rainha elizabeth

A primeira-ministra britânica Liz Truss enfrentou a pressão de deputados que pediam sua renúncia após uma reviravolta em uma de suas principais políticas econômicas

Liz Truss renuncia: a ascensão e queda (rápida) da primeira-ministra britânica, em imagens

BBC News Brasil*

Seu mandato como primeira-ministra é o período mais curto da história britânica, mas certamente foi agitado.

Ela viu a morte da rainha Elizabeth 2ª, grande turbulência no mercado e caos político.

Início liberal

Quando adolescente, Truss causou alvoroço na conferência dos Liberal Democrats (Liberais Democratas) com sua postura anti-monarquia

Liz Truss hoje é uma conservadora convicta, mas quando era estudante ela foi presidente dos Democratas Liberais (outro partido político britânico) da Universidade de Oxford.

Quando fala sobre sua infância, ela descreve seu pai, professor de matemática, e sua mãe, enfermeira, como "de esquerda".

Membro do Parlamento

Depois de mudar de lado para o Partido Conservador, Truss tornou-se membro do parlamento (MP, na sigla britânica) em 2010, após duas tentativas fracassadas em 2001 e 2005.

Quando questionada sobre a razão de mudar sua posição para uma postura conservadora, ela disse que conheceu no partido pessoas com ideias semelhantes que compartilhavam seu compromisso com a "liberdade pessoal, a capacidade de moldar sua própria vida e seu próprio destino".

Primeira mulher Lorde Chanceler do Reino Unido

Truss tornou-se a primeira mulher Lorde Chanceler e secretária da Justiça no Reino Unido em 2016

Em 2016, Truss tornou-se a primeira mulher Lorde Chanceler (um cargo do alto escalão do governo britânico) e ministra da Justiça. No cargo, ela teve vários confrontos de alto nível com o Judiciário.

Após 11 meses como ministra da Justiça, ela foi rebaixada a ministra-chefe do Tesouro.

Ministra de Relações Exteriores do Reino Unido

Truss usando um tradicional chapéu de pele russo durante uma viagem a Moscou como ministra de Relações Exteriores do Reino Unido

Antes de se tornar primeira-ministra, Truss atuou como ministra de Relações Exteriores, ministra do Comércio e ministra da Justiça.

Seu mandato de ministra de Relações Exteriores foi marcado por polêmicas.

No cargo, ela acusou a primeira-ministra da Escócia, Nicola Sturgeon, de "querer aparecer", teve uma briga diplomática com o presidente francês Emmanuel Macron e foi criticada por apoiar pessoas do Reino Unido que queriam pegar em armas e lutar na Ucrânia.

Primeira-ministra

Liz Truss durante um evento conservador em Londres

Truss venceu a disputa pela liderança do Partido Conservador em 2022 em setembro, depois que o ex-primeiro-ministro Boris Johnson perdeu o apoio de seus parlamentares e renunciou.

Liz Truss foi nomeada como a nova primeira-ministra do Reino Unido pela rainha em 6 de setembro, dois dias antes da morte de Elizabeth 2ª. Para conseguir o cargo mais alto, Truss conquistou 81.326 votos entre os membros do partido, em comparação com 60.399 de seu rival Rishi Sunak.

A morte da rainha

Liz Truss se tornou a última primeira-ministra britânica a se encontrar com a rainha Elizabeth 2ª

Na sua primeira semana no cargo, Truss comunicou à nação que a monarca mais longeva do Reino Unido, a rainha Elizabeth 2ª, havia morrido.

Sob os holofotes mundiais, Truss liderou homenagens e o funeral da rainha durante um período de luto de 10 dias.

Cortes de impostos e caos

A primeira-ministra Liz Truss e ochanceler do Tesouro Kwasi Kwarteng durante uma visita a Berkeley Modular em Northfleet Kent

Em menos de um mês no cargo, Truss demitiu seu ministro da Economia, Kwasi Kwarteng. Um novo ministro, Jeremy Hunt, foi nomeado na semana passada e imediatamente reverteu quase todos os planos de corte de impostos de seu antecessor.

Isso aconteceu depois que as propostas econômicas de Kwarteng colocaram os mercados em turbulência, levando a libra a um nível recorde e forçando o Banco da Inglaterra a intervir. Kwarteng havia proposto aumento de gastos públicos e corte de impostos para lidar com a maior onda inflacionária das últimas quatro décadas.

A última semana de Truss

Liz Truss renunciou em 20 de outubro

Depois de alguns meses caóticos no governo e com pessoas no Reino Unido lutando com uma crise de aumento do custo de vida, seus próprios parlamentares pediram que Truss renunciasse ao cargo de primeira-ministra.

Ela insistiu que era a pessoa certa para o cargo, mas nesta quinta-feira (20/10) admitiu a derrota e afirmou que havia dito ao rei Charles 3º que estava renunciando ao cargo de líder do Partido Conservador.

Diante de dezenas de repórteres, ela diz que assumiu o cargo em um momento de "grande instabilidade econômica e internacional". Ela afirmou não poder cumprir o mandato para o qual foi eleita pelos conservadores e renunciou.

Texto publicado originalmente na BBC News Brasil.


Bolsonaro visita caixão da rainha ao lado de Michelle e Silas Malafaia | Foto: Chip Somodevilla/AP Photo/picture alliance

O Brasil na imprensa alemã (21/09)

Made for minds*

Neues Deutschland – Bolsonaro modera o tom (20/09)

Em meados de setembro, vários podcasters evangélicos tiveram um convidado especial em seu estúdio: Jair Bolsonaro. Ao ser questionado, o presidente do Brasil disse se arrepender de algumas declarações sobre a pandemia. Mas um trecho particular da entrevista, que durou mais de quatro horas, circulou nas redes sociais: nele, Bolsonaro contou que passaria a faixa presidencial se não fosse reeleito.

Foram tons incomuns para o radical de direita. Há meses, Bolsonaro vem atacando instituições democráticas e disseminando mentiras sobre o sistema de votação eletrônica. Ele afirmou várias vezes que aceitaria os resultados somente se fosse eleito. "Somente Deus" poderia tirá-lo da Presidência. É claro que Bolsonaro não teve uma mudança repentina de opinião. Os tons mais moderados provavelmente fazem parte de uma estratégia de campanha.

Em todas as pesquisas, Bolsonaro está claramente atrás de seu principal adversário, Lula. Se Bolsonaro ainda quiser vencer as eleições, dependerá dos eleitores do centro e deve tentar superar sua rejeição. E isso não funciona com aparições exageradamente estridentes e visões radicais.

Na verdade, Bolsonaro esperava que os protestos em massa [de 7 de Setembro] lhe pudessem dar um impulso nas pesquisas. [...] Mas o desejado "efeito das ruas" não aconteceu, pelo contrário: em pesquisas recentes, Bolsonaro caiu ainda mais. Os benefícios sociais concedidos pelo governo também tiveram pouco efeito. 

Süddeutsche Zeitung – Campanha eleitoral no funeral da rainha (20/09)

Apenas 2 quilômetros em linha reta separam a residência do embaixador brasileiro em Londres do Westminster Hall, no Parlamento britânico. No domingo, o caixão da rainha Elizabeth 2ª ainda estava no local quando Jair Bolsonaro apareceu na sacada da residência do embaixador. Logo embaixo, na rua, apoiadores estavam reunidos e gritavam "mito, mito". [...]

Bolsonaro disse ter profundo respeito pela família real e pelo povo do Reino Unido, mas que estava ali também por outro motivo. "Teremos que decidir o futuro da nossa nação." O presidente afirmou que o Brasil está no caminho certo, e que o país é um exemplo brilhante para o mundo. "Nosso lema é Deus, pátria, família e liberdade", disse Bolsonaro. "Não tem como a gente não ganhar no primeiro turno." [...]

Todas as pesquisas preveem uma vitória clara do adversário: no primeiro turno, Lula está mais de 10 pontos percentuais à frente de Bolsonaro e, de acordo com as projeções, mais da metade dos eleitores quer votar no candidato da esquerda num segundo turno. [...]

Nas últimas semanas, Bolsonaro percorreu incansavelmente o país. Participou de rodeios e cultos evangélicos. O fato de ele ter agora viajado para o funeral da rainha no meio da campanha eleitoral é visto por observadores como uma tentativa de mostrar aos eleitores de seu país que seu governo desfruta de apoio no exterior.

Der Tagesspiegel – Com balas e pistolas (16/09)

Em um comício em Fortaleza, Delegado Cavalcante – deputado estadual pelo Ceará e membro do PL, o partido do presidente Jair Bolsonaro – pegou o microfone. Algumas centenas de pessoas foram ao local para ouvi-lo, a maioria vestindo camisas amarelas que se tornaram a marca registrada do bolsonarismo. [...] Com voz rouca, Cavalcante gritou à multidão: "Se a gente não ganhar nas urnas, se eles roubarem nas urnas, nós vamos ganhar na bala. Na bala!" A multidão aplaudiu. [...] A retórica agressiva de Cavalcante foi extrema, mas nenhuma exceção. E ela tem consequências. [...]

Na corrida pela Presidência, Bolsonaro está claramente atrás de seu adversário, o ex-presidente Lula, em todas as pesquisas. O mais tardar no segundo turno, no final de outubro, Lula pode ser eleito o próximo presidente do Brasil. Seria um retorno surpreendente para Lula – e um pesadelo para Bolsonaro e seus apoiadores.

Por isso, eles reagem de forma agressiva. Bolsonaro chama Lula de "bandido de nove dedos". [...] Repetidamente, Bolsonaro classifica a eleição como um voto "entre o bem e o mal". Ele mesmo é um patriota, diz, e Deus o escolheu para liderar o Brasil. Por outro lado, Lula levaria o país ao socialismo, fecharia igrejas, ensinaria ideologia de gênero nas escolas e legalizaria o aborto e as drogas. [...]

Dois assassinatos de apoiadores de Lula já foram registrados nessa campanha. [...] Os casos são os exemplos mais extremos do clima eleitoral agressivo, mas não são os únicos. Em uma igreja evangélica em Goiânia, uma briga começou porque o pastor disse aos fiéis para não votarem "nos vermelhinhos". Logo depois, um policial bolsonarista atirou na perna de um apoaidor de Lula.

A polarização da sociedade brasileira é frequentemente apontada como a culpada por essa violência. Mas a polarização tem um nome: Bolsonaro. O presidente normalizou a linguagem da violência na política nos últimos quatro anos. [...] Bolsonaro nunca tentou reconciliar o país ou dialogar com seus adversários. Em vez disso, tem criado constantemente novos conflitos. E diante da derrota, Bolsonaro semeia dúvidas sobre a confiabilidade das urnas.


*Texto publicado originalmente no portal
 dMade for minds.


Hamid Dabashi: O príncipe Philip foi um racista ferrenho

Nesta sexta-feira (9), dia em que morreu aos 99 anos o príncipe Philip, o DCM reproduz um artigo sobre o principal legado que o marido da rainha Elizabeth deixa para a família real britânica: o racismo.

Publicada em 2017 no site do canal de notícias Al Jazeera e escrito por Hamid Dabashi, Professor de Estudos Iranianos e Literatura Comparada na Universidade de Columbia, a reportagem traz uma montanha de declarações preconceituosas do duque de Edimburgo.

“O príncipe Philip realiza seu último compromisso oficial”, informou a BBC ao mundo em 2 de agosto de 2017. “O duque de Edimburgo conheceu a Royal Marines em seu último compromisso público solo antes de se aposentar dos deveres reais.

Há um ar de solenidade histórica no tom da BBC. “O homem de 96 anos anunciou sua aposentadoria em maio, depois de décadas apoiando a Rainha e participando de eventos para suas próprias instituições de caridade e organizações. O príncipe Philip completou 22.219 compromissos desde 1952.”

Em 1952 eu tinha um ano de idade. No ano seguinte, o MI6, o órgão de inteligência militar do governo do duque de Edimburgo, ajudou a CIA a dar um golpe em minha terra natal. A BBC não quis dizer qual dos 22.219 deveres reais coincidiu com aquela ocasião.

Naquela ocasião, em vez disso, a BBC fez o que faz de melhor: apontou para uma verdade, mas camuflou-a com uma série de eufemismos que distorcem completamente o que ela parece marcar. O príncipe Philip – como podemos dizer com delicadeza aqui – é um racista ferrenho. Seu racismo é segredo público. Todo mundo sabe disso. O próprio príncipe habitualmente o encena. Portanto, a BBC precisa relatá-lo, embora de uma forma típica da BBC – tornando-o frívolo e inócuo.

“As gafes do príncipe Philip em décadas no dever real”, é a manchete da BBC. Portanto, as declarações surpreendentes do bom príncipe não são o que são, sintomáticas de uma mente profundamente racista. São apenas “gafes” – comentários não intencionais e infelizes que causam constrangimento, coisas que ele não deveria ter dito e não queria realmente dizer, mas infelizmente disse. É por isso que são “gafes”.

“Ainda arremessam lanças?”

A BBC então se move para colorir essas declarações racistas vintage com pincéis ainda mais grossos como “frases memoráveis ​​que podem fazer algumas pessoas rir e outras se encolher”. Isso tem o objetivo de cancelar o “estremecimento” com uma “risada” e resultar em uma tosse neutralizante. O resto é inteiramente o conhecimento padrão da BBC esculpindo fatos brutais com ginástica etimológica: “O Príncipe Philip é conhecido por falar o que pensa – muitas vezes explicado como sua tentativa de aliviar o clima – e essa natureza franca às vezes levou à controvérsia, com algumas dessas observações oscilando à beira de ser ofensivo.”

Essas frases clássicas da BBC deveriam ser estudadas na Columbia School of Journalism e em outros lugares respeitáveis, como o exercício de puro charlatanismo. “Falar o que pensa” é adorável, não é? “Iluminar o clima” ele faz – não é? Fabuloso mesmo! Nosso adorável Príncipe é “franco” – não é tão corajoso! Cada frase é bem trabalhada para adoçar uma verdade amarga.

Agora vamos dar uma olhada em algumas dessas “tentativas de aliviar o clima”:

“Mulheres britânicas não sabem cozinhar”

“Todo mundo dizia que devemos ter mais lazer. Agora eles reclamam que estão desempregados ”(durante a recessão de 1981).

“Você é mulher, não é?” (no Quênia, depois de aceitar um presente de uma mulher local).

“Se vocês ficarem aqui por muito mais tempo, ficarão com os olhos arregalados” (para um grupo de estudantes britânicos durante uma visita real à China).

“Você não pode estar aqui há tanto tempo, você não tem barriga” (para um britânico que conheceu na Hungria).

“A maioria de vocês não descende de piratas?” (para um ilhéu rico das Ilhas Cayman).

“Como você mantém os nativos longe da bebida por tempo suficiente para passar no teste?” (para um instrutor de direção escocês).

“Parece que foi instalado por um indiano” (referindo-se a uma caixa de fusíveis antiquada em uma fábrica perto de Edimburgo).

“Vocês ainda jogam lanças?” (pergunta feita a um australiano aborígine durante uma visita).

“A sua família está muito presente esta noite” (depois de olhar para o crachá do empresário Atul Patel em uma recepção no palácio para índios britânicos).

“Como você mantém os nativos longe da bebida por tempo suficiente para passar no teste” (para um instrutor de direção escocês).

“Parece que foi instalado por um indiano” (referindo-se a uma caixa de fusíveis antiquada em uma fábrica perto de Edimburgo).

“Ainda jogando lanças?” (pergunta feita a um australiano aborígine durante uma visita).

Existem outras pérolas ainda mais notáveis que a BBC obviamente não listou. Mas isso deve bastar.

Racismo inestimável

Apesar da tentativa transparente da BBC de branquear, o racismo do príncipe Philip não tem preço, porque é muito natural para ele. Ele não está fingindo. Ele não está tentando ofender ninguém. Ele é ofensivo. Ele é assim – e a longa panóplia de seus preconceitos racistas, sexistas, elitistas, misóginos, privilegiados de classe e desequilibrados é um museu móvel do fanatismo europeu em exibição.

O duque de Edimburgo prestou ao mundo um serviço extraordinário por ser quem ele é, por encenar porções generosas de sua disposição fanática e está se aposentando feliz por ter catalogado todo ou pelo menos a maior parte de seu inventário inestimável para a posteridade ler e aprender.

Nosso amado duque de Edimburgo está felizmente velho. Ele viveu uma vida longa, rica e gratificante – e que viva o resto de seus dias de racismo com a dignidade e a postura que negou aos outros. Seu fanatismo xenofóbico é puro, seu senso de direito de classe não diluído, desimpedido, sem censura, livre de qualquer indício de inibições burguesas. Ele não pretende ser ofensivo. Ele simplesmente é. Ele é uma personificação ambulante de todas as camadas de lava do racismo europeu resumidas dentro de uma cabeça real.

Hoje, as pessoas da classe privilegiada aprenderam a camuflar seu racismo em códigos variados e eufemismo burguês complicado. O tipo de intolerância que o príncipe Philip exala e encena agora é considerado rude e vulgar, antiquado e antiquado, considerado classista e direcionado às camadas sociais mais baixas. A preciosa vantagem do príncipe Philip é que ele é um membro da realeza do coração da aristocracia britânica (e europeia). Ele conta a história como achar melhor.

O Príncipe é o repositório de todo o passado colonial e de todos os privilégios de classe do presente. Seus comentários racistas não devem ser pintados de branco ou camuflados. Eles precisam ser apropriadamente, precisamente e literalmente catalogados na Biblioteca Britânica e disponibilizados para futuras gerações de estudiosos e pensadores críticos, antropólogos do primeiro plano racista do imperialismo europeu para uma análise cuidadosa e detalhada. Eles são a insígnia de toda uma semiologia do racismo colonial em dicção aristocrática desenvolvida. Do racismo desenfreado agora dominante em Israel à perniciosa xenofobia evidente na América de Trump, está tudo lá: enraizado nesses palavrões desequilibrados no inglês britânico polido e aristocrático.

As expressões do racismo do Príncipe Philip não são “gafes”, como a BBC e outros veículos britânicos envergonhados por sua vulgaridade as classificam – embora se possa ver por que a BBC está se apressando em denominá-las como tal e varrê-las rapidamente para baixo do tapete proverbial. Para o mundo em geral, no entanto, no extremo receptor do colonialismo racista britânico e europeu, essas “gafes” são, na verdade, relíquias inestimáveis ​​de uma época agora profundamente camuflada sob eufemismos liberais e de aparência adorável. Como resultado, precisamos tratá-los como os arqueólogos tratam qualquer outra relíquia e fragmento que encontrem. Com base em tais vestígios, eles reconstroem épocas passadas e as verdades esquecidas que revelam e ocultam ao mesmo tempo.

A consciência culpada de um império decadente

O tipo de racismo que o príncipe Philip exala lembra o próprio espírito do imperialismo britânico e de outros imperialismos europeus em seu apogeu. Foi assim que os britânicos pensaram quando governaram a Índia, os franceses quando governaram a Argélia, os italianos quando conquistaram a Líbia, os belgas quando possuíam o Congo.

O Príncipe Philip é uma peça de museu – um sujeito vivo, respirando, móvel, alegre, bom, sorridente, bonito, charmoso bisavô que caminha alegremente, profere obscenidades enquanto sua comitiva tenta encobrir suas “indiscrições”. Mas essas não são “indiscrições” ou “gafes”. Ele significa o que ele diz e ele diz o que ele quer dizer. Ele é a memória viva de toda uma história de arrogância imperial agora sendo ativamente reprimida para oferecer um caráter mais liberal, tolerante e cosmopolita aos britânicos e, por extensão, “ao europeu”.

O príncipe Philip para a aristocracia europeia é o que Donald Trump representa para a democracia liberal americana: uma vergonha – os homens que exibem a verdade feia sob o verniz fino de sua etiqueta burguesa. O provincianismo racista do Príncipe Philip e de Donald Trump é irresistivelmente charmoso para seus admiradores e embaraçoso para seus detratores, mas identicamente revelador para o mundo em geral. Seu racismo é tão contrário à “tolerância” liberal recentemente fabricada que eles não sabem onde escondê-lo.

Pense na palavra, no conceito, na própria ideia de “tolerância” de que a democracia liberal tanto se orgulha. O que significa ser “tolerante?”

De ‘Carta sobre a Tolerância’ de John Locke (1689) ao ‘Tratado de Tolerância’ de Voltaire (1763), dois importantes filósofos europeus argumentaram contra o fanatismo e o fanatismo religioso ou político. Mas hoje a “tolerância” liberal equivale a uma convicção fanática sobre as próprias crenças mal disfarçadas sob o verniz de “tolerar”, ou seja, tolerar as crenças e práticas equivocadas de outras pessoas.

Ser tolerante hoje significa que estamos convencidos da superioridade de nossas próprias crenças, mas pela generosidade de nosso espírito e bondade de nosso coração e pela superioridade de nossa civilização que toleramos você, pois não temos escolha. Tanto a superioridade da crença quanto a virtude da tolerância são, portanto, atribuídas à cultura tolerante, em vez de negadas à barbárie assim tolerada.

Até que cheguemos a um ponto em que não “toleramos” uns aos outros, mas de fato vemos a verdade e a beleza do mundo da perspectiva um do outro, Príncipe Philip, abençoe sua alma esplendidamente racista, expõe a hipocrisia da “tolerância liberal” ”. Eu o amo por isso. Ele grita em voz alta o que outros racistas como ele aprenderam a esconder e camuflar o que pensam e projetam como uma atitude civilizada – enquanto carregam seus aviões de combate com bombas para jogarem em pessoas morenas e negras para enviá-los “de volta à Idade da Pedra ”.

Há uma bela barbárie de verdade no racismo do Príncipe Philip, expondo a horrível hipocrisia na própria fundação da “civilização ocidental”.