pública

Hélio Schwartsman: Vacinação pública ou privada?

Vacinações são por excelência uma estratégia coletiva de saúde

A vacinação só será capaz de pôr fim à epidemia se estiver no âmbito de um programa universal e público. E, se a circulação do vírus permanecer muito elevada, nem quem tem dinheiro para pagar por um imunizante estará livre de riscos. Vacinações são por excelência uma estratégia coletiva de saúde.

Isso dito, não vejo problemas em permitir que clínicas particulares importem e apliquem vacinas contra a Covid-19. A rigor, qualquer agente que consiga trazer para o Brasil biofármacos que de outra forma não chegariam aqui está contribuindo para o esforço comum.

É preciso, contudo, alguns cuidados. Seria decerto um despropósito se a iniciativa privada e o setor público entrassem numa disputa suicida pelos mesmos imunizantes. Mas há fórmulas menos drásticas que o veto às clínicas particulares para evitar esse tipo de situação.

Uma objeção que merece consideração é a de que a participação privada, ao criar oportunidades diferenciadas de acesso à vacina com base em renda, corrompe o caráter público da fila e o princípio do acesso igualitário. Não vejo como discordar, mas receio que o argumento seja forte demais. Parece-me complicado usá-lo para vacinas, mas deixá-lo de lado para todo o resto.

Nós, afinal, não adotamos a fila única para leitos de UTI em hospitais públicos e privados. E não é só na pandemia. Há décadas aceitamos que pacientes de câncer do SUS morram à espera de vagas para tratamento, enquanto elas sobram na rede particular. A aplicação consistente do princípio da igualdade de acesso implicaria uma espécie de veto à medicina privada, o que não ocorre em nenhum país democrático.

O fato de eu não ver com maus olhos a participação de clínicas particulares na vacinação não significa que ela seja solução. Só voltaremos a algum tipo de normalidade depois que a maioria dos brasileiros tiver recebido sua vacina —e apenas o poder público é capaz de fazer isso.


Pública: Afinal, o Brasil é o maior consumidor de agrotóxico do mundo?

Não existem dados recentes que comparam consumo em diferentes países; segundo pesquisa da FAO, Brasil foi campeão em gastos com agrotóxicos em 2013, mas o sétimo na comparação com a área plantada

O título atribuído ao Brasil de “maior consumidor de agrotóxicos do mundo” é motivo de discordância entre grupos favoráveis e contrários à flexibilização da legislação sobre os químicos. A reportagem reuniu e analisou os principais levantamentos sobre o assunto para entender se há como bater martelo sobre a posição brasileira no uso de agrotóxicos mundial.

O principal dado sobre uso de agrotóxicos é o da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO, na sigla em inglês) feito pela consultoria de mercado Phillips McDougall. O trabalho é utilizado como referência tanto pelas indústrias do setor agroquímico, quanto por especialistas da área e ambientalistas.

O relatório compara o valor investido em pesticidas nos 20 maiores mercados globais em 2013 e atribui três rankings sob diferentes perspectivas: em números absolutos, número por área cultivada e por volume de produção agrícola.

A pesquisa mostra que naquele ano o Brasil foi o país que mais gastou com agrotóxicos no mundo: 10 bilhões de dólares. Estados Unidos, China, Japão e França ficam, respectivamente, nas posições seguintes.

O segundo ranking divide os gastos totais pela área cultivada, ou seja, o quanto é investido em agrotóxico por hectare plantado. Na lista o Brasil fica em sétimo lugar, com 137 dólares por hectare. Atrás de Japão, Coreia do Sul, Alemanha, França, Itália e Reino Unido.

Afinal, o Brasil é o maior consumidor de agrotóxico do mundo?

O terceiro ranking mostra quanto cada país gasta com pesticidas tendo o tamanho da produção agrícola como referência. Para isso, são divididos os gastos absolutos pelas toneladas de alimento produzidos. O Brasil é o 13º da lista (9 dólares por tonelada), que mais uma vez é liderada por Japão e Coreia do Sul.

Afinal, o Brasil é o maior consumidor de agrotóxico do mundo?

O informe anual sobre a produção de commodities da FAO, divulgado em setembro do ano passado, mostrou que o Brasil é o terceiro maior exportador agrícola do mundo. Segundo o levantamento, no ano de 2016, o país era responsável por 5,7% da produção agrícola do planeta, abaixo apenas dos Estados Unidos, com 11%, e da União Europeia, com 41%.

Os dados brutos do levantamento podem ser conferidos em inglês no site da Consultoria Phillips Mcdougall.

Afinal, o Brasil é o maior consumidor de agrotóxico do mundo?

O professor de Agroecologia do Instituto de Estudos Socioambientais da Universidade Federal de Goiás (IESA/UFG) Adriano Rodrigues chama de “disputa de narrativa” a discussão em relação aos dados divulgados pela FAO.

“É justamente sobre a correlação da área produtiva coberta e do volume de agrotóxicos. Somos o país que mais utiliza veneno no mundo. Porém, efetivamente, quando você considera a quantidade de hectares de área plantada no Brasil, que é muito grande, essa correlação nos faz cair no ranking”, pontua.

Já a pesquisadora Larissa Mies Bombardi, professora da Faculdade de Geografia da Universidade de São Paulo, questiona o cálculo feito no Ranking da FAO sobre uso de pesticida por hectare. Para ela, o dado que coloca o Brasil na sétima posição não reflete a realidade. “Quando se divide o consumo de agrotóxico brasileiro pela área plantada você dilui esse volume gigantesco. São considerados área cultivada regiões como de pasto, que são terras improdutivas. Essa conta faz com que o Brasil fique lá embaixo no ranking”, explica.

Larissa é autora de um dos principais trabalhos brasileiros recentes sobre o nosso consumo de pesticidas é o Atlas Geográfico do Uso de Agrotóxicos no Brasil e Conexões com a União Europeia. O livro, publicado em 2017, traz levantamento de dados inédito sobre o consumo de agrotóxicos no Brasil (todos com fontes oficiais) e faz um paralelo com o que acontece na União Europeia.

A autora compara a média de aumento mundial no consumo de agrotóxico com o brasileira, tendo como base os números de vendas de pesticida. Entre 2000 e 2010, cresceu em 100% o uso de pesticidas no planeta, no mesmo período em que o aumento no Brasil chegou a quase 200%. Segundo a apuração, cerca de 20% de todo agrotóxico comercializado no mundo é consumido no Brasil. O atlas conta com 296 páginas e está disponibilizado na íntegra em e-book gratuitamente.

“Em termos de volume, desde 2008, Brasil e Estados Unidos revezam o primeiro lugar”, explica a professora, baseando-se em dados da própria indústria. A especialista diz que há dificuldades em fazer rankings dos países que mais utilizam pesticidas, pois as nações utilizam diferentes metodologias, o que dificulta comparações científicas. Sobre o levantamento da FAO, Larissa explica que as informações são passadas para a organização pelo próprios países. “Não existe um monitoramento internacional para fazer a classificação”, pontua.

Para o professor Universidade Federal de Goiás (IESA/UFG) Adriano Rodrigues, além de observar os números da FAO é necessários analisar os efeitos causados pelo contato com os agrotóxicos. “Mais importante do que apenas dizer se somos ou não os maiores consumidores, é mostrar as consequências desse uso tão grande. O Ministério da Saúde emite relatórios que quantificam o número de intoxicações no Brasil por exposição a agrotóxicos, mais de 80.000 notificações”, diz.

Os dados citados pelo pesquisador fazem parte última edição do Relatório Nacional de Vigilância em Saúde de Populações Expostas a Agrotóxicos, publicado em 2018, que traz um compilado de dados de 2007 a 2015. A publicação mostra que neste período foram notificados 84.206 casos de intoxicação no Brasil — em unidades de saúde pública e privada.

É possível estimar quantos litros de agrotóxico cada brasileiro bebe?

Outro dado comum no debate sobre agrotóxicos é a quantidade de defensivo que cada brasileiro consome. Em 2011, a Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida divulgou que cada brasileiro consumia cerca 5,2 litros de agrotóxico por ano. Para chegar ao número, a organização não-governamental dividiu o número de 1 bilhão de litros de pesticidas vendidos a cada ano pela população brasileira na época, de 192 milhões.

Quatro anos depois uma nova pesquisa da ONG, junto agora da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), mostrou que o brasileiro estava bebendo ainda mais agrotóxico. Eles utilizaram números divulgados pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) em 2015, referentes à quantidade de princípios ativos de agrotóxicos vendidos em 2013, e a receita anual da indústria agroquímica — cerca de 36,6 bilhões de reais.

Com uma média dos preços ponderada pela participação no mercado, a pesquisa chegou ao valor médio de 24,68 reais por litro de agrotóxico. Dividiu-se a receita anual da indústria (R$36,6 bilhões) pelo valor médio do litro de agrotóxico (24,68 reaus) — o que resultou em 1,48 bilhão de reais, número que foi dividido novamente pela população brasileira estimada pelo IBGE (201 milhões de pessoas). O resultado foi de 7,6 litros por pessoa.

Mas isso significa que o brasileiro literalmente bebe 7,36 litros de agrotóxico por ano? Não. Parte dos pesticidas são utilizados em plantações que não dão origem a alimento, como algodão, eucalipto ou soja. Além disso, boa parte da produção é exportada. E, segundo especialistas, é possível eliminar os agrotóxicos que ficam na parte de fora de alguns alimentos, embora seja impossível eliminar os que penetram dentro dos legumes.

Segundo a Abrasco, o objetivo do número é ter um indicador de aproximação do tema, com caráter pedagógico. “Ninguém literalmente bebe 7 litros de agrotóxico, porque se bebesse morreria. Trata-se de um número de aproximação, assim como o PIB, que não é demonizado. Nosso indicador tem objetivo pedagógico”, explica Fernando Carneiro, membro do Grupo Temático de Saúde e Ambiente da Abrasco.

“Evidentemente, quando calculamos o PIB per capita brasileiro e o comparamos com o de outros países, sabemos que a renda de todo brasileiro não é igual. Há grande desigualdade. Mas o PIB é um indicador de aproximação, assim como o nosso”, relata o especialista.

O que diz a indústria?

Multinacionais produtoras de agrotóxico negam que o Brasil mereça o título de maior consumidor de pesticidas do planeta. Em entrevista concedida em 2018 para a agência de notícias Deutsche Welle Brasil, a DW, o presidente da Bayer no Brasil, Theo van der Loo, explicou o motivo. “O uso dessas substâncias no Brasil é muito alto porque o Brasil é um grande produtor. Além de o país ser grande, tem duas safras por ano, às vezes até três. Na Europa e nos EUA é apenas uma safra por ano. Por hectare, de longe o Brasil não é o país que mais usa agroquímico”, disse o executivo paulista de 63 anos, no comando da empresa desde 2011.

A Syngenta tem posicionamento semelhante. Pelo Youtube, a empresa publica uma série de vídeos na qual afirma “desmistificar e esclarecer temas ligados à agricultura no Brasil”. Em um dos vídeos, a companhia diz que a afirmação do Brasil ser o maior consumidor de agrotóxico é verdadeira, “mas vem um pouco distorcida”. “No Brasil o clima quente e úmido possibilita a produção de até duas safras e meia por ano. O que é ótimo, mas contribui para o aumento do consumo de defensivos. Pois são mais safras anuais em um clima que favorece o desenvolvimento de pragas e doenças”, diz Gustavo Costa, engenheiro agrônomo da Syngenta, durante o vídeo.

A assessoria de imprensa da Syngenta diz que a imagem do Brasil como maior consumidor do mundo é “falsa”. “Essa informação é irrelevante se não compararmos os dados normalizados, ou seja, se não correlacionarmos a utilização de defensivos por área ou por produção”.

O uso de agrotóxicos continua subindo?

Desde 2013, nenhum outro estudo de tanta reputação foi realizado comparando os gastos mundiais de agrotóxico. Porém, desde então, dados nacionais mostram que a venda de agrotóxicos no Brasil cresceu quase todos os anos.

O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) publica desde 2000 boletins anuais de comercialização de agrotóxicos no Brasil. Em 2013, foram 495.700 toneladas de pesticidas vendidos, enquanto em 2017 o número chegou a 539.900 toneladas. O recorde foi registrado em 2016, com 541.800 toneladas vendidas.

Os valores de 2018 ainda não foram divulgados. Mas a expectativa é que os números tenham aumento e sigam crescendo neste ano.

Afinal, o Brasil é o maior consumidor de agrotóxico do mundo?

Isso porque o segmento de insumos foi o único do PIB do agronegócio brasileiro a apresentar alta no primeiro bimestre deste ano, mantendo a tendência observada em 2018. Segundo cálculo do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), da Esalq/USP, em parceria com a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), o setor de insumos teve aumento de 2,35% em relação ao mesmo período do ano passado. Fazem parte dele os setores de fertilizantes e corretivos de solo, agrotóxicos, máquinas agrícolas, rações e de medicamentos para animais.

Apenas a produção de agrotóxicos aumentou em 34,10% na comparação com o ano passado, segundo o estudo.

*Esta reportagem faz parte do projeto Por Trás do Alimento, uma parceria da Agência Pública e Repórter Brasil para investigar o uso de Agrotóxicos no Brasil. A cobertura completa está no site do projeto.

 


El País/Pública: Tribunais de contas, os permissivos fiscais expostos pela Lava Jato

Oito em dez dos responsáveis por fiscalizar no Brasil têm elo com políticos, diz Transparência Brasil. No último ano, pelo menos 13 conselheiros foram afastados por suspeitas de corrupção

Por Alice Maciel, da Agência Pública

“As minhas contas foram aprovadas pelo Tribunal de Contas do Estado.” Essa frase está na ponta da língua dos políticos investigados na Operação Lava Jato por fraudar licitações e superfaturar obras. E o argumento não é falso. Os ex-governadores Aécio Neves (PSDB), de Minas Gerais, Sérgio Cabral (MDB), do Rio de Janeiro, e Beto Richa (PSDB), do Paraná – investigados por suspeita de terem favorecido empresas em licitações –, tiveram as contas aprovadas nos tribunais de contas de seus estados, colocando em xeque a credibilidade dos órgãos de controle como mecanismo para coibir esquemas de corrupção.

O problema é que, entre os julgadores das suas movimentações financeiras, estavam aliados políticos. A ONG Transparência Brasil revelou, em estudo publicado no ano passado, que oito em cada dez conselheiros de contas do país exerceram mandatos eletivos ou altas funções em governos. A pesquisa, realizada em 2014 e atualizada em 2016, incluiu membros do Tribunal de Contas da União (TCU), dos 27 tribunais de contas dos estados e do Distrito Federal, e dos tribunais municipais. Existem quatro tribunais de contas do conjunto de municípios dos estados de Pará, Goiás, Ceará e Bahia, e Tribunais Municipais de contas nas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro.

O levantamento mostra que 23% dos 233 conselheiros e ministros respondem a processos ou já foram punidos na Justiça e até mesmo nos próprios tribunais de contas. Os supostos guardiões do dinheiro público são acusados de fraudar licitações, superfaturar obras e enriquecer ilicitamente. A mais comum acusação que recai sobre eles: improbidade administrativa.

Embora não tenha havido nenhuma investigação específica sobre elas, a Operação Lava Jato escancarou a participação dos integrantes dessas cortes estaduais, municipais e federal nos esquemas de desvio de dinheiro. No Rio de Janeiro, cinco conselheiros do TCE estão afastados, suspeitos de cobrar propina para fazer “vista grossa” de contratos do governo com empreiteiras.

Até fevereiro deste ano, o ex-ministro das cidades do governo de Dilma Rousseff Mário Negromonte (PP-BA) ocupava uma cadeira no conselho do Tribunal de Contas dos Municípios do Estado Bahia (TCM). Ele foi acusado de pedir propina de R$ 25 milhões para beneficiar empresas do setor de rastreamento de veículos quando era ministro. Indicado pelo ex-governador Jaques Wagner (PT-BA), em 2014, o conselheiro foi afastado depois que virou réu por corrupção passiva. O senador Agripino Maia (DEM-RN) teria influenciado a mudança de parecer do TCE do Rio Grande do Norte, favorecendo a OAS na construção do estádio Arena das Dunas para a Copa do Mundo de 2014, de acordo com denúncia da Procuradoria-Geral da República, acatada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). A operação atingiu também a cúpula do TCU. O filho do ministro Aroldo Cedraz (ex-deputado federal da Bahia pelo PFL, hoje DEM), o advogado Tiago Cedraz, passou a ser investigado em 2015 depois de o dono da empreiteira UTC Engenharia, Ricardo Pessoa, ter dito que o contratou para obter dados de difícil acesso na corte e para comprar uma decisão referente à usina nuclear Angra 3. Procurados pela reportagem da Pública, todos negam as acusações. (Leia o que dizem os citados)

Tudo dominado
Os tribunais de contas estaduais possuem sete conselheiros. Quatro são escolhidos pelo voto dos deputados; um, livremente pelo governador; e os outros dois, também pelo governador, mas têm de ser auditores e procuradores do Ministério Público de Contas.

Procurador do Ministério Público junto ao TCU e presidente da Associação Nacional do Ministério Público de Contas (Ampcon), Júlio Marcelo de Oliveira – conhecido por ser o autor da representação que levou à reprovação das contas de 2014 da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) por fraude fiscal –, alerta que, quanto mais tempo o mesmo grupo político permanece no poder de um estado, mais influência ele tem no tribunal de contas.

É o caso, por exemplo, de Minas Gerais. O PSDB permaneceu no governo por 12 anos, de janeiro de 2003 a janeiro de 2015. Todos os membros do órgão mineiro são ligados aos ex-governadores tucanos Aécio Neves e Antonio Anastasia: os ex-deputados Mauri Torres (PSDB), José Alves Viana (DEM), Wanderley Ávila (PSDB) e Sebastião Helvécio (PDT) foram indicados pela Assembleia Legislativa. Já os dois cargos técnicos, ocupados por Cláudio Terrão e Gilberto Pinto Dinis, foram nomeação de Anastasia.

O levantamento da ONG Transparência Brasil que avaliou a vida pregressa de todos os membros das cortes dos tribunais de contas na ativa em 2016 traz a informação de que, no grupo de conselheiros que jamais ocuparam cargo eletivo nem foram secretários de governo, 6% respondem a processo na Justiça. Já entre os conselheiros que são políticos profissionais, a porcentagem sobe para 27%.

Políticos que perderam o mandato, que estão achando difícil se reeleger, ou que querem aumentar o poder político da família, sendo substituídos na Assembleia pelo filho ou mulher, por exemplo, cobiçam as vagas de conselheiros de contas. Ali, recebem diversos benefícios, como foro privilegiado, cargo vitalício, salários altos – o salário-base é de R$ 30.471 –, além de gratificações e outras vantagens.

Juntos, os tribunais de contas custam mais de R$ 10 bilhões aos cofres públicos, de acordo com o procurador Júlio Marcelo de Oliveira. Os cargos de conselheiros são equivalentes aos dos desembargadores, e os ministros do TCU são equiparados pela Constituição Federal aos ministros do Supremo Tribunal de Justiça (STJ). Os membros dos órgãos de controle estão regidos pela Lei Orgânica da Magistratura. No entanto, ninguém os fiscaliza. “Os tribunais de contas não têm controle nenhum. Ninguém fiscaliza esses órgãos”, ressaltou Oliveira.

Em abril deste ano, vagou uma cadeira na corte de Minas, com a morte da conselheira Adriene Andrade, mulher do ex-senador Clésio Andrade (MDB). Ela preenchia a vaga de indicação livre do governador. Será a vez agora do atual gestor do estado, Fernando Pimentel (PT), indicar um nome. O líder do governo no Legislativo, deputado estadual Durval Ângelo, é o mais cotado a assumir o conselho, perpetuando a prática de aliados políticos fiscalizarem a prestação de contas de governadores.

Com interesses políticos predominando sobre interesses públicos, não faltam escândalos no currículo do TCE de Minas Gerais. Em 2002, o então presidente do órgão, José Ferraz, já falecido, foi apontado pelo Ministério Público do estado como um dos envolvidos em um incêndio criminoso que destruiu provas de investigações fiscais. Em 2008, três conselheiros, incluindo o presidente, foram indiciados por suspeita de envolvimento com uma organização criminosa acusada de ter desviado R$ 200 milhões em verbas do Fundo de Participação dos Municípios. O esquema foi revelado na Operação Pasárgada, que teve como alvo também membros da corte do Rio. Em 2015, o jornal Estado de Minas revelou que os conselheiros receberam, em dezembro de 2014, salários que ultrapassavam R$ 150 mil mensais.

O Ministério Público chegou a questionar na Justiça, em 2006, a indicação de Adriene Andrade ao conselho da corte de contas, com o argumento de que ela não possuía os requisitos para preencher a vaga. Ela era ré em processos sob a acusação de fraudar licitações e respondia a ações cíveis e inquéritos policiais por supostas irregularidades administrativas quando foi prefeita de Três Pontas, de 2001 a 2004. (Veja o que dizem os mencionados na reportagem)

Sociedade civil fica de fora do TCE
Para ser conselheiro do TCE de Minas, de acordo com artigo 78 da Constituição mineira, que foi inspirada na brasileira – na qual há os critérios destinados aos ministros do TCU –, é preciso ter “mais de trinta e cinco e menos de sessenta e cinco anos de idade; possuir idoneidade moral e reputação ilibada; notórios conhecimentos jurídicos, contábeis, econômicos, financeiros ou de administração pública; e ter mais de dez anos de exercício de função ou de efetiva atividade profissional que exijam os conhecimentos mencionados no inciso anterior”.

Doutor em contabilidade e finanças públicas, com mais de dez anos de serviço público, sendo quatro no TCE, o contador Alexandre Bossi encontrou na lei a possibilidade de fazer diferente: ocupar uma vaga de juiz de contas sendo um representante da sociedade civil. O desejo surgiu depois que ele trabalhou como auditor no tribunal mineiro. “Eu me sentia muito incomodado. Como auditor concursado, como técnico, você levanta várias coisas, faz inspeção na rua, visita municípios, faz um trabalho técnico de qualidade, com levantamento de irregularidades, de má gestão. Quando chega para votação política, no plenário, muitas vezes aquilo que a gente pesquisava, pegando o que a lei estipula em termos de punição, era deixado de lado. Achávamos, por exemplo, alguma irregularidade muito grande em uma estatal, aí, ao invés de aplicar multa, aplicava ressalva. Ou seja, não funcionava”, lembrou Bossi.

Em 2000, com a morte de um conselheiro indicado pela Assembleia, Bossi decidiu candidatar-se. O percurso, descobriu, não era tão simples como parecia. De acordo com o regimento interno do Legislativo mineiro, para entrar na disputa por uma vaga na corte de contas, é preciso ter o apoio de 20% dos deputados estaduais. “É feito para a sociedade não participar. É publicado no rodapé do Diário Oficial e, quando abre a vaga, só tem dez dias para fazer o registro”, avaliou.

Consultor do Legislativo desde 1993, ele tinha proximidade com os parlamentares e bateu na porta dos 77 gabinetes para conseguir os 16 votos necessários. Cada deputado pode apoiar até dois candidatos. “Os deputados falavam comigo: ‘Você tá doido? Já tenho compromisso com meu colega aqui, do partido tal’. Eu respondia: “Ô deputado, não diga isso. Diga que tem compromisso porque acredita que ele vai ser um bom fiscal, um bom auditor, mas não porque é seu amigo de partido”, lembrou. Bossi conseguiu o apoio e foi o primeiro representante da sociedade civil a disputar o cargo no país. Ele concorreu naquele ano com cinco deputados.

Na votação do plenário, Bossi precisaria de 39 votos, mas teve apenas um. Depois que experimentou a eleição pela primeira vez, o servidor público conseguiu entrar na disputa todas as outras cinco vezes em que vagaram cadeiras da Assembleia, em 2004, 2005, 2009, 2011 e 2012, sempre concorrendo com deputados. Ele até mesmo tentou ser o indicado do Aécio, em 2006. “Eu tentei falar com o governador, dizer pra ele para indicar uma pessoa com perfil técnico, mas o Aécio nem me recebeu. Foi o Anastasia, na época secretário de Estado, quem me atendeu”, contou. Naquele ano, Adriene Andrade foi a escolhida.

“Não vou me candidatar mais”, garantiu Bossi. “Eu fiquei de 2000 a 2012 mexendo com isso. É muito cansativo, eu paro a minha vida, mas isso não significa que eu desisti da luta”, explicou. Ele disse desconhecer casos de nomeações que não sejam políticas. “A sociedade civil organizada jamais conseguiu emplacar um nome. No caso da minha candidatura, eu tive a iniciativa, mas contei com o apoio de entidades como o Conselho Regional de Contabilidade e do Sindicato dos Servidores do Tribunal de Contas”. Para ele, é muito importante colocar os tribunais de contas, “órgãos desconhecidos da sociedade e tão importantes no combate à corrupção”, sempre na pauta de discussão. “Os diversos casos de desvio de dinheiro público que, com frequência, aparecem nas primeiras páginas dos jornais são prova de que os tribunais de contas não andam exercendo satisfatoriamente o seu papel fiscalizador”.

Aprovada pelo TCE-MG, cidade administrativa cai na mira da Lava Jato
Na mira da Operação Lava Jato, a Cidade Administrativa da capital mineira passou pelo crivo do Tribunal de Contas de Minas em 2007. As suspeitas reveladas nas investigações da Polícia Federal (PF) são de que o então governador Aécio Neves tenha recebido da Odebrecht R$ 5,2 milhões em propina para que a empresa faturasse a licitação. Os recursos teriam ido para sua campanha, de acordo com a delação do ex-executivo da empreiteira Benedicto Júnior. Sempre que questionado sobre as acusações, Aécio Neves diz que “o edital de licitação foi apresentado previamente ao Ministério Público Estadual e ao Tribunal de Contas do Estado”.

Inaugurada em 4 de março de 2010, dia em que o avô de Aécio, o ex-presidente Tancredo Neves, completaria 100 anos, a Cidade Administrativa é a obra mais cara da gestão do tucano. Ela custou R$ 1,2 bilhão aos cofres públicos. Apesar do alto investimento, salta aos olhos de quem frequenta o local a infraestrutura já decadente: pisos com rachaduras surgidas apenas três meses depois da inauguração , janelas proibidas de serem abertas – ficam lacradas – porque os vidros caem lá do alto e cheiro forte de esgoto nos jardins. Em 2015, um vendaval arrancou parte do teto do prédio.

Em fevereiro, Fernando Pimentel decidiu desativar o Palácio Tiradentes, um dos prédios da Cidade Administrativa, onde o governador despachava. De acordo com Pimentel, a medida trará uma economia de 40% nos gastos com insumos diversos, manutenção rotineira e com o consumo de água e energia. O PSDB rebateu a decisão do petista e garantiu que a centralização da estrutura governamental naquele espaço gerou uma economia de R$ 590 milhões aos cofres públicos entre 2011 e 2015.

Passados 17 anos do lançamento do edital da Cidade Administrativa, o TCE de Minas instaurou, em abril de 2017, um procedimento para investigar se houve fraude no contrato. A medida foi tomada depois que a Procuradoria-Geral da República abriu inquérito para averiguar a existência de crimes envolvendo Aécio Neves na obra. A iniciativa para a investigação partiu do Ministério Público de Contas.

A Pública entrou em contato com as assessorias de imprensa do senador Aécio Neves e do Tribunal de Contas de Minas, que não deram retorno.

Ministério Público
Além de atuarem como auxiliares dos tribunais de contas no controle e na fiscalização da execução do orçamento e dos atos de gestão dos recursos públicos, os membros do Ministério Público de Contas podem apresentar uma denúncia à corte de contas para que irregularidades sejam apuradas e os gestores, responsabilizados. Os pareceres dos procuradores de contas, servidores concursados com carreira de bacharel em direito, são opinativos. Ou seja, eles não têm o poder de vetar as decisões dos conselheiros, que podem acatar ou não suas recomendações, tendo apenas como ferramenta o recurso para que as decisões sejam revistas.

Nunca na história do TCE de Minas, por exemplo, houve reprovação das contas de um governador. Mesmo quando os procuradores de contas alertaram para problemas graves. Em 2013, o Ministério Público de Contas advertiu que o estado não cumpriu o mínimo constitucional para a educação, de 25% da receita, tendo aplicado apenas 23,91%. Isso não impediu, no entanto, que os conselheiros aprovassem as contas do ex-governador Antonio Anastasia, argumentando que o gestor havia cumprido os índices constitucionais.

13 conselheiros afastados em um ano
O descumprimento da aplicação mínima constitucional de 15% da receita para a saúde foi um dos principais argumentos dos conselheiros do TCE do Rio para a rejeição do balanço financeiro de 2016 do governador Luiz Fernando Pezão (MDB). A última vez que o TCE havia emitido parecer contrário às contas do estado fora em 2003. A decisão contrária a Pezão se deu em maio do ano passado. “O colegiado que deliberou pela rejeição das contas em 2016 foi integrado por conselheiros suplentes, tendo em vista o afastamento dos titulares por ordem judicial (IPL 1133/DF – Operação Quinto do Ouro). Note-se que em anos anteriores (2007-2015) o número de inconsistências foi até maior. Ainda assim as contas eram sistematicamente aprovadas com parecer favorável do TCE, numa evidente demonstração de que o controle era meramente formal e de que existia uma estratégia de proteção mútua entre os órgãos”, alertou o Ministério Público Federal (MPF) no documento que justifica a Operação Cadeia Velha, que revelou um esquema de corrupção na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro.

Apesar da recomendação do TCE, a Assembleia do Rio aprovou, em setembro de 2017, a movimentação financeira do governador. A população e os servidores do estado, que convivem com salários atrasados, foram proibidos de participar da votação. À época, o Legislativo fluminense justificou que a decisão foi tomada pela presidência, por recomendação da segurança da Casa, “amparada em informações de que poderia haver atos violentos nos protestos”. Dois meses depois da reunião, Pezão indicou para o conselho da corte Edson Albertassi (MDB), então presidente da Comissão de Orçamento, Finanças, Fiscalização Financeira e Controle da Alerj, que também tinha dado aval à sua prestação de contas.

“Os fatos, no entanto, demonstraram que a argumentação de Albertassi não passou de mera retórica para justificar a proteção ao governo cujas contas, se tivessem sido rejeitadas, poderiam levar à responsabilização pessoal do governador”, observaram os procuradores no documento. Ex-líder do governo na Assembleia, Albertassi foi preso na Operação Cadeia Velha, antes de assumir a vaga no TCE. Ainda de acordo com o MPF, “desde 2007 e durante toda a administração de Sérgio Cabral, houve razões de sobra para a reprovação das contas do governo, contudo, como o processo de fiscalização sempre esteve viciado, em momento algum o ex-governador esteve sob o risco de se ver submetido ao processo político de impedimento”.

Há suspeitas de que durante o governo de Cabral cinco dos sete conselheiros do tribunal – Aloysio Guedes, Domingos Brazão, Marco Antônio de Alencar, José Gomes Graciosa e José Maurício Nolasco – participaram de um esquema de cobrança de propina para fechar os olhos para os contratos entre empreiteiras e o governo. A Operação Quinto do Ouro, da PF, que revelou o esquema, teve como base a delação premiada do ex-presidente do TCE Jonas Lopes. Os cinco conselheiros foram presos temporariamente em 29 de março de 2017 e soltos em 7 de abril, mas seguem afastados de suas funções desde então. O TCE do Rio afirmou, por meio de nota, que não irá comentar sobre o assunto. A reportagem não conseguiu contato com a defesa dos conselheiros afastados.

No Mato Grosso também foram afastados cinco conselheiros. Eles são suspeitos de ter recebido R$ 53 milhões em propinas para não prejudicar o andamento das obras da Copa no estado. O esquema foi revelado em delação do ex-governador Silval Barbosa (MDB) durante a Operação Malebolge, da PF. Os conselheiros Valter Albano, Antônio Joaquim, José Carlos Novelli, Waldir Júlio Teis e Sérgio Ricardo de Almeida foram afastados em setembro do ano passado pelo STF. A Malebolge é uma sequência da Operação Ararath, que desde 2013 investiga um suposto esquema de lavagem de dinheiro público e crimes financeiros no Mato Grosso.

À reportagem, o TCE do Mato Grosso informou, por meio da assessoria de imprensa, que houve uma investigação interna em outubro de 2016. “A investigação foi conduzida por dois conselheiros substitutos e um procurador do Ministério Público de Contas, com conclusão em março de 2017”, observou o órgão. “Não chegou a nenhuma evidência de crime, mas mesmo assim a comissão responsável entendeu por bem encaminhar cópias dos autos para os Ministérios Públicos Federal e Estadual”, diz a nota.

Leia o que dizem os conselheiros

No Espírito Santo, o conselheiro José Antônio Almeida Pimentel foi acusado de receber dinheiro em troca de facilitação e favorecimento para a aprovação de processos perante a corte de contas do Estado. As investigações revelaram também que ele teria oferecido expertise e apoio técnico no direcionamento de processos licitatórios em diversos municípios capixabas. José Antônio é alvo da Operação Moeda de Troca, deflagrada em 2010, que apura fraudes em licitações de municípios no Espírito Santo. Ele saiu do cargo, por decisão do STJ, em junho do ano passado.

A defesa argumentou ao STF que a denúncia contra José Antônio Pimentel seria inepta, principalmente por ausência de justa causa relativa aos crimes de lavagem de dinheiro e organização criminosa. Os fatos imputados ao denunciado, de acordo com a defesa, não estariam especificados.

O conselheiro do TCE do Amapá José Júlio de Miranda Coelho foi igualmente afastado de suas funções em março de 2018 pelo STJ. Ele é acusado de ter cometido 62 vezes o crime de lavagem de dinheiro com uso de terceiros.

José Júlio tinha sido afastado em 2015 e voltou ao cargo em dezembro de 2017 por decisão do STF. Diante do novo processo de afastamento, a defesa de Coelho alegou que, diante da reintegração promovida pela Suprema Corte, não havia fato recente que justificasse o novo pedido de afastamento feito pelo Ministério Público Federal. Mas ele foi afastado mesmo assim.

Bom relacionamento e parentesco
A relação de cumplicidade entre o órgão de controle e seu controlado é um dos principais motivos da corrupção nos tribunais de contas, de acordo com o procurador Júlio Marcelo de Oliveira. “O político que ocupa a cadeira de conselheiro terá, na maioria dos casos, uma visão mais simpática ao seu grupo político. O desenho institucional atual é vulnerável à captura política”, acrescentou.

“É com muita tranquilidade e serenidade que eu afirmo que este governo do estado do Rio de Janeiro, com suas finanças públicas, seus controles públicos, faz uma nova era do estado. Nós que cuidamos das contas do estado sentimos claramente a mudança radical que houve na Secretaria de Fazenda”, afirmou o então presidente do TCE do Rio de Janeiro José Maurício Nolasco durante a abertura do IV Encontro do Conselho Nacional dos Órgãos de Controle Interno, que ocorreu em 2009. Anos depois, ele seria investigado na Operação Quinto do Ouro, já mencionada anteriormente.

“Da parte do Tribunal de Contas de Goiás e do nosso governo, o que tem ocorrido invariavelmente é uma relação harmônica, porque há, acima de tudo, uma identidade de propósitos”, afirmou o então governador de Goiás Marconi Perillo (PSDB) durante a inauguração de uma nova sede do TCE, em agosto de 2016. Perillo é acusado de ter formado uma aliança com o dono da construtora Delta, Fernando Cavendish, e com o bicheiro Carlinhos Cachoeira para receber vantagens indevidas em troca de contratos com o governo goiano que causaram prejuízos aos cofres públicos. Em nota enviada à imprensa quando denunciado ao STJ, em março de 2017, ele negou as acusações. Assim que deixou a vaga para disputar a reeleição, em abril, o governador que o substituiu, José Eliton (PSDB), indicou o cunhado de seu antecessor, Sérgio Cardoso, ao conselho do Tribunal de Contas dos Municípios do Estado de Goiás. (Veja a íntegra da nota do TCE-GO)

O levantamento da ONG Transparência Brasil mostrou também que 32% dos conselheiros têm relações de parentesco com políticos. “As relações são diversas e demonstram, em alguns casos, laços com figuras influentes na política local há diversas gerações. Em um caso, o poder remonta ao período imperial: o clã político cearense Paula Pessoa, ao qual pertence o conselheiro Luís Alexandre Albuquerque Figueiredo de Paula Pessoa, do TCE do Ceará, conta com oito gerações de políticos influentes. O conselheiro, além de ter de pai, irmão e sobrinho na política subnacional, tem como antepassado um senador do Império”, observou a ONG no estudo. (Veja o que dizem os mencionados na reportagem).

O movimento #MudaTC, criado pela entidade presidida pelo procurador junto ao TCU, Júlio Marcelo de Oliveira, a Ampcon, a Confederação Nacional das Carreiras Típicas de Estado (Conacate) e a Federação Nacional das Entidades dos Servidores dos Tribunais de Contas do Brasil (Fenastc), depois do escândalo no TCE do Rio, apoia a aprovação da PEC 329/2013, que está pronta para ir a plenário.

Entre os principais pontos está a mudança na composição dos tribunais de contas, proibindo indicações políticas. O projeto prevê também que os conselheiros sejam fiscalizados pelo Conselho Nacional de Justiça, assim como todos os juízes, desembargadores e ministros do STF e do STJ.

Já a Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon) defende que seja criado um Conselho Nacional dos Tribunais de Contas para fiscalizar as cortes de contas. Em relação à composição dos tribunais, o presidente da entidade, Fábio Nogueira, explica que a associação não é contra a indicação de políticos à vaga. “Nós não temos nenhum preconceito contra aqueles que vêm do Parlamento. O que nós precisamos é ter cautela nas indicações”, defendeu.

A proposta de mudanças da Atricon está na PEC 22/2017. Ela foi formulada e sugerida pela entidade e apresentada pelo senador Cássio Cunha (PSDB-PB). O projeto assegura a maior parte dos assentos aos membros das carreiras técnicas – cinco no TCU e quatro nos outros tribunais. E prevê o fim das indicações livres do chefe do Executivo e a redução das indicações do Legislativo, fixando critérios como quarentena de três anos afastado de mandato eletivo, não ter sido condenado judicialmente nem ter tido contas reprovadas.

Além disso, a PEC determina que os conselheiros deverão ter graduação e experiências nas áreas jurídica, contábil, econômica e financeira ou de administração pública. Atualmente, apesar de a Constituição exigir “notórios conhecimentos jurídicos, contábeis, econômicos, financeiros ou de administração pública”, há conselheiros de diversas áreas e sem ensino superior nas cadeiras de tribunais de contas estaduais. De acordo com estudo do perfil desses tribunais publicado em 2014 pelo contador Alexandre Bossi, que também é professor do Centro Universitário UNA em Belo Horizonte, esse grupo chega a 23% dos conselheiros. A pesquisa dele abrangeu o TCU, os 26 tribunais estaduais e o do Distrito Federal.

Atualização em 15/06: Depois da publicação, a assessoria de imprensa do Tribunal de Contas do Estado de Goiás entrou em contato com a reportagem da Pública afirmando que o governador do estado, José Eliton, indicou Sérgio Cardoso, cunhado do ex-governador Marconi Perillo, para o Tribunal de Contas dos Municípios e não para o Tribunal de Contas do Estado, conforme a Pública havia informado anteriormente. Sérgio Cardoso não analisará as contas referentes ao mandato do ex-governador. A informação foi corrigida.