Mariliz Pereira Jorge

Mariliz Pereira Jorge: 'Para que essa ansiedade?', pergunta Pazuello, o tranquilão

Ministro da Saúde questionou angústia pela chegada da vacina contra Covid-19

O ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, que não entende xongas de saúde, não deve fazer ideia de que quatro em cada dez brasileiros tem experimentado algum nível de ansiedade por causa da pandemia. Entre 16 países, somos o que mais sofre, segundo pesquisa da Ipsos.

Talvez esses dados iluminem o titular da pasta que, ao ser questionado sobre detalhes do “plano de imunização” do governo, minimizou a complexidade de proteger 200 milhões de pessoas. “Para que essa ansiedade, essa angústia?” Segundo Pazuello, temos o maior programa de imunização do mundo e somos os maiores fabricantes de vacina da América Latina. Ok, conte agora uma novidade. Que dia começa a vacinação?

Ele diz que pode começar em dezembro. Muda para janeiro. Março. A última notícia é de que será em fevereiro. Depois da divulgação do “plano” ficou claro que o único projeto que o governo tem é de extermínio. Não tem plano. O brasileiro que não entrou em negação, se não morrer de Covid, sucumbe ao pânico. Mas o ministro tranquilão não entende por que estamos ansiosos.

Temos mais de 180 mil mortes pela Covid-19. O Brasil está perto de voltar a enterrar mil pessoas todos os dias. Os hospitais estão lotados. Os casos estão explodindo em cidades sem UTI. Para que angústia?

E ainda tem Jair Bolsonaro. Ele tem dado declarações com sinal trocado. No lançamento do “plano” falou sobre a importância de “união para buscar a solução de algo que nos aflige há meses”, um dia depois de ter conspirado sobre a segurança da vacina e de ter dito que não vai tomá-la. O resultado é o aumento da desconfiança na população. Mas pra que ficar ansioso?

Milhares de pessoas passarão as festas de dezembro, assim como já ficaram o ano todo, longe dos seus. Perdemos familiares, amigos, emprego, esperança, mas Pazuello não sabe por que estamos ansiosos por uma bendita vacina.


Mariliz Pereira Jorge: Bolsonaro, um genocida

Ninguém mais deve ter dúvida de que Bolsonaro é um maldito genocida

Quanto mais demorarmos a vacinar a população contra a Covid-19, mais gente morrerá. Se antes a responsabilidade de Jair Bolsonaro era subjetiva, no momento em que vários países começam a imunizar seus cidadãos, não resta dúvida: a incompetência, o desdém e a demora do governo, na figura do presidente, serão culpados por cada morte que poderia ser evitada com uma vacina.

Para alguém que tinha tanta pressa de que o país voltasse "à normalidade", um dirigente que se preocupava tanto com a economia, é curioso que Bolsonaro não tenha sido um dos primeiros líderes a garantir a compra de vacina. Senão por causa da vida das pessoas, que fosse pela saúde da economia.

Bem, seria curioso, se fosse alguém razoável e não um idiota, que resolve inaugurar um brechó no Palácio do Planalto quando o mundo vive um acontecimento histórico. Enquanto Jair e a dona "por que Queiroz depositou R$ 89 mil na conta de Michelle?" usavam a estrutura palaciana para seu momento "memorável", eu chorava ao ver gente sendo vacinada no Reino Unido.

Bolsonaro completa dois anos na Presidência e continua sem a menor ideia do que faz lá. E quem se ferra de verde e amarelo somos nós. Sua campanha não teve proposta, além de baboseiras, como acabar com a ideologia de gênero, com o comunismo, com o PT, liberar armas, "rasgar e jogar na latrina" o Estatuto da Criança e do Adolescente.

Ele não sabia o que fazer quando a pandemia chegou a não ser negar sua existência e gravidade, assim como não consegue organizar a claque de incompetentes do seu governo. Nesta quarta (9), o Ministério da Saúde anunciou que o plano de vacinação deve ser apresentado na semana que vem. Alguém me explica, como se eu fosse uma criança de cinco anos: não era para estar pronto? Se alguém tinha alguma dúvida de que Bolsonaro é um maldito genocida, não precisa mais ter.

*Jornalista e roteirista de TV.


Mariliz Pereira Jorge: É muito difícil ser bolsonarista

Pense no susto se bolsonaristas descobrirem que o establishment são eles

Inegáveis a devoção, a energia e a habilidade que os apoiadores do governo demonstram. A capacidade infinita de enxergar seus ídolos com filtros coloridos não é estranha a nenhum militante, mas a vida do bolsonarista é um malabarismo permanente.

A começar pela exaltação da cloroquina. Todos virados em direção ao Palácio da Alvorada, a meca dos "patriotas", para louvar um remédio que inúmeras pesquisas apontam como ineficaz contra o coronavírus.

Rejeitar a ciência, porém, é nada perto do contorcionismo para apoiar Madonna, que, de feminista de carteirinha e defensora do aborto legal, e portanto inimiga, passou a correligionária após defender o uso do medicamento.

E o que dizer dessa massa que passou a eleição falando em combate à corrupção e à velha política, fim de privilégios e bandido morto e hoje aplaude Bolsonaro de mãos dadas com o centrão, exalta o ex-presidiário Roberto Jefferson, defende o foro privilegiado de Flávio Bolsonaro e a prisão domiciliar de Queiroz?

Um dia o bolsonarista pede a volta da ditadura, desconjura militar frouxo, diz que a mídia mente. No outro, reclama que vive sob uma ditadura, clama pelo direito de ir e vir e de desrespeitar medidas sanitárias de combate à pandemia, defende fake news e liberdade de expressão (a deles).

Eles ainda encontram tempo para, entre uma novela e outra da Globo, seguir os perfis da "extrema imprensa" só para poder cravar seus slogans, #globolixo, #folhalixo, #acabouamamata. Menos, claro, a mamata oficial. O interino da Saúde nomeou uma amiga, sem experiência, para chefiar o ministério em Pernambuco. E daí? O que pega mesmo os bolsonaristas é a propaganda de Dia dos Pais com o transexual Thammy Gretchen.

Sem falar nas reclamações rotineiras contra o establishment, que partem inclusive de integrantes do governo e de filhos do presidente. O contorcionismo é admirável. Pense no susto se descobrirem que o establishment são eles.


Mariliz Pereira Jorge: Mamadeira de piroca reloaded

O presidente distorce as questões sobre a pedofilia pela própria ignorância ou em clara oposição ao que diz a ciência

Jair Bolsonaro sabe que o melhor remédio para uma crise de popularidade é mamadeira de piroca. Nada como requentar uma mentira que envolve sexo e servir ao eleitorado, como fez nesta terça (14) ao afirmar que a esquerda quer “descriminalizar a pedofilia, transformando-a em uma mera doença ou opção sexual”.

O resultado foi imediato. Seguidores sedentos por um biscoito para alimentar sua fome contra inimigos políticos responderam com engajamento muito maior do que o presidente tem em suas redes sociais quando faz de conta que governa. Nem os tuítes em que mente sobre o uso da cloroquina rendem tanto.

A postagem é resposta às cobranças da enfraquecida ala ideológica do governo que tem sinalizado a perda de apoio no ambiente virtual, considerado estratégico por eles, e agravada pelo comportamento domesticado do presidente.

Para distrair a seita, Bolsonaro requentou um assunto de 2018, quando acusou Fernando Haddad (PT) de defender a “descriminalização da pedofilia”, um dos absurdos do combo de delírios bolsonarista, que ainda tinha “kit gay”.

O presidente, não sabemos, distorce as questões sobre a pedofilia pela própria ignorância ou em clara oposição ao que diz a ciência. O fato é que seu discurso desce como uma cerveja gelada pela goela da massa de analfabetos funcionais que o apoia.

Segundo a OMS, pedofilia é um transtorno mental. Não é crime previsto no Código Penal, mas o comportamento do pedófilo pode ser criminalizado com base no Estatuto da Criança e do Adolescente.

Portanto, estupro de vulnerável, produção de vídeo ou fotos de sexo ou nudez que envolvam menores são crimes. Bolsonaro quer fazer crer que, ao se apontar a distinção entre as duas coisas, exista a intenção de “normalizar” a prática da pedofilia. E seus seguidores aplaudem. Bem, o que esperar de quem acredita em mamadeira de piroca?


Mariliz Pereira Jorge: Quem acredita em Bolsonaro?

Ficou ainda mais difícil acreditar em qualquer coisa que ele fale ou faça

Não desejo a morte a Jair Bolsonaro, mas se ele tivesse um comportamento apenas crível seria um bom começo para minimizar maus pensamentos. Ficou ainda mais difícil acreditar em qualquer coisa que ele fale ou faça depois do teatro armado para anunciar seu teste para a Covid-19.

Impossível levar a sério um presidente que se comporta como garoto propaganda das facas Ginsu. Não é má vontade, é rotina. Levantamento da agência de checagem Aos Fatos mostra que Bolsonaro mentiu ou distorceu declarações 1.355 vezes desde que assumiu o cargo.

Em janeiro, o Datafolha mostrava que os entrevistados tinham mais confiança em figuras como Lula e Sergio Moro do que no presidente, que já ostentava baixa credibilidade entre 55% das pessoas. E nem vivíamos os horrores da pandemia, na qual desfiou um rosário de inverdades e de irresponsabilidades. Quem ainda acredita em Bolsonaro, além dos 15% de seguidores de sua seita?

Credibilidade é dos mais importantes capitais políticos, sem ela não há liderança. O presidente se revelou um mentiroso compulsivo e colhe o descrédito por suas atitudes. Conseguiu a façanha de levantar dúvidas até sobre seus exames de saúde. Os primeiros, apresentados com pseudônimos, depois da intervenção da Justiça. A reação de desconfiança se repete agora, quando revela, todo pimpão e com o descaso de sempre, o resultado positivo que leva seu nome.

Em seguida, nos brinda com o Show da Cloroquina, a promessa de que todos serão curados e mais desinformação sobre grupos de risco e gravidade da doença. Enquanto mente e nos entretém, o 01, Flávio, presta finalmente depoimento sobre as rachadinhas.

Nesta quarta (8), Jair tuitou que nenhum país do mundo fez como o Brasil e que preservamos vidas e empregos sem propagar pânico. Quem não está em pânico com esse mitômano no Planalto não entendeu nada.


Mariliz Pereira Jorge: Máscara é coisa de comunista?

Essa liberdade de escolha pelo uso vale para aborto e drogas também?

Há uma profusão de cenas de conservadores americanos metidos em confusão ao se recusarem a usar máscara em locais públicos. Numa reunião em que cidadãos de Palm Beach puderam se manifestar, houve quem dissesse que o direito era o mesmo de não vestir calcinha. Um médico foi "ameaçado" de prisão por crimes contra a humanidade. Não faltaram os argumentos de que é parte de um plano comunista e de que o adereço era contra as leis de Deus. Tudo isso por causa de uma máscara.

Essa mesma politização da Covid-19 está prestes a ter capítulos patéticos no Brasil agora que grandes cidades, como o Rio, entram em nova fase de flexibilização. Já tivemos alguns casos, mas deve piorar.

Posso apostar uma paçoquita que, a exemplo do que acontece nos Estados Unidos, em que grupos que apoiam Trump se recusam a usar máscara, bolsonaristas devem se guiar pela mesma cartilha negacionista em aceno a Jair Bolsonaro, que só adere à proteção raramente e muito contrariado.

A influência que ele tem sobre seus apoiadores não pode ser minimizada, haja vista o estudo que mostra menor taxa de isolamento e maior número de mortes nas cidades em que teve maior votação.

Mas agora é tudo junto e misturado, e a irresponsabilidade de uns pode significar a morte injusta daqueles que seguem as recomendações dos órgãos competentes. Evoluímos (sic) do pobre debate que dividia esquerda e direita em relação ao apoio ao isolamento, ao uso da cloroquina e à volta ao trabalho para um ainda mais raso.

Pela lógica bolsonarista raiz, o uso da máscara deve ser coisa de esquerdista comunista e será motivo de bate-boca e agressões entre os que têm consciência coletiva e aqueles que, em defesa de uma pauta política, apelarão aos direitos individuais numa questão que diz respeito a todos.

Essa liberdade de escolha vale para aborto e drogas também?


Mariliz Pereira Jorge: Rouba, mas é pouco

O apoio ao clã presidencial pode evoluir para 'rouba, não faz nada, mas e daí?'

Impressiona, ainda que não surpreenda, o contorcionismo dos apoiadores do governo para empacotar a corrupção como um mal menor diante da prisão de Fabrício Queiroz e da possibilidade de o primeiro-filho, o senador Flávio Bolsonaro, ter o mesmo destino.

Corrupção, confirmamos mais uma vez, nunca foi a razão para eleger um sujeito ignóbil como Jair. Fosse isso, bolsonaristas não defenderiam agora rachadinha como prática aceitável, “porque todo mundo faz”, “porque nem se compara ao que o PT ou Sérgio Cabral roubaram”. Mesmo para o padrão tupiniquim de lambe-bota de político, essa praga que nos assola, a mítica frase “rouba, mas faz” sofre aqui um duplo twist carpado.

Sabemos que a moral de parte da população é flexível. Bate palmas para tipos como Paulo Maluf, porque construiu pontes e avenidas, embora tenha enchido o bolso com milhões. Defende que partido que tira pobre da miséria não merece crítica nenhuma, apenas redenção, apesar dos comprovados pesares.

De Adhemar de Barros ao PT, o “rouba, mas faz” sempre foi exaltado. Coisa nova na vida política é a defesa apaixonada do “rouba, mas é pouco”. Não é pouco e faz falta na educação, na saúde, na segurança.

Bolsonaro tem razão quando diz que os brasileiros deveriam ser estudados. Muitos fecham o nariz e pulam no esgoto do pragmatismo político. Apoiadores do presidente têm demonstrado que podem nadar de braçada nessa imundice ao aceitar rachadinha, contratação de funcionário fantasma, inclusive pelo então deputado Jair, uso de verba pública para financiar atos privados e sites ideológicos, além dos superfaturamentos tão disseminados nos gabinetes parlamentares.

Com um ano e meio de governo, resultados desastrosos em todas as áreas, já sabemos que o apoio ao clã presidencial é irrestrito e pode evoluir até mesmo para o “rouba, não faz nada, mas e daí?”.


Mariliz Pereira Jorge: Vitória de Bolsonaro

Não teremos a quem confiar nossas vidas quando tudo o que conta é capital político

Prefeitos e governadores se rendem à chantagem feita por Jair Bolsonaro e começam a flexibilizar o que nunca funcionou de fato no Brasil, o isolamento para conter a crise da Covid-19. Um a um, eles passam a jogar a toalha, vencidos pelo cansaço e pela ambição. O Brasil é uma república cheia de bananas. Vaidosas e irresponsáveis.

A história da pandemia por aqui teria sido diferente em termos de números e de desgaste emocional se as medidas tivessem sido alinhadas e a população não fosse levada a uma divisão por conta do negacionismo do presidente. A flexibilização da quarentena, nesse momento precoce pela avaliação dos especialistas, é uma vitória de Bolsonaro.

De olho nas perdas políticas, prefeitos e governadores tentam amenizar a rejeição daqueles que embarcaram no discurso do presidente, que terceirizou as responsabilidades do governo federal diante da pandemia, já de olho em 2022. Não há um único dia que Bolsonaro não jogue a culpa do colapso da economia e dos mortos na conta de Dorias e Witzels. “Uma mentira contada mil vezes torna-se uma verdade”, não é mesmo?

Mas com a retomada de muitas atividades e a tão reivindicada volta ao “normal”, esses mesmos governantes, que até agora peitaram a postura genocida de Bolsonaro, deixam à deriva toda uma parte da população que apoia as medidas de isolamento e entende que ainda é muito cedo para qualquer reabertura.

Não sobrará um adulto na sala e não teremos a quem confiar nossas vidas quando tudo o que conta é capital político e a eleição que se avizinha. O Brasil deve ser o único país no mundo que bate recordes nos números da Covid-19, em que a curva de contaminações e de mortes ainda aponta para cima, e que seus governantes acham que já pode trabalhar, abrir igrejas, surfar e ir ao shopping. É cada um por si. Eu continuo em casa.

*Mariliz Pereira Jorge é jornalista e roteirista de TV.


Mariliz Pereira Jorge: Bolsovírus

Presidente infectou o país com raiva e desesperança

Estamos todos doentes. Não bastasse o drama que vivemos com a crise da Covid-19, temos que lidar com o rastro de destruição deixado por um germe patogênico incapacitante: o bolsovírus, como foi apelidado.

Jair Bolsonaro conseguiu a façanha de contaminar a população com seu discurso inescrupuloso, seu apreço pela ignorância e seu desprezo pela humanidade. Deixou um país inteiro infectado pela raiva e pela desesperança.

Estamos todos mentalmente desequilibrados. Quem não está cego e não perdeu toda a capacidade de discernimento e a decência sente os efeitos dessa infecção devastadora provocada pelo bolsovírus de uma forma também bastante severa: as pessoas estão tristes, abatidas, exaustas com o festival diário de asneiras, de grosserias e de ataques à democracia.

Assistindo ao noticiário, que dedica boa parte do seu tempo a descrever a crise institucional que não abandona o país, tenho a falsa e perigosa sensação de que não temos outro problema ainda maior, o coronavírus. A gravidade da pandemia acaba diluída diante dos mandos e desmandos desse brutamontes que enlameia a cadeira da Presidência.

Somos atropelados pelo tiroteio entre o presidente e o ex-ministro da Justiça, as brigas com os governadores, os lampejos golpistas, que se tornaram corriqueiros. E, no final do dia, trombamos com o número de mortes pela Covid-19, a baixa adesão ao isolamento, o recorde de perdas entre os profissionais da saúde, os hospitais em colapso.

Todas as nossas atenções deveriam estar focadas em salvar vidas, mas passamos boa parte do tempo tentando nos livrar da insanidade a que Bolsonaro submete o país.

Quem ainda não está louco, condição "sine qua non" para não apoiar este governo tresloucado e incompetente, está sendo enlouquecido à medida que faz oposição a ele. Ou acabamos com o bolsovírus ou não sei o que será de nós.


Mariliz Pereira Jorge: O que eu quero, Bolsonaro?

Obrigada por ter perguntado, presidente

Jair Bolsonaro insiste na narrativa de que não tem nada a ver com as mortes causadas pela Covid-19. Vai que cola. "E daí? Lamento. Quer que eu faça o quê?", ele pergunta. Obrigada por ter perguntado, presidente. Aqui vão algumas sugestões do que fazer, visto que o senhor parece meio sem ideia.

Uma medida urgente é que você pare de brincar de roleta russa com a vida do brasileiro. O Imperial College diz que o Brasil tem a maior taxa de contágio do coranavírus do mundo e prevê mais de 5.000 mortes, na próxima semana. Diferentemente do que você disse, se insistir em abrir o comércio, quem corre risco é o povo. O único risco a que você se expõe é ser tachado de genocida. Mas e daí?

O que eu quero, Bolsonaro? Que você peça desculpas por ter dito que é gripezinha, histeria, fantasia. Que o vírus está indo embora, que está superdimensionado, que brasileiro pula em esgoto e não pega nada, que todo mundo vai morrer um dia.

O que mais eu quero? Que você pare de tentar interferir nas investigações da Polícia Federal para proteger seus filhos, que mostre os resultados de todos os seus exames para Covid-19, que trate jornalistas sem parecer um cavalo, que não cumprimente as pessoas com a mão cheia de perdigotos, que desista de estimular e de participar de atos golpistas. Entenda, você até "manda", mas não é dono do país.

Por fim, deixe que os governadores façam o que você não tem feito, tentar preservar vidas. Já dizia qualquer avó: se não for para ajudar, não atrapalhe. Aproveite e demita o incompetente do Weintraub e também o Ricardo Salles, antes que não sobre uma árvore em pé na Amazônia. Antes que eu me esqueça, conta pra gente, cadê o Queiroz?

Se nada disso for possível, tenho uma sugestão muito mais simples. Renuncie. E, por favor, leve junto para o inferno os zeros à esquerda dos seus filhos. Se Deus realmente existe, é para lá que vocês vão.


Mariliz Pereira Jorge: Reféns da extrema direita

Como permitimos que a extrema-direita sequestrasse nossos maiores símbolos nacionais?

Ao ver as imagens de um homem vestido de verde e amarelo agredir um casal com camisetas vermelhas, nas manifestações de domingo (19), pensei: como permitimos que a extrema direita sequestrasse nossos maiores símbolos nacionais?

Professor de relações internacionais da FGV, Oliver Stuenkel, escreveu no ano passado sobre essa tendência ao redor do mundo. "Os radicais têm se apropriado de bandeiras nacionais para poder chamar vozes discordantes de inimigos da pátria". Não por acaso, é assim que Jair Bolsonaro, parlamentares aliados e apoiadores se referem a qualquer pessoa que faça oposição ao presidente.

Stuenkel dá como exemplo o leão e a cruz, imagens nacionais na Finlândia, hoje associados a grupos xenófobos. A tentativa de Trump em se apropriar da bandeira americana. A mesma tática do partido de extrema direita AfD, na Alemanha, que acusa os demais de terem vergonha dos símbolos alemães.

No Brasil, nossas cores encheram as ruas em favor do impeachment de Dilma como contraponto ao vermelho, marca registrada do PT. A partir daí, bandeira, hino e o verde e amarelo passaram a ser evitados por pessoas contrárias ao afastamento e hoje também por opositores do governo, atitude que acabou dando de bandeja parte da identidade do país aos radicais, que os fizeram reféns da estética cafona-bolsonarista.

A maioria dos perfis bolsonaristas nas redes sociais tem nossa bandeira como marca registrada. Tomamos horror ao uniforme verde e amarelo. O hino nacional virou trilha sonora de passeatas que pedem intervenção militar e também resposta às panelas que gritam "fora, Bolsonaro".

Ao nos afastarmos dos símbolos, segundo o que escreveu Stuenkel, "facilitamos o trabalho da extrema direita, a qual busca estabelecer uma falsa dicotomia entre cidadãos 'verdadeiros' e aqueles menos comprometidos com a nação". Ainda que não seja uma competição, talvez esteja na hora de mudar esse jogo.


Mariliz Pereira Jorge: O que falta para Bolsonaro ser banido das redes?

Redes sociais deletaram posts do presidente por compartilhar desinformação que pode causar danos à população diante da crise da Covid-19

Twitter, Instagram e Facebook apagaram postagens de Jair Bolsonaro, nas quais ele passeia por algumas localidades do Distrito Federal, entra em estabelecimentos, conversa com comerciantes e apoiadores, o que desrespeita todas as recomendações da OMS (Organização Mundial da Saúde) e também do seu próprio ministro.

A justificativa é de que o presidente compartilha desinformação que pode causar danos à população diante da crise da Covid-19.

A iniciativa é bastante significativa. Entre líderes mundiais, apenas o ditador venezuelano Nicolás Maduro sofreu esse tipo de sansão ao indicar uma bebida que poderia ser útil para curar a Covid-19. Mas ainda é pouco.

Em 2016, quando completou dez anos, o passarinho azul havia perdido 30% do seu valor de mercado. Havia apostas de que seu destino era o fim. Adotado pelo então candidato Donald Trump como principal meio de comunicação com seu eleitorado, atitude copiada por outros políticos, como Jair Bolsonaro, o Twitter ganhou fôlego.

Hoje, é lá que o debate público acontece e onde marcam presença, além dos representantes do povo, jornalistas, ativistas, cientistas políticos, entre outras vozes atuantes nas redes sociais.

A questão que ronda a plataforma é que ao deixar as rédeas muito soltas, o Twitter foi conivente com o empobrecimento do diálogo e com a escalada dos discursos de ódio e a perda de controle sobre a disseminação de fake news.

Agora corre contra a própria negligência, também para se defender das críticas que só crescem e devem piorar num momento em que a desinformação ganha potencial destruidor diante da Covid-19.

No ano passado, a empresa cancelou milhares de contas em todo mundo, muitas ligadas a atividades públicas. Hoje, tem respondido a denúncias com cancelamento de contas e, novidade mais do que esperada, resolveu punir personalidades conhecidas por manipular informações, compartilhar notícias falsas, perseguir adversários políticos.

Na semana passada, deu um castigo ao ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, ao senador Flávio Bolsonaro (sem partido-RJ) e ao blogueiro bolsonarista Allan dos Santos por terem violado suas regras.

As três contas foram bloqueadas por 12 horas porque a empresa considerou que seus tuítes poderiam “expor as pessoas a risco durante a crise do coronavírus”, conforme informou o Painel.

O YouTube, por exemplo, apagou recentemente um vídeo em que o guru bolsonarista Olavo de Carvalho colocava em dúvida a existência da pandemia de coronavírus.

O Facebook, já no ano passado, deletou uma postagem em que o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) divulgava nomes e fotos de jornalistas.

Ao que tudo indica, perceberam, ainda que só agora, a necessidade de adotar uma linha mais dura com autoridades que se valem da liberdade de expressão para manipular sua audiência.

Mais grave do que disseminar falsas notícias sobre mamadeira de piroca e ameaça comunista é confundir a população sobre o que precisa ser feito no meio de uma pandemia que pode deixar um rastro de dezenas de milhares de mortos no país.

Nesta segunda (30), Bolsonaro e apoiadores usaram as redes para tirar de contexto uma fala do diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, para validar o discurso do presidente, que defende a volta ao trabalho.

Há centenas de postagens nas redes sociais, inclusive de pessoas públicas ligadas ao seu governo, que usam o argumento repetido por ele de que Ghebreyesus segue sua “mesma linha”.

A OMS negou que tenha mudado de direção sobre a necessidade do isolamento e seu diretor teve que ir ao Twitter reforçar a importância de que governos providenciem políticas econômicas para beneficiar a população que está sem renda.

Mas o estrago já está feito. Os bolsonaristas usam o órgão mais importante de saúde do mundo para bancar seus delírios e comprometer os esforços feitos para convencer as pessoas da importância de ficar em casa e de cobrar do governo federal o suporte para atravessar a crise da Covid-19.

O episódio mostra que não adianta apagar posts, congelar contas por algumas horas. Gente com a mesma postura de Bolsonaro e de seus apoiadores deveria ser banida das redes sociais. O que falta para que Twitter, Facebook, YouTube e Instagram cancelem essas contas para sempre?

Mariliz Pereira Jorge

Jornalista e roteirista de TV.