recuperação

José Roberto Mendonça de Barros: Vamos bater no muro?

A percepção de que a situação fiscal se deteriorou muito é agora universal

Do ponto de vista econômico, a resposta brasileira ao coronavírus foi muito robusta, pois algo como 12% do PIB foi transferido para mais de 65 milhões de pessoas, um valor bastante concentrado a partir de junho. Isso provocou um grande salto na demanda das famílias, que ativou parte do comércio e da indústria. Como resultado, a queda do PIB deste ano será menor do que se projetava, ficando entre -4% e -5%.

Entretanto, boa parte do setor de serviços não viveu essa melhora. Falo aqui de viagens, de toda a cadeia de hospitalidade, da economia criativa e de tudo o que depende de aglomeração. Essa situação não mudará de forma substancial, uma vez que o número de novas mortes e de novos casos vem caindo de forma muito lenta, sem falar no risco de uma segunda onda, como a que ocorre atualmente na Europa.

Em consequência, o mercado de trabalho vem se recuperando com certa lentidão, até porque muitas empresas quebraram ou encolheram, reduzindo a oferta de empregos permanentes. Mais ainda: já dá para perceber que o grande salto do processo de digitalização e da automação que resulta da pandemia também está reduzindo o número de empregos permanentes, processo que se verifica no mundo inteiro. Isso mostra a dificuldade de uma recuperação em “V”. Para citar um único exemplo: pense em quantas agências bancárias se tornaram desnecessárias como resultado do inacreditável avanço do “home banking” e da digitalização dos meios de pagamento – isso sem falar no sucesso que fará o Pix. O mesmo raciocínio se aplica para inúmeros outros serviços, como venda de carros, assistência técnica, ensino etc.

Por outro lado, a demanda de consumo deverá se reduzir no início do próximo ano. O fim do programa do coronavoucher deprimirá a renda disponível de muitas famílias, mesmo que a desejada expansão do Bolsa Família consiga ser operacionalizada, porque cairá drasticamente o número de beneficiários. Essa queda de renda, como já argumentado, não será compensada pela criação de novos empregos permanentes. Além disso, a forte elevação do custo da alimentação, que segue crescendo acima de 10%, reduz o poder de compra de muita gente. Apenas a entrada de uma nova safra, em 2021, reverterá essa tendência.

Em paralelo, não há atualmente qualquer indicação de elevação dos investimentos públicos ou privados. Ao contrário, continuamos a ver uma queda nos investimentos estrangeiros. Alguma surpresa? Basta pensar nos reveses sofridos pelo ambiente regulatório (como no caso da Linha Amarela, no Rio de Janeiro), nos atrasos em projetos que estão no Congresso (Lei do Gás) e nas privatizações que simplesmente não existem…

Tudo indica que o crescimento de 2021 ficará pouco acima de 2% e que a inflação será maior que a deste ano. Além da pressão no preço de alimentos, existem fortes altas em matérias-primas industriais básicas, químicas e metálicas, cujo repasse aguarda apenas alguma recuperação da demanda. Por baixo dessas pressões está a desvalorização do real que, dadas as incertezas atuais, tem pouca chance de ser revertida. A taxa de juros será elevada no próximo ano, ou mesmo antes.

A percepção de que a situação fiscal se deteriorou muito é agora universal. Isso mesmo sem os gastos adicionais que o Executivo e o chamado Centrão querem incluir na proposta orçamentária para o próximo ano. Como resultado, a rolagem da dívida pública agora se faz apenas com papéis mais curtos e as taxas mais longas já subiram no mercado quando comparadas a algumas semanas atrás.

Temos assim um impasse. De um lado, a situação fiscal exige uma resposta: apontar qual a trajetória que se objetiva uma vez passada a emergência do combate ao vírus. De outro, Brasília segue em festa como nos bons tempos, com óbvio apetite por elevar os gastos – e não falo apenas do Executivo, mas também de boa parte do Legislativo e do Judiciário (alguém aí pensou do novo Tribunal Regional Federal em Minas Gerais?).

No meio disso tudo, o Ministério da Economia, cada vez menor e sem rumo.

Daí a pergunta título: se o embate crescer, vamos bater no muro?

*Economista e sócio da MB Associados


Luiz Carlos Mendonça de Barros: Uma nova fase da crise econômica

Estimativa para o PIB no 2º trimestre de 2020 tem números melhores dos que os estimados anteriormente

Os trinta dias decorridos desde minha última coluna no Valor revelam, de maneira mais clara, o roteiro que vamos seguir em nossa difícil estrada para a recuperação econômica em 2022. Uma primeira informação importante que agora dispomos é que está sendo impossível aos governos nacionais - no Brasil e em vários outros países - seguir o roteiro original em que o isolamento social só seria abandonado quando o controle da pandemia estivesse assegurado e o achatamento da curva da doença atingido. Inclusive nos países em que o controle teve sucesso inicial, acabou ocorrendo aceleração da abertura da economia, mesmo que ao custo de vidas humanas.

No Brasil - como nos Estados Unidos - o controle social radical foi abandonado com volta do crescimento da economia se impondo como valor político inadiável. Mas a avaliação sobre acertos e erros na evolução do relaxamento - ou mesmo de seu total abandono - vai ser feito no futuro.

Com este novo protocolo na busca da normalização da economia, podemos trazer nossa atenção para sua dinâmica ao longo dos próximos meses. A China voltou ao nível de sua atividade econômica de antes da covid-19 como prêmio pela dureza e eficiência com que tratou o controle da pandemia. Em segundo lugar nesta disputa pela volta ao normal, contrariando as expectativas dos analistas, está a zona do Euro. Mesmo aos trancos e barrancos ao longo dos primeiros noventa dias a grande maioria de seus países membros controlaram a covid 19 com certo sucesso e iniciaram, ainda no segundo tri, um processo gradativo de relaxamento do controle social e já estão colhendo os primeiros frutos de ter saído do chamado fundo do poço.

Certamente uma das causas de sua recuperação, adiante de outros países, foi a injeção de ânimo nos agentes econômicos provocado por um pacote fiscal, de quase US$ 1 trilhão, para ser usado pelos países mais frágeis da região mediterrânea. Este sinal de solidariedade, nunca antes visto, acabou por provocar uma valorização do euro em relação ao dólar e consolidar a recuperação das economias nacionais. Mas mesmo assim a queda do PIB no segundo tri de 2020 foi histórico e, em algumas economias, perto dos 15% ao ano.

O Brasil ficou no grupo de países com uma política de enfrentamento da pandemia pouco eficiente, com divergências profundas entre seus líderes políticos de como implementar o afastamento social. Por esta razão a velocidade de recuperação da economia é mais lenta e o custo final de perdas de vidas humanas certamente mais elevado do que teria ocorrido se seguido o caminho da Europa. Neste sentido estamos seguindo os Estados Unidos, este sim a grande decepção no tratamento da crise de saúde e da recuperação de sua economia. A diferença a nosso favor foi a implantação de um abrangente programa de apoio de renda aos brasileiros que vivem no mundo da informalidade e uma logística de acesso ao benefício que funcionou com eficiência. Nos Estados Unidos os conflitos políticos, e um presidente fortemente negacionista em relação à pandemia, criaram as condições para um colapso histórico do emprego e da renda dos mais pobres.

A melhor prova do nosso sucesso no apoio à renda dos mais vulneráveis veio esta semana com a divulgação de algumas estatísticas econômicas referentes ao mês junho, principalmente a das vendas ao varejo. Os números divulgados mostram que este segmento importante do consumo dos brasileiros já voltou aos níveis de antes da pandemia. A equipe de economistas da FGV divulgou a primeira estimativa para o PIB no segundo trimestre de 2020 com números melhores dos que os estimados anteriormente: queda de 10,3% em relação ao primeiro tri e de 10,7 % em relação ao mesmo período do ano passado. Posteriormente o BC divulgou o seu indicador mensal do PIB - o IBC-Br - mostrando até junho números compatíveis com os da FGV.

Quando comparada com a queda de outras economias importantes neste mesmo período esta primeira medida da intensidade da nossa recessão se mostrou menor do que a queda de 12,1% estimada para a zona do euro - no caso da França este número foi 14,2% - e apenas 1/3 da queda de 32,9% ocorrida nos Estados Unidos, o que serve de algum conforto para uma sociedade tão sofrida como a nossa.

Além destas informações mais favoráveis sobre a recuperação da economia, outros indicadores que medem as expectativas dos agentes econômicos levaram a equipe da FGV a rever suas previsões para o ano fechado em dezembro: queda do PIB de 4,5% em 2020 e um crescimento de 3,5% em 2021. Se isto ocorrer efetivamente, chegaremos ao fim de 2021 com um PIB nominal praticamente igual ao de 2019 lembrando que há poucos meses a queda prevista pela grande parte dos analistas chegava a mais de 3% neste mesmo período de dois anos.

Mas a batalha pela recuperação do crescimento ao longo do restante do ano e principalmente nos primeiros meses de 2021 vai exigir do governo federal uma postura realista e madura em relação à política econômica. Se houver afastamento deste caminho, com a busca do crescimento via utilização de artifícios populistas, vamos ter uma recaída na recessão na parte final do mandato do presidente Bolsonaro. Estamos vivendo tempos parecidos com os anos iniciais do governo Geisel em 1975 quando a ansiedade de voltar a crescer fez o governo atropelar o ciclo econômico e tentar uma via mais rápida com resultados desastrosos para o regime militar poucos anos à frente.

*Luiz Carlos Mendonça de Barros, engenheiro e economista, é presidente do Conselho da Foton Brasil. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações.


Roberto Freire: A recuperação econômica vai à mesa

Depois de enfrentarmos três anos da maior recessão econômica da história brasileira, não são poucos os dados que apontam o início de um processo cada vez mais consolidado de retomada. Se, até há pouco tempo, grande parte da população ainda não sentia os efeitos mais visíveis de uma evidente recuperação, nos últimos meses houve uma mudança significativa justamente nos hábitos de consumo das famílias – que, aos poucos, voltaram a incluir em sua lista de compras alguns produtos e mercadorias que haviam sido cortados em função da crise.

Para que se tenha uma ideia do impacto desse fenômeno, um levantamento realizado pela consultoria Kantar Worldpanel mostra que, em 2017, a manteiga retornou à mesa de nada menos que dois milhões de lares brasileiros ao menos uma vez no ano, ao invés da margarina. No ápice da grave crise que assolou o país durante o governo de Dilma Rousseff, o produto marcava presença em 32,9% dos lares – esse índice saltou para 36,8%. Ainda de acordo com a pesquisa, é algo semelhante ao que ocorreu com o azeite de oliva, que desbancou o óleo de soja e retomou o seu lugar na lista de compras de 1,4 milhão de famílias. O requeijão, a batata congelada e o pão industrializado também retornaram ao cardápio dos brasileiros.

Não há dúvidas de que, entre os fatores que permitiram essas mudanças nos hábitos de consumo, estão a inflação baixa, a taxa de juros em seu menor patamar histórico, o aumento da renda e certo reaquecimento do mercado de trabalho, embora ainda tímido. Além de tudo isso, houve uma expressiva redução no endividamento das famílias – que comprometia 19,9% da renda mensal em dezembro do ano passado, de acordo com dados do Banco Central, índice inferior aos 22,8% registrados em 2015.

Especialistas têm estimado, de forma reiterada e praticamente unânime, que a economia brasileira seguirá firme na rota da recuperação nos próximos meses. O varejo, por exemplo, deve registrar um crescimento de mais de 4% em 2018 – o que pode ser fundamental para que as previsões de expansão de 3% do PIB ao final do ano se concretizem. Segundo a Tendências Consultoria Integrada, São Paulo e alguns estados da região Norte devem ser os maiores responsáveis por puxar o consumo. Economistas do banco Santander, por sua vez, já projetam um ganho de mais de R$ 120 bilhões para a economia nacional somente em função do aumento da massa salarial e da retração do endividamento das famílias.

Diante de tantas notícias auspiciosas, que agora se transformam em realidade palpável para a grande massa da população em seu dia a dia, é cada vez mais nítido que o trabalho desenvolvido pela equipe econômica do governo de transição merece ser reconhecido. Só não o é, como era de se esperar, pela oposição histriônica liderada pelo PT, refém da própria desfaçatez criada por meio de narrativas que pouco ou nada tem a ver com o mundo real, desprovidas que são de maior credibilidade e cada vez mais isoladas da opinião pública e da sociedade em geral.

Apesar de todo o descalabro deixado como herança perversa pelos governos lulopetistas, sobretudo com uma economia destruída após 13 anos de incompetência e irresponsabilidade na condução do país, o fato é que a população brasileira vem superando os momentos mais dramáticos da recessão e já começa a olhar para frente, em direção a um futuro mais digno.

Ainda há muito por fazer, é evidente. Mas não há como negar que o Brasil voltou aos trilhos e está novamente no caminho certo. Mais do que nunca, agora é necessário consolidar a recuperação da nossa economia, aprovar as reformas, ampliar a geração de empregos e aguardar com grande expectativa as eleições de outubro próximo.

Será a hora em que o povo brasileiro, de forma livre e soberana, dirá que país deseja pelos próximos quatro anos. Sem nenhum exagero, de forma emblemática e categórica, os alimentos de volta à mesa constituem a melhor e mais contundente resposta àqueles que desejam voltar ao passado. Derrotamos a recessão. Não podemos retroceder.

 


Míriam Leitão: Lenta e gradual

O ano de 2017 terá mais crescimento e menos inflação do que se previa até recentemente, mas a recuperação continuará lenta e gradual. Isso ficou claro mais uma vez com a forte queda do comércio em outubro. As vendas voltaram ao nível de janeiro e estão 9,6% abaixo de outubro de 2014, maior ponto da série. Com o adiamento da reforma da Previdência, a economia terá mais dificuldade em ganhar tração.

A expectativa do mercado financeiro era de alta de 0,2% nas vendas em outubro, e o IBGE divulgou um forte recuo de 0,9% em relação a setembro. Com a pequena alta de 0,2% na indústria, o quarto trimestre começou sem demonstrar a força que se esperava. Ainda assim, nas últimas semanas as estimativas de crescimento do PIB subiram pelo Boletim Focus e a tendência é que encostem em 1% nas próximas divulgações.

A economia continua presa em várias travas. A principal delas é a crise fiscal. As projeções mostram que o governo continuará com déficit primário pelo menos até 2021. O governo não tem votos para aprovar a reforma da Previdência, mesmo tendo feito concessões que enfraqueceram o projeto. O senador Romero Jucá afirmou que a votação ficará mesmo para fevereiro do ano que vem, informação que já havia sido divulgada na coluna de ontem. Outro problema é a incerteza política, com candidatos que não defendem a agenda de reformas bem posicionados nas pesquisas eleitorais.

A inflação abaixo de 3% este ano, o piso da meta, fará o Banco Central escrever uma carta na qual terá que se justificar. A grande pergunta é se os juros poderiam ter sido cortados antes e mais rapidamente. O BC tem dito que houve um fato inesperado, um choque positivo, dado pela alta produção agrícola, que levou à deflação de alimentos. De fato, o grupo alimentos e bebidas registra queda nos preços de 2,4% de janeiro a novembro. A alimentação em domicílio ficou 5,25% mais barata. Muitos itens do dia a dia da mesa do brasileiro tiveram quedas de dois dígitos, como arroz, feijão, açúcar, mandioca entre vários outros produtos.

Para o ano que vem, o quadro deve ser outro. Na terça-feira, o IBGE divulgou a estimativa de safra de 2018, e a expectativa é de queda de 9,2%. Se a agropecuária em 2017 ajudou a derrubar a inflação e a impulsionar o PIB, deve ter efeito inverso no ano que vem. Segundo relatório anual do banco Credit Suisse, o PIB do setor deve cair 2,4% em 2018, e os preços dos alimentos devem subir 5%. Por isso, essa inflação abaixo do piso da meta não preocupa. O país não corre o risco de entrar em um longo período de deflação.

As projeções indicam uma aceleração gradual do crescimento no ano que vem, para a casa de 2,5%. Uma taxa ainda baixa, diante de tudo que se perdeu. Na visão do Credit Suisse, a economia vai crescer pelo consumo das famílias e pela volta dos investimentos. A redução dos juros irá destravar o crédito, que deve saltar 6,3%, depois de ficar estagnado este ano. O que chama atenção na análise do banco é que o olhar para 2019 é de nova desaceleração do PIB, para 2,3%.

A crise diminuiu o potencial de crescimento do país, e ainda não há garantia de aprovação das reformas.

 

 


Míriam Leitão: O começo da volta

A economia está se recuperando. Há indicadores positivos mostrando que o país saiu do fundo do poço, mas há ainda um grande caminho a andar até chegar ao ponto do qual o país caiu na recessão. A produção industrial em outubro ficou 5,3% maior do que a de outubro do ano passado, mas ainda esta 17% abaixo do melhor momento, em 2013. A queda já chegou a ser de 21%. O caminho de volta só está começando.

Nada será como em outras recuperações. A volta será trilhada passo a passo e no meio do caminho haverá não apenas uma, mas várias pedras. Esta recessão não foi provocada por uma crise externa, foi feita aqui mesmo. Quando começou, o país já estava em desordem fiscal e ela se aprofundou pela queda forte da arrecadação. A dívida bruta subiu 20 pontos percentuais do PIB, desde o começo do governo Dilma. O cenário político é confuso, o governo não inspira confiança. Tudo isso é fator desestabilizador que dificulta o crescimento. Mesmo assim, há dados mostrando que a recuperação já começou.

No final de 2016, a economia estava 9,2% menor do que no final de 2014. Com os três trimestres consecutivos de alta este ano, ela está 5,8% menor, na mesma comparação. Ou seja, ainda não é o que era, mas está reduzindo o PIB perdido. O consumo das famílias está em queda de 6,6%, e os investimentos, apesar de terem voltado a crescer, estão 22% menores.

No mercado de trabalho, a situação é mais preocupante. O Brasil chegou a ter apenas 6 milhões de desempregados em 2013, mas viu o número disparar para 14,1 milhões no pior momento deste ano, em março. Em outubro, havia diminuído para 12,7 milhões. Mesmo assim, ainda é muita alta a quantidade de brasileiros procurando empregos sem encontrar.

O mercado financeiro vem revisando para cima as projeções para o PIB deste ano e do ano que vem. O chefe de economia e estratégia do Bank of America no Brasil, David Beker, passou de 0,6% para 1% a estimativa para 2017 e prevê alta de 3% em 2018, puxada pelo consumo. Mas ele define a recuperação como gradual e diz que há vários fatores impedindo uma retomada mais forte.

— Esta não é uma recuperação como as outras. Temos uma crise fiscal ainda não solucionada, com endividamento crescente do governo, desemprego alto, e muitas empresas também endividadas. Além disso, o Brasil perdeu produtividade. Nossa capacidade de crescer hoje é menor — explicou.

Ontem, o Bank of America lançou um relatório anual com perspectivas para a economia mundial em 2018. De um lado, a expectativa é de mais um ano de forte crescimento, o que ajudará o Brasil. Mas, por outro, o banco espera condições financeiras mais apertadas, com aumento de juros nos Estados Unidos e diminuição dos estímulos monetários na Europa. Com isso, os mercados emergentes, e principalmente os países com risco fiscal, como o Brasil, poderão ter mais dificuldades para atrair investimentos.

— A reforma tributária de Trump vai pressionar os gastos do governo americano. Com isso, o Banco Central dos EUA pode ter que elevar mais os juros do que o mercado previa. Isso afetará os emergentes — disse.

Uma das mudanças favoráveis do quadro brasileiro é o ajuste externo. O país chegou a ter um déficit em conta-corrente de 4% do PIB e hoje é de 0,4%. O Banco Central tem alto volume de reservas e o Investimento Estrangeiro Direto continua forte. Por isso as oscilações externas poderão ser enfrentadas. O Bank of America acredita que o Banco Central poderá manter os juros baixos durante todo o ano que vem. A expectativa dos economistas para hoje é que o Copom reduzirá a Selic para 7%, a menor taxa da série histórica. Dependendo do comunicado, o Banco Central poderá indicar novas quedas, para a casa de 6% no ano que vem.

— O Brasil poderá ter juros menores do que os do México, que está com a taxa em 7%. Isso vai ajudar na recuperação — explicou Beker.

A percepção da população é diferente da visão do mercado financeiro e do que dizem os índices. Apesar da melhora nos indicadores, a sensação de crise permanece porque o país melhorou mas está distante ainda do ponto em que estava. Quando um indicador sobe, como a produção industrial de outubro, divulgada ontem, consegue apenas reduzir a dimensão da queda.

 

 


Míriam Leitão: Retomada e eleição

O sistema financeiro teve que absorver R$ 200 bilhões de perdas das empresas com a recessão e a Lava-Jato. O crédito às famílias já voltou. No ano que vem, o país passará por momentos de muita volatilidade cambial, mas o BC reduziu de US$ 115 bilhões para US$ 24 bi sua posição nos swaps cambiais e tem enorme volume de reservas. Assim a economia se prepara para a eleição mais difícil desde a redemocratização.

A recuperação da economia será lenta pela natureza da crise. Foi uma recessão de alavancagem, como dizem os economistas. Houve um aumento grande do endividamento das famílias na época do boom, pelos estímulos dados pelo governo. Para quitar as dívidas, o consumo despencou. Neste caso, o padrão é a volta lenta ao nível de atividade. As famílias brasileiras tiveram que fazer o ajuste em situação difícil: a renda caiu, e mesmo assim as dívidas foram reduzidas. Após a desalavancagem, elas voltaram lentamente a aumentar o consumo e a tomar crédito. Há cinco meses cresce o crédito para as famílias. Em relação às companhias, voltará mais devagar, mas pode se normalizar nos próximos dois meses.

Na origem da crise, houve também o endividamento das empresas. Elas foram abatidas pela queda do PIB e enfrentaram ainda o problema do envolvimento das grandes companhias nos casos de corrupção. Grupos empresariais foram à lona, pediram recuperação judicial, acumularam passivos com as multas ou acordos de leniência, e tiveram que enxugar atividades e ativos para continuar operando. Tudo isso provocou, por reflexo, um abalo numa série incalculável de firmas pelo Brasil afora. Alguns economistas temiam que a crise das investigadas da Lava-Jato fosse provocar uma onda de inadimplência e quebras sucessivas de empresas. Uma crise sistêmica. Tudo foi grave, mas a economia conseguiu digerir esse volume colossal de dívidas não pagas.

Na avaliação de quem acompanha com minúcias o que se passa no sistema financeiro, o pior passou e a situação do crédito ao mundo corporativo começa a dar sinais de normalização. Na semana passada a FGV, através do Comitê de Datação dos Ciclos Econômicos, anunciou oficialmente que a recessão, que havia começado em meados de 2014, terminou no fim de 2016. Mas essa recuperação será diferente das outras por estes dois fatores: a recessão teve na sua origem o excesso de alavancagem e houve o fator complicador de empresas estarem envolvidas em escabrosos casos de corrupção. Todas as grandes empreiteiras e a maior empresa de alimentos do país foram apanhadas em atividades criminosas. Além disso, a maior empresa do país, a Petrobras, foi abalada diretamente. Tem sido uma crise tripla: econômica, corporativa e política.

Agora está começando a recuperação. A ideia de que o PIB está subindo porque caiu é uma explicação simplista. Houve acertos na condução da política econômica e muito esforço privado para esse resultado. Os dados têm oscilado, mas a tendência está clara em todos eles: o Brasil recomeça a crescer. Porém, será uma recuperação diferente das outras. Nas duas grandes recessões anteriores, dos anos 1980 e 1990, a alta foi forte. Desta vez, será bem mais difícil.

Uma das razões é a incerteza política. Muitas empresas que têm planos de investir vão esperar um ano antes de realizar os projetos porque dependem do que ocorrerá na eleição do ano que vem. Os bancos estão com liquidez e capacidade de financiar o investimento, mas não haverá demanda porque o grau de incerteza nesta eleição é maior do que nas anteriores. O crédito vai parar de cair em breve, mas as grandes operações devem ficar em suspenso por enquanto.

O ritmo do crescimento no ano que vem será modesto, mas os economistas começam a ter previsões mais otimistas. O governo mandou ao Congresso, embutida no Orçamento, a projeção do PIB de 2%. O Banco Central divulgou seu cenário com uma taxa de 2,2%. Alguns economistas apostam em 2,5% ou até 3%. O país começa a deixar para trás a mais prolongada recessão da sua história, mas será uma saída lenta e sujeita às turbulências políticas dos tempos atuais.

 

 


Míriam Leitão: Pontos de azul

Pela primeira vez em mais de três anos, o IBGE fez uma divulgação da produção industrial com todos os números no azul. Os indicadores têm sempre várias leituras, dependendo da comparação que é feita. Mas o dado de setembro mostra alta seja qual for a base. O crescimento foi tímido, apenas 0,2% quando o cálculo é feito contra agosto, mas no acumulado em 12 meses é a primeira alta em 39 meses.

O quadro permanece ruim apesar das notícias positivas colhidas aqui e ali. A crise permanece, principalmente nesse setor, apesar de o país estar saindo devagar, e de forma hesitante, da crise que tem vivido desde 2014. A produção industrial ainda está 17% abaixo do pico e só 5,4% acima do pior momento da recessão, em fevereiro de 2016. A indústria é, e continuará sendo, o segmento da economia onde a crise é mais profunda, porque ela foi a primeira a começar a encolher e há razões estruturais que tem levado à queda da sua participação no PIB.

Toda vez em que se tem expectativa de que a indústria vai engrenar, ela decepciona. Este ano, houve vários meses de crescimento em relação ao mês anterior, mas em agosto caiu 0,7%. A expectativa do mercado financeiro era de crescimento de 0,6% em setembro. E cresceu bem menos. Em períodos de recuperação frágil, como o atual, os números ficam sempre mistos. Alguns vão para o azul em um mês, enquanto outros voltam para o vermelho. Tem sido assim com a indústria.

A alta foi tímida e além disso foi pouco espalhada pelos setores. Apenas oito dos 24 setores que o IBGE pesquisa foram positivos, os outros 16 caíram. Na comparação com o mesmo mês do ano passado, a produção industrial aumentou 2,6%. E nesse cálculo já vinha crescendo há vários meses.

Ontem, a FGV divulgou o índice de confiança empresarial e houve nova alta em outubro, para 90,3 pontos, o maior patamar em mais de três anos, desde abril de 2014. Esse indicador mede a confiança de empresários da indústria, dos serviços, do comércio e da construção. Pelo terceiro mês seguido, houve aumento maior no sentimento de situação atual do que nas expectativas em relação ao futuro. Também melhorou o indicador de emprego previsto, que ficou acima de 100 pontos, o que significa mais empresas pensando em contratações do que em demissões. Isso não ocorria desde novembro de 2014.

Notícias boas estão começando a aparecer na economia quando se analisa qualquer indicador, mesmo na indústria. Ainda assim, não é possível ver a luz no fim do túnel. A indústria encolheu e tende a continuar à deriva por motivos de sempre, nunca enfrentados, como o do peso dos impostos, o custo logístico, a produtividade estagnada. O governo e o próprio setor quando pensam em política industrial defendem proteção, benefícios localizados, barreiras ao produto internacional, remédios tão velhos quanto ineficientes. A indústria só terá futuro se os nossos gargalos forem enfrentados de frente e o país se integrar ao mundo. O projeto insular nunca funcionou.

A produção de bens de capital caiu 0,3%, mas no ano tem crescimento de 4,5%. Mesmo assim, o nível de produção de máquinas e equipamentos, hoje, está mais baixo do que o pior momento de 2008, na entrada da crise financeira internacional. É um sinal claro de que a economia não está investindo.

O grande problema continua sendo a incerteza política e a crise fiscal. É isso que trava os investimentos e impede a queda da “parte longa” da curva de juros. Ou seja, contratos com vencimentos para daqui a 5 ou 10 anos. Enquanto a taxa Selic caiu para 7,5%, os contratos que vencem em 2028 ainda pagam 11% de juros. Isso afeta setores importantes da economia, como a construção civil e o setor imobiliário, explica o presidente da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip), Gilberto Duarte.

— Os juros caíram, é verdade, mas para o setor imobiliário o que conta são os contratos de longo prazo. As taxas com vencimento em 10 anos caíram de 16% para 11% desde janeiro de 2016. Não é o mesmo patamar de 7,5% da Selic. É preciso votar as reformas no Congresso e resolver a crise fiscal para que a curva longa caia ainda mais — explicou.

Na indústria, o peso do dever de casa não feito é mais difícil de superar.

 


Míriam Leitão: Recuperação gradual  

O setor de petróleo ainda vai esperar a superação da crise política antes de recuperar o nível de investimentos no Brasil. É o que mostra pesquisa da Accenture Strategy em parceria com a FGV Energia. No curto prazo, a agenda ainda é de austeridade, mas a partir de 2019 a expectativa é de retorno gradual dos projetos. Para 2026, no melhor cenário, os investimentos podem chegar a US$ 50 bilhões, contra US$ 16 bi de 2016.

O Brasil perdeu o melhor momento do setor para investir. Quando os preços estavam acima de US$ 100, o país ficou discutindo a mudança no marco regulatório, no final do governo Lula e início do governo Dilma. Foram cinco anos sem rodadas de licitação, e o bilhete premiado do pré-sal se transformou em uma conta bilionária de desvios revelados pela Operação Lava-Jato. Nesse período, outros campos de petróleo foram descobertos pelo mundo, e os Estados Unidos começaram a produzir fortemente o petróleo por exploração não convencional (shale gas). Hoje, os preços estão rodando a casa de US$ 50, e as petrolíferas estão mais seletivas na hora de investir.

O impacto da interferência política no setor de petróleo fica evidente quando se olha para os investimentos. Em 2013, eles chegaram a US$ 33 bilhões, mas despencaram para US$ 16 bi no ano passado. A estimativa da Accenture e da FGV Energia é que esse número só começará a subir de forma mais consistente no próximo governo.

— Os anos de 2017 e 2018 ainda serão de reestruturação. Os leilões vão voltar este ano, mas levará tempo até que os investimentos saiam do papel. O que a pesquisa mostrou foi que a partir de 2019 deve ocorrer um retorno gradual dos investimentos, depois que ficar para trás a instabilidade política — explicou Daniel Rocha, diretor-executivo e líder da indústria de Energia da Accenture Strategy.

Desde junho do ano passado, após a troca de governo, o setor passou por uma série de mudanças regulatórias. A Petrobras deixou de ser a operadora única do pré-sal; as rodadas de licitação voltaram a ser agendadas; as regras de conteúdo nacional foram flexibilizadas. Ainda assim, a visão do setor é de que há fortes barreiras ao investimento. Entre os 74 executivos entrevistados pela Accenture, 51% deles citaram a crise política como entrave e 57% reclamaram da carga tributária elevada. O pré-sal também deixou de ser unanimidade.

— O mais importante para o governo é manter a regularidade nos leilões, e, além disso, das áreas que sejam mais atrativas. Isso é fundamental neste momento de maior incerteza — disse.

Rocha destaca o trabalho que vem sendo feito pela atual gestão da Petrobras. Explica que o endividamento da companhia, em relação à geração de caixa, já caiu de 5,3 para 3,2 anos. A petrolífera conseguiu cumprir o seu plano de desinvestimento em 2016, apesar das dificuldades que enfrentou na Justiça para colocar à venda alguns projetos. A pesquisa também mostrou que para 75% dos executivos entrevistados a venda de ativos da Petrobras vai estimular novos investimentos no país. Isso porque haverá um ambiente de maior competitividade, com mais empresas tocando os projetos.

No final deste mês, já acontecerá a 14º rodada de licitação, e a expectativa é positiva. Para 93% dos executivos ouvidos pela pesquisa, haverá boas oportunidades de negócio e para 76% o leilão pode significar um marco para a retomada do setor.

Ontem, o ministro Henrique Meirelles disse que a economia poderá crescer em um ritmo de 3% em 2018. Destravar o setor de óleo e gás será importante para impulsionar a economia e para conter a crise fiscal em estados produtores, como o Rio. _

O Ibovespa caiu 0,45% e frustrou expectativa de quebrar o recorde histórico atingido em maio de 2008.

Dólar caiu a R$ 3,08 e também atingiu a menor cotação em 33 meses contra uma cesta de moedas, segundo o “Financial Times”.

Levantamento da consultoria Sabe mostra que o lucro dos 24 maiores bancos do país subiu 7% no primeiro semestre.

 


Roberto Freire: País começa a abandonar agenda negativa

Freire diz que País começa a abandonar agenda negativa e defende aliança democrática para 2018. Para o presidente do PPS, os "extremos políticos" têm que ser combatidos

O presidente do PPS, deputado federal Roberto Freire (SP), afirmou que o Brasil, aos poucos, volta a ter uma “relativa estabilidade”, e que o governo de transição ganhou força após a Câmara dos Deputados rejeitar o pedido de investigação da PGR (Procuradoria Geral da República) contra o presidente Michel Temer. Ele observou que esse fato coincide com a reversão da crise econômica e a reorganização da sociedade em torno de um projeto político para 2018.

“O Brasil está vivendo uma relativa estabilidade. Depois da negativa da Câmara dos Deputados em conceder autorização para a investigação do presidente da República nos termos da PGR [Procuradoria-Geral da República], temos um presidente que readquiriu certa força e que garante uma certa estabilidade. Isso coincide com dois fenômenos que começam a ocorrer e que ajudam a termos mais otimismo com a transição até 2018, nas eleições gerais: a recuperação da economia e a saída do País de uma pauta negativa por conta dos malfeitos praticados por políticos”, disse (veja aqui o vídeo).

Ao analisar os índices econômicos que apontam a superação da recessão deixada pelo lulopetismo, o parlamentar ressaltou que o País começa a sair do “fundo do poço”.

“No campo econômico temos alguns sinais positivos da retomada [da economia]. São sinais que dizem que já atingimos o fundo do poço e agora parece que estamos saindo. Retomando, ainda de uma forma não desejável porque seria importante um ritmo maior de recuperação, mas com certa constância. Os dados da economia estão se sucedendo e isso é muito importante”, afirmou.

Aliada a retomada econômica, Roberto Freire disse que a sociedade brasileira começa a deixar a pauta negativa, criada pela corrupção que assolou a nação durante os 13 anos de desgoverno petista, e começa a se preocupar politicamente com 2018.

“A sociedade brasileira está saindo de uma pauta negativa. De uma agenda da indignação, uma justa indignação, por conta das malfeitorias, do desmantelo, da corrupção e do emblema da Lava-Jato, que terá continuidade, mas que hoje não é mais a única temática e agenda da sociedade brasileira. Começa a se ter a política. Começa a surgir a movimentação política para 2018. Começa a se falar em alternativas e de candidaturas que podem existir”, analisou.

Extremos

Freire chamou atenção, no entanto, para o surgimento de “extremos políticos” que precisam ser combatidos.

“Estamos vendo as forças derrotadas pelo impeachment tentando se articular. Não sabem ainda se com o ex-presidente, um nome novo ou com outro partido. Importante levar em consideração que é uma articulação profundamente antidemocrática. São apoiadores da sanguinária ditadura de [Nicolás] Maduro. Eles têm descompromisso total com a democracia. Por outro lado, toda uma intensa mobilização, em função do desastre que foi o governo PT, de uma direita que cresce em torno de uma postura e visão também profundamente antidemocrática. De um candidato que apoia ditadura, defende tortura e torturadores. Evidentemente isso é uma demonstração cabal de total descompromisso com a democracia”, afirmou.

Alternativa

O deputado ressaltou que diante desta polarização é preciso debater uma alternativa com todas as forças comprometidas com a democracia no País.

“Para combater isso cabem às forças democráticas, como o PPS e tantas outras que estão na arena política brasileira, discutir a construção de uma alternativa para evitar os dois extremos, com o Brasil retomando o desenvolvimento e uma sociedade mais solidária”, defendeu.

Aliança democrática

O presidente do PPS chamou atenção para o artigo do senador Cristovam Buarque (DF) “Aliança para Salvar Brasília” (veja aqui), que trata da importância da realização de alianças republicanas com o objetivo de defender interesses da sociedade.

“Uma análise muito interessante sobre a realidade de Brasília que se aplica até com maior propriedade na atual conjuntura nacional. O PPS deve procurar uma articulação e grande aliança com outras forças democráticas exatamente para produzir uma alternativa. O artigo de Cristovam merece ser lido porque traz uma excelente reflexão”, sugeriu.