voto.

As Constituições estaduais, na sua maior parte, reproduziram a mesma lógica da Constituição Federal: governadores só poderiam ser afastados do cargo com autorização prévia do Legislativo, seja no recebimento de denúncia por crime comum ou na hipótese de crime de responsabilidade.

Ainda que as regras constitucionais sejam consideravelmente claras, a interpretação dos tribunais tem sido vacilante quanto à sua extensão.

Nos últimos anos, foi ampliada a interpretação dada a flagrante de crime inafiançável para permitir a prisão de senador. Trata-se do caso Delcídio do Amaral, preso por decisão monocrática de Teori Zavascki, depois referendada em plenário.

Também recentemente, o Supremo passou por duas versões distintas de uma mesma questão jurídica: a possibilidade de afastamento da função pública como cautelar alternativa à prisão de parlamentares.

No caso Eduardo Cunha, a decisão monocrática também de Teori Zavascki, referendada depois em plenário, que suspendeu o exercício de suas funções, não passou por crivo da Câmara dos Deputados; logo depois, o Supremo decidiu que a decisão suspendendo mandato de Aécio Neves deveria ser analisada pelo Senado (que derrubou a decisão de afastamento).

Logo depois, o Supremo decidiu restringir a interpretação sobre foro por prerrogativa de função: crimes cometidos antes da diplomação e sem relação com mandato seriam investigados pelas instâncias ordinárias. Desde então, a decisão tem suscitado questões inéditas.

Juízes de primeira instância poderão determinar a prisão cautelar ou afastamento de deputados e senadores de suas funções? Poderão determinar busca em gabinetes parlamentares?

Recentemente, investigações contra José Serra (PSDB-SP) foram suspensas monocraticamente pelo presidente do STF, Dias Toffoli, pois as buscas determinadas por juízes de primeira instância poderiam afetar documentos relacionados ao atual mandato de senador.

Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), investigado no suposto esquema das “rachadinhas” antes de se tornar senador, teve foro garantido.

O Supremo também tem se debruçado sobre as imunidades de governadores.

Para o tribunal, o regime de responsabilidade criminal de governadores deve ser distinto do conferido a presidente da República.

Por isso, o Legislativo estadual não pode ser uma etapa prévia para a análise da denúncia criminal, e governadores podem ser presos, inclusive por atos estranhos ao mandato e no curso do mesmo. Também para o Supremo, se alguém com cargo eletivo pode ser preso, pode receber uma cautelar diversa da prisão, como o afastamento da função pública.

A interpretação restritiva significou o avanço do Judiciário sobre as imunidades parlamentares e foi amparada —e isso é inegável— por um sistema político agindo de forma nada republicana, não raras vezes usando as imunidades como anteparo para a prática criminosa. Traem a lei e seus representantes.

Mas a substituição de maus políticos através de decisões judiciais instáveis, sem colegialidade e sujeitas a maior politização, tampouco é um bom resultado.

É nessa trajetória cheia de idas e vindas que se insere o caso de Wilson Witzel: uma decisão monocrática provisória de um ministro do Superior Tribunal de Justiça suspendeu o exercício das funções de um governador eleito.

Mesmo não sendo uma decisão inédita, estando repleta de indícios de crimes de corrupção (frise-se, afetando as políticas de saúde durante uma pandemia) e referenciada por uma série de julgamentos recentes, algo parece fora de lugar.

Não à toa. Afinal, o sofisticado desenho constitucional de responsabilização por crimes comuns, no qual a suspensão do mandato só ocorre com chancela dos pares eleitos e, sua perda, após trânsito em julgado da sentença penal condenatória com avaliação de um tribunal colegiado, foi substituído pela decisão cautelar de um único juiz.

É como se foro por prerrogativa de função, que se caracteriza pela colegialidade, fosse extinto na marra: um juiz sozinho pode afastar um governador.

A cautelar de afastamento de função pública é uma alternativa à prisão. Porém aplicada a cargos eletivos parece esquecer um componente essencial dessa relação: a proteção que a Constituição dá ao voto.

*Eloísa Machado de Almeida, professora e coordenadora do Supremo em Pauta da FGV Direito SP


Celso Rocha de Barros: O presidente derrubou um governador?

É curioso que tanta gente no mundo da Justiça esteja tomando decisões claramente ilegais

Se o governador do Rio de Janeiro tiver caído por influência do presidente da República, a deterioração institucional brasileira deu um salto grande.

A decisão de afastar Witzel monocraticamente foi ilegal. Quem quiser saber por que, consulte o texto do professor Ricardo Mafei Rabelo Queiroz, da Faculdade de Direito da USP, no site da revista Piauí. É possível que a decisão do ministro Benedito Gonçalves, do STJ, não tenha sido uma tentativa de conseguir uma vaga no Supremo.

Mas é curioso que tanta gente no mundo da Justiça esteja tomando decisões claramente ilegais —a libertação de Queiroz, o dossiê contra os antifascistas, a perseguição a Hélio Schwartsman, o afastamento de Witzel —que coincidem perfeitamente com os interesses de Jair Bolsonaro, justamente o sujeito que vai decidir quem fica com a vaga no STF.

O afastamento de Witzel não é conveniente para Bolsonaro apenas porque o governador fluminense havia se tornado rival do presidente da República. No final deste ano, seja lá quem for o governador do Rio vai escolher o novo procurador-geral do Estado.

Como já noticiou a Folha, Bolsonaro quer influir nessa escolha para que o novo nome seja sensível aos interesses de seu esquema de corrupção familiar.

A escolha terá que ser feita dentro da lista tríplice, mas nada impede que os bolsonaristas inventem um candidato até lá e trabalhem por ele.

Se a decisão do STJ for um sintoma de aparelhamento da Justiça por Bolsonaro, pense bem no tamanho do que estamos discutindo.

Volte mentalmente até o dia da promulgação da Constituição de 1988 e tente explicar para Ulysses Guimarães que, 30 anos depois, o governador do Rio será afastado por decisão de um único ministro do STJ, com forte suspeita de que a coisa toda foi uma armação para resolver uns problemas do presidente da República com a polícia.

Depois disso, peça para o Doutor Diretas tentar adivinhar se, em 2020, o documento que ele acabou de aprovar ainda está vigente.

Longe de mim botar a mão no fogo pela honestidade de Wilson Witzel. Ele foi eleito com o apoio de Jair Bolsonaro. Ao contrário da família Flordelis, a família Bolsonaro nunca precisou do Google para achar “gente da barra pesada”. No mesmo dia do afastamento de Witzel, aliás, rodou o Pastor Everaldo, velho chapa de Bolsonaro que o batizou “simbolicamente” nas águas do rio Jordão.

Foi tudo encenação: Bolsonaro continuou católico. Everaldo também teria sido um dos responsáveis pela aproximação de Bolsonaro com o liberalismo econômico, e esse batismo tampouco parece ter sido lá muito para valer.

Mas para lidar com as acusações contra Witzel já existia o processo de impeachment, este sim, claramente previsto na Constituição e já em curso no Rio de Janeiro. Qual a necessidade de uma decisão que coloca as instituições sob suspeita?

É muito grave, mas, ao que parece, ninguém se importa. Pelo contrário, parte do mundo político vem tentando se reaproximar de Bolsonaro.

O exemplo de Witzel deveria servir-lhes de aviso: ser adotado como aliado por Bolsonaro é como ser adotado como marido pela deputada Flordelis.

Mesmo depois das repetidas tentativas de envenenamento, o establishment brasileiro parece disposto a ir com Bolsonaro para a casa de swing.

*Celso Rocha de Barros, servidor federal, é doutor em sociologia pela Universidade de Oxford (Inglaterra).


Vera Magalhães: Governador do Rio colapsou com a mesma rapidez que surgiu

Wilson Witzel é um fenômeno sui generis na política brasileira, que vem acumulando espécimes desta natureza desde 2018. Na campanha ao governo do Rio, era um ex-juiz desconhecido, algo caricato, de um partido nanico, figurante. Foi então que colou sua imagem à de Jair Bolsonaro, tentou surfar na então maré influente de juízes valentões, participou do gesto de rasgar a placa de Marielle Franco e enfrentou Eduardo Paes num debate.

Foi esse o “currículo” que levou o desconhecido cujo nome ninguém sabia pronunciar direito à vitória no terceiro maior Estado da Federação já encalacrado, com dois ex-governadores (Sérgio Cabral e até então também Luiz Fernando Pezão) na prisão, outros três (casal Garotinho e Moreira Franco) tendo feito escalas por lá, absolutamente quebrado do ponto de vista fiscal e econômico, fraturado socialmente, dominado pela violência, loteado entre tráfico e milícia.

Não que houvesse grandes opções. O adversário favorito era Eduardo Paes, que, embora não tenha sido engolfado pelo escândalo de Cabral diretamente, foi aliado do exgovernador o tempo todo de seus dois mandatos na prefeitura. Na capital do Rio o comandante é o bispo Marcelo Crivella, que transformou a cidade num experimento de política neopentecostal, levado adiante mesmo no enfrentamento da pandemia.

Alarmante é pouco para descrever a situação em que se encontra o Rio. A magnitude e a extensão da operação que afastou Witzel do cargo, prendeu políticos proeminentes, como Pastor Everaldo, e mostrou um esquema seriíssimo de fraude na Saúde em plena pandemia mostra um Estado carcomido por sucessivos grupos políticos que viram nele apenas uma casa a ser saqueada até não sobrarem nem as vigas.

Witzel não tinha projeto, não tinha noção de administração pública, não tinha partido e não tinha, agora vê-se, boas intenções. Desde o dia 1 no cargo se alternou entre declarações e ações midiáticas, brigas com Bolsonaro e encrencas com a Assembleia. A briga com o presidente e espelho político se mostrou seu maior erro, ocasionado pela ilusão de que poderia ser candidato a presidente.

Governador acidental, Witzel parece ter acreditado que era um ungido para voos maiores. A queda tão rápida quanto a ascensão ao menos corta na raiz uma carreira política de que Rio e Brasil não precisavam. E assim como ele está cheio de arrivista por aí, nos Executivos e Legislativos.