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Evandro Milet: Mussolini em Copacabana

Às vésperas da Segunda Guerra Mundial, a noite de 27 de maio de 1939 foi marcada pelos passinhos de samba que a filha do ditador italiano, Edda Mussolini, arriscou diante do chefe do Estado Maior do Departamento de Guerra dos Estados Unidos, George Marshall, Jr., em pleno Palácio Guanabara, residência oficial do ditador brasileiro. O General Marshall entraria para a história ao batizar o Plano de recuperação da Europa depois da guerra. Edda atuava como embaixadora cultural do fascismo, enquanto Marshall procurava aproximar o Exército norte-americano das Forças Armadas brasileiras, ambos disputando a parceria estratégica do Brasil no Atlântico Sul.

Getúlio, malabarista e ambíguo como sempre, com a intenção de enfatizar a neutralidade de seu governo até ali, fez coincidir as datas de visita e dedicou a mesma cortesia para ambos. Ele tinha simpatia pelo fascismo italiano, mas tentava negociar o apoio desejado pelos americanos, incluindo na pauta a construção de uma siderúrgica, que viria a ser a Companhia Siderúrgica Nacional - CSN, marco da industrialização do país.

A jovem e atraente Edda fez sucesso junto ao público masculino, mas o único que chegou junto foi o irmão mais novo de Getúlio, Bejo Vargas, apesar do fato daquela jovem senhora de 29 anos ser casada com o Ministro das Relações Exteriores da Itália. Durante duas semanas no Rio, Edda e Bejo barbarizaram, culminando com uma tórrida madrugada nas areias de Copacabana, em um banho de mar completamente nus, para escândalo dos moradores da avenida em frente.

“Eu não me contive, tchê!”, teria justificado Bejo, quando Getúlio lhe pediu explicações. 

Getúlio era um camaleão político. Nos seus 19 anos de poder, brigou e fez as pazes com os mesmos personagens inúmeras vezes. Fez alianças inimagináveis com antigos desafetos políticos e com esse pragmatismo sobreviveu a inúmeras intenções de golpe. Hoje o Presidente escolhe um inimigo por mês, como os quadros afixados nas paredes das lanchonetes. Já tiveram seus retratos carimbados pelas hashtags do gabinete do ódio: Maia, Alcolumbre, Dória, Witzel, o Congresso, o STF, Mandetta, Moro, Alexandre Morais, Macron, Merkel, o Papa, a Greta, a China, as jornalistas Patrícia e Vera, Globo, Estadão e Folha. 

Essa mistura de personagens, fatos históricos, ideologias e comportamentos nos leva a associar com a postura de Bolsonaro, que assume democraticamente com a bandeira da luta contra a corrupção e uma pauta liberal na economia e, de repente, muda tudo. Discurso autoritário, guerra com os outros poderes, apoio às manifestações pela intervenção militar e o AI-5, acordo com o centrão e um Plano Marshall desenvolvimentista o levam de volta à sua verdadeira natureza política, econômica, comportamental e de patrocinador de causas menores. Cobrado pelos eleitores ele diria como Bejo: "Eu não me contive, tchê".