Refugiados

Tatuagem Mein Kampf | Foto: reprodução/Europe1

Revista online | O que nos dizem aquelas tatuagens nazistas do batalhão Azov

Paolo Soldini, com tradução de Luiz Sérgio Henriques, especial para a revista Política Democrática online (44ª edição: junho/2022)

Vimos na televisão suásticas, runas, cruzes célticas, retratos de Hitler tatuados nos corpos dos homens do batalhão Azov. Propaganda russa enviesada, para validar ex post a pretensão de Vladimir Putin pela qual a “operação especial” deveria servir também para “desnazificar” a Ucrânia? Certamente. Não somos ingênuos a ponto de considerar tais corpos um motivo para justificar, ainda que minimamente, o que os russos fizeram, estão fazendo e farão nas terras que ocuparam com a força. E também é difícil evitar a repugnância que sentimos diante da exibição dos prisioneiros, nus, impotentes, num espetáculo para uso da mídia com a marca da obscena propaganda dos vencedores.

As tatuagens nazistas

No entanto, as tatuagens existiam. Nem todos as tinham, por certo, mas muitos, sim, e, apesar de as terem, é como se ninguém entre nós as houvesse visto. Não são um problema, não merecem uma linha ou uma palavra como comentário. Ninguém, ou quase ninguém, sequer as mencionou. O que significa este silêncio? Será que, por terem se comportado tais homens como inimigos dos nossos inimigos, devemos absolvê-los da culpa de ser nazistas? Devemos fingir não saber se, como e em que medida, antes de se encerrarem nos subterrâneos da Azovstal, comportaram-se como nazistas?

Guerra é guerra, e mortes e destruições terminam por anular a potência dos símbolos, mesmo daqueles inscritos com dor na própria pele. Contudo, devemos nos perguntar se é mesmo normal que, num conflito em que se mata sem piedade, todos tendamos a considerar quase um detalhe afirmações de pertencimento ideal que em outras circunstâncias, na normalidade da paz, consideraríamos aberrantes. 

Suásticas e efígie de Stepan Bandera

O nazismo não é um detalhe da história. Menos ainda nas terras em que, hoje, os ucranianos estão se defendendo da agressão dos russos. Entre as imagens que apareciam na pele dos homens de Azov, havia também a efígie de Stepan Bandera. Para quem não sabe, trata-se do ultranacionalista ucraniano que alinhou seu exército independentista ao lado dos alemães quando estes invadiram a União Soviética. Queria a liberdade do seu povo em face dos russos, mas o subjugou ao Terceiro Reich de Hitler, e as SS ucranianas foram tão impiedosas quanto as austríacas e as alemães para matar judeus.

Bandera foi “reabilitado” em 2010 pelo presidente Viktor Yushchenko. Apesar dos duros protestos das comunidades hebraicas e de Israel, sua imagem reapareceu nas praças durante a revolta de Euromaidan e, desde então, está muito presente, com estátuas e ruas com seu nome, sobretudo na parte ocidental da Ucrânia. Assinala uma continuidade ideal que existe, assim como as tatuagens dos homens que reapareceram das trevas do subsolo de Mariupol.

Veja, a baixo, galeria de fotos:

Estação de metrô na Ucrânia serve de abrigo para milhares de pessoas durante os ataques russos | Foto: Drop of Light/Shutterstock
Mãe segura seu bebê em abrigo antiaéreo na Ucrânia | Foto: Marko Subotin/Shutterstock
Em Varsóvia, na Polônia, uma grande tenda foi instalada para abrigar refugiados ucranianos | Foto: Damian Lugowski /Shutterstock
Mãe refugiada ucraniana atravessa a fronteira para fugir da guerra | Foto: Halfpoint/Shutterstock
Crianças se abrigam em seu porão na cidade de Mariupol, Ucrânia, durante bombardeio pela aviação russa | Foto: Vladys Creator/Shutterstock
Lenço nas cores da bandeira da Ucrânia em fronteira com a Eslováquia | Foto: Vladys Creator/Shutterstock
Famílias ucranianas fogem da guerra por meio de fronteira com a Hungria | Foto: Vladys Creator/Shutterstock
Foto: Dba87/Shutterstock
Alemanha e UE anunciam 'novo Plano Marshalll' para Ucrânia | Foto: reprodução/Flickr
Demonstrators display a banner in the colours of the Ukrainian flag reading "Stop [Russian President] Putin, Stop war" during a protest at Berlin's Brandenburg Gate on January 30, 2022. - Demonstrators criticised Putin's massing of troops near the Ukrainian border and called on Germany to play a more active role in defending Ukraine's interests. (Photo by John MACDOUGALL / AFP) (Photo by JOHN MACDOUGALL/AFP via Getty Images)
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Alemanha e UE anunciam 'novo Plano Marshalll' para Ucrânia
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Não os tratemos como heróis

Quem se preocupa com a liberdade dos ucranianos e quer que se criem as condições para a paz tem o dever de exigir que tal continuidade seja quebrada. Que não haja mais nenhuma ambiguidade e que possa ser lançado na lixeira da propaganda mais estúpida o afirmado propósito de Putin de “desnazificar” a Ucrânia.

Depois, poderemos nos ocupar da sorte dos prisioneiros. Esperamos todos que tenham a vida poupada, que sejam tratados como prisioneiros de guerra, que os russos finjam (como nós) não ver as tatuagens e, quem sabe, mandem-nos de volta para casa numa troca de prisioneiros. Mas, por favor, paremos, ao menos nós, de chafurdar nos mares da retórica, tratando-os como “heróis”. Mais do que nunca vale nesta circunstância a advertência do Galileu de Bertolt Brecht: “Infeliz é a terra que precisa de heróis”. 

Sobre o autor

*Paolo Soldini, jornalista do histórico L’Unità e, também, de Il Riformista e da Radio Tre Rai. Artigo originalmente publicado em strisciarossa (www.strisciarossa.it), em 24 de maio de 2022. Tradução de Luiz Sérgio Henriques.

** O artigo foi traduzido para publicação na revista Política Democrática online de junho de 2022 (44ª edição), produzida e editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania.

*** As ideias e opiniões expressas nos artigos publicados na revista Política Democrática online são de exclusiva responsabilidade dos autores. Por isso, não refletem, necessariamente, as opiniões da publicação.

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Biblioteca Salomão Malina oferece curso de espanhol para iniciantes, gratuitamente | Arte: FAP

Curso gratuito de espanhol é oferecido pela Biblioteca Salomão Malina

João Vítor*, com edição do coordenador de Publicações da FAP, Cleomar Almeida

Sem qualquer custo, pessoas a partir de 14 anos de idade podem se inscrever no curso de espanhol para iniciantes, a ser ministrado na Biblioteca Salomão Malina, mantida pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), no Conic, no centro de Brasília. O início das aulas presenciais está marcado para o dia 6 junho, a partir das 16 horas. As vagas são limitadas.

As aulas serão ministradas pelo professor e poeta argentino Javier Valado. A população de Brasília pode tanto fazer a inscrição online, quanto presencialmente na unidade de leitura. São oferecidas 35 vagas. Sempre às segundas-feiras, o curso terá duração de três meses. 

O professor Valado acredita na possibilidade de construir códigos de confiança e respeito com base na experiência educativa. Ele mora no Brasil desde 2013. Decidiu mudar-se para Salvador, na Bahia, para vivenciar a cultura nordestina e trabalhar com arte.

O argentino pondera que ensinar significa mostrar, aprender com prazer. “É como as crianças aprendem a brincar. Sendo adultos, vamos brincar seriamente de aprender espanhol. Todos somos, de alguma maneira, professor e aluno. Todos temos pelo menos um saber importante para compartilhar”, diz. 

No Brasil, 491 mil pessoas falam espanhol. O idioma é o quarto idioma mais usado no mundo, com 538 milhões de falantes. Valado explica que o baixo número de usuários da língua espanhola é reflexo da relação da população com países coloniais.

"A Argentina olha para Espanha. O Brasil, para Portugal”, afirma o professor do curso para acrescentar que, por ser a grande potência da América do Norte, os Estados Unidos retêm a atenção da população brasileira, considerada por ele como a grande potência da América do Sul.

“Então, é lógico que a grande maioria da população brasileira queira aprender inglês e não espanhol porque não se identifica com as culturas do resto dos países da América. Isso, que é histórico, faz com que o Brasil fique culturalmente quase que isolado do resto da América”, diz Valado.

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Aluno

O curso, realizado pela Biblioteca Salomão Malina, já tem alunos confirmados. Um deles é Alan Douglas Da Silva, de 34 anos, que trabalha como gráfico e vê a importância de aprender um novo idioma para abrir portas para seu desenvolvimento pessoal, cultural e profissional.

Ele é estudante do curso de técnico de enfermagem e ressalta que “o mercado está considerando como pré-requisitos básicos que a pessoa a ser contratada tenha domínio em algum idioma”.

Dados do Ministério da Justiça mostram que, em 2021, 23.147 venezuelanos solicitaram refúgio no Brasil. Douglas diz ter interesse em entrar em contato com esses estrangeiros e outros imigrantes. 

O objetivo de Douglas no curso é aumentar a possibilidade de “diálogo com imigrantes, que estão em Brasília, como os venezuelanos, argentinos e outros da América latina”.

Serviço

Curso de espanhol para iniciantes

Início das aulas: 6/6/2022

Horário: a partir das 16h

Onde: Biblioteca Salomão Malina

Endereço: SDS, Bloco P, ED. Venâncio III, Conic, loja 52, Brasília (DF). CEP: 70393-902

Telefone: (61) 3323-6388

WhatsApp: (61) 98401-5561

Inscrições: https://forms.gle/8AJwnv81zQMfbiSz7  

*Integrante do programa de estágio da FAP, sob supervisão do jornalista, editor de conteúdo e coordenador de Publicações da FAP, Cleomar Almeida


Fernando Gabeira: Uma visão de campanha

Por enquanto, os candidatos hipnotizam com suas propostas. Não se preocupam em mobilizar, dividir papéis. Nesse sentido, é uma campanha analógica, embora, paradoxalmente, tenha invadido as redes sociais

Estou em Boa Vista, pela quarta vez visito a fronteira Brasil-Venezuela. No princípio era apenas um aviso de que algo poderia sair do controle. Nas últimas viagens, era uma certeza.

O chamado socialismo do século 21 foi pro espaço. Seus estilhaços caem dentro do território brasileiro, na forma de onda migratória, crise energética, revolta e violência. Logo no Brasil, arruinado por uma experiência de esquerda e hoje governado pelos parceiros eleitorais do PT.

Não sei se isso vai repercutir na campanha eleitoral brasileira. É tudo tão longe. E aqui não temos o hábito de avaliar criticamente o passado. A esquerda comporta-se como se nada tivesse acontecido. Sua proposta nostálgica é uma viagem ao início do século, voltar a ser feliz.

Não se discute o processo de democratização, sua esperança de usar o Estado para a redução das desigualdades, superar por meio de uma ação de governo todos os grandes problemas do País. A própria Constituição foi escrita nessa ânsia de promover a justiça social, com juros limitados a 12% e uma previsão de imposto sobre grandes heranças. Ficou no papel, mas revela um pouco do espírito da época, que acabou encontrando sua maior expressão no governo de esquerda.

Ainda hoje, a ilusão de que o governo vai resolver todos os grandes problemas sobrevive. Os próprios candidatos revelam seus programas, dizem o que vão fazer em cada área, como se estivessem vendendo o serviço que nos prestarão.

Há pouco espaço nesse tipo de discurso para a participação social, exceto consumir bens e serviços. O PT, por exemplo, tende a igualar felicidade ao aumento de consumo. Um bom exercício para seus militantes seria, por exemplo, refletir sobre esta questão: muita gente diz que votaria em Lula, mas quase ninguém, exceto CUT e MST, se mobiliza para tirá-lo da cadeia.

Minha hipótese é de que todos recebem bem a ideia de aumento de consumo, mas poucos se interessam por valores. No caso de Lula, pode até ser que não se movam baseados num valor: o respeito à independência da Justiça. Mas se isso é verdade, como explicar sua opção eleitoral?

Parto da esquerda para avançar no espectro e constato que a maioria dos candidatos se apresenta como alguém que vai realizar inúmeras tarefas, como se estivesse vendendo seus serviços a clientes cuja única missão é comprá-los. Dificilmente mencionam nos debates o papel que destinam à sociedade na grande tarefa da reconstrução. Basta votar certo, isto é, no orador, que tudo se vai resolver a partir do esforço e competência dele.

O interessante, sem querer criticar os candidatos, pois os tempos são duros, é que se apresentam como aspirantes a um cargo e prometem trabalhar bem. Mas não ousam exercer uma liderança, definindo as tarefas conjuntas de governo e sociedade. No momento em que a hipótese de interação aparece na campanha, ela é inadequada e, ainda assim, respondida com a tradicional afirmação: isso é tarefa do governo e não devemos envolver as pessoas.

Refiro-me à proposta de Jair Bolsonaro de liberar a compra de armas. É possível afirmar que não é o melhor caminho, mas com outro argumento: o de que a participação da sociedade deve focar a informação, a autodefesa com a ajuda da tecnologia, celulares, aplicativos.

Sempre vai aparecer alguém para dizer: e se um assaltante entra na sua casa, armado, de que adianta o telefone celular? De fato, nessa circunstância há pouco a fazer. Mas dentro de uma outra perspectiva, câmeras, vizinhos antenados, sistemas de alarme, tudo isso pode fazer um estranho ser detectado antes de entrar numa casa. É apenas um exemplo, até prosaico, para indicar a sensação de lacuna que sinto na campanha.

A sociedade brasileira teve esperanças e ilusões. Elas se perderam no caminho. Mas precisam de alguma forma ser renovadas.Um escritor espanhol costumava dizer que uma sociedade sem esperança e ilusões é como um monte de pedras na beira de um caminho. O que às vezes os candidatos parecem dizer é isto: reconheço seu ceticismo, mas vou trabalhar muito bem e quando concluir minhas tarefas o País estará novamente de pé.

O que a esquerda propõe é renovar as esperanças num projeto fracassado. Por seu lado, a direita nos remete ao dístico da bandeira: ordem e progresso. Ordem com uma política de segurança rígida e progresso por meio de uma economia liberal.

Uma simples frase inspirada no positivismo não é capaz de abarcar a complexidade do momento. Mesmo porque o progresso hoje é visto também com desconfiança, num momento em que as ameaças ao planeta se tornam visíveis. Progresso para continuar ou acabar com a sobrevivência humana.

O próprio conceito de ordem não se limita à segurança pública. A corrupção é uma desordem, o gasto irracional da máquina do governo é outra, assim como obras inacabadas, vulnerabilidade biológica com o colapso da saúde pública.

Reconheço que é muito difícil sintetizar num slogan uma saída para o Brasil. No passado, quando se tratava apenas do progresso, Juscelino nos propôs avançar 50 anos em 5. Tenho a impressão de que agora, num momento eleitoral, é preciso falar de crescimento para 13 milhões de desempregados.

Mas creio que cada vez mais amadurece entre as pessoas a hipótese de que a educação pode ser o motor dessa nova fase nacional. Seria preciso alguém afirmando que, além de suas tarefas presidenciais, nos levaria a uma sociedade mais bem educada, alguém que propusesse essa nova esperança, acreditasse mais na sociedade do que no próprio governo e a liderasse para esse objetivo.

Por enquanto, os candidatos hipnotizam com suas propostas. Não se preocupam em mobilizar, dividir papéis. Nesse sentido, é uma campanha analógica, embora, paradoxalmente, tenha invadido as redes sociais.

Como ela está no começo, merece o benefício da dúvida: são reflexões provisórias.


Caos perto da Europa

A situação na Síria e Líbia torna mais convulsivas as fronteiras da UE

Em apenas 48 horas, entre segunda-feira e terça-feira passados, as patrulhas de resgate que operam no Mediterrâneo resgataram 10.655 migrantes e refugiados. Viajavam em barcos precários e superlotados. Ninguém que não esteja desesperado se joga ao mar em condições aterrorizantes. Quando os sobreviventes abandonavam os navios, o chão estava coberto com os cadáveres dos asfixiados, tal era a superlotação imposta pelas máfias. Estes números não só representam o drama de uma crise humana sem precedentes; também mostram a dimensão e a gravidade da situação de caos e destruição que ocorre às portas da Europa.

A UE aprovou nesta quinta-feira enviar à Bulgária o primeiro contingente da nova polícia de fronteira da Europa, mas pouco servirá este instrumento, se nada for feito sobre as causas do êxodo. A quebra da trégua na Síria continua alimentando uma diáspora que atingiu seu pico em 2015, mas que está longe de terminar. Na ausência de expectativas de poder voltar para seu país, muitas famílias que passaram anos vivendo pessimamente em campos de refugiados turcos ou libaneses fazem o caminho para a Europa, mesmo sem garantias de chegar ou de serem bem recebidos. Enquanto isso, na Líbia se concentram dezenas de milhares de migrantes procedentes de vários países africanos. Alguns fogem de conflitos, outros da miséria. Após viagens longas e perigosas, ficam presos sem possibilidade de voltar. Na situação perigosa de desgoverno que vive a Líbia, muitos são vítimas de abusos, trabalho forçado e estupro. Correr o risco de uma travessia incerta é para eles o mal menor.

Até agora este ano já chegaram à Europa através do Mediterrâneo mais de 300.000 migrantes — 166.000 através da Grécia, 130.000 pela Itália — e se afogaram ou desapareceram mais de 3.500. Desde que há seis meses foi assinado o acordo com a Turquia, o fluxo através do Egeu foi reduzido, mas agora é a Itália que recebe a maior pressão. Devemos celebrar a resposta muito positiva por parte de seu Governo, que não reduziu os esforços e mantém a política de acolhida. O mesmo deve ser dito da Grécia, apesar da falta de solidariedade do resto da UE, que se mostra incapaz de cumprir sequer com seus próprios acordos. Agora faz exatamente um ano que foi aprovado o plano que devia distribuir 160.000 refugiados entre os diferentes membros da UE. Na metade do prazo previsto, apenas 5.651 foram realocados, só 3,5%. O resto continua aí. A má gestão deste problema leva a Europa cada vez mais para posições que violam não só seus princípios fundadores, mas também suas leis. A pressão sobre suas fronteiras não vai diminuir por mais que olhemos para o outro lado.


Fonte: brasil.elpais.com


UNICEF: Mais de 28 milhões de crianças foram deslocadas por conflitos em 2015 e estão ameaçadas

Fundo das Nações Unidas para a Infância alertou que, em 2015, mais de 100 mil crianças não acompanhadas pediram asilo em 78 países – o triplo do número de 2014. “Imagens como de Aylan Kurdi na praia ou o rosto atordoado e sangrento de Omran Daqneesh [foto] chocaram o mundo. Mas cada imagem, cada menina ou menino, representa muitos milhões de crianças em risco – e isso exige ação”, afirmou o diretor-executivo do UNICEF, Anthony Lake.

Na região das Américas, que abriga 6,3 milhões de crianças migrantes – um quinto do total global –, o Brasil é o sétimo país com o maior número de emigrantes e imigrantes em 2015, e o oitavo que recebeu o maior número de imigrantes crianças.

Milhões de crianças expulsas de suas casas devido à violência e conflitos, ou na esperança de encontrar um futuro melhor e mais seguro, enfrentam novos perigos ao longo do caminho – incluindo o risco de afogamento em travessias marítimas, desnutrição e desidratação, tráfico, sequestro, estupros e até assassinatos.

O quadro preocupante foi divulgado pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) por meio de um relatório publicado nesta quarta-feira (7).

“Imagens permanentes de cada criança – o pequeno corpo de Aylan Kurdi em uma praia após o afogamento no mar, ou o rosto atordoado e sangrento de Omran Daqneesh em uma ambulância depois de sua casa ter sido destruída – chocaram o mundo”, afirmou o diretor-executivo do UNICEF, Anthony Lake.

“Mas cada imagem, cada menina ou menino, representa muitos milhões de crianças em risco – e isso exige que a nossa compaixão para com as crianças individualmente seja combinada com a ação para todas as crianças”, acrescentou.

O relatório – intitulado “Desenraizados: a crescente crise de crianças refugiadas e migrantes” – apresenta um quadro sombrio da vida e situações de milhões de crianças e famílias afetadas por conflitos violentos e outras crises, situações estas que fazem parecer mais seguro arriscar tudo em um viagem perigosa do que permanecer em casa.

De acordo com o relatório, cerca de 50 milhões de crianças, em todo o mundo, migraram através de ou dentro de suas fronteiras, ou foram deslocadas à força. Mais de metade desse número – 28 milhões – são meninos e meninas com menos de 18 anos que fugiram da violência e da insegurança.

Além disso, o documento aponta que mais e mais crianças estão atravessando as fronteiras por conta própria. Em 2015, mais de 100 mil crianças não acompanhadas pediram asilo em 78 países – o triplo do número de 2014.

As crianças não acompanhadas estão entre aquelas com maior risco de exploração e abuso, incluindo por parte de contrabandistas e traficantes.

Em termos de distribuição geográfica, o relatório assinala que a Turquia acolhe o maior número total de refugiados recentes e, muito provavelmente, o maior número de crianças refugiadas no mundo. Em termos percentuais, o Líbano acolhe o maior número de refugiados por uma margem esmagadora: cerca de uma em cada cinco pessoas no Líbano é refugiada.

Na região das Américas, o Brasil é o sétimo país com o maior número de migrantes – tanto emigrantes quanto imigrantes – em 2015, e o oitavo que recebeu o maior número de migrantes internacionais com menos de 18 anos.

O Brasil foi o destino de 714 mil crianças em 2015, o que não representa nem 1% de sua população total. Em contrapartida, pouco mais de 1,5 milhão de crianças deixaram o país, também em 2015, para migrar para outro país – número que ultrapassa 1% da população brasileira.

Um em cada dez migrantes nas Américas é criança, sendo que quatro em cada cinco crianças migrantes vivem em apenas três países: Estados Unidos, México e Canadá. Estes países possuem números muito acima dos demais países. No total, 6,3 milhões de crianças migrantes vivem nas Américas, o que representa um quinto do total global.

Acesse o relatório na íntegra, em inglês, clicando aqui. Saiba mais sobre o que o UNICEF está fazendo sobre o tema aqui.


Fonte: nacoesunidas.org