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Miriam Leitão: Subsídios condenados pela OMC custam quase o mesmo que as universidades públicas

Era pedra cantada. A OMC iria condenar o Brasil porque os subsídios e incentivos concedidos nos governos Lula e Dilma dentro da política industrial que eles adotaram são condenáveis. Ferem as regras internacionais do comércio e ofendem a lógica. Por que dar a alguns setores industriais um subsídio que custa quase R$ 7 bilhões ao ano? Isso é o valor equivalente ao que é transferido às universidades federais. Quanto custa? Essa é a pergunta central e deve ser feita a cada política pública adotada. Quem tiver por hábito fazer essa pergunta descobrirá por que o Brasil é assim desigual. Daqui até 2019, o país vai gastar com eles R$ 21 bilhões, isso sem falar em subsídios escondidos. Desde 2010, a OMC calcula que R$ 25 bi já foram concedidos aos setores beneficiados. Segundo o Itamaraty, agora sob o comando do PSDB e na presidência de Michel Temer, as políticas adotadas atendem a objetivos sociais, ambientais e de saúde.

Quais mesmo? A indústria automobilística tem que adotar tecnologias menos poluentes e investir em pesquisa e desenvolvimento. Ora, e o contribuinte brasileiro tem que pagar por isso? No mundo inteiro a indústria que fabrica carros está adotando novas tecnologias de menor impacto ao meio ambiente por uma razão de sobrevivência, porque os governos e o consumidor exigem. Se o país tivesse concedendo incentivo para a instalação de nova tecnologia disruptiva, a que vai substituir a dos motores a combustão, poderia até se entender. Mas é ainda a velha tecnologia que os governos passados incentivaram, e o atual ainda defende. Outro conjunto de benefícios é para o setor de informática, que desde os anos 1980 vem sendo protegido e subsidiado no Brasil. Acabou uma lei de informática e começou outra. O governo Temer podia aproveitar a deixa e cortar esses incentivos porque eles são gastos públicos. O Itamaraty prefere recorrer para protelar ao máximo a aplicação da pena. Este é o Brasil. Mudam-se os governos, mas não as alianças que sustentam as transferências para as empresas.

Desde sempre no Brasil se testa a tese de que se houver proteção tarifária e não tarifária, dinheiro público barato, redução ou isenção de impostos, a indústria será pujante. E ela encolhe ano a ano. Os governantes poderiam concluir, por óbvio, que esse caminho não tem dado certo e que é melhor escolher outro. Mas é pedir demais dos governantes que eles consigam dizer “não” aos lobbies.

A condenação na OMC não é uma formalidade. Países serão autorizados a retaliar o Brasil. Em vez de reconhecer o erro, o governo certamente vai procurar uma nova forma de dar uma forcinha para empresas de alguns setores. Em vez de buscar os fatores que realmente aumentam a competitividade, vai continuar usando os recursos do país para defender o que é condenável. E sempre será.

O advogado Marcos André Vinhas Quintão, da Associação Brasileira de Direito Financeiro, disse que as pessoas no país não estão com a noção exata do poder dessa condenação, porque o país tem 90 dias para mudar as políticas ou sofrer retaliação:

— O Brasil pode sofrer retaliação unilateral por parte de todos os países que fazem parte da OMC, e não apenas da União Europeia e do Japão. Para o setor de autopeças o impacto pode ser grande porque o país pode sofrer sanções da Colômbia, Argentina, Peru, Venezuela, Chile, países para os quais o Brasil tradicionalmente exporta esses produtos — diz.

Ele explica que as regras da OMC permitem que se dê incentivos fiscais a quem investir em Pesquisa e Desenvolvimento, mas que não foi isso que a indústria automobilística brasileira fez:

— Para isso a indústria teria que registrar patentes, por exemplo, mostrando que de fato inventou algo de novo para o setor no mundo.

Ele acha que o tipo de incentivo estimula a empresa preguiçosa e dependente e tem esperanças de que o processo na OMC acelere a mudança de mentalidade no Brasil.

Pouco provável. Está aí o Reintegra que não nos deixa mentir. É outro incentivo que pode dar problema e representa um valor dado ao exportador para supostamente tirar os restos de impostos da exportação. Recentemente, o governo decidiu não ampliar o benefício e já começou a choradeira. Vai ser mantido até a próxima condenação.