gasoduto
Míriam Leitão: Nova aposta no setor de gás
Três pequenos gasodutos mudariam totalmente a oferta de gás no país, se fossem construídos. Na conta dos grandes consumidores dessa energia, a nova lei permitirá essas obras e o estímulo à importação de gás natural liquefeito (GNL). Com isso, a oferta no país cresceria até 60%, derrubando os preços. As distribuidoras têm uma visão mais cautelosa. Alegam que a lei tem avanços, mas o cenário mudou com a pandemia. O relator da proposta na Câmara, deputado Laércio Oliveira (PP-SE), defende seu texto, que seria, em sua opinião, resultado de meses de debates, e admite que novos aprimoramentos podem ser feitos depois da aprovação do projeto de lei (PL).
Olhar todos os lados em qualquer tema ligado à energia demanda paciência. O ministro Paulo Guedes havia dito há mais de um ano que tudo seria fácil, mas as complicações sempre aparecem. Agora, contudo, há muita gente animada. Neste novo marco do gás, que vai substituir o de 2009, as apostas são mais favoráveis. O PL, por exemplo, recebeu o apoio de mais de 60 associações ligadas ao setor industrial, que é o grande consumidor desse tipo de energia.
— No curto prazo, a nova lei facilita a importação de gás liquefeito (GNL), que está com preços baixos internacionalmente, e três pequenos gasodutos podem aumentar bastante a oferta. Isso deve ajudar a diminuir os preços. Mas a grande diferença acontecerá quando o pré-sal aumentar a produção, daqui a quatro ou cinco anos, e esse PL prepara o país para esse momento — explica Adrianno Lorenzon, gerente de gás natural da Associação Brasileira dos Grandes Consumidores de Energia (Abrace).
Um dos principais pontos do PL é a mudança do regime de concessão para o de autorização. No modelo atual, a agência reguladora elabora o projeto, faz uma licitação e abre para consulta pública. Os especialistas afirmam que nos últimos 13 anos nenhum gasoduto foi construído, por causa do excesso de burocracia. Agora, partirá da empresa privada provocar a agência reguladora, que irá fazer a análise para autorizar ou não as obras. Outra mudança apontada como importante é a obrigação de as companhias — entenda-se Petrobras — compartilharem toda a sua infraestrutura com outras empresas, em caso de subutilização. A ideia, explica o relator do projeto, Laércio Oliveira, é que haja competição em todos os elos da cadeia.
— A agência reguladora terá mais poderes para atuar na sua área de competência. Hoje, a Petrobras vende o gás por um preço fechado. Esse valor compreende parcelas como o custo do gás natural na cabeça do poço, o custo de fazer o escoamento até a costa e o custo de tratamento. O objetivo é que cada etapa desse processo tenha seu preço aberto e haja competição entre os agentes de cada elo da cadeia — disse.
O Brasil hoje consome 80 milhões de m3 de gás por dia, e pelas contas da Abrace mais 50 milhões podem entrar no sistema por aqueles três pequenos trechos: a construção da Rota 3, que vai interligar o pré-sal e a Bacia de Campos ao Comperj, um gasoduto no Porto do Açu, no Rio, e outro no Terminal de Sergipe. Isso poderia ser feito até o final do ano que vem.
— Em Sergipe, o gás chega de navio e fica armazenado em um terminal de gás liquefeito. Apenas um terço desse gás é consumido pela termelétrica de Porto de Sergipe. A ideia é construir um pequeno gasoduto que conecte esse terminal à malha, e com isso o gás excedente possa chegar rapidamente às regiões Sul e Sudeste do país — explica Adrianno Lorenzon.
Há visões divergentes. Na opinião da Abegás e do consultor Adriano Pires, do CBIE, o projeto de lei avança pouco e foi elaborado antes da pandemia, quando o setor de óleo e gás vivia outro momento. Pires argumenta que os investimentos só vão deslanchar se houver garantia de aumento da demanda. Por isso, defende que o PL estabeleça que as termelétricas a gás entrem na base do sistema elétrico, ou seja, que garantam um consumo fixo do produto. O deputado Laércio discorda. Acha que isso é papel da agência reguladora e não deve ser objeto desse projeto de lei.
Há um ano, o setor comemorava um Termo de Compromisso de Cessação (TCC) estabelecido entre o Cade e a Petrobras. Na época, se dizia que era o início do fim do monopólio da empresa. De lá para cá, pouca coisa andou, e a petrolífera foi notificada no final de julho por um possível descumprimento de regras. Agora, as esperanças se voltam a este novo PL do gás.