governo bolsoanro

Celso Ming: PIB em boa recuperação

Fator positivo inesperado foi o aumento da poupança, o pedaço da renda não consumido, na participação do Produto Interno Bruto

Foi bom, vá lá… Não foi uma grande vitória, mas foi uma vitória, especialmente quando seu resultado é comparado com o que se esperava no início da crise. O avanço do Produto Interno Bruto (PIB) no terceiro trimestre do ano (sobre o anterior) foi de 7,7%, um pouco menor do que tinha sido cravado na expectativa dos analistas.

É um número que parece graúdo, mas não deve enganar. Foi medido sobre uma base anterior muito baixa e ainda não pode ser tomado como garantia de que haverá uma recuperação firme nos trimestres seguintes.

Baseou-se no consumo turbinado pelo auxílio emergencial que distribuiu mais de R$ 275 bilhões para 68 milhões de beneficiários. Não foi possível contar com o avanço da agropecuária, o setor campeão deste ano, porque o terceiro trimestre coincide com a entressafra. Fator positivo inesperado foi o aumento da poupança, o pedaço da renda não consumido, na participação do PIB. Deveu-se ao comportamento mais conservador do consumidor, que temeu por dias piores e entendeu que devesse guardar algum dinheiro para enfrentar dias ruins.

Para fugir da crítica de uma análise excessivamente focada pelo espelho retrovisor, convém avaliar o que vem pela frente. O fator mais positivo é a perspectiva de vacinação. O ritmo de distribuição da vacina no Brasil deverá ser inferior ao de muitos países avançados por conta da política negacionista e confusa sobre os efeitos da pandemia mantida até aqui pelo governo federal. Mas, já no primeiro trimestre do ano que vem, haverá progresso, com forte impacto sobre o setor produtivo e, também, sobre o consumo.

Outro fator positivo para a economia brasileira é a melhora da economia mundial. Além de providenciar vacinação em massa, os governos das grandes potências continuam empenhados em investimentos destinados a destravar a economia.

O novo governo Biden, nos Estados Unidos, anunciou um programa robusto de infraestrutura. E os grandes bancos centrais seguem com políticas monetárias (políticas de juros) frouxas para evitar restrições ao crédito.

Mas essa não é toda a história, pelos enormes riscos que estão logo aí, a começar pela desorganização das contas públicas. O governo federal continua sem planejamento claro sobre como resolvê-la. Esse é o principal fator que deverá impedir a distribuição de mais parcelas do auxílio emergencial. Também não está claro como o governo pretende tocar as reformas tributária e administrativa.

Essas omissões são fontes de incertezas que seguram os negócios, os investimentos e a criação de empregos, num cenário já minado por nada menos que 14,1 milhões de desempregados e pelo menos outros tantos de subempregados.

Resumo da ópera: a queda do PIB em todo este ano ultraproblemático pode ficar um pouco aquém dos 4,5% agora projetados.

E, para 2021, já há quase certeza de bom crescimento da renda nacional. Mas é preciso um pouco mais de quilometragem rodada para ter uma boa ideia de suas proporções.


Míriam Leitão: O PIB sobe e fica devendo

O dado de crescimento de 7,7% no terceiro trimestre é bom, mas veio abaixo do esperado por bancos, consultorias e até pelo governo. Houve um aumento forte da poupança e isso pode ajudar a recuperação nos próximos meses. O problema da economia é que neste quarto trimestre aumentou a intensidade da pandemia, foi reduzido o valor do auxílio emergencial e ele vai desaparecer no fim do ano. Outro problema é que não voltamos ao ponto de antes da queda. O PIB ainda ficou devendo.

Apesar de o dado ter vindo abaixo do esperado, quase nada mudou na visão dos economistas. Como houve a revisão para melhor na série pelo IBGE, o entendimento é que tudo veio de acordo com as projeções. Até no governo eu ouvi isso. “Como o IBGE melhorou os dados do segundo trimestre, de queda de 11,4% para queda de 10,9%, então no combinado nada muda e continuamos prevendo recessão de 4,5% em 2020”. O Itaú Unibanco espera que o quarto trimestre ainda tenha um crescimento de 2,9% sobre o trimestre anterior. Com isso, o carregamento estatístico para 2021 ficaria em 3,4%. Ou seja, mesmo que a economia fique parada ao longo de todo o ano que vem, estatisticamente, haveria essa alta forte sobre 2020. Já o Ibre FGV tem uma leitura mais conservadora, e acha que esse efeito será de 2%, porque o quarto trimestre será pior do que se previa , com o aumento das medidas de isolamento social.

Uma das apostas da equipe econômica é que a alta da poupança durante a pandemia sirva agora como um estímulo ao consumo. No terceiro trimestre, a taxa de poupança subiu a 17,3% do PIB, o maior percentual desde o terceiro trimestre de 2013. Esses recursos agora podem ser usados para a compra de bens e serviços, mantendo a atividade econômica aquecida. O governo acha que parte disso é poupança dos pobres que economizaram alguma coisa do auxilio emergencial, por outro lado, na classe média o medo do futuro, o risco do desemprego elevaram a propensão a poupar. Esse dinheiro poupado pode sustentar a demanda por bens e serviços e manter parte do crescimento futuro.

Mas não se pode subestimar a dimensão da crise econômica. O país acumula queda de 5%, a alta do terceiro tri atenua a queda da economia, mas os fatos recentes aumentam as dúvidas sobre o futuro.

O setor agropecuário é o único que fechará o ano positivo, mas teve uma queda no terceiro trimestre comparado ao segundo. “A expectativa é de um crescimento da agropecuária de 2,3%, muito abaixo dos 14,2% de 2017”, lembra a MB Associados. Mas, explica a consultoria, “o resultado efetivo do setor em 2020 é muito melhor do que o de 2017, com crescimento de mais de 20% na renda da agropecuária”.

Houve uma queda na construção civil, mas o setor está num bom momento, com produção de tijolos e cimento apresentando resultados positivos. Todos os segmentos do setor de serviço cresceram, mas, em parte, porque haviam caído demais. Destaque para o comércio, que cresceu 15,9%, um setor que no distanciamento social teve que inventar o caminho digital até o consumidor, apressando uma transição que pensou que teria tempo para fazer.

Os números parecem todos desencontrados, como a de uma economia que foi chacoalhada. A disparidade entre os setores é muito grande nesta recuperação, o que já havia sido alertado por vários economistas. Se a indústria cresceu 14,8% no terceiro trimestre, os serviços subiram bem menos, 6,3%, enquanto a agricultura surpreendeu negativamente, com uma queda de 0,5%. Até mesmo dentro de um mesmo setor, as velocidades foram muito diferentes. A indústria de transformação cresceu 23,7%, já a extrativa teve alta menor, de 2,5%. O comércio cresceu 15,9%, mas depois de três trimestres de queda. Os serviços financeiros subiram 1,1%, mas não tiveram recuo durante a pandemia.

Na equipe econômica trabalha-se com o cenário de que o distanciamento social está no fim e que isso permitirá a retomada da economia. Por isso, na visão da equipe, o auxílio não seria mais necessário. Mas o cenário que parece mais provável é o de que o novo crescimento dos casos de Covid-19 manterá a economia travada, e a oferta de emprego, muito abaixo do necessário. A taxa de desemprego deve subir até mais fortemente no começo do próximo ano.

O erro inicial do governo na economia foi não se preparar para o pior cenário. E o pior aconteceu. A resposta foi improvisada, com erros e atrasos. É fundamental que a área econômica saia desta segunda onda de negação. O Brasil está num momento de agravamento da doença e essa variável precisa entrar na equação do Ministério da Economia.


Janio de Freitas: A impunidade do governo está assegurada, protegida pelo esquecimento fácil

Tente encontrar um autor de monstruosidade que tenha sofrido consequências

Vida curta, umas 72 horas, a do escândalo de testes da pandemia entulhados em Guarulhos. O retorno das contaminações em massa deve-se, em parte, à baixíssima aplicação pública de testes. À falta de explicação, Bolsonaro recorreu à condição de farsante profissional e mentiu que “todo o material foi enviado aos estados e municípios”. Mas não faltaram crimes contra a saúde pública e de administração perdulária.

Sete milhões de testes PCR seguiam para o fim da validade em janeiro, sem se saber o número dos já perdidos, enquanto o Conselho Nacional de Secretários de Saúde repetia, em ocasiões sucessivas, o alerta ao Ministério da Saúde para a falta de kits do PCR, o mais eficiente, em vários estados. Os comunicados do CNSS derrubam outra mentira, esta do ministério, segundo a qual a distribuição dos kits dependia da requisição para estados e municípios.

A realização dos testes em massa, para identificação dos que contaminam sem se saberem doentes, é tida pelos cientistas como meio determinante para a contenção do número de vítimas e do descontrole de focos. Impedimentos anormais a esse procedimento têm autores que devem ser identificados em inquéritos e submetidos a processo.

Jogaram com vidas e mortes de pais, mães, filhos, com o futuro de famílias em número de precisão impossível, mas pressentido pelo senso comum.

Aqui, a impunidade está assegurada. E protegida pelo esquecimento fácil e rápido. Não à toa, o general-ministro Eduardo Pazuello diz que, se sair do Ministério da Saúde, estará feliz.

Nós também.

É a mesma certeza de impunidade que permite aos Bolsonaro, mais do que desconsiderar os interesses do país, agir contra eles. O ataque do deputado Eduardo Bolsonaro e do Itamaraty à China é um caso típico. Por trás desse e de outros ataques recentes, está o negócio imenso que é a adoção do novo e fantástico sistema de comunicação, chamado 5G.

Os Bolsonaro agem em favor do sistema americano, atrasado na tecnologia e no tempo em comparação com o chinês.

O interesse real do Brasil só pode ser o de possuir o melhor sistema, sendo essa inovação tecnológica vista como capaz de mudar a hierarquia atual dos países, a depender do sistema em uso e da capacidade de explorar seus recursos.

Escolhê-lo com segurança exige estudos rigorosos e uma concorrência perfeita na soberania brasileira, na seriedade e na transparência. Bolsonaro, porém, já avisou: “Quem vai escolher sou eu. Sem palpite aí”. Afinal de contas, ou a iniciá-las, esse negócio não é uma usual rachadinha, é um rachadão.

derrota de Trump lançou reflexos sombrios no assunto. A menos que haja como apressar alguma providência jurídica que amarre ou, no mínimo, encaminhe a decisão para o sistema americano, cria-se um problema para os propósitos de Bolsonaro. Fazer negócio com os Estados Unidos de Biden não será o mesmo que concretizá-lo com o país de Trump. Daí ser fácil deduzir que Eduardo Bolsonaro não fez aos chineses um ataque extemporâneo, que lhe deu na telha quebrada. Ao acusar a China de fazer do seu sistema um dispositivo de espionagem, precipitou sobre o 5G chinês um conceito corrosivo. E aproximou a escolha.

Manobra essa que agride o interesse do Brasil em preservar relações estáveis com a China, maior parceiro comercial e destino de um terço das exportações brasileiras, com tendência a aumento.

Para retaliar aos ataques constantes, à China bastaria cortar uma parte, uns 10% ou 15%, das importações. Criaria terremotos econômicos por aqui. E os produtores americanos estariam prontos, como estão ansiosos, para aumentar seu fornecimento dos mesmos produtos à China.

Eduardo Bolsonaro deveria ser submetido, no mínimo, a afastamento da Comissão de Relações Exteriores da Câmara e a processo disciplinar. Fica impune.

Como os que, no atual governo, agem contra os interesses do Brasil e as necessidades dos brasileiros.

Pense em qualquer dos autores e envolvidos nas monstruosidades do governo Bolsonaro, incluídas as do próprio, e tente encontrar, entre eles, um que tenha sofrido as consequências devidas.

É o governo das impunidades.


‘Brasil é destaque entre países com respostas tardias e insuficientes à pandemia’

Em artigo publicado na Política Democrática Online, Lígia Bahia e Mario Scheffer analisam comportamento do governo brasileiro na crise sanitária global

Cleomar Almeida, assessor de comunicação da FAP

Promessas não cumpridas, omissões e o reconhecimento da indisponibilidade de insumos estratégicos para o SUS (Sistema Único de Saúde) têm marcado a gestão do governo federal no combate à pandemia do coronavírus. A análise é da médica e professora adjunta da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) Lígia Bahia e do professor do DMP (Departamento de Medicina Preventiva) da FMUSP (Faculdade de Medicina da USP) Mario Scheffer, em artigo que produziram, conjuntamente, para a revista Política Democrática Online de novembro.

Clique aqui e acesse a revista Política Democrática Online de novembro!

A publicação é produzida e editada pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania. Todos os conteúdos da revista podem ser acessados, gratuitamente, no site da entidade. “A pandemia da Covid-19 e seus trágicos desdobramentos sanitários, políticos e econômicos concederam ao Brasil lugar destacado entre os países com respostas tardias e insuficientes à prevenção de casos e óbitos”, criticam os autores do artigo.

Lígia e Scheffer destacam que a demora e a desproporção entre a quantidade de recursos para rastreamento e tratamento de pacientes mobilizados e a magnitude da epidemia passaram a ser um problema em si. “Entre fevereiro e agosto de 2020, houve nítida mudança no conteúdo de pronunciamentos governamentais. No primeiro semestre, a preocupação com a ‘falta’ de leitos, equipamentos e testes competiu com debates em torno do uso ou não da cloroquina”, lamentam.

Em seguida, de acordo com os autores, o foco das atenções convergiu para o auxílio emergencial e para a abertura das atividades econômicas. Em maio de 2020, conforme eles lembram, três meses após o governo federal ter declarado o estado de emergência em saúde pública no Brasil, o SUS, os profissionais da saúde e a população diretamente afetada pela Covid-19 ainda conviviam, em muitas cidades, com problemas. “Grave insuficiência de leitos de internação, falta de médicos e de equipamentos de proteção individual para profissionais de saúde, assim como era precário o fornecimento de ventiladores e kits de testes diagnósticos”, afirmam.

Leia também:

Reforma administrativa para manter teto de gasto é desprovida de senso, diz José Luis Oreiro

‘Trump nega regras democráticas que funcionam há séculos’, afirma Paulo Baía

Nova onda de Covid-19 na Europa divide governadores no Brasil sobre volta às aulas

‘Precisamos de coalizão para enfrentar governança das polícias’, diz Luiz Eduardo Soares

‘Kassio Nunes não é um dos mais notáveis juristas brasileiros’, diz Murilo Gaspardo

Benito Salomão afirma que eleições 2020 podem iniciar fase melhor da vida política

Forças de oposição devem fortalecer leque de alianças para segundo turno das eleições

Rubens Ricupero avalia potencial de eleição de Joe Biden para mudar o mundo

Política Democrática Online destaca coalizão para reforma estrutural nas polícias

Confira aqui todas as edições da revista Política Democrática Online


Reforma administrativa para manter teto de gasto é desprovida de senso, diz José Luis Oreiro

Em artigo que publicou na Política Democrática Online de novembro, professor da UnB analisa proposta em tramitação

Cleomar Almeida, assessor de comunicação da UnB

O professor do Departamento de Economia da UnB (Universidade de Brasília) José Luis Oreiro afirma que “a realização de reforma administrativa com o objetivo de preservar o teto de gastos parece ideia desprovida do mínimo senso de realidade”. A análise consta de artigo que ele produziu para a revista Política Democrática Online de novembro, produzida e editada pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira), sediada em Brasília. Todos os conteúdos da publicação podem ser acessados, gratuitamente, no site da entidade.

Clique aqui e acesse a revista Política Democrática Online de novembro!

No debate econômico brasileiro atual é crescente o consenso de que não é possível manter o Teto de Gastos, que, conforme lembra Oreiro, estabelece o congelamento dos gastos primários da União em termos reais até 2036, devido ao crescimento dos gastos com Previdência Social a um ritmo de 3% ao ano, mesmo após a reforma da previdência, realizada em 2019. “O que levará a um esmagamento progressivo das despesas discricionárias como, por exemplo, os gastos com investimento público e com o custeio de Saúde e Educação”, avalia o autor.

No artigo publicado na revista Política Democrática Online de novembro, o professor da UnB observa que o elevado nível de desemprego da força de trabalho combinado com alta ociosidade da capacidade produtiva na indústria exige aumento expressivo da demanda agregada, o que, segundo ele, nas condições atuais, só pode ocorrer por intermédio do investimento público. “O que esbarra nas limitações legais ao aumento de gasto público imposto pela EC 95”, escreve.

De acordo com Oreiro, um dos principais problemas da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 32 é que acaba sendo vazia, já que, ele diz, deixa para regulamentar o essencial posteriormente. Estes são os casos de definição de quais serão as carreiras típicas de Estado, os critérios de avaliação de desempenho e as novas formas de acesso ao serviço público, tanto quanto a política remuneratória e de benefícios percebidos pelos servidores, as regras para a ocupação de cargos de liderança e assessoramento e a progressão e a promoção funcionais que serão tratados por projeto de lei complementar.

“Outro ponto crucial é que a reforma proposta deixa de fora as maiores fontes de distorções no serviço público – os militares, os juízes e membros do Ministério Público, e os parlamentares”, critica, para acrescentar: “No caso dos militares, parece que até obterão ganhos com essa reforma, ao poderem acumular determinados cargos (docência e empregos na saúde, sob certas condições), o que é explicitamente facultado no novo texto”.

Leia também:

‘Trump nega regras democráticas que funcionam há séculos’, afirma Paulo Baía

Nova onda de Covid-19 na Europa divide governadores no Brasil sobre volta às aulas

‘Precisamos de coalizão para enfrentar governança das polícias’, diz Luiz Eduardo Soares

‘Kassio Nunes não é um dos mais notáveis juristas brasileiros’, diz Murilo Gaspardo

Benito Salomão afirma que eleições 2020 podem iniciar fase melhor da vida política

Forças de oposição devem fortalecer leque de alianças para segundo turno das eleições

Rubens Ricupero avalia potencial de eleição de Joe Biden para mudar o mundo

Política Democrática Online destaca coalizão para reforma estrutural nas polícias

Confira aqui todas as edições da revista Política Democrática Online


‘Trump nega regras democráticas que funcionam há séculos’, afirma Paulo Baía

Em artigo publicado na Política Democrática Online de novembro, sociólogo diz que comportamento de Bolsonaro é ‘espelho’ de presidente dos EUA

Cleomar Almeida, assessor de comunicação da FAP

Eleição norte-americana escancarou o negacionismo de Donald Trump e, por tabela, do presidente Jair Bolsonaro, avalia o sociólogo e cientista político Paulo Baía, em seu artigo na revista Política Democrática Online de novembro, em que analisa o bolsonarismo na visão de Jairo Nicolau, autor do livro O Brasil dobrou à Direita. “Em tempos de negacionismo, a maior democracia mundial vive momentos em que o poder nas mãos de um populista de extrema-direita questiona o sistema eleitoral, negando as regras democráticas do país, que funcionam da mesma forma há séculos”, criticou o autor do artigo.

Clique aqui e acesse a revista Política Democrática Online de novembro!

A revista Política Democrática Online é produzida e editada pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira), sediada em Brasília. Todos os conteúdos podem ser acessados, gratuitamente, no site da entidade. Em sua análise, Baía chamou o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) de “espelho ao Sul da América do Sul” de Trump. “[Bolsonaro] deixa de ser representante de uma nação para virar cabo eleitoral e torcedor fervoroso daquele que acredita ser seu amigo”, observou.

Na avaliação do cientista político, o interessante é que o atual presidente da República do país representante da liberdade, garantidor dos valores liberais e iluministas é aquele que deseja ser reeleito no tapetão, suspendendo a contagem de votos dos que não votaram nele. “É o retrato da negação. Nas terras de cá, negam-se os mais de 14 milhões de desempregados, o aumento da pobreza extrema, a crise fiscal por causa da pandemia, a inflação nos produtos da cesta básica por conta do aumento do dólar e o empresariado preferindo vender para o mercado externo do que o interno, diminuindo a oferta e aumentando a procura”, afirmou Baía.

O sociólogo disse, ainda, que “todos os graves problemas por que passa o Brasil são reflexos de uma disputa partidária, criados pelos adversários para roubar seu poder”. No artigo, ele lembrou que o professor de ciência política Jairo Nicolau acabou de lançar o livro O Brasil dobrou à Direita. Nesta obra, ele compila uma série de dados do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

“Cruzando dados como idade, gênero, religião, educação etc., o pesquisador chega a conclusões muito interessantes sobre os eleitores de Bolsonaro”, afirmou, para continuar: “Ele foi o primeiro candidato que rompeu a ideia de que, para vencer, o presidente precisa de uma máquina eleitoral. Bolsonaro foi o preferido nas três faixas de ensino: fundamental, médio e ensino superior. Em 2018, foi a primeira vez em que o fator gênero se fez presente”.

Bolsonaro também foi o preferido de 2 a cada 3 homens, batendo o adversário em 10% a mais. E teve, respectivamente, 53% votos das mulheres e 64% dos homens; já Haddad obteve 47% dos votos dos homens e 36% das mulheres. “Outro fator diz respeito ao cruzamento entre dados de homens e instrução: Bolsonaro ganhou em todos os níveis de ensino, todavia, quanto maior a instrução, menor a aceitação”, acentuou.

Leia também:

Nova onda de Covid-19 na Europa divide governadores no Brasil sobre volta às aulas

‘Precisamos de coalizão para enfrentar governança das polícias’, diz Luiz Eduardo Soares

‘Kassio Nunes não é um dos mais notáveis juristas brasileiros’, diz Murilo Gaspardo

Benito Salomão afirma que eleições 2020 podem iniciar fase melhor da vida política

Forças de oposição devem fortalecer leque de alianças para segundo turno das eleições

Rubens Ricupero avalia potencial de eleição de Joe Biden para mudar o mundo

Política Democrática Online destaca coalizão para reforma estrutural nas polícias

Confira aqui todas as edições da revista Política Democrática Online


Nova onda de Covid-19 na Europa divide governadores no Brasil sobre volta às aulas

Reportagem especial da Política Democrática Online de novembro mostra situação em cada Estado no país

Cleomar Almeida, assessor de comunicação da FAP

Ao menos 16 redes públicas estaduais de ensino retomaram parte das aulas presenciais ou têm previsão de retorno às salas de aula, ainda em 2020, oito meses após o fechamento das escolas por causa da pandemia do novo coronavírus, em março deste ano. O risco de a segunda onda de Covid-19 chegar ao país aumenta o alerta para governadores.

Em outros oito estados, governadores já se posicionaram pela volta das atividades escolares presenciais somente no ano que vem. No Distrito Federal e em Minas Gerais, professores, sindicatos, governos e Ministério Público travam briga até na Justiça para o retorno das aulas nas escolas.

Clique aqui e acesse a revista Política Democrática Online de novembro!

O sinal verde para a volta às aulas tem como parâmetro portaria do Ministério da Educação (MEC) publicada em julho e que define diretrizes para a retomada das atividades presenciais. Entre elas, está a obrigatoriedade do uso de máscaras, distanciamento social de 1,5 metro e afastamento de profissionais que estejam em grupos de risco. No entanto, governos estaduais e municipais têm autonomia para definição do calendário pedagógico a fim de reorganizar as aulas nas escolas.

Nos estados que já reabriram as salas de aula gradativamente, as escolas devem seguir uma série de protocolos sanitários estabelecidos em portarias dos governos e continuarem oferecendo ensino a distância aos alunos que optarem por essa modalidade. Nessa lista estão Acre, Alagoas, Amapá, Amazonas, Ceará, Espírito Santo, Pará, Paraná, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, São Paulo, Sergipe e Tocantins.

Em geral, os governadores sustentam suas decisões na diminuição do número de casos de Covid-19 nos respectivos estados. As estruturas hospitalares emergenciais passaram a ser desmobilizadas. Dos leitos clínicos e de UTI do Sistema Único de Saúde (SUS) abertos a partir do início da pandemia, 65% já foram fechados. Por outro lado, o Brasil é o segundo país com mais mortes – atrás dos Estados Unidos – e o terceiro com maior quantidade de contaminações registradas – atrás dos Estados Unidos e da Índia.

A segunda onda de Covid-19 na Europa é um alerta importante aos governadores que decidiram optar por cautela e autorizar retorno às aulas presenciais somente em 2021 ou após a confirmação de uma vacina para imunizar a população. Nesse grupo, estão Goiás, Maranhão, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Pará, Paraíba, Rio Grande do Norte e Roraima. Bahia e Rondônia ainda não firmaram posição sobre o assunto.

Leia também:

‘Precisamos de coalizão para enfrentar governança das polícias’, diz Luiz Eduardo Soares

‘Kassio Nunes não é um dos mais notáveis juristas brasileiros’, diz Murilo Gaspardo

Benito Salomão afirma que eleições 2020 podem iniciar fase melhor da vida política

Forças de oposição devem fortalecer leque de alianças para segundo turno das eleições

Rubens Ricupero avalia potencial de eleição de Joe Biden para mudar o mundo

Política Democrática Online destaca coalizão para reforma estrutural nas polícias

Confira aqui todas as edições da revista Política Democrática Online


'Precisamos de coalizão para enfrentar governança das polícias', diz Luiz Eduardo Soares

Em entrevista à Política Democrática Online, ex-secretário Nacional de Segurança Pública afirma que ditadura reordenou instituições

Cleomar Almeida, assessor de comunicação da FAP

Ex-secretário Nacional de Segurança Pública, Luiz Eduardo Soares diz que polícias militares são refratárias à democracia, em entrevista exclusiva à revista Política Democrática Online de novembro, produzida e editada pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira), sediada em Brasília. “Nós precisaríamos de uma grande coalizão e entender a necessidade de enfrentar a questão da governança das polícias e do que eu chamei um enclave institucional, alterando posturas do Ministério Público, da Justiça”, disse.

Clique aqui e acesse a revista Política Democrática Online de novembro!

Todos os conteúdos da revista são disponibilizados, gratuitamente, no site da FAP. Soares é um dos 579 alvos de um dossiê elaborado pelo Ministério da Justiça do governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), a partir do monitoramento secreto de um grupo descrito como “militantes antifascistas”. O entrevistado também é escritor, dramaturgo, antropólogo, cientista político e pós-doutor em Filosofia Política.

Soares tem proposto debates sobre segurança pública, polícias e justiça criminal no Brasil há mais de 30 anos. Na opinião dele, a transição para a democracia no Brasil não foi completa porque as polícias militares mantiveram-se no tempo da ditadura e são agentes na desigualdade e no racismo estrutural que ainda assola o país, diariamente.

De acordo com a entrevista concedida à revista Política Democrática Online, há um legado à democracia de estruturas organizacionais forjadas na ditadura. “A ditadura não inventou a violência policial, as práticas conhecidas e nem as instituições como as conhecemos, mas as reordenou, reorganizou e qualificou”, disse. ‘Qualificar aqui tem sentido negativo e problemático. Essas instituições reformadas, reorganizadas e retemperadas pela ditadura, instituições muito problemáticas que têm passado obscurantista, autoritário, que dialogam com o pior da nossa tradição escravagista, foram legadas pela ditadura acriticamente, por assim dizer”, lamentou.

Soares tem vinte livros publicados, como “Elite da Tropa” (com André Batista e Rodrigo Pimentel), editado em 2006 pela Objetiva, “Elite da Tropa II” (com os mesmos coautores e Claudio Ferraz), publicado pela Nova Fronteira, em 2010, “Espírito Santo” (com Rodney Miranda e Carlos Eduardo Ribeiro Lemos), editado pela Objetiva, em 2008, além de “Rio de Janeiro; histórias de vida e morte”, publicado em 2015 pela Cia. das Letras, e os romances “Experimento de Avelar”, premiado pela Associação de Críticos Brasileiros em 1996, e “Meu Casaco de General”, este, finalista do Prêmio Jabuti em 2000. Foi professor da Unicamp e do IUPERJ, além de visiting scholar em Harvard, University of Virginia, University of Pittsburgh e Columbia University.

Leia também:

‘Kassio Nunes não é um dos mais notáveis juristas brasileiros’, diz Murilo Gaspardo

Benito Salomão afirma que eleições 2020 podem iniciar fase melhor da vida política

Forças de oposição devem fortalecer leque de alianças para segundo turno das eleições

Rubens Ricupero avalia potencial de eleição de Joe Biden para mudar o mundo

Política Democrática Online destaca coalizão para reforma estrutural nas polícias

Confira aqui todas as edições da revista Política Democrática Online


‘Kassio Nunes não é um dos mais notáveis juristas brasileiros’, diz Murilo Gaspardo

Em artigo que publicou na revista Política Democrática Online de novembro, doutor em direito pela USP mostra proximidade do novo ministro do STF com o Centrão

Cleomar Almeida, assessor de comunicação da FAP

Diretor da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da Unesp (Universidade Estadual Paulista) Câmpus de Franca (SP), Murilo Gaspardo diz que é “controversa” o nome indicado para a escolha do substituto do ministro Celso de Mello, que se aposentou, ao STF (Supremo Tribunal Federal). “Embora Kassio Nunes preencha os requisitos constitucionais para a indicação e tenha trajetória respeitável, certamente não é um dos mais notáveis juristas brasileiros”, criticou, em artigo que produziu para a revista Política Democrática Online de novembro.

Clique aqui e acesse a revista Política Democrática Online de novembro!

Todos os conteúdos da publicação, produzida e editada pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira), podem ser acessados, gratuitamente, no site da entidade. Livre-docente em Teoria do Estado pela Unesp e doutor em Direito do Estado pela USP (Universidade de São Paulo), Gaspardo a posição política que orienta a interpretação constitucional do indicado, conservadora, não é um problema intrínseco, mas, conforme analisa, o caminho de sua escolha.

Isto porque, de acordo com o autor do artigo, a escolha de Nunes passa pela sua proximidade com o Centrão, e as especulações de que seja parte da estratégia para blindar o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e seus familiares das investigações e dos processos criminais em curso não condizem com os princípios republicanos. ‘Soma-se a isso o fato de o Senado não ter exercido a contento seu papel constitucional no processo de aprovação da nomeação”, afirmou Gaspardo.

Na análise publicada na revista Política Democrática Online de novembro, o analista ressaltou que a questão não é a decisão favorável, mas, de acordo com ele, a não realização de uma arguição pública digna desse nome, que exigisse minimamente a demonstração pelo indicado de seu notável saber jurídico e de sua orientação na interpretação constitucional.

Segundo Gaspardo, é necessário aguardar o início do exercício de suas funções pelo novo ministro para saber se o fará de forma autônoma, bem como se a afirmação do presidente de acordo com a qual ele está “100% alinhado” é restrita à posição conservadora, ou também compreende um alinhamento pessoal, portanto, não republicano.

Leia também:

Benito Salomão afirma que eleições 2020 podem iniciar fase melhor da vida política

Forças de oposição devem fortalecer leque de alianças para segundo turno das eleições

Rubens Ricupero avalia potencial de eleição de Joe Biden para mudar o mundo

Política Democrática Online destaca coalizão para reforma estrutural nas polícias

Confira aqui todas as edições da revista Política Democrática Online


El País: Com menção a pólvora e maricas, Bolsonaro desvia atenção do desemprego e acusação contra seu filho

Foi mais um dia marcado pelas palavras do presidente, que pisou no acelerador, possivelmente com os olhos voltados para o primeiro turno das eleições municipais do próximo domingo

Naiara Galarraga Gortázar, do El País

presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, lançou mão de um comentário homofóbico como fez tantas vezes ao longo de sua carreira política. Nesta terça-feira foi para se queixar da crise do coronavírus, de como está sendo administrada e da atenção midiática que recebe. “Temos que deixar de ser um país de maricas”, disparou durante uma cerimônia no Palácio do Planalto, em Brasília. Bolsonaro, conhecido negacionista da gravidade da doença, governa um dos países mais afetados do mundo, com 162.000 mortos e a caminho dos seis milhões de infectados. O mandatário populista dinamitou durante o dia a tônica dos últimos meses em que reduziu a frequência de suas típicas grosserias: comemorou a suspensão do teste clínico da vacina chinesa, insultou homossexuais, pela primeira vez se referiu a Joe Biden desde as eleições nos EUA, mas não para cumprimentá-lo, e gabou-se do poder de dissuasão militar diante dos EUA.

Foi mais um dia marcado pelas palavras do presidente, que pisou no acelerador, possivelmente com os olhos voltados para o primeiro turno das eleições municipais do próximo domingo. Bolsonaro é um artista que desvia a atenção dos problemas relevantes como o desemprego, a inflação ou a recém-formalizada acusação de corrupção contra o filho mais velho. Fica incomodado que o coronavírus ainda esteja no centro do debate político porque é um campo em que seu principal rival, João Doria, se movimenta bem.

Nenhum dos dois é candidato às eleições para prefeitos e vereadores, mas cada um apoia um candidato em São Paulo, a cidade mais rica e populosa do Brasil, onde o homem do presidente, Celso Russomanno, está bem atrás do atual prefeito nas pesquisas, Bruno Covas, apoiado por Doria.

Bolsonaro presidia uma solenidade no Palácio do Planalto sobre a necessidade de reativar o turismo, moribundo por causa da pandemia, quando deu renda solta à sua exasperação: “Tudo agora é pandemia. Tem que acabar com esse negócio, pô. Lamento os mortos, lamento, mas todos nós vamos morrer um dia. Não adianta fugir disso, da realidade. Temos que deixar de ser um país de maricas e enfrentar isso de peito aberto, lutar”, disse Bolsonaro, um paraquedista militar aposentado que construiu sua carreira política como um dos políticos mais medíocres, mas provocadores, do Congresso. O atual presidente ganhou fama há muitos anos por seus elogios à ditadura, além de seus insultos machistas e homofóbicos.

O governador de São Paulo aproveitou a crise sanitária para se destacar entre os vários aspirantes a candidato às presidenciais de 2022. Doria apostou na ciência desde o início da pandemia e sua prioridade agora é a vacina chinesa produzida pela Sinovac em colaboração com Instituto Butantan. É por isso que a recente suspensão do teste dessa vacina por parte do Governo, em uma decisão cercada de suspeitas, é um revés para Doria que Bolsonaro comemorou com entusiasmo como uma vitória pessoal.

O chamado Trump dos trópicos também aproveitou para romper o silêncio sobre a vitória de Biden sobre o Trump verdadeiro, aliado e candidato preferido do brasileiro. Bolsonaro não mencionou o democrata pelo nome, referiu-se a ele como “um grande candidato a chefe de Estado”. Criticou as propostas do próximo presidente dos EUA de liderar um fundo de financiamento para preservar a Amazônia –que o Brasil considera um ataque frontal à sua soberania– e, diante de hipotéticas sanções comerciais, exibiu poder de dissuasão: “Apenas na diplomacia não dá. Porque quando acaba a saliva, tem que ter pólvora, senão não funciona. Precisa nem usar pólvora, mas tem que saber que tem”, declarou o capitão.

Entre os graves problemas que o presidente quer afastar dos holofotes está o desemprego, que ronda os 14 milhões, incluindo um milhão de pessoas acrescentadas no último trimestre. Embora o Brasil tenha melhores perspectivas econômicas do que a maioria de seus vizinhos e o fluxo de dinheiro público para os bolsos dos brasileiros tenha mitigado o impacto, a pandemia interrompeu os ambiciosos planos econômicos. As reformas previstas avançam em passo de tartaruga. O próprio ministro da Economia, Paulo Guedes, se diz frustrado por não ter conseguido privatizar uma única empresa pública em dois anos de mandato. E também existe o caso de corrupção contra o senador Flavio Bolsonaro. O filho mais velho do presidente acaba de ser formalmente acusado pelo Ministério Público de peculato, de ter aumentado o seu patrimônio em um milhão de reais graças ao desvio de fundos públicos no Rio de Janeiro.

As eleições de domingo não servirão para saber com precisão se o bolsonarismo goza de boa saúde porque o presidente está há meses sem partido e seus aliados estão espalhados em uma infinidade de siglas. Será mais fácil avaliar a situação do Partido dos Trabalhadores de Lula.


Rosângela Bittar: Alma Gêmea

Guedes incorporou o raciocínio confuso, a linguagem agressiva e até os trejeitos do chefe

Noves fora a pandemia, o ministro Paulo Guedes e a economia estão na berlinda e inspiram as previsões de mudanças importantes no governo no início do novo ano. Enfrentar seu jogo é para os fortes, pois tem reflexos no câmbio, na bolsa, na inflação, na dívida. No entanto, para explicar o que acontece com o laureado economista, cujo poder declina, recorre-se apenas a uma anedota: Instrutor infiel aconselhou seu aprendiz de hipnose a fazer, como dever de casa, treinamento com os peixes, diante de um desses imensos aquários de parque turístico. Preocupado com a demora, o professor foi atrás e encontrou-o em transe, olhos fixos, lábios em bico, abrindo e fechando a boca, em estado de respiração mecânica. Em vez de hipnotizar, fora hipnotizado.

Eis a questão. Admitido para ser contraponto e conselheiro técnico do desaparelhado presidente Jair Bolsonaro, Guedes se fundiu a ele e se perdeu junto. O temperamento e a impertinência, já os possuía ao chegar. Em menos de dois anos, porém, incorporou o raciocínio confuso, a linguagem agressiva, a interpretação distorcida da realidade e até os trejeitos do chefe. Tornou-se sua alma gêmea.

Não se está falando só das já folclóricas gafes que tanto poderiam ilustrar a biografia de um como do outro. Quem não se lembra das empregadas domésticas e a Disneylândia? E a dos funcionários públicos, os “parasitas”? Aquelas do uso dos precatórios como orçamento e da taxação do seguro desemprego, deslizes técnicos engavetados, candidatos à ressurreição. Tem a última, a de ter medo de ser derrubado por “lobby da Febraban”. E as penúltimas, dos nazistas, da volta do AI 5, dos insultos à mulher do presidente da França…

Mas há também o traço de caráter, a preferência pelo conflito, a soberba, a falta de disposição e competência para o diálogo com o Congresso Nacional e com o Supremo Tribunal Federal. Bem como dificuldades extremas na relação com os ministros em particular. Tal e qual. Nas instâncias da economia, existia relativa confiança no que poderia fazer Guedes neste governo. Uma certeza é que teria coerência com as ideias liberais que sempre defendeu. Iria impor uma certa visão de necessários privatização e equilíbrio fiscal. Sua capacidade executiva não esteve em dúvida. Saberia, ainda, reunir pessoas adequadas a cada tarefa, suprindo suas fragilidades.

Nada, porém, encontrou no perfil de quem lhe serviu de espelho. A maioria das expectativas restaram frustradas, com duas exceções, uma em equipe, outra em resultados da política econômica: O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, e a reforma da Previdência. Campos tem uma agenda própria e a está cumprindo. A reforma da Previdência, Guedes encontrou-a pronta, depois de 20 anos de discussão, e a recebeu resmungando pela ausência da capitalização, uma de suas obsessões à época.

De outra obsessão, a CPMF, imposto mundialmente considerado um lixo, não desiste, embora tenha sido a razão de seu fracasso na reforma tributária. Preparou uma reforma administrativa megalômana, proibitiva para um presidente em permanente campanha de reeleição. Suas propostas na área fiscal foram desprezadas, até o momento. Como Bolsonaro, Guedes faz recuos temporários e estratégicos. Como Bolsonaro, recuos e avanços numa mesma frase: vai ter, não vai ter!

Previstos na lei do teto e da responsabilidade fiscal, os gatilhos empacaram nas divergências internas. O teto é, por sinal, o tema preferencial da disputa interna de poder. Apenas discursiva, sem consequência, pois ninguém sabe o que fazer.

Não há propostas para sair da crise que o governo imaginava fugaz. Aprofundou-se a dívida. Vem aí a segunda fase da pandemia. Bolsonaro vai segurar o teto? Guedes tem solução para não deixá-lo desabar? Até a próxima conferência do ministro. Até o próximo comício do presidente.


Catarina Rochamonte: A Constituinte do centrão

Em uma de suas frases acerbas a respeito da nossa Carta de 1988, Roberto Campos a descreve como "saudavelmente libertária no político, cruelmente liberticida no econômico, comoventemente utópica no social." Essa é, de modo geral, a visão liberal acerca da atual Constituição. Reavaliá-la deve estar no horizonte político, e o Congresso guarda poder para modificá-la através de emendas.

Embora seja possível uma nova Constituinte, ela configura uma ruptura com a ordem em vigor e normalmente resulta de lutas sociais, revoluções ou golpes de Estado. Pode resultar também de um descarado oportunismo político, como é o caso do projeto que o líder do governo, Ricardo Barros, pretende submeter ao Congresso no sentido de viabilizar um plebiscito para uma nova Constituinte. Felizmente a proposta está sendo amplamente repudiada.

Tentando evitar desgastes ao governo, o general Mourão disse que a ideia de Barros foi um "voo solo". Não convence. O líder de Bolsonaro é um dos ases do fisiologismo político e sempre vai por onde sopra o vento coletivo do centrão. Em seguida, veio o próprio Barros dizer que errou "em não consultar o governo antes". Convence menos ainda. Até porque ele continua a tocar o projeto sem nenhum óbice por parte do presidente.

O interesse da Constituinte disparatada é a impunidade. A questão crucial dos políticos fisiológicos que controlam o Congresso é impedir que políticos corruptos sejam investigados e presos: "estancar a sangria", como revelou lá atrás Romero Jucá.

A construção da impunidade dos grandes, coisa que chamam de "governabilidade", é a razão de ser do centrão, tão bem representado pelo líder Ricardo Barros. Tal estratégia é uma questão de sobrevivência, pois o centrão abriga uma variada gama de políticos sob investigação judicial, denunciados, réus; alguns presos.

Mas eles nem precisavam se arriscar em uma proposta tão ousada quando a impunidade já vai indo tão bem na atual conjuntura política.

*Catarina Rochamonte, doutora em filosofia, autora do livro 'Um olhar liberal conservador sobre os dias atuais' e presidente do Instituto Liberal do Nordeste (ILIN)