industria

O Estado de S. Paulo: Sistema S acumula R$ 23 bilhões em imóveis

De 2,8 mil unidades, há espaços abandonados, e um deles foi alvo de invasão, afirma TCU

POR Cleide Silva, Mônica Scaramuzzo e Raquel Brandão, DE O Estado de S.Paulo

Dono de um patrimônio bilionário, o Sistema S, formado por um grupo de entidades da indústria, comércio, agronegócio e transporte, tem R$ 23 bilhões em imóveis. São 2.805 propriedades espalhadas por todo o País, das quais cerca de 490 são usadas para finalidades que não estão ligadas às atividades do Sistema S, segundo auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU). Há imóveis abandonados e um deles foi invadido.

Outra questão refere-se à remuneração dos empregados. Há indícios de que os salários no Sistema S estejam acima daqueles pagos pelo mercado. Em 2016, as entidades empregavam 108 mil funcionários, dos quais 40% recebiam mais do que a média do mercado. O salário médio mensal variava de R$ 3,5 mil a R$ 15,5 mil, dependendo da entidade.

 

Para fazer o comparativo, o TCU utilizou dados do Ministério do Trabalho. Das nove entidades e duas agências de fomento que compõem o sistema, a maior empregadora era o Sesi, com 28,4 mil funcionários e salário médio de R$ 3,8 mil por mês, seguido pelo Sesc, com 24,4 mil funcionários que recebiam, em média, R$ 3,9 mil.

Excelência
Para o economista José Roberto Mendonça de Barros, da MB Associados, “parte da montanha de dinheiro que o Sistema S recebe é muito bem aplicada, mas falta transparência, principalmente na sua gestão.” Mendonça de Barros cita como “louvável”, por exemplo, o trabalho de formação desenvolvido pelo Senai e seus laboratórios, “que estão entre os mais avançados no País”.

Em 2017, o Senai efetuou 2,3 milhões de matrículas em educação profissional e o Sesi computou 1,187 milhão de matrículas em educação básica, continuada e em ações educativas.

O QUE FAZEM AS ENTIDADES

Sesi: Vinculado à indústria, oferece cursos de educação básica, cultura, lazer e esporte

Senai: Vinculado à indústria, oferece cursos profissionalizantes e assessoria técnica

Sesc: Vinculado ao comércio, oferece cultura, lazer e esporte

Senac: Vinculado ao comércio, oferece cursos

Sebrae: Vinculado às micro e pequenas empresas, oferece cursos e apoio para acesso a crédito

Senar: Vinculado ao agronegócio, oferece cursos para trabalhadores rurais

Sescoop: Vinculado às cooperativas, oferece cursos e assessorias

Sest: Vinculado ao setor dos transportes, oferece cultura, lazer e esporte

Senat: Vinculado ao setor dos transportes, oferece cursos


Míriam Leitão: Cenário econômico

A produção industrial de março caiu 0,1%, quando a expectativa geral era de alta de 0,5%. Isso já virou rotina, os indicadores deste ano têm sido sempre piores do que o esperado. Há diversas razões para isso, mas os economistas ainda acham que a queda da taxa de juros acabará fortalecendo a retomada da economia. A alta do dólar não assusta os especialistas, porque o governo não tem passivo externo, ele é credor.

Fernando Honorato, economista-chefe do Bradesco, acha que isso muda totalmente a situação em relação a outros momentos em que, por estresse político, o dólar subia. Ele acha que a volatilidade de agora não se deve à questão interna. O economista José Márcio Camargo, da Opus Investimento, também acha que o dólar ficará instável no segundo semestre pelas eleições, e que agora o movimento se deve à questão internacional. Mas também ele não está preocupado com a alta recente da moeda americana. Acha que é natural porque o real estava valorizado.

Entrevistei os dois ontem na GloboNews sobre a conjuntura econômica. O Bradesco reduziu a previsão de crescimento do PIB de 2,8% para 2,5%. José Márcio tinha uma projeção mais otimista, acreditava num PIB de 3,8%. Agora também acha que será bem menos. Disse que seu cenário otimista partia da hipótese de aprovação da reforma da Previdência. Como não foi aprovada, o grau de incerteza nas contas públicas ficou muito maior.

Em outras eleições em que o dólar subiu em cenários de incerteza econômica, a situação das contas externas era bem pior. Fernando Honorato explica com números.

— A dívida externa das empresas privadas é normal, e elas resolvem isso com hedge. O país como um todo tem dívida externa, mas o governo é credor. Os números são os seguintes: a dívida externa do país hoje é US$ 313 bilhões mais os US$ 235 bilhões de dívida intercompanhias, mas esta não produz estresse porque é uma empresa devendo à sua matriz. De toda essa dívida, apenas US$ 72 bilhões são do governo central, que tem também os US$ 380 bilhões das reservas, por isso é credor — me disse o economista, numa entrevista após o programa.

Há um fator perturbador na conjuntura internacional, que está afetando o mercado de moedas, que é a crise entre EUA e China. José Márcio acha que este ponto é mais grave do que está sendo entendido.

— Acabei de voltar de uma viagem aos Estados Unidos e a percepção geral, não só dentro do governo americano, mas entre economistas e leigos, é que os chineses são desonestos do ponto de vista das relações comerciais com outros países. Trump é uma consequência desse sentimento. Existe uma percepção de que a China está em busca de hegemonia econômica e política no mundo. Esse conflito é mais sério do que uma guerra comercial.

Esse cenário torna o mundo potencialmente mais instável. Fernando Honorato também acha que a política de Trump é a causa hoje da instabilidade do dólar.

— A gente está tentando monitorar de onde vem essa volatilidade. Tem dois aspectos cruciais. Primeiro a política econômica dos EUA. Trump está fazendo uma série de medidas protecionistas, fechando uma economia com pleno emprego, e isso gera inflação. Na frente interna, acho que se deu pouca importância ao diferencial de juros. Diante da nossa incerteza fiscal, o diferencial de juros não paga o risco de manter recursos no Brasil.

Sobre o mercado de trabalho, José Márcio chama a atenção de que a Pnad, por ser uma média móvel, muda mais devagar do que o Caged que é mensal.

— No primeiro trimestre desse ano, pelo Caged foram gerados 200 mil empregos formais, e pela Pnad foram destruídos 400 mil empregos. Tem um problema aí, é que a Pnad carrega o número ruim por mais tempo porque é trimestral.

Fernando Honorato diz que no Departamento Econômico do Bradesco calcula-se que este ano serão criados entre 500 mil e 700 mil empregos formais.

— Ninguém está comemorando esse nível de desemprego. Ele está super elevado e ainda há o fenômeno do desalento.

A Selic e a inflação devem continuar muito baixas, segundo os economistas, e os juros menores vão elevar o ritmo de crescimento a médio prazo. O ritmo dependerá do cenário fiscal do país, que está ligado ao resultado das eleições.

(COM MARCELO LOUREIRO)


Samuel Pessôa: Indústria, causa do desenvolvimento?

Um tema recorrente no debate público brasileiro e na academia é a relação entre desenvolvimento econômico e especialização produtiva. Ou seja, um país é rico em função do que produz ou outros fatores são causa tanto do crescimento econômico como da especialização produtiva?

Recentemente meu colega José Luis Oreiro, professor da UnB (UNiversidade de Brasília), circulou um gráfico que indicava elevada correlação –por volta de 40%– entre renda per capita e sofisticação da produção.

Nota-se que a Austrália é um caso à parte: apesar de ser uma economia com baixa complexidade produtiva –segundo a base de dados do gráfico de Oreiro–, apresenta elevada renda per capita.

Será que Austrália é "a exceção que confirma a regra"? Nunca entendi essa expressão. Do ponto de vista lógico, se há uma única exceção, não há regra a ser confirmada.

O que há é confusão entre causalidade e correlação. Temos o famoso caso do biscoito Tostines: fresquinho porque vende muito ou vende muito porque é fresquinho?

O pensamento econômico latino-americano considera que a correlação observada –que está longe de ser tão elevada assim– entre complexidade produtiva e renda per capita significa causa.

Ou seja, políticas para subsidiar investimentos em setores complexos e que, portanto, alterem a especialização produtiva da economia produziriam crescimento.

Programas com a Lei de Informática na década de 1980, o programa de renovação da indústria naval e o programa Inovar-Auto, que subsidia uma indústria nascente há mais de 60 anos, têm como pressuposto essa lógica.

Todos são um rotundo fracasso.

É estranho que as mesmas pessoas que observam causa na correlação entre "complexidade produtiva" e renda per capita nunca enfatizam a correlação entre o desempenho do sistema público de educação dado pelo Pisa (Programa Internacional de Avaliação de Alunos), por exemplo, e o crescimento futuro das economias.

É razoável supor que um sistema de educação de elevada qualidade seja capaz de causar ambos: crescimento econômico e complexidade produtiva. Fato esse que será ainda mais verdadeiro se o país não for muito dotado em recursos naturais –pois, se assim for dotado, como é o caso australiano, haverá outras oportunidades de desenvolvimento econômico.

Adicionalmente, esse fato deve ser ainda mais verdadeiro se o país, além de ter um excelente sistema público de educação e de ser pobre em recursos naturais, possuir um setor público que gaste pouco com seguridade social –sendo, portanto, um país em que a carga tributária é baixa e a poupança das famílias é muito elevada.

Se o leitor lembrou do caso asiático (Japão, Coreia, Taiwan e China) não foi mera coincidência. Muita educação de qualidade –reduzindo o custo do trabalho qualificado– e muita poupança –o que reduz o custo do capital– estão na origem da complexidade produtiva.

Evidentemente, falar de escola e de poupança não é muito charmoso. Mais fácil ficar discutindo longamente sobre complexidade tecnológica e como temos que nos defender da exploração dos países centrais, ou qualquer outra bobagem conspiratória desse tipo.

O maior complexo de vira-lata é achar que o subdesenvolvimento não é responsabilidade nossa, mas sim fruto de algum mecanismo perverso de exploração das nações ricas.

 


Almir Pazzianotto Pinto

Almir Pazzianotto Pinto: Robotização e desemprego

Com a informatização, a globalização e o novelo trabalhista descobrimos a fórmula do fracasso

A recessão em que mergulhou a economia parece haver despertado a atenção para o problema do emprego. Emprego, aliás, não é problema, mas desemprego o é, e de gravíssima gravidade, como diria Ruy Barbosa.

Exceção feita a um ou outro momento de crise, durante décadas o Brasil conheceu a euforia do crescimento, com elevada capacidade de geração de vagas de trabalho. Nesse sentido, observou Mário Henrique Simonsen: “A feição mais surpreendente da inflação brasileira, no período pós-guerra, consiste na sua capacidade de ter coexistido, pelo menos até 1961, com uma elevada taxa de crescimento econômico. Com efeito, entre 1947 e 1961, não obstante a alta crônica dos preços, o produto real do País cresceu a uma taxa média de 5,8% ao ano – taxa das mais elevadas no cenário mundial do após-guerra. O produto real per capita expandiu-se, em média, de 3,0% ao ano – o que indiscutivelmente representa um ritmo de desenvolvimento econômico bastante satisfatório” (A Experiência Inflacionária no Brasil, Ed. Iepes).

Durante o governo do presidente Juscelino Kubitschek (1956-1961), a implantação da indústria automotiva, a construção de Brasília, a expansão dos sistemas de comunicação, a geração e distribuição de energia elétrica dinamizaram o incipiente parque industrial, proporcionaram a criação de milhões de empregos diretos e indiretos e fortaleceram o mercado consumidor.

Apesar da inflação, que foi de 12% em 1956, alcançou 40% em 1959 e retrocedeu a 30% em 1961, o Brasil permaneceu firme na rota do crescimento, que passou a ter na indústria automotiva o melhor dos instrumentos de aferição. Quem pesquisar os anuários editados pela Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) constatará o rápido aumento do volume de veículos fabricados e do número de empregados a partir de 1957, quando 9.773 trabalhadores produziram o total de 30.542 automóveis, caminhonetes, caminhões e ônibus. Em 2007, passados 50 anos, a produção alcançou o número de 2.980.163 unidades e a quantidade de empregos diretos atingiu 104.274.

A Revolução Industrial do século 18 teve na expansão do proletariado uma das condições essenciais de sucesso. A constante evolução dos equipamentos mecânicos, para atender ao rápido crescimento da demanda, exigia, em quantidade sempre maior, a energia do trabalho humano.

Ao longo de décadas avaliava-se o sucesso do empreendimento pelo número de contratações. O setor têxtil, o primeiro a ser beneficiado com a invenção de máquinas revolucionárias, requeria elevado contingente de operários, operárias e aprendizes, submetidos a condições degradantes.

Decorrido pouco mais de um século, Valéry Giscard d’Estaing, presidente da França, percebeu que algo de inusitado ocorria no mundo industrial. Em dezembro de 1976, interessado em conhecer a nova realidade, ordenou ao inspetor-geral das Finanças, Simon Nora, a apresentação de relatório sobre o que denominou informatização da sociedade. No ofício que lhe endereçou, escreveu: “O desenvolvimento das aplicações da informática é um fator de transformação econômica e social e do modo de vida; convém que a nossa sociedade esteja em condições, ao mesmo tempo, de o promover e de o controlar para colocá-lo a serviço da democracia e do desenvolvimento humano”.

O desemprego é fruto perverso de vários fatores. Não se trata, como poderia parecer, de filho exclusivo da recessão. Para ele contribuem, além da engenharia da informática, também conhecida como robotização, a globalização, o descalabro administrativo causado pela incompetência lulopetista e a arcaica, emaranhada e questionada legislação trabalhista, na qual incluo as Normas Regulamentadoras do Ministério do Trabalho e Emprego.

A rápida automação responde por parte considerável do problema, pois o desemprego que causa é irreversível. Volto a me referir à indústria automotiva, que em 2016, com o mercado em queda livre, fabricou 2.157.379 veículos com 104.414 empregados, produzindo 20,67 veículos por empregado (em 2013 conseguiu 27,6). Dito de outra forma, com a robotização a indústria reduz trabalhadores para fabricar maior número de produtos.

Em entrevista ao Estadão (1.º/1/2017) o presidente da Volkswagen, David Powels, relatou que a empresa, “após ver sua participação no mercado despencar nos últimos anos”, passou por “reestruturação dura, mas necessária”. Em seguida, afirmou: “Hoje temos 18 mil trabalhadores (nas quatro fábricas). Há dois anos eram 22 mil. São 4 mil a menos, mas todos saíram por meio de programas de demissão incentivada”. Para ser competitiva a Volks não admitiu, como faria no passado, simplesmente dispensou. É o que hoje todos fazem: as empresas reduzem o número de assalariados para eliminar despesas obrigatórias como horas extras, INSS, FGTS e adicionais diversos, evitar ações trabalhistas, afastar greves, melhorar resultados de produtividade.

O desemprego tecnológico está em toda a economia: construção civil, sistema financeiro, indústrias de transformação. Adicionando-se à informatização a globalização e o indecifrável novelo trabalhista, descobrimos a fórmula infalível do fracasso.

Quem padeceu sob a inflação galopante não deseja revivê-la. Não é disso que falo, mas da necessidade de maior liberdade para que o mercado volte a funcionar. O intervencionismo excessivo é prejudicial para as relações de trabalho. Como está não podemos permanecer. O desempregado não dispõe de recursos para esperar. O caminho para o revigoramento do mercado de trabalho passa pela reforma trabalhista. Não qualquer reforma, mas aquela que garanta segurança ao investidor.


* Advogado, foi ministro do Trabalho e presidente do Tribunal Superior do Trabalho

David Kupfer: A indústria ainda é aquela

A pesada queda sofrida pelo nível de atividade industrial em agosto último, que foi 3,8% menor do que o do mês anterior, virtualmente anulou toda a recuperação que a indústria havia acumulado em 2016. Esse resultado tão negativo, surpreendente somente para as Polianas de plantão, é revestido de importante caráter didático. O problema econômico brasileiro está longe de ser eminentemente expectacional.

Claro que alterações no estado de confiança dos tomadores de decisão de produção e investimento são variáveis de grande relevância na determinação das perspectivas da economia. Mas o Brasil de hoje está muito menos parecido com um mar de oportunidades enevoado por um quadro expectacional cinzento do que com um deserto de novos e bons projetos provocado pelas toneladas de areia que graves distorções estruturais estão colocando nos motores da economia.

Se é correto que a estagnação da economia brasileira tem origem primariamente estrutural, a solução não estará ao alcance de medidas que simplesmente tenham o dom de convencer investidores reticentes a reencontrarem o espírito animal perdido. Terá de vir de políticas que proporcionem a retirada das amarras ao processo de investimento, reabrindo um horizonte de atratividade econômica para as empresas. Daí a importância crucial de se entender a dinâmica (ou a falta de) recente da formação de capital na economia brasileira, visando identificar onde estão as principais travas.

Sob a ótica da demanda, os números que descrevem a contribuição dos seus componentes para a variação do Produto Interno Bruto durante o último ciclo de crescimento (2004-2010) mostram com clareza o papel fortemente dinamizador exercido pela formação de capital fixo.

Com a exceção de 2009, ápice da crise financeira global, a contribuição desse componente se elevou ano após ano no período até atingir 3,4% em 2010. Isso correspondeu a quase a metade da variação do PIB nesse ano, que foi de 7,5%, e quase igualou a contribuição dada pelo consumo das famílias, que foi de 3,9%, mesmo tendo esse último um peso no produto três vezes maior. Esse dado é importante para desmistificar uma ideia muito difundida, embora muito pouco verdadeira, de que a economia brasileira teria experimentado um puro ciclo de consumo nos anos de expansão da década passada.

Com a chegada de 2011, as tensões e dilemas que vinham marcando o processo de retomada econômica no Brasil começaram a aflorar. No plano internacional, o mergulho da Eurozona sinalizava que a recuperação da economia mundial não viria como resultado das medidas monetárias tomadas pelos bancos centrais líderes. No Brasil, o sucesso das políticas anticíclicas adotadas após a crise de 2008 levou a um paradoxo fundamental: como prosseguir com essas políticas anticíclicas na arquitetura de um modelo de estabilização tão procíclico como o do Tripé Macroeconômico adotado pelo país. Evidentemente, a corda iria arrebentar para algum lado. E arrebentou para o lado da robustez macroeconômica, fazendo do investimento o grande perdedor de longo prazo.

Sob a ótica da oferta, o ciclo anterior de expansão (2004-2010) ocorreu em meio a um quadro muito favorável de preços internacionais dos bens commodities nos quais a economia brasileira é relativamente especializada, que pode ser atribuído, de forma simplificada, ao chamado efeito China que preponderou nesses anos. Mas a expansão dos serviços, especialmente comércio, transportes, e serviços prestados às famílias, também constituiu uma fonte dinâmica tão ou mais relevante, como consequência do efeito renda que se estabeleceu no mercado interno.

A contribuição da indústria manufatureira (não-commodities) foi minimizada pelo “vazamento” para fora decretado pela perda de competitividade relativa trazida pelo período muito longo de apreciação cambial conjugado à estagnação da produtividade e forte ampliação dos custos sistêmicos da produção.

Com o esgotamento do ciclo anterior que se dá a partir de 2011 teve lugar uma reviravolta. Ao invés de premiar, os mercados internacionais de commodities passaram a penalizar a economia brasileira enquanto o dinamismo dos serviços, totalmente dependente que era do efeito renda, literalmente evaporou. Projeções que se possam fazer para frente indicam ser inevitável que, sem o impulso da demanda, os preços dos serviços acabem cedendo como, aliás, a despeito das defasagens, vem sendo gradualmente captado pelos índices de inflação. Mais cedo ou mais tarde, essa trajetória de queda de preços irá disparar um intenso processo de aumento da produtividade dos serviços, que implicará novas tensões sobre a economia brasileira.

A saída da crise, quando vier, vai envolver, necessariamente, a viabilização de novos blocos de investimento. E onde estarão essas oportunidades? Não é preciso ter uma bola de cristal para responder que uma parcela importante virá da infraestrutura. Mas há um outro bloco de investimentos, talvez menos visível, que poderá vir exatamente do processo de modernização dos serviços acima discutido. Ambos acarretam um crescimento da importância da indústria no fornecimento de insumos intermediários e bens de capital mais sofisticados que serão necessários.

Daí decorre uma conclusão cristalina. Dificilmente a retomada virá sem que se recomponha o papel indutor da indústria como motor do crescimento. Mas atenção: será uma nova indústria. E é exatamente nas políticas voltadas para a promoção dessa nova indústria que está a saída. (Valor Econômico – 10/10/2016)

David Kupfer é diretor do Instituto de Economia da UFRJ e pesquisador do Grupo de Indústria e Competitividade (GIC-IE/UFRJ). Escreve mensalmente às segundas-feiras. E-mail: gic@ie.ufrj.br.


Fonte: pps.org.br