José Serra

José Serra: Um teto seguro e possível

PEC 182 propõe excluir despesas com benefícios do RGPS e o excesso de precatórios previsto para o ano seguinte

José Serra / O Estado de S. Paulo

O Orçamento do governo federal precisa do teto de gastos, e nossos concidadãos mais vulneráveis e mais duramente atingidos pela pandemia também precisam de um teto para morar, de comida no prato e de uma renda básica para viver dignamente. O governo alega que esses dois objetivos são incompatíveis, mas existe no Congresso uma proposta de legislação tecnicamente superior, que permite ao Executivo financiar novos gastos com assistência aos mais vulneráveis, mas preservando o arcabouço institucional na área fiscal e evitando postergar infinitamente o pagamento de dívidas do governo já sancionadas em definitivo pelo Judiciário (os afamados precatórios).

A proposta do governo federal para mudar a forma de calcular o teto de gastos, combinada com a fixação de um limite de pagamento de precatórios, pode ser encarada como uma bomba fiscal. Trata-se de uma aventura que terminará com a sociedade toda sem saber o rumo que o País resolveu seguir, vivendo com juros altos e inflação descontrolada.

Após a aprovação da reforma da Previdência em 2019, apresentei a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 182, com o objetivo de aperfeiçoar e harmonizar as instituições e regras fiscais em vigor no País. São pouquíssimos artigos, mas com efeitos importantes: amplia controladamente o espaço fiscal no teto de gastos e institui no Brasil um sistema de revisão periódica dos gastos públicos. É uma mudança que permite manter o Teto Constitucional até 2036, com possibilidade de alteração em 2026, tal como estabelece a Emenda Constitucional promulgada no final de 2016.

A proposta exclui as despesas com benefícios previdenciários da base de cálculo do teto de gastos de forma retroativa a 2016. No Orçamento do próximo ano, essa medida abre espaço de R$ 9,2 bilhões. O texto também deveria retirar o excesso de precatórios previsto para o ano subsequente, em relação ao que se espera gastar no ano corrente, o que amplia o espaço fiscal adicional para R$ 43,2 bilhões.

Uma simples matemática ajuda a entender por que é uma boa medida excluir o Regime Geral de Previdência Social (RGPS) do limite para gastos. As despesas com previdência social ocupam cerca de metade do teto do Poder Executivo e crescem a taxas bem acima do indicador que corrige anualmente esse limite de gastos. Isso quer dizer que as demais despesas do Orçamento, como investimentos, saúde e educação, serão comprimidas pelo crescimento do RGPS, comprometendo o suporte estatal em áreas vitais para o desenvolvimento do País.

Propostas que buscam excluir do teto os gastos com investimentos, a saúde e a educação apenas acentuam o principal problema do teto: o efeito de compressão do RGPS sobre as demais despesas do Poder Executivo. São propostas que acabam com a regra constitucional aprovada em 2016.

Excluir do teto o excesso de precatórios envolve questões fiscais e morais. Primeiro, abrir espaço fiscal limitando o pagamento de precatórios, como propõe o governo federal, é uma pedalada fiscal: gasta-se mais gerando dívida que não aparece nas estatísticas fiscais oficialmente divulgadas pelo Banco Central e pelo Tesouro Nacional. Segundo, é simplesmente um calote. O País não pode sinalizar ao mundo que deixa de pagar despesas decorrentes de sentenças judiciais.

A aprovação da PEC 182 é oportuna porque abre espaço fiscal de R$ 43,2 bilhões no teto, viabilizando uma agenda social indispensável para enfrentar a fome e a pobreza extrema. Por outro lado, permite quitar as dívidas com precatórios, dando exemplo de responsabilidade aos credores do Estado brasileiro.

A PEC 182 também avança propiciando inovação institucional. Adotando princípios gerais de um sistema de revisão periódica de gastos públicos, lá fora conhecido como

Spending Reviews, a PEC coloca o País na rota dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) em matéria de governança fiscal. Mais importante: busca instituir no País um modelo de gestão fiscal que pode revolucionar a forma de discutir o orçamento público. Não há quem possa racionalmente opor-se à revisão periódica dos gastos públicos, com transparência e método racional envolvendo toda a administração pública.

Sobre a proposta do governo, tenho pouco a dizer: é uma bomba fiscal. Sua fórmula de correção do teto abre espaço fiscal comprometendo o planejamento orçamentário, já que o Orçamento do ano subsequente será enviado ao Congresso sem a definição do teto que deveria orientar a gestão dos recursos públicos. Aí, sim, transforma nosso Orçamento em peça de ficção. Sobre o limite de pagamento de precatórios, convenhamos, é calote, é pedalada, é tudo, menos responsabilidade fiscal.

As lideranças do Poder Executivo e do Congresso Nacional devem entender que o País está à beira de um precipício fiscal. Nunca foi tão importante priorizar a assistência social e os gastos que permitem retomar o caminho da prosperidade. Precisamos manter a parcela da sociedade mais vulnerável protegida por um teto bem construído, sem inflação fora do controle e longe das taxas de juros elevadas.

*Senador (PSDB-SP)

Fonte: O Estado de S. Paulo
https://opiniao.estadao.com.br/noticias/espaco-aberto,um-teto-seguro-e-possivel,70003881843


José Serra: A constitucionalização das pedaladas

PEC 23 enviada ao Congresso pelo Poder Executivo é uma ofensa aos princípios e regras fundamentais do arcabouço fiscal

José Serra / O Estado de S. Paulo

As eleições presidenciais no Brasil costumam atrair governantes para o tentador caminho das pedaladas fiscais. Foi assim em 2014, quando lideranças do Poder Executivo produziram resultados fiscais fictícios com a intenção de angariar votos, mostrando à sociedade um retrato falso de contas públicas sob controle. O recente pacote de alterações constitucionais apresentado pelo governo lembra as manobras criativas adotadas naquele período para distorcer a situação fiscal do País. Só que desta vez os truques se escondem nas estranhas de uma proposta de emenda constitucional (PEC).

As pedaladas fiscais ficaram famosas no processo de impeachment da presidente Dilma. Pode-se dizer que se referem a atos ilegais praticados pelo Executivo em função de dois objetivos: driblar regras de controle das contas públicas e apresentar um resultado fiscal melhor do que o real. Entre 2012 e 2016, de fato, as projeções econômicas e fiscais do governo federal foram ficando cada vez mais descoladas da realidade, revelando uma gestão fiscal pouco transparente e despreocupada com a solidez das contas públicas.

Já é sabido também que, em períodos de eleição, os governantes e os políticos revelam preferência por políticas públicas que aumentam suas chances de reeleição, deixando de lado preocupações sobre a sustentabilidade fiscal dos programas governamentais. O resultado costuma ser devastador: corrosão da credibilidade da política fiscal e alta na taxa de juros cobrada para financiar o governo, combinadas com crise institucional, social e econômica.

Desta vez, o Poder Executivo parece querer apostar na estratégia das pedaladas fiscais para vencer as eleições em 2022. Pelo menos passou essa impressão ao encaminhar ao Congresso a PEC n.º 23, basicamente alterando dispositivos constitucionais que tratam do regime de pagamento de precatórios e do processo orçamentário. Precatórios, para quem não conhece, são uma espécie de título emitido pelo governo para saldar uma dívida que nasce de uma sentença judicial. Em outras palavras, uma pessoa – física ou jurídica – ganha na Justiça o direito de receber uma quantia do governo, que, por sua vez, emite um precatório em favor dessa pessoa para assegurar o compromisso de pagamento dentro de um prazo exequível.

O volume de precatórios a serem pagos cresceu vertiginosamente nos últimos anos, de R$ 54,7 bilhões em 2021 para R$ 89,1 bilhões em 2022. Como são despesas computadas no teto de gastos – regra constitucional criada em 2016 para limitar o aumento das despesas públicas –, o governo precisa agir para evitar a paralisação da máquina pública. Afinal, não há espaço fiscal para acomodar esse gasto extra com precatórios no teto, mantendo também a administração pública em funcionamento.

Nota-se que a PEC n.º 23 compreende alternativas para lidar com essa montanha de precatórios, mas sem perder de vista a oportunidade de flexibilizar princípios orçamentários e regras de controle do gasto. Claramente envolve mudanças constitucionais que, em última análise, entregam a chave secreta do cofre guardado no Tesouro Nacional para o presidente da República poder gastar na corrida eleitoral.

O texto encaminhado pelo governo apresenta basicamente cinco partes: 1) Institui o parcelamento de pagamento de precatórios e sentenças judiciais na administração pública federal; 2) altera o teto de gastos a partir de triangulação de operações financeiras, com impacto fiscal imprevisível; 3) flexibiliza importante dispositivo da Lei de Responsabilidade Fiscal, que veda financiamento de gasto corrente com recursos derivados da alienação de bens e direitos; 4) muda o desenho constitucional da regra de ouro, enfraquecendo o controle das despesas correntes; e 5) autoriza a capitalização de fundos por meio de transações extraorçamentárias, reduzindo a transparência fiscal.

Sem espaço para explicar tecnicamente o efeito de cada uma dessas mudanças, tenho preocupações em relação à PEC 23. Como ex-ministro do Planejamento e relator constituinte do capítulo sobre Finanças Públicas na Constituição, quero alertar as lideranças do Congresso Nacional sobre os perigos dessa proposta, que, no formato originalmente proposto, é uma ofensa aos princípios e regras fundamentais do arcabouço fiscal construído desde a redemocratização.

Uma PEC que representa a constitucionalização das pedaladas fiscais precisa ser reformulada no Congresso. Sem dúvida, algo precisa ser feito para resolver o problema dos precatórios. Contudo a solução não deve passar por mudanças que comprometam a estrutura óssea do nosso arcabouço de regras e princípios fundamentais de controle dos orçamentos.

A proposta do Executivo é invertebrada e precisa ser aperfeiçoada no Congresso. Em vez de se constitucionalizar a prática das pedaladas fiscais, os parlamentares deveriam seguir o caminho da transparência: excluir do controle do teto o excesso de precatórios para 2022, cobrar do Poder Executivo providências para melhorar a gestão de riscos fiscais daqui em diante e honrar as dívidas com os precatoristas.

Fonte: O Estado de S. Paulo
https://opiniao.estadao.com.br/noticias/espaco-aberto,a-constitucionalizacao-das-pedaladas,70003821395


José Serra: Orçamento sem bom censo

O Orçamento público aprovado no final de abril, com atraso e inconsistências técnicas, compromete o desempenho das políticas públicas no País e cancela, na prática, os recursos para a realização do Censo 2021. Nos Estados Unidos, o presidente Joe Biden defende seu ambicioso plano de Estado para os próximos dez anos; já no Brasil, os formuladores de políticas governamentais promovem desorganização das contas públicas e desmantelamento de programas de governo indispensáveis ao desenvolvimento do País.

Soma-se a esse inadmissível desacerto na condução da política econômica a inepta tese de que o Orçamento público deve ser decidido pelos parlamentares. Como se o papel do Executivo fosse somente largar na porta do Congresso Nacional o principal instrumento de planejamento e gestão do País. Não é admissível que um governo se exima de governar.

Nossa Constituição federal confere ao Poder Executivo competência privativa para elaborar o Orçamento, em função de metas e prioridades estabelecidas pelo presidente da República. Quando o governo abre mão dessa prerrogativa durante o processo de elaboração do Orçamento, o Parlamento ocupa esse espaço e, por inércia, tende a avançar na alocação unilateral dos recursos públicos, por meio de emendas orçamentárias.

Nota-se que o governo federal se descompromete das próprias metas e prioridades ao evitar interações com o Poder Legislativo na fase de discussão do Orçamento. Por sua vez, os parlamentares têm interesses próprios relacionados às suas bases eleitorais e locais. Num sistema político-partidário fragmentado, como se verifica no Brasil, a estratégia do governo, em última análise, compromete a qualidade do gasto e alimenta o viés deficitário do Orçamento.

Nesse contexto, o Congresso praticamente excluiu do Orçamento de 2021 a previsão de recursos para a realização do censo. O relator-geral do Orçamento adotou uma estratégia conhecida na Esplanada como “inversão de prioridades”: corta-se uma despesa essencial para financiar outros gastos de prioridade duvidosa, sabendo que, no fim das contas, haverá forte pressão para recompor a verba cortada.

Sabe-se que o censo, no Brasil, deve ser realizado a cada dez anos, nos termos do primeiro artigo da Lei 8.184, de 1991. Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal, ao ser provocado, decidiu corretamente ao determinar que o governo tome as providências para realizá-lo neste ano. A Corte julga agora um recurso da Advocacia-Geral da União contra essa determinação, mas, ao que tudo indica, os ministros devem manter a decisão anterior.

O Censo 2021 deve ter prioridade e medidas devem ser tomadas para superar questões sanitárias. Na ponta do lápis, o custo é irrisório comparado aos benefícios: gasta-se pouco para lançar mão de dados que ajudam os gestores públicos a fazer uma alocação melhor e mais eficiente dos recursos públicos. Trata-se de uma ampla pesquisa que cobre os domicílios brasileiros, com um retrato detalhado da população – desde quantidade e características das famílias até o tipo de moradia em que vivem, levando em conta acesso a coleta de lixo, energia elétrica e transporte público, por exemplo.

Cabe também observar que o Brasil vem sofrendo transformações substanciais na última década. São mudanças nos fluxos migratórios e na pirâmide etária do País, por exemplo, que só podem ser medidas com maior precisão com o censo. E são indicadores fundamentais para tomada de decisões e formulação de políticas públicas.

Em países avançados, o censo é considerado uma ferramenta essencial para o desenvolvimento. Recentemente tive a oportunidade de acompanhar a manifestação de um ministro canadense explicando a importância das pesquisas censitárias, especialmente para o planejamento dos negócios no setor privado e das políticas públicas mais importantes para as comunidades. Devemos seguir esse caminho, pondo o censo como instrumento prioritário da administração pública.

Quando ministro do Planejamento, tive a oportunidade de coordenar a elaboração do primeiro plano plurianual do governo Fernando Henrique Cardoso. A maioria das reuniões era realizada no ministério, mas não foram poucas as vezes em que fui pessoalmente ao Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), braço direito na elaboração do plano.

Eram presença marcante e constante dessas reuniões técnicos da Secretaria de Orçamento Federal (SOF) e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Este, hoje tão desrespeitado e desprestigiado, foi o responsável por fornecer as estatísticas sobre o acesso da população brasileira aos serviços básicos, níveis educacionais e outros indicadores que nortearam a definição das políticas públicas a serem implementadas no Brasil à época.

É uma pena observar manobras no Orçamento federal que comprometem a realização do Censo 2021. O governo precisa recuperar seu protagonismo no processo de elaboração do Orçamento, sinalizando para o Congresso o compromisso com o planejamento das políticas públicas. Caso contrário, o Orçamento continuará sem bom censo.

*Senador (PSDB-SP)

Fonte:

O Estado de S. Paulo

https://opiniao.estadao.com.br/noticias/espaco-aberto,orcamento-sem-bom-censo,70003713088

 


José Serra: Flexibilizando patentes na pandemia

O abuso econômico das patentes deve ser encarado como questão de Estado

O Senado Federal vem discutindo, acertadamente, medidas que alteram a Lei de Propriedade Industrial na direção de uma nova agenda global. Pretende-se promover maior escala de vacinação para enfrentar o novo coronavírus a partir da flexibilização dos direitos de patentes. Trata-se de uma decisão relevante, pois os países em desenvolvimento vêm encontrando dificuldades no acesso às vacinas, ficando mais vulneráveis a novas ondas de contágio da doença. E não apenas esses países, mas também a economia global.

Na Organização Mundial do Comércio (OMC), África do Sul e Índia lideram uma agenda que busca flexibilizar regras sobre patentes previstas em acordos internacionais, com o objetivo de promover a vacinação em países não desenvolvidos. Ex-chefes de Estado enviaram recentemente uma carta ao presidente dos Estados Unidos, o democrata Joe Biden, em apoio a essa demanda. Na carta os signatários manifestam sua preocupação com o monopólio da tecnologia das vacinas durante a pandemia. Nota-se que economistas renomados – com Prêmio Nobel – também assinaram o documento encaminhado ao presidente norte-americano.

Três falhas de mercado no setor farmacêutico representam um grande desafio para economistas no debate. Primeiro, a demanda de vacinas em relação ao preço é inelástica, ou seja, a decisão dos países para adquiri-las não depende do preço. Segundo, o consumidor tem poder de decisão reduzido sobre qual vacina adquirir, dado que se trata de questão de vida ou morte. Terceiro, a barreira à entrada de concorrentes na indústria farmacêutica é notoriamente elevada. Se há elevado número de empresas no ramo, também existem diversos expedientes para formação de poderes monopolísticos.

O indiano Prabodh Malhotra analisou o impacto, na Índia e em países em desenvolvimento, do famoso acordo internacional sobre direitos de propriedade, conhecido como Trips – Trade Related Intellectual Property Services –, em seu livro Impact of Trips in India, an access to medicines perspective, que recomendo aos interessados no assunto.

Prabodh observa que o Trips é um instrumento jurídico que favorece desproporcionalmente a indústria farmacêutica, restringe o acesso a medicamentos e tem potencial para causar mortes desnecessárias em países em desenvolvimento. Nações desenvolvidas se beneficiaram efetivamente de invenções e descobertas de outros países, sem limites, mas o Trips nega às nações em desenvolvimento as mesmas oportunidades.

Cabe esclarecer que os lucros auferidos pela indústria farmacêutica são importantes para tornar viáveis investimentos em pesquisa e desenvolvimento. Sem uma margem de lucro razoável haveria desincentivo à atividade inovativa. Mas também não se pode esquecer que o regime de patentes é uma exceção ao livre mercado, um dos princípios postulados pela nossa Constituição federal. Esse princípio constitucional supõe que toda exceção deve ser aplicada de forma ponderada, especialmente quando há abuso econômico na provisão de produtos e medicamentos durante uma pandemia.

As patentes e o direito às políticas públicas fazem parte da minha trajetória de vida pública, especialmente quando estive à frente do Ministério da Saúde. Coordenei a reforma da Lei de Propriedade Industrial em 2001, que resultou em maior poder do Estado no processo de concessão de patentes. Antes disso já havia assinado o Decreto n.º 3.201, de 1999, com o objetivo de inaugurar no Brasil regras sobre a implementação da licença compulsória, permitindo a quebra temporária de patentes em casos de emergência nacional ou interesse público.

Essas reformas foram feitas observando dispositivos específicos previstos no próprio acordo Trips. Com a licença compulsória no leque de possibilidades, tivemos condições de negociar forte redução do valor dos medicamentos usados no tratamento de aids, hepatite e outras doenças. Vencemos a guerra de preços contra os laboratórios adotando a tese de que ninguém pode gerar superlucros pondo em risco o direito à vida.

O arranjo jurídico em vigor no Brasil autoriza o governo federal a licenciar compulsoriamente a exploração de vacinas ou outros medicamentos patenteados por qualquer instituição pública ou empresa privada no País. Assim, o principal obstáculo para o Brasil ter acesso a vacinas e medicamentos não reside na existência de patentes, mas sim no compromisso e na disposição do governo federal para enfrentar as empresas que estejam usando tais patentes de maneira que permita penalizar a população brasileira, bem como para fazer os investimentos necessários à expansão da produção de vacinas no País.

O abuso econômico das patentes durante a pandemia deve ser encarado como questão de Estado. Na batalha contra o novo coronavírus, o Congresso Nacional deve atuar quando o Poder Executivo revelar-se omisso em relação ao tema, aperfeiçoando a Lei de Propriedade Industrial na parte que regula a licença compulsória. Essa é uma agenda global que interessa profundamente aos países em desenvolvimento na luta contra o vírus.

*Senador (PSDB-SP)


José Serra: Patentes - Um debate do Congresso Nacional

Legislação brasileira sobre o tema deve se alinhar a acordo internacional

Senador da República (PSDB-SP), ex-governador de São Paulo (2007-2010), ex-prefeito de São Paulo (2005-2006) e ex-deputado federal (1987-1991); doutor em economia pela Universidade Cornell (EUA)

Temos dois tipos básicos de leis: as que geram benefícios para a sociedade no curto e longo prazos, e as que impõem uma troca (a sociedade opta por perder agora para ganhar depois). Temos aqui um conflito que exige decisões políticas. Grupos de interesse perdem privilégios assegurados em lei para aumentar o bem-estar social, mas aos poucos a nova legislação passa a ser aceita por todos como legítima.

Conflitos dessa natureza ocorrem com frequência quando se trata de inovação e seu papel econômico e social. Por exemplo, a regulação de combate aos cartéis promove, a um só tempo, crescimento e eficiência. Oligopólios e monopólios tendem a não inovar, e a concorrência promovida pela legislação produz mais eficiência graças ao incentivo à inovação. O fim dos lucros extraordinários permite preços mais baixos, o que incentiva o consumo e, consequentemente, o crescimento econômico.

Leis referentes à exclusividade na exploração de direitos de propriedade intelectual geram uma troca a curto prazo. Para a sociedade obter um nível eficiente de inovação, foi criado o instituto da patente, que é um monopólio jurídico temporário para quem criar uma inovação, garantindo ao autor o retorno para os recursos investidos no processo de geração da nova tecnologia.

Como todo monopólio, a patente produz uma ineficiência: o inventor, por ter poder de mercado, pode estabelecer o preço de seu produto a um valor bem acima do que seria ideal para a sociedade. Esse poder de mercado é limitado pelo tempo de vigência da patente: quanto maior o prazo, mais incentivos para atuação monopolista ineficiente.

A patente é um direito do pesquisador garantido na Constituição Federal. A LPI (Lei de Propriedade Industrial) prevê o prazo mínimo de 10 anos —a contar da concessão da patente— e o prazo geral de 20 anos —a contar do depósito da patente— para o inventor gozar desse privilégio temporário.

A morosidade nos processos de concessão de patentes pelo Inpi (Instituto Nacional de Propriedade Intelectual) faz com que o privilégio concedido às patentes ultrapasse o prazo de 20 anos devido à exigência do prazo mínimo de 10 anos previsto no parágrafo único do artigo 40 da LPI, que, por isso, está sendo agora questionado no Supremo Tribunal Federal.A demora do INPI para analisar patentes de medicamentos é tal que estudo da UFRJ concluiu que a União teve gasto adicional de cerca de 60% com medicamentos de alto custo, entre 2014 e 2018, devido à extensão do prazo concedida pela legislação. Ação da Procuradoria-Geral da República junto ao STF aponta pelo menos 74 medicamentos que tiveram prorrogação de prazo com fundamento nesse dispositivo da LPI, entre fórmulas para tratamento de HIV, diabetes e hepatites virais.Fórmula fabricada com exclusividade por um laboratório japonês, com potenciais efeitos contra o novo coronavírus, ainda aguarda patente que já deveria ter expirado no Brasil.

Esse dispositivo da LPI não está ancorado no Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio (Trips), que inspirou a lei, pois amplia a proteção que prejudica a concorrência e dificulta o acesso aos medicamentos. O próprio Trips estabelece que nenhum Estado signatário é obrigado a adotar medidas mais rígidas.

A análise dos efeitos econômicos e sociais aí envolvidos precisa ser efetuada no Congresso Nacional, independentemente do pronunciamento do STF sobre o tema. Eu defendo um alinhamento da legislação brasileira ao acordo internacional. Por isso, em 2018 apresentei o Projeto de Lei do Senado 437, que, entre outras providências, revoga o parágrafo único do artigo 40 da LPI.

Ao meu ver, essa proteção ampliada prejudica a concorrência e restringe acesso aos medicamentos. O relatório do senador Rogério Carvalho (PT-SE) está pronto para a deliberação do Senado, que não haverá de se omitir nem deixar essa iniciativa morrer durante a maior crise sanitária da nossa história.

*José Serra, senador (PSDB-SP)


José Serra: A pressa é inimiga da Constituição

Sociedade tem o direito de esperar que processo legislativo seja seguido com absoluto rigor

O escritor português José Saramago é conhecido por tiradas geniais que nos fazem refletir diante de encruzilhadas. Lembrei-me de uma delas em plena votação da chamada PEC Emergencial: “Não tenhamos pressa, mas não percamos tempo”. O Senado aprovou celeremente uma emenda constitucional que autoriza o pagamento do auxílio emergencial, mas, ao mesmo tempo, cobre a Constituição com uma cortina de fumaça que compromete a credibilidade do nosso arcabouço fiscal.

Nosso país enfrenta a pior fase da pandemia, com nosso sistema público de saúde próximo do colapso. Diante disso, infelizmente, o governo vem sendo negligente: critica o uso de máscaras, condena o distanciamento e dificulta a vacinação.

Na discussão da PEC Emergencial o governo adotou uma estratégia que consiste em acuar o Congresso, com o objetivo de aprovar a agenda de austeridade improvisada pelo Ministério da Economia. Usou seu poder para introduzir na PEC um dispositivo que torna viável o pagamento de um benefício emergencial ao mesmo tempo que, em troca, embute uma obscura reforma estrutural nas demais partes da emenda.

Às limitações do sistema semipresencial de votações junta-se uma celeridade que torna a discussão precipitada e os resultados, confusos. Analisando a proposta com a experiência que tive de relator dos capítulos de finanças públicas na Constituinte, percebi a armadilha em que fui colocado: sem poder votar contra o auxílio emergencial, nem concordar com que se manipule a Constituição.

Julgo que emendar a Constituição implica responsabilidade análoga à tarefa de elaborá-la. A maioria dos estudiosos classifica as alterações constitucionais como emanadas do poder constituinte. Assim sendo, sua execução exige o máximo de cautela, a fim de evitar casuísmos e imprudências com a norma jurídica mais importante da fundação do Estado.

O próprio texto constitucional se protege de mudanças improvisadas e arriscadas: estabelece que não se pode emendá-lo na vigência de situações emergenciais, como o estado de defesa, o estado de sítio e a intervenção federal. Esse dispositivo, aliás, remonta à Constituição de 1934, em resposta à Emenda Constitucional n;° 3, promulgada em plena vigência do estado de sítio decretado em 1926 pelo presidente Artur Bernardes.

A pandemia permanece assolando nosso país e impedindo a volta da normalidade. Neste contexto, várias comissões do Congresso Nacional nem sequer voltaram a funcionar. Isso por si só já justifica postergar a votação de emendas constitucionais, a não ser que haja absoluto consenso, como no caso do Fundeb.

Mas o texto da PEC Emergencial exige considerações acerca das duas dimensões: uma emergencial, outra estrutural. Considero a emergência a dimensão mais importante para enfrentar o vírus e nela constato uma tática do tipo tudo ou nada. A medida torna viável o pagamento de auxílio emergencial limitado a R$ 44 bilhões, o que pode ser considerado o plano oficial do governo para enfrentar o vírus neste ano.

Assim como não foi possível combater a emergência sanitária no ano passado com R$ 5 bilhões – de acordo com os planos do governo no início da crise –, é improvável que a estimativa atual seja suficiente para enfrentar todos os efeitos da pandemia em 2021. Para resolver esse impasse previsível a PEC apresenta outra saída emergencial: suspender todas as regras fiscais do País. Uma emenda comparável a um AI-5 sobre o sistema fiscal previsto na Constituição.

Um plano fiscal para enfrentar a crise é o mínimo que se espera de um governo responsável. Não temos plano. Nem mesmo o Orçamento anual foi aprovado.

Ademais, a proposta encaminhada à Câmara compromete a credibilidade do nosso arcabouço fiscal. Criam-se regras fiscais com lacunas jurídicas e incentivos à contabilidade criativa, levando ao crescimento do gasto público.

Sabe-se que a crise fiscal tem um viés eminentemente federativo. Hoje, 68% das despesas com funcionários e 84% das verbas destinadas ao consumo de bens e serviços têm sua origem nos Estados e nos municípios. A PEC 186 estabelece que as medidas de ajuste fiscal a serem adotadas por governadores e prefeitos limitem a despesa corrente a um máximo de 95% da receita corrente.

Uma análise, mesmo superficial, revela que esse porcentual pode estimular o aumento da despesa: governadores e prefeitos que gastam menos de 95% poderão aumentar as despesas até esse patamar, especialmente em épocas de eleição. O Executivo poderá aumentar os gastos correntes dando aumentos salariais e subsídios, pois a regra tem por alvo o gasto passado, mas não o futuro.

Numa situação emergencial como a que vivemos hoje, não se deveria sequer pensar em alterar regras estruturais do Estado brasileiro. O momento não é propício, o contexto é temerário. A sociedade tem direito a esperar de nós, seus representantes na Câmara e no Senado, que o processo legislativo seja seguido com absoluto rigor.

Em poucas palavras: a pressa é inimiga da Constituição.

*Senador (PSDB-SP)


José Serra: Haverá futuro sem o SUS?

O momento exige iniciativas que melhorem a qualidade e eficiência das políticas de saúde

Em agosto do ano passado o Estado publicou três editoriais sobre o Sistema Único de Saúde (SUS), a única tábua de salvação ao alcance da maioria da população brasileira diante da ameaça da pandemia de covid-19. Mais recentemente, em 8 de dezembro, o jornal voltou à carga, citando uma pesquisa de orçamento familiar do IBGE segundo a qual quase dois terços dos brasileiros dependem exclusivamente do SUS.

Não é nada trivial que um jornal de porte nacional e com o prestígio do Estado dedique sua principal plataforma de opinião a dar destaque ao mesmo tema. Tampouco é trivial um veículo com firme tradição de apoio às políticas de austeridade fiscal empenhar-se em defender o financiamento de uma rede estatal que compete com a rede privada. Pode-se constatar, nas opiniões defendidas nesses editoriais, um pragmatismo que lembra a frase de Deng Xiaoping sobre ideologia e vida real: não importa a cor do gato desde que ele cace o rato.

Até hoje o rato continua personificando a peste, mas o desafio sanitário enfrentado pelos brasileiros é de outra ordem, não se reduz ao vírus, pois afeta, além da saúde, a economia, a organização social e o desenvolvimento humano de toda uma Nação.

O SUS é “seguramente uma das maiores conquistas civilizatórias da sociedade (brasileira) no século passado”, porque retira o sistema de saúde do País da lógica de mercado e o torna direito fundamental. Um direito que em nenhum país do mundo o sistema privado foi capaz de garantir.

De que modo um país com dimensões continentais e em plena retração econômica, em meio a uma crise política de dimensões graves, poderia oferecer um sistema de saúde universal e gratuito que fosse também de qualidade?

Outras duas perguntas estão estampadas no título deste artigo: haveria futuro sem o SUS? O que resultará do teste de estresse a que o SUS está sendo submetido pelas demandas extraordinárias, para as quais teve de improvisar em grande parte, e pelas inseguranças de uma gestão submetida a seguidas mudanças de ministro, em plena crise de confiança e de visões opostas sobre o valor da vida, do conhecimento e da ação governamental?

Tomo a liberdade de tentar responder, escorado em minha experiência de atividade pública na área de saúde, em que me orgulho de ter contribuído para a consolidação do SUS, seja em termos regulatórios e financeiros, seja expandindo sua atuação em tratamentos de doenças específicas, acesso a medicamentos e equipamentos de alta complexidade. Vejo que há dois caminhos para isso, a via legislativa e a das políticas estratégicas.

O momento exige maior sensibilidade do Congresso para iniciativas que melhorem a qualidade e a eficiência das políticas de saúde. Há bons projetos de lei em pleno andamento, como o que autoriza a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) a adotar termos de ajuste de conduta como alternativa a penalidades a serem aplicadas pela infringência de normas a responsáveis pela produção e comercialização de produtos e serviços submetidos à vigilância sanitária. Isso permitiria corrigir os problemas sem recorrer a custosos procedimentos legais, economizando tempo para a agência e incentivando a melhoria do serviço prestado em hospitais, comércio de medicamentos e outros.

Outro exemplo é o projeto de lei que impede a concessão de patentes sem anuência prévia da Anvisa, mediante comprovação de que os medicamentos não prejudicam a saúde pública nem comprometem a sustentabilidade das políticas de acesso a medicamentos estratégicos no âmbito do SUS.

Quanto às políticas estratégicas, o combate à pandemia de covid-19 é um caso exemplar de consolidação de qualidade, economicidade e eficiência do SUS. As autoridades brasileiras tinham de antemão condições favoráveis para combater a pandemia, destacando-se a de dispor de um sistema de saúde de alcance universal, gratuito, cobrindo desde o atendimento médico, do mais simples ao mais complexo, até o desenvolvimento de pesquisa e a distribuição gratuita de medicamentos essenciais. E que acumulou ao longo de décadas uma bem-sucedida experiência de campanhas nacionais de vacinação.

Porém essas vantagens de nossa gestão da saúde pública não se converteram automaticamente em mecanismo capaz de planejar e gerir uma máquina de guerra de combate a um desastre das proporções da pandemia de covid-19. A começar por planejamento estratégico, elaboração de políticas, implementação de gestão da crise provocada pela pandemia, que vai muito além de seus aspectos sanitários. Por falta de planejamento e de senso estratégico, o Ministério da Saúde deixou que a má condução da gestão orçamentária, em pleno novo surto de covid-19, levasse o SUS a reduzir drasticamente a disponibilidade de UTIs e de equipamentos de ventilação, alegando falta de verbas.

Enquanto isso, o governo federal, com a outra mão, promete renunciar a receita tributária para benefício de um grupo de seus aliados. Falta de planejamento, incompetência da gestão orçamentária ou prevaricação pura e simples?

*Senador (PSDB-SP)


José Serra: Por um Congresso autônomo

Nas eleições do Legislativo, devemos preservar o Estado democrático de Direito

A autonomia do Poder Legislativo é a espinha dorsal da democracia representativa, especialmente no regime presidencialista. Nossa Constituição é cristalina em seus dois primeiros artigos: o Brasil constitui-se em Estado democrático de Direito e os Poderes da União —Legislativo, Executivo e Judiciário— representam, cada um em sua esfera, a soberania popular.

Note-se que o primeiro dos sete artigos da Constituição norte-americana —famosa por ser sintética e objetiva— trata do Poder Legislativo. É a parte mais extensa do documento que configura uma das democracias mais importantes do mundo. Pode-se dizer que a primeira emenda constitucional, introduzida em 1789 por James Madison, é considerada o coração da democracia americana: “...que o Congresso não faça nenhuma lei submetido a uma religião ou proibido de seu livre exercício”.

Com a convicção de que precisamos preservar nosso Estado democrático de Direito e a independência do Poder Legislativo, participarei do processo de escolha do presidente do Senado Federal, a quem caberá presidir o Congresso Nacional nos próximos dois anos.

O desafio de conduzir o Senado nesses tempos de pandemia de Covid-19 é imenso. Assim sendo, cabe ao senadores escolher com completa independência, dada a agenda de deliberações decisivas que o Congresso terá pela frente em colaboração com o Poder Executivo.

A primeira da lista é a luta contra a pandemia, o que envolve custos consideráveis. E aqui não faço referência somente ao aspecto financeiro. Tempo e energia são despendidos para administrar e coordenar políticas públicas, assim como para harmonizar as conflitantes demandas populares.

É preciso notar que todo o esforço do governo federal para banalizar o vírus e combater a vacinação vem, ao fim e ao cabo, promovendo uma ação descoordenada extremamente custosa e que coloca em risco vidas de famílias e de empresas. A sociedade e a mídia incorrem, literalmente em custos desnecessários, para restaurar a verdade e sinalizar o óbvio: o vírus é perigosíssimo, e a vacina é insubstituível!

Para otimizar esses custos de coordenação e sinalização, o Poder Legislativo deverá atuar de forma independente, promovendo uma agenda capaz de assegurar saúde, renda e empregos, sobretudo para os grupos mais afetados pela pandemia, sem descuidar do processo de recuperação econômica do país. São agendas complementares, na medida em que o controle do novo coronavírus é condição necessária para a retomada do crescimento.

Por um lado, faz-se necessário priorizar uma agenda social para sustentar o SUS, assegurar renda básica e atrair mais investimentos. Isto supõe a provisão de crédito mais barato, em subsídios, se necessário, a empresas atingidas pela crise. É inadmissível o setor público não agir diante de situações como a que ocorreu em Manaus: pessoas morrendo em hospitais por asfixia por falta de equipamentos básicos, como balões de oxigênio. Da mesma forma, não se pode deixar que pessoas e empresas atingidas pelas consequências da Covid-19 sejam abandonadas à sua própria conta.

Ademais, deve-se priorizar também uma agenda econômica para fomentar a recuperação econômica do país. Para tanto, é fundamental discutir reformas que tornem o setor público mais eficiente e que estimulem o setor privado a investir no país. Cito, por exemplo, reformas como a administrativa e os projetos de lei tidos como relevantes para dinamizar os investimentos em infraestrutura.

Por fim, vale lembrar que não iremos longe se não promovermos uma ação governamental planejada e coordenada, mais pragmática e menos ideológica. Para isso é fundamental apostarmos as fichas na independência do Congresso Nacional.

*Senador da República (PSDB-SP), ex-governador de São Paulo (2007-2010), ex-prefeito de São Paulo (2005-2006) e ex-deputado federal (1987-1991); doutor em economia pela Universidade Cornell (EUA)


José Serra: Encontraremos o caminho

Combatamos de novo o bom combate, dando a mão aos vulneráveis neste momento difícil

No meu primeiro artigo deste ano instei o Congresso Nacional a legislar com responsabilidade, coragem e eficácia, revestindo meus argumentos com dados e fatos. Naquele momento não poderia ter previsto a pandemia que viria, nem o papel que o Congresso assumiria numa das piores conjunturas da nossa História recente. O ano não foi fácil, mas continuo relativamente otimista no prognóstico. Em respeito às pessoas que perderam familiares, amigos, vizinhos, a todos os doentes e aos profissionais da saúde, temos de perseverar.

O cenário econômico e político já se mostrava desafiador no início de 2020. Os problemas sociais e a desigualdade, combinados com retrocessos em áreas como educação, meio ambiente e relações exteriores, formavam uma tempestade perfeita para dificultar qualquer proposta de desenvolvimento econômico e social sustentável. Sejamos claros: não chegaremos longe sem uma pacificação política – com menos disputas e mais diálogo – em torno de programas convergentes de políticas públicas viáveis.

Após a aprovação da reforma da Previdência, a chegada da pandemia e a omissão da ação estatal nas áreas de educação, meio ambiente e relações exteriores deram lugar a um ambiente político infestado de crises e divisões, prevalecendo interesses políticos desconectados da boa gestão pública. E o que é pior: em matéria de crescimento econômico, estamos para encerrar a pior década desde o início do século passado.

Aliás, na área econômica, este ano foi marcado por uma política fiscal difícil em relação à transparência e ao planejamento. Enfrenta-se uma epidemia dramática, com forte elevação do desemprego e das desigualdades, mas o ano se encerra sem um Orçamento bem definido para 2021 – temporariamente engavetado – e com indefinições elementares da prevalência do teto de gastos. Já fui ministro do Planejamento e posso dizer que essa neblina no horizonte fiscal decorre não de erros da área econômica, mas da ausência de rumo do governo.

Não existe vento bom para quem não tem rumo certo.

Os instrumentos de planejamento orçamentário que ajudei a conceber há mais de 30 anos, como a Lei de Diretrizes Orçamentárias, que resultou de emenda de minha autoria, estão funcionando como verdadeiras âncoras fiscais. Afinal, ainda temos uma meta fiscal para atingir no próximo ano, regida por regras básicas de execução provisória do Orçamento não aprovado. Nessa matéria, o Tribunal de Contas da União teve papel fundamental para reverter a ideia do governo de adotar uma meta fiscal flutuante, que afrontaria a Lei de Responsabilidade Fiscal.

Tenho por certo que o Congresso Nacional salvou o ano na área educacional ao aprovar as novas regras do Fundeb. Em tempos de pandemia, a luta pela regulamentação desse importante fundo representa a garantia dos investimentos na infraestrutura das escolas públicas, em sentido amplo. Por sorte, o poder de ação do Parlamento nessa matéria mais do que compensou a omissão olímpica do Poder Executivo na área da educação.

Sempre que possível, procuro sustentar meus argumentos com fatos. Penso que o meio ambiente e as relações exteriores – duas áreas de governo fundamentais para o crescimento econômico e o desenvolvimento social – também vêm sofrendo as consequências do despreparo. Na questão ambiental, ficamos de fora da lista de países que participarão do encontro preparatório para a próxima Conferência sobre Mudanças Climáticas – que será realizado no Reino Unido em 2021. E nas relações exteriores presenciamos um caso raríssimo: um candidato a chefe de missão no exterior, apontado pelo chanceler, recusou-se, em plena sabatina, a responder à pergunta de uma senadora! Não foi de estranhar que, diante dessa afronta inusitada à prerrogativa do Senado de confirmar, ou não, sua nomeação, o nome do escolhido do Executivo tivesse sido recusado.

O Congresso vem atuando com responsabilidade ao salvar a educação, aprovando o Fundeb, e ao poupar vidas, aprovando planos de apoio aos governos estaduais e municipais, que basicamente estão na linha de frente do combate à covid-19. Neste ano nasceram no Senado Federal as leis que direcionaram recursos para entidades filantrópicas, bem como para Estados e municípios conseguirem lutar no front da batalha. O auxílio emergencial foi mais uma conquista do Legislativo, a partir de um projeto do Executivo de apenas R$ 200.

O Poder Executivo apresentou uma série de propostas ao Congresso que podem resultar em reformas estruturantes nas áreas econômica e fiscal. É importante ter como alerta alguns sinais inflacionários e o elevado endividamento público, que reduzem a margem de manobra da política fiscal. Nesse sentido, apostar na vacinação de todos os brasileiros, a começar pelos mais vulneráveis, e nas reformas estruturantes é um passo acertado.

Encontraremos o caminho certo. Neste meu último artigo do ano volto a fazer o mesmo convite aos meus pares: é hora de o Parlamento assumir efetivamente suas responsabilidades e partir para a ação. Combatamos novamente o bom combate, dando a mão aos mais vulneráveis nestes momentos tão difíceis.

*Senador (PSDB-SP)


José Serra: A dimensão federativa da crise

A solução da crise passa por um federalismo de cooperação, como vem apontando Joe Biden

A economia brasileira está lidando com desequilíbrios das contas públicas simultâneos com uma pandemia imprevisível. Há forte pressão da sociedade por aumento de gastos na área social, ao mesmo tempo que os orçamentos das três esferas de governo – União, Estados e municípios – não apresentam capacidade fiscal para dar conta dessa necessidade de apoio estatal. Neste cenário incerto, uma certeza pode ser considerada apartidária: a crise fiscal tem dimensão federativa.

Sabe-se que o Brasil é uma República Federativa formada pela união indissolúvel dos Estados, municípios e do Distrito Federal. É o que está escrito no primeiro artigo da nossa Constituição. Mais ainda, nossa República se apresenta como uma organização político-administrativa que compreende três esferas de governo autônomas, nos termos do artigo 3.º da nossa Lei Maior.

Pode-se debater o tema, mas não se pode negar que nosso federalismo começa com duas palavras: união e ampla autonomia. Na maioria dos sistemas federativos os governos locais são “extensões” dos Estados federados, ao passo que no Brasil os municípios não estão subordinados a nenhuma outra esfera da Federação. É o acordo que se estabeleceu na Constituição, como condição de cláusula pétrea.

Bem, essa noção de que precisamos manter a integridade do nosso federalismo fiscal, um dos pilares da nossa Constituição, é fundamental no contexto da crise atual. Tenhamos claro que o País só vai sair desta crise e conseguir deslanchar, reduzir as desigualdades e promover o bem de todos – os objetivos da República previstos no mesmo artigo 3.º – se tornar viável um plano de curto e médio prazos, politicamente acertado com a participação das lideranças das três esferas de governo e da sociedade.

Ainda assim, o desafio é maior: essa concertação política deve envolver os três Poderes – Executivo, Legislativo e Judiciário. Ou alguém ainda duvida de que medidas e ações precipitadas, ou autoritárias, de algum modo desequilibradas em matéria federativa, serão provavelmente revertidas pelo Congresso Nacional e/ou pelo Supremo Tribunal Federal (STF)? Aqui cabe lembrar nosso histórico de decisões tomadas por esses dois Poderes, alterando ou moldando iniciativas do Poder Executivo federal.

Nota-se nesse contexto próprio que importar o federalismo de colisão patrocinado pelo presidente americano, Donald Trump – União versus Estados –, é uma estratégia perigosa. Basta perceber que, se os Estados e municípios brasileiros não forem capazes de financiar suas despesas, o Brasil simplesmente para de prover bens e serviços públicos para a sociedade. Isso porque somos uma das Federações mais descentralizadas do planeta, em que quase a metade do gasto público total está alocado nos orçamentos dos governos estaduais e municipais.

Vejamos alguns números sobre o nosso federalismo fiscal a fim de evidenciar a perspectiva federativa da nossa crise fiscal em tempos de pandemia.

Os gastos com salários no setor público, sem considerar proventos de aposentadorias, representaram cerca de 13,3% do produto interno bruto (PIB) em 2019, sendo 9,1% referente a Estados e municípios. Isto é, para cada R$ 100 que são gastos com salários no setor público brasileiro, basicamente R$ 70 se referem a servidores estaduais e municipais. Em relação à contratação de bens e serviços, o Estado brasileiro gasta cerca de 5,3% do PIB, sendo que os Estados e os municípios respondem por 85%. E com relação às despesas com consumo de capital fixo? Mais de dois terços são realizados pelas administrações públicas estaduais e municipais.

Foi nessa conjuntura do sistema federal brasileiro que o Congresso Nacional aprovou o Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus. Assim que a pandemia invadiu o País – paralisando a atividade econômica e colapsando o sistema público de saúde –, a arrecadação de tributos despencou. Ao mesmo tempo, houve significativo aumento das despesas com ações governamentais adicionais para o enfrentamento da proliferação do vírus nas cidades brasileiras.

A espinha dorsal do pacote de ajuda consistiu em dois tipos de socorro financeiro: um auxílio financeiro de R$ 60,1 bilhões e a suspensão das dívidas dos entes da Federação com a União e os bancos públicos, totalizando uma folga no caixa dos Estados e municípios de R$ 47,5 bilhões. Algumas questões ainda estão sendo discutidas no Congresso, como a retomada gradual dos pagamentos das dívidas com a União, levando em consideração que os efeitos negativos da redução da atividade econômica e as ações de combate à pandemia ainda persistirão, pelo menos, no médio prazo.

É importante ter claro que as medidas a serem tomadas daqui para a frente devem assumir a dimensão federativa da crise. O governo federal precisa assumir a liderança das negociações sobre as necessárias reformas na área econômica, sem perder de vista a responsabilidade fiscal e as características do nosso sistema federativo. Bom é dizer que a solução passa por um federalismo de cooperação, como, aliás, vem apontando o novo presidente dos EUA, Joe Biden, no contexto norte-americano.

*Senador (PSDB-SP)


José Serra: Vendendo ilusões a preço de ouro

Lobistas dos cassinos e seus arautos não se detêm ante repetidas derrotas no Congresso

Tal uma praga, que destrói o que há de bom e belo ao seu redor, tal um vírus que volta todos os anos provocando grandes surtos, assim também são as sucessivas tentativas de explorar as piores fraquezas da condição humana, mediante a legalização dos jogos de azar. Tudo, evidentemente, revestido de imensas benfeitorias para as pessoas, as empresas, a economia nacional, enquanto não são mais que venda de ilusões (a preço de ouro). Mas a mesma conversa fiada tem-se repetido, com estranha regularidade, desde que a presidente Dilma Rousseff anunciou que iria aprovar, em 2016, um projeto de lei em tramitação no Congresso. Afinal, essa exploração das fraquezas humanas não tem ideologia.

A criação de cassinos atinge diretamente as pessoas, seu emprego, sua família e a economia local. Não seriam os mais ricos, mas os aficionados de renda média para baixo os principais clientes a tirar seu suado salário do bolso, deixando de gastar em outras coisas para perder dinheiro em roletas e caça-níqueis. Esse dinheiro, escasso e vital, é que financia o jogo e cria os empregos nos cassinos, enquanto elimina outros, vinculados a outras atividades. O bem-estar e o consumo das famílias seriam diretamente atingidos, assim como seus investimentos em saúde, educação ou moradia e lazer.

E a economia local, com seus empregos, seus serviços, sua segurança, seria comprovadamente abalada: a introdução dos cassinos em Atlantic City – superada apenas por Las Vegas em matéria de jogos de azar – reduziu em 25% os empregos nos setores não ligados à jogatina. No Estado americano de Illinois, somente no ano de 1995 os custos associados ao funcionamento dos cassinos superaram em US$ 287 milhões os seus benefícios.

A economia nacional seria também vítima da legalização do jogo, com efeitos negativos tanto nas contas externas quanto na receita. No caso do Brasil, o jogo provocaria déficits significativos, uma vez que o setor é intensivo em importação de equipamentos especializados. E o controle dos cassinos tende a ser dominado por grandes conglomerados internacionais, livres para aplicar seus ganhos em outra freguesia.

Do ponto de vista da receita, de acordo com o Projeto de Lei 530, o mais novo ataque do lobby da jogatina, a tributação dos cassinos e caça-níqueis seria de apenas 10% da renda bruta, enquanto a carga tributária da gasolina é de 48%. Faça as contas, não só o jogo é financiado em grande parte pelos aficionados de renda média para baixo, mas seria, na prática, subsidiado por todos nós mediante renúncia de receita.

Também do nosso bolso sairão outros benefícios fiscais, garantidos pelas normas vigentes e até baseados na Constituição, como no caso dos fundos de desenvolvimento regionais. Além disso, o poder público pode camuflar subsídios, via concessão de terrenos, investimentos em infraestrutura e “flexibilização” das normas em vésperas de votações importantes.

Além de contribuir pouco, quando não negativamente, para as necessidades locais, o jogo tende a inflar as despesas com segurança, uma vez que a simples concentração de grandes fluxos de dinheiro tende a estimular o crime e a articulação de redes de narcotráfico, lavagem de dinheiro e violência contra mulheres. No Estado americano de Wisconsin os crimes aumentaram 6,7% após a abertura dos cassinos. Segundo o Instituto Americano de Seguros, 40% dos crimes de colarinho-branco se originam no jogo. Quando os cassinos nos Estados Unidos foram autorizados a operar fora de Las Vegas, em 1997, as taxas de criminalidade cresceram de tal modo que passaram a aumentar a incidência de seis dentre os sete tipos de delitos violentos.

Ademais, justamente para a área de segurança, que juntamente com programas de educação, esporte e cultura se beneficia de cerca de metade dos recursos das loterias da Caixa, a competição dos bingos e caça-níqueis seria letal.

Mas o maior dano dos cassinos, e dos jogos de azar em geral, não é no bolso dos viciados, mas na alma, o dano moral que contagia toda a família e leva à desagregação familiar.

Em New Jersey, 26 mil chamados telefônicos foram registrados num serviço público, apenas em 1996, de jogadores desesperados pelas consequências das dívidas feitas por causa de jogo. Atrás das dívidas vêm a perda de produtividade, o absenteísmo, os desfalques, a inadimplência de impostos e taxas, que em 1990 provocaram prejuízos de US$ 1,5 bilhão no Estado americano de Maryland.

A antropóloga Natasha Schüll, do Massachusetts Institute of Technology (MIT), comprovou que esses jogos de frequência ininterrupta, oferecidos pelos cassinos e jogos online, induzem um estado de transe psíquico a que o jogador se mantém preso por muitas horas e até dias. A família do viciado vai sofrer, impotente, a pobreza e a desonra.

Afinal, a legalização do jogo não faz nenhum bem? Tudo considerado, acho que faz bem, sim, aos lobistas e seus arautos, que não se detêm diante de suas repetidas derrotas no Congresso. Para eles, a opinião pública é composta por otários e o Congresso, por oportunistas. Mas até agora não passaram.

*Senador (PSDB-SP)


José Serra: Energia renovável e recuperação

O Brasil é a maior potência ambiental e pode se beneficiar das transformações do setor

A aprovação do novo marco do saneamento pelo Congresso Nacional, em julho deste ano, proporcionou, como previ naquela ocasião, a discussão e aprovação de uma pauta de retomada do crescimento pós-pandemia, voltada para a melhoria da produtividade. Publiquei um conjunto de artigos sobre investimentos em infraestrutura: um novo marco regulatório para as ferrovias e no setor de energia, com a aprovação urgente de mudanças na lei do petróleo, para possibilitar a realização de leilões em 2021, e nas leis do gás natural e do setor elétrico.

A cada ano que passa o mundo valoriza mais o que é feito a partir das energias renováveis. A vitória de Joe Biden reforçará essa agenda. O presidente eleito dos Estados Unidos deixou bem claro que dará uma guinada na política energética americana, retornando ao Acordo de Paris. Sua presidência deve lançar as bases para a descarbonização mais profunda e radical da História do país. O novo presidente promete investir US$ 2 trilhões em apoio às energias renováveis, para tornar os Estados Unidos totalmente independente do carvão e do petróleo até 2035. Existe a intenção de tornar toda a nação neutra em carbono até 2050.

O que isso tem que ver com o Brasil? Quais são as oportunidades que se podem abrir para o nosso desenvolvimento econômico e social? Já pensou? Um selo brasileiro de produto à base de energia renovável? Seria possível e altamente benéfico para o planeta!

O Brasil é a maior potência ambiental do mundo e pode se beneficiar fortemente das transformações do setor de energia global, com participação crescente das renováveis, da geração solar e eólica e também da inovação no armazenamento de energia. As baterias vão criar novas possibilidades, e tudo leva a uma expansão cada vez mais acelerada das renováveis. Em futuro não muito distante poderemos transformar-nos em potência energética se nos engajarmos nessa nova agenda.

Cabe lembrar que o consumo eficiente também pode ser o caminho mais fácil para atender às demandas futuras. A tecnologia hoje permite que redes inteligentes de energia conectem todos os seus consumidores, com uma riqueza de detalhes e dados que favorecem um sistema complexo e integrado, como o que já existe no Brasil.

Um exemplo bem cotidiano, que já é realidade em outros países, são os eletrodomésticos – como a máquina de lavar roupa – que esperam o momento de preço baixo da energia para funcionar e são automaticamente acionados. Em breve essa realidade passará a fazer parte dos lares brasileiros. Num simples ato de lavar roupas, o consumidor detém um poder de escolha que é bom para ele mesmo, para o sistema elétrico e para o meio ambiente.

É indispensável integrar as energias. Não esqueçamos que, no Brasil, temos uma frota de veículos movida a etanol, em última instância um derivado da “energia solar”. Em breve já poderemos sonhar com uma cena em que os consumidores geram energia com seus carros a etanol, como células combustíveis injetando energia no sistema. Ou mesmo carregando seus carros com energia de painéis solares. Essa energia também pode ser armazenada em baterias e utilizada quando necessário.

Também chegou a hora da diversidade, da integração, da competição e de dar poder cada vez maior aos consumidores. E, ademais, reconhecer que as soluções baseadas exclusivamente na intervenção dos governos e com dinheiro público se esgotaram. Esse gigantesco potencial de integração, pela via do mercado, vai permitir ao Brasil uma relação proveitosa com nossos vizinhos latino-americanos. Em conjunto, temos energia barata, matérias-primas, mão de obra e mercado para suportar um projeto que nos devolva o protagonismo na economia global.

Para que todo esse futuro se torne realidade precisamos modernizar nosso setor de energia. O caminho certo para criar um ambiente que atraia o capital privado e promova a concorrência passa pela nova lei do gás, pela atualização de regras do setor elétrico, por específicas para renováveis e biocombustíveis baseadas na inovação e na competitividade, e não em subsídios eternizados. Assim, vamos reforçar as estruturas de governo e das agências reguladoras com as vacinas que nos protejam dos riscos da captura do sistema por movimentos oportunistas.

No momento em que pensamos na recuperação do Brasil pós-pandemia, devemos pensar num processo estruturado de desenvolvimento com base na competitividade. A energia é uma chave geral desse projeto.

Só o debate democrático permitirá equilibrar os interesses diversos e fazer as escolhas certas. E o eixo desse debate está colocado nos projetos em apreciação no Congresso. Precisamos todos participar desse debate.

A agenda da energia reflete, no campo econômico, as demandas da sociedade brasileira. Ela envolve diversidade, maior poder para as pessoas, maior concorrência e transparência – e contribui para fazer a riqueza do País chegar a todos os brasileiros. Tão logo terminem as eleições municipais deve ser retomada com prioridade, fazendo da energia o combustível e o motor do nosso desenvolvimento.

*Senador (PSDB-SP)