lei do impeachment

Vinicius Torres Freire: Bolsonaro, um dia de fúrias e de crimes contra o país

Presidente cometeu tantos crimes de responsabilidade que a lei do impeachment se tornou letra morta

Jair Bolsonaro já violou impunemente tantos artigos da lei dos crimes de responsabilidade que essa norma que pretendia enquadrar e conter o comportamento do Presidente da República tornou-se letra morta. As instituições e boa parte da elite lhe dão carta de corso para barbarizar o Estado, a decência e a ordem. Isto é, enquanto reparta o butim.

Como ficou ainda mais claro desde o tempo da subversão dos comícios golpistas (não faz nem seis meses), o poder mortal de Bolsonaro não será ameaçado desde que não cause mais danos financeiros do que custaria um processo de impeachment. Ou seja, desde que não provoque um tumulto econômico, derrubando o teto de gastos, que não aumente impostos de modo significativo e que pague os serviços que comprou no Congresso.

Esta terça-feira foi um dia pleno de bolsonarismo. Logo pela manhã, houve a saudação fúnebre. Bolsonaro jactou-se de derrotar João Doria porque uma morte prejudicou o andamento dos testes da vacina encomendada pelo governo de São Paulo. Mas passemos, porque “proceder de modo incompatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo”, como está escrito no artigo 9º da lei dos crimes de responsabilidade, do impeachment, é o comportamento esperado de Jair Bolsonaro.

Na tarde de um dia especialmente abjeto até para os padrões bolsonaristas, o capitão da extrema direita ameaçou os Estados Unidos com “pólvora”. As frases são as seguintes: "Assistimos há pouco um grande candidato à chefia de Estado dizer que, se não apagar o fogo da Amazônia, vai levantar barreira comercial contra o Brasil… Apenas diplomacia não dá. Quando acabar a saliva, tem que ter pólvora”.

E daí? Bolsonaro subiu um tom apenas na sua irresponsabilidade de iletrado desvairado, pode se dizer. É aceitável para seus cúmplices e colaboracionistas em geral, que fizeram por isso o país se tornar esta casa de tolerância. É um “surto” dizem. Talvez porque um de seus filhos tenha sido acusado formalmente de roubar dinheiro público. Talvez porque um ministro do Supremo tenha mandado para a Procuradoria-Geral da República uma notícia-crime, pois Bolsonaro manipula as instituições para evitar que seus filhos e amigos milicianos terminem na cadeia.

Mas é crime. Como está escrito no artigo 5º da lei do impeachment, um dos crimes de responsabilidade contra a existência política da União é “cometer ato de hostilidade contra nação estrangeira, expondo a República ao perigo da guerra, ou comprometendo-lhe a neutralidade”. Parece piada, porque Bolsonaro será, em parte, ignorado na sua insignificância lunática. Em parte.

Em parte, não. Pelo menos tentar qualquer dos crimes de responsabilidade mencionados na lei pode motivar processo de impeachment. Mais relevante, de prático, Bolsonaro e seus cúmplices também no governo, vários deles oficiais-generais, atentam contra a segurança nacional e contra os interesses econômicos do país porque ameaçam as relações diplomáticas, comerciais e financeiras com alguns dos maiores países do mundo e tantos de nossos vizinhos, países amigos.

Bolsonaro ainda zombou dos mortos, dos brasileiros que cuidam de si e de seus compatriotas evitando espalhar a doença e a morte, disse que as eleições no Brasil são passíveis de fraude e muito mais. Pareceu apenas um pot-pourri, um show de sucessos de sua sordidez habitual. Mas não. Bolsonaro demonstrou mais uma vez que é uma ameaça; quem tolera seus crimes, no Congresso ou no mundo do dinheiro grosso, é seu cúmplice maior.