Ministério da Justiça

O Estado de S. Paulo: Moro aceita superministério da Justiça de Bolsonaro

Magistrado divulgou uma nota detalhando os termos da proposta que aceitou

Por Fausto Macedo, Marcio Dolzan e Vinicius Neder

O juiz federal Sérgio Moro, da Operação Lava Jato, aceitou nesta quinta-feira, 1, o convite do presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) para comandar o superministério da Justiça. O magistrado vai divulgar uma nota detalhando os termos da proposta que aceitou.

Moro deixou o condomínio onde mora o presidente eleito, no Rio, às 10h45, após cerca de 1h30 de reunião. Na saída, o magistrado chegou a deixar o carro onde estava para falar com a imprensa, mas, diante do tumulto no local, não fez nenhuma declaração.

O juiz chegou às 9h à residência de Bolsonaro. O presidente eleito convidou Moro para assumir um superministério da Justiça, ampliado e com órgãos de combate à corrupção, que estão atualmente em outras pastas, como a Polícia Federal e o Coaf, que estão envolvidas nessa operação.

Ao desembarcar no aeroporto Santos Dumont, pela manhã, o magistrado não falou com a imprensa e, antes de chegar à casa do presidente eleito, fez uma pequena parada em um hotel que vem sendo usado como uma espécie de QG para quem visita Bolsonaro. No Santos Dumont, Moro desembarcou diretamente na pista de pouso do aeroporto, de onde partiu em um carro da Polícia Federal.

Durante o voo, Moro falou com a Rede Globo, que o acompanhou na viagem. Segundo o G1, o magistrado disse que a motivação de seu encontro com Bolsonaro se dá em razão de o País precisar de uma agenda anticorrupção e anticrime organizado.

“Se houver a possibilidade de uma implementação dessa agenda, convergência de ideias, como isso ser feito, então há uma possibilidade. Mas como disse, é tudo muito prematuro”, disse Moro à reportagem da Globo. Durante o voo, ele chegou a dizer que ainda não há nada definido. “Ainda vai haver a conversa”, emendou.

Leia abaixo a nota divulgada por Moro após o encontro:

"Fui convidado pelo Sr. Presidente eleito para ser nomeado Ministro da Justiça e da Segurança Pública na próxima gestão. Apos reunião pessoal na qual foram discutidas políticas para a pasta, aceitei o honrado convite. Fiz com certo pesar pois terei que abandonar 22 anos de magistratura. No entanto, a perspectiva de implementar uma forte agenda anticorrupção e anticrime organizado, com respeito a Constituição, a lei e aos direitos, levaram-me a tomar esta decisão. Na prática, significa consolidar os avanços contra o crime e a corrupção dos últimos anos e afastar riscos de retrocessos por um bem maior. A Operação Lava Jato seguira em Curitiba com os valorosos juízes locais. De todo modo, para evitar controvérsias desnecessárias, devo desde logo afastar-me de novas audiências. Na próxima semana, concederei entrevista coletiva com maiores detalhes".


Folha de S. Paulo: Prisão de delatores terá consequências graves, diz ministro da Justiça

O ministro da Justiça, Torquato Jardim, 67, se diz "surpreso" com o que considera falta de preparo dos procuradores que fizeram a delação da JBS. Para ele, a prisão de Joesley Batista e Ricardo Saud trará "consequências graves" para o caso.

Camila Mattoso, da Folha de S. Paulo 

Torquato assumiu o cargo em maio logo após as revelações feitas pelos delatores da empresa, o que levantou suspeitas de que poderia tentar influenciar a Lava Jato. Três meses depois, classifica a afirmação como "ridícula".

Em entrevista à Folha, ele confirma a mudança no comando da Polícia Federal, mas evita adiantar nomes.

Diz ainda ser "chocante" a descoberta dos R$ 51 milhões em dinheiro vivo em um "bunker" ligado a Geddel Vieira Lima, ex-ministro de Lula e Temer.

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Folha - Como o sr. avalia a prisão de Joesley Batista e Ricardo Saud?
Torquato Jardim - Terá consequências graves para a credibilidade do processo. Razoável presumir que depoimentos e provas fiquem sob suspeição de manipulaç?o pelos agora presos. O MPF por certo será ainda mais cuidadoso e minucioso ao examinar os fatos e os documentos pertinentes

O senhor considera o caso da JBS como uma vergonha?
Não é uma vergonha. A delação é um instituto novo no Brasil. O que me surpreende é que haja vazamento. Isso quebra a dignidade do instituto. Outra coisa que não foi aprendida é a técnica de interrogatório. Basta ver cinema, que um interrogador experiente sabe ler os olhos, as narinas, a movimentação de boca, as carótidas, a respiração, tudo é indicativo de estado de espírito.
Não é possível, não seria razoável admitir, que esses dois delatores e outros mais tenham enganado tão bem tantos, tanto tempo. Agora foram pegos no tropeço. O triste, além de todas as consequências jurídicas para quem foi envolvido, é que a delação esteja sendo colocada em prática por pessoas que não se preparam para essa tarefa.

Isso joga suspeita sobre o Ministério Público?
Suspeita é uma palavra muito forte. Prefiro crer que houve só pouco preparo profissional de quem atuou.

Defende a anulação dos benefícios dos delatores?
Não me cabe opinar.

O senhor acha correto o empresário Joesley Batista ter imunidade?
Faz parte do acordo, não é? Se vai continuar, é o Ministério Público que vai decidir.

'Enquanto houver bambu, lá vai flecha', frase dita pelo procurador-geral Rodrigo Janot. O senhor acha que tem mais bambu ou mais flecha?
Não sou índio, nunca usei flecha. Tem uma ali decorando o gabinete. Essa aqui machuca, as outras eu não sei.

O sr. acha que há clima para uma segunda denúncia contra o presidente Michel Temer?
Isso é de competência exclusiva do procurador-geral.

Um aliado de Temer, Rodrigo Rocha Loures, é filmado com uma mala de dinheiro (R$ 500 mil, da JBS). É possível não vincular isso ao presidente?
Não tem nada a ver. Nem a denúncia consegue fazer a relação. É mera ilação. Eu diria até indigna com o presidente.

Qual é a data de anúncio do novo diretor da Polícia Federal?
Não há.

Quem são os três nomes que sr. disse ter para substituir Leandro Daiello?
Não são.

E qual o papel do general Sérgio Etcghoyen, ministro do gabinete de Segurança Institucional, nessa escolha?
É conselheiro do presidente, pode opinar em todos os assuntos que o presidente pedir.

A Polícia Federal cometeu erros na Lava Jato?
Não que eu saiba.

A troca no comando tem a ver com algum erro cometido?
Não.

Tem a ver com o quê?
Com a transição natural da vida. O delegado [Leandro] Daiello está há sete anos no posto, trabalho excepcional. Ele próprio já disse que quer deixar o posto, que quer tirar férias e se aposentar.

O governo procura um nome alinhado para que as operações diminuam?
Não existe essa hipótese.

É possível desenvolver projetos considerando que o senhor é o terceiro a sentar nesta cadeira na Justiça em um ano?
É razoável que haja ceticismo, mas não quer dizer que não possamos definir uma política nacional de segurança pública, como política de Estado, e, portanto, que transcenda governos.

Três anos e meio de Lava Jato e a PF encontra R$ 51 milhões em espécie ligados ao ex-ministro Geddel Vieira Lima. Não choca?
Claro que sim. Pelo tempo, que não foi possível esgotar a investigação, e terá todo o apoio do governo e do Ministério da Justiça, nunca houve e nem haverá intenção de inibir o trabalho da PF.
E que estejam acontecendo casos ainda dessa dimensão, que é chocante. Choca a cidadania, choca qualquer um.

O momento é de pânico no Palácio do Planalto com a prisão de Geddel?
Não. Nenhuma relação de causa e efeito.

Há relatos de pressão do governo nesse caso. O senhor foi chamado para tentar intervir na operação?
Especulação.

O senhor esteve com o presidente Temer um dia após a apreensão, não foi para falar desse assunto?
Não comigo.

O procurador Rodrigo Janot disse que o seu ministério está atrapalhando acordos de cooperação com outros países.
A nota do Ministério da Justiça é extremamente didática e qualquer pessoa com mínimo de boa alma e boa compreensão tê-la-á entendido muito bem. Quem assina acordos internacionais é o Estado brasileiro. Ninguém está atravancando nada.

O presidente foi gravado duas vezes em um ano (por Joesley e pelo ex-ministro Marcelo Calero). Falta segurança institucional ao governo?
Não sei.

O que o senhor acha dos encontros de Temer fora da agenda?
Não existe encontro fora da agenda. O presidente é presidente sete dias por semana, 24 horas por dia.

É defensável um presidente encontrar um investigado tarde da noite em sua casa?
Não há problema algum.

O senhor chegou como quem iria salvar o presidente do processo no TSE e quem poderia frear a Lava Jato. Acha que conseguiu mudar essa imagem?
Essa sempre foi uma assertiva completamente ridícula e eu nunca me preocupei com ela.

Raquel Dodge, nova procuradora-geral, indicada por Temer, terá o mesmo trabalho do senhor, de tentar mudar a imagem em relação a freio à Lava Jato?
Isso eu não sei. Pergunte à doutora Raquel. O Ministério Público continuará sendo Ministério Público. O que varia é o método operacional. Quem poderá falar é a doutora Raquel.

O senhor não foi à pré-estreia do filme da Lava Jato. Algum motivo?
Não. Eu gosto de ficar em casa à noite.

A direção do filme diz que é uma trilogia. Com tantos fatos, o senhor acha que precisaria de quantos?
Depende. A história da família Gambino [do filme O Poderoso Chefão] foi contada em três episódio do Coppola. Todos necessários. Depende de quem escreve e de quem conta.

As decisões do STF de libertar investigados não são uma forma de frear a Lava Jato?
Não. "Bad people make a good law". São cinco palavras mágicas do direito constitucional libertário. Gente ruim faz bom direito. O bandido ajuda a construir o direito constitucional.

É possível acabar com a corrupção?
Depende. A corrupção começa a acabar quando um pai ou a mãe tirar da cama o filho preguiçoso para ir à escola e mandá-lo para fazer prova, em vez de deixar o filhinho dormindo e pedir atestado médico para justificar a falta.

O senhor tem viajado muito. Pretende ser candidato a alguma coisa?
Eu seria candidato à presidência do Atlético Mineiro se em Minas estivesse meu título eleitoral.

O governo fez promessas a deputados para barrar a primeira denúncia contra Temer. Qual é a conta que o presidente deixou para o senhor pagar?
Nada nos envolve e não sei do que se trata.