Organizações internacionais

‘Witzel poderá ser primeiro governador do Rio a sofrer impeachment’, analisa Paulo Baía

Em artigo publicado na 20ª edição da revista Política Democrática Online, sociólogo diz que governador também implantou política de extermínio do ‘tiro na cabecinha’

Cleomar Almeida, assessor de comunicação da FAP

O sociólogo e cientista político Paulo Baía, professor da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), diz que o comportamento inefável do governador Wilson Witzel (PSC) contaminou todos os níveis da administração pública do Estado. “O ex-juiz federal apostou na grave crise de violência, expondo o abismo da segregação que os moradores das favelas vivenciam, ao implantar uma política de extermínio do ‘tiro na cabecinha’”, diz, em artigo de sua autoria publicado na 20ª edição da revista Política Democrática Online. “O ex-juiz federal poderá ser o primeiro governador do Rio a sofrer impeachment”, afirma, em outro trecho.

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A publicação é produzida e editada pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira), sediada em Brasília. Todos os conteúdos podem ser acessados, gratuitamente, no site da entidade. De acordo com o autor do artigo, Witzel incentivou ações ilícitas de agentes públicos das forças policiais e, para completar, acabou com a corregedoria externa e a ouvidoria das polícias. “Uma de suas medidas centrais foi desfazer a Secretaria de Segurança Pública, recriando as fracassadas Secretarias de PM e de PC, que funcionaram de 1983 até 1994”, lamenta o sociólogo.

No artigo publicado na revista Política Democrática Online, Baía lembra que as demais secretarias foram assumidas, com raras exceções, por pessoas sem lastro administrativo, escolar e acadêmico, evidenciando a ausência de pessoas com expertise em governança pública. “Desde que tomou posse, em janeiro de 2019, o governador passou a ser protagonista de uma ‘ópera bufa’, com atitudes e falas capazes de demonstrar o quanto ter poder era seu maior objetivo, com atitudes espalhafatosas e comportamento de líder que pretendia fazer história com bravatas e mortes”, critica.

A crise sanitária da Covid-19, de acordo com o cientista político, escancarou o descalabro das violências policiais e milicianas contra jovens pretos, pobres, favelados e moradores das periferias. “De tal forma que o ministro Edson Fachin, em ato judicial inédito, concedeu liminar proibindo as ações policiais em favelas, sem justificativa prévia informada ao MPE e ao Poder Judiciário”, escreve.

Apesar de o ex-juiz querer ser o representante de uma renovação política, com as vistas postas no Planalto, conforme analisa o artigo, Witzel cometeu erros crassos por não fiscalizar medidas fundamentais, como a contratação milionária com empresas sem tradição e de baixíssimo capital social.

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‘Decisão de organização internacional tem, em geral, caráter recomendatório’

Em artigo publicado na revista Política Democrática Online, Gilberto Saboia cita casos de adoção de regulamentos para prevenir ocorrência e propagação internacional de doenças

Cleomar Almeida, assessor de comunicação da FAP

Diplomata aposentado e membro da Comissão de Direito Internacional da ONU (Organização das Nações Unidas), Gilberto Saboia diz que as decisões e resoluções de uma organização internacional têm em geral caráter recomendatório, não estritamente obrigatório, visando a persuadir os Estados a adotarem certo tipo de comportamento. O artigo dele foi publicado na 20ª edição da revista Política Democrática Online, produzida e editada pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira), sediada em Brasília.

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Em sua análise, Saboia observa que as organizações internacionais podem, também, de acordo com seu instrumento constitutivo, adotar decisões com caráter obrigatório. No caso da OMS (organização Mundial da Saúde), o artigo 21 autoriza a Assembleia a adotar regulamentos para prevenir a ocorrência e a propagação internacional de doenças, e dispor sobre vários outros aspectos relativos à saúde pública.

Pelo artigo 22, conforme explica o diplomata aposentado, estas regras, que constituem o Regulamento Sanitário Internacional, entram em vigor para todos os Estados membros após um prazo determinado, exceto para os países que notificarem sua não aceitação dentro deste prazo. “Tornam-se regras internas dos Estados”, enfatiza.

Ele lembra que a Constituição da OMS, por exemplo, contém um preâmbulo que enumera os princípios básicos acordados entre os membros sobre cooperação internacional em matéria de saúde. Seguem-se 82 artigos que estipulam concretamente os objetivos, funções e a forma de operação dos diferentes órgãos.

O diplomata também ressalta que o caráter normativo dos atos das organizações internacionais e as obrigações deles decorrentes para com os Estados membros têm sua fonte primária no acordo constitutivo, tratado internacional ao qual o Estado deu seu consentimento, e cujas normas devem ser cumpridas de boa-fé. “Seu descumprimento gera consequências”, destaca o autor. “Assim, a falta de pagamento das quotas anuais devidas para financiar o orçamento pode ocasionar a perda do direito de voto”, continua.

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Caos perto da Europa

A situação na Síria e Líbia torna mais convulsivas as fronteiras da UE

Em apenas 48 horas, entre segunda-feira e terça-feira passados, as patrulhas de resgate que operam no Mediterrâneo resgataram 10.655 migrantes e refugiados. Viajavam em barcos precários e superlotados. Ninguém que não esteja desesperado se joga ao mar em condições aterrorizantes. Quando os sobreviventes abandonavam os navios, o chão estava coberto com os cadáveres dos asfixiados, tal era a superlotação imposta pelas máfias. Estes números não só representam o drama de uma crise humana sem precedentes; também mostram a dimensão e a gravidade da situação de caos e destruição que ocorre às portas da Europa.

A UE aprovou nesta quinta-feira enviar à Bulgária o primeiro contingente da nova polícia de fronteira da Europa, mas pouco servirá este instrumento, se nada for feito sobre as causas do êxodo. A quebra da trégua na Síria continua alimentando uma diáspora que atingiu seu pico em 2015, mas que está longe de terminar. Na ausência de expectativas de poder voltar para seu país, muitas famílias que passaram anos vivendo pessimamente em campos de refugiados turcos ou libaneses fazem o caminho para a Europa, mesmo sem garantias de chegar ou de serem bem recebidos. Enquanto isso, na Líbia se concentram dezenas de milhares de migrantes procedentes de vários países africanos. Alguns fogem de conflitos, outros da miséria. Após viagens longas e perigosas, ficam presos sem possibilidade de voltar. Na situação perigosa de desgoverno que vive a Líbia, muitos são vítimas de abusos, trabalho forçado e estupro. Correr o risco de uma travessia incerta é para eles o mal menor.

Até agora este ano já chegaram à Europa através do Mediterrâneo mais de 300.000 migrantes — 166.000 através da Grécia, 130.000 pela Itália — e se afogaram ou desapareceram mais de 3.500. Desde que há seis meses foi assinado o acordo com a Turquia, o fluxo através do Egeu foi reduzido, mas agora é a Itália que recebe a maior pressão. Devemos celebrar a resposta muito positiva por parte de seu Governo, que não reduziu os esforços e mantém a política de acolhida. O mesmo deve ser dito da Grécia, apesar da falta de solidariedade do resto da UE, que se mostra incapaz de cumprir sequer com seus próprios acordos. Agora faz exatamente um ano que foi aprovado o plano que devia distribuir 160.000 refugiados entre os diferentes membros da UE. Na metade do prazo previsto, apenas 5.651 foram realocados, só 3,5%. O resto continua aí. A má gestão deste problema leva a Europa cada vez mais para posições que violam não só seus princípios fundadores, mas também suas leis. A pressão sobre suas fronteiras não vai diminuir por mais que olhemos para o outro lado.


Fonte: brasil.elpais.com


Civilizar e crescer

Foram poucas as conclusões práticas do encontro do G20

Depois do surgimento da crise, confiou-se, no G20, que a gestão desta fosse não só mais participativa, com um protagonismo destacado das principais economias emergentes, mas que atentassem para os problemas apenas intuídos pelo pouco representativo G7, das principais economias avançadas. Na reunião que acaba de terminar em Hangzhou as conclusões operacionais foram poucas. O enunciado mais comercial foi o de “civilizar o capitalismo”.

Sob tal frase de efeito, pretende-se colocar freio ao descontentamento social derivado de uma gestão da crise que se traduziu em uma redução do potencial de crescimento e uma menor capacidade de reduzir a desigualdade na distribuição da renda e da riqueza que a própria crise acentuou. Mas ninguém no G20 colocou sobre a mesa decisões corretas. Nem sequer a diretora-gerente do FMI, que tornou o diagnóstico um pouco mais palpável ao destacar que “o crescimento está sendo pequeno demais, durante muito tempo, para muito poucos”. E mesmo quando nos documentos internos do FMI as políticas de expansão da demanda e reativação do comércio internacional se sobressaem sobre os ajustes orçamentários, a concretização continua encontrando objeções em algumas economias centrais da zona do euro. Que tenha aparecido no comunicado final uma referência à necessidade de controlar mais eficazmente a taxação das grandes multinacionais, sugerida pelo presidente da Comissão Europeia, não pode furtar-se ao freio que a zona do euro continua representando à normalização da economia mundial.

A condição necessária para que a dinâmica de globalização encontre menos rejeição social não exige tanto a dramatização de perseguições fiscais, mas decidir de forma imediata políticas que garantam a restauração do potencial de crescimento perdido, e a elevação do desemprego estrutural em não poucas economias.


Fonte: El País


'Brexit': O mundo deve agradecer ao Reino Unido

Britânicos demonstraram que a política não é, ou não deveria ser, um jogo frívolo.

“Nunca tantos deveram tanto a tão poucos”, disse Churchill sobre o sacrifício dos aviadores da RAF na Segunda Guerra Mundial. Podemos dizer o mesmo hoje do sacrifício que o Reino Unido fez pela humanidade.

O consenso quase total no mundo é que, ao aprovar sua saída da União Europeia no referendo de quinta-feira, os britânicos (ou, melhor dizendo, os ingleses) cometeram um erro incompreensível, demencial e de proporções épicas. Após conhecer o resultado, os rostos pálidos, os tons de voz entrecortados e inclusive as palavras assombrosamente sóbrias – não triunfais – dos dirigentes conservadores da campanha pelo Brexit deram a impressão de que eles acordaram de manhã, após uma noite de álcool e excessos, se perguntando: “Meu deus! O que fizemos?”.

Isso é ruim para o Reino Unido, mas bom para todos os outros. Os britânicos se encontram repentinamente numa crise econômica e política sem precedentes, tão gratuita como desnecessária, e pela qual só podem culpar a si mesmos. Consequentemente, a democracia parlamentar mais antiga deu ao mundo uma lição de incalculável valor, uma lição sobre como não fazer as coisas num país que aspira à prudência e à prosperidade.

O que o Reino Unido nos demonstrou é que a política não é, ou não deveria ser, um jogo frívolo; que os líderes demagogos, que para alimentar sua vaidade e sua ânsia de poder estimulam a noção de que a sabedoria das massas é a virtude máxima da democracia, devem ser ouvidos com cautela; que as decisões de Estado são todas debatíveis, mas exigem que quem as toma tenha um mínimo de responsabilidade cívica e um mínimo conhecimento de como funciona o Estado; que quando os políticos que governam ou aspiram a governar opinam sobre a economia, por exemplo, devem saber do que falam, ou pelo menos saber mais que o grosso da população.

Em resumo, aqueles que têm em mãos o poder de influir nas vidas de milhões e milhões de pessoas precisam ser especialistas. E foram justamente os especialistas que tiveram seus argumentos rechaçados pela maioria britânica, que optou por seguir as sedutoras melodias dos flautistas do Brexit, conduzindo-os, como o do Hamelin, às catacumbas do inferno.

O 'Brexit' é o sintoma mais alarmante até agora do fenômeno global “antielite”

O momento mais revelador da campanha do Brexit foi quando uma das suas principais figuras, Michael Gove, declarou: “O povo deste país está farto dos especialistas”. Gove, que foi ministro da Educação durante quatro anos no governo de David Cameron, estava respondendo às advertências do Banco da Inglaterra, de líderes sindicais, dos principais empresários britânicos, de Barack Obama e de praticamente toda a gente informada e pensante do mundo, que se expressou contra a saída britânica da UE. Ouçam seus corações e seus julgamentos, dizia Gove aos eleitores, gente que majoritariamente, como as pessoas do mundo todo, se interessa muito mais por futebol, ou por telenovelas, ou por concursos de talento, ou pelas histórias das vidas íntimas dos famosos ou, obviamente, por suas famílias e seus trabalhos do que pela política, um esporte minoritário aonde quer que se vá. Isso, que tanto custa aos ideólogos profissionais aceitar, não é nem bom nem ruim. É o que é, e o que tem para hoje.

E é o motivo pelo qual o primeiro-ministro Cameron pecou de uma irresponsabilidade histórica e de uma idiotice monumental ao delegar a decisão sobre esse tema tão complexo, entendido por uma ínfima fração da população. Se tivesse sido fiel ao princípio da democracia representativa, que os próprios britânicos patentearam no século XVIII, teria deixado a decisão nas mãos de deputados eleitos, relativamente especialistas, entre os quais mais de três quartos eram favoráveis à permanência, e que agora se encontram na surrealista circunstância de precisar obedecer ao veredicto das massas e solicitar formalmente o desligamento a Bruxelas.

Muitos comentaristas da elite e que escrevem para a elite dizem que o Brexit é o sintoma mais alarmante até agora de um fenômeno global contemporâneo “antielite”. Isso virou um chavão, repetido (por um colunista de elite do The New York Times na sexta-feira, por exemplo) à exaustão. Assim é explicada dia após dia, nos Estados Unidos, na Europa e em todas as partes, a ascensão de Donald Trump, primo-irmão dos brexiters. Se tanta gente diz isso, algo de verdade deve ter, supõe-se, mas existe uma explicação mais simples para esses fenômenos, uma à qual as elites opinativas talvez resistam, por temor de serem tachadas de elitistas: que em questões políticas e econômicas nacionais as pessoas são facilmente manipuláveis por quem tem a cínica astúcia de apelar aos seus preconceitos e sentimentos mais viscerais ou tribais, como, no caso dos ingleses, o desdém e a desconfiança ancestrais pelos desumanizados “estrangeiros”, valores incutidos desde a infância.

Com sorte, será mais difícil que os norte-americanos sucumbam a Trump ou os franceses a Le Pen

Por que os londrinos e os escoceses, diferenciando-se de quase todo o resto do Reino Unido, escutaram os especialistas, ignoraram os populistas e votaram esmagadoramente a favor da permanência na Europa? Fácil. Porque os londrinos habitam a cidade mais cosmopolita do mundo, convivem e trabalham com estrangeiros todos os dias, e veem não só que estes contribuem muito para a cidade nos aspectos econômico e social como também que são tão reconhecivelmente humanos quanto eles próprios. No caso dos escoceses, que receberam enormes quantidades de imigrantes em sua terra nos últimos anos e que, quando são pobres, são tão pobres quanto os ingleses, há uma dupla explicação. Uma, que não foram doutrinados com sentimentos xenófobos desde a tenra idade, muito pelo contrário; a outra, que o sistema educacional estatal na Escócia é, como o bem sabe o ex-ministro Michael Gove, muito superior ao inglês. Os escoceses possuem em maior abundância que os ingleses as faculdades mentais necessárias para saber distinguir entre os pregadores farsantes e os sinceros, entre as políticas que lhes convêm e as que não.

A saudável lição que o resto do mundo deve tirar do disparate em que caíram os ingleses, portanto, é estar mais alerta do que nunca ao populismo barato daqueles que pretendem chegar ao poder apelando aos seus preconceitos e ressentimentos. Com sorte, o resultado do referendo britânico e as consequências desastrosas que ele acarretará tornarão mais difícil que o eleitorado norte-americano sucumba ao flautista Trump, ou o francês a Marine Le Pen, do mesmo modo que o apocalíptico fracasso do também disparatado projeto chavista na Venezuela com sorte servirá de advertência a outros países da América Latina.

Se o mundo não aprender com estas lições, talvez chegue o dia em que teremos que rever a ideia de que a democracia é o sistema político menos ruim já inventado pela humanidade. Meu pai, que combateu na RAF de 1939 a 1945, dizia com frequência algo de que tenho me lembrado muito nos últimos dias: que o melhor sistema de governo é a autocracia moderada pelo assassinato. Sempre achei que era uma loucura, e que ele dizia isso de brincadeira. Já não tenho mais tanta certeza.


Fonte: brasil.elpais.com