flávio dino

El País: 'Bolsonaro busca a polêmica para disfarçar a incopetência', diz Flávio Dino

O governador do Maranhão, um comunista com peso político superior ao que lhe confere seu Estado, surge como uma das vozes alternativas da esquerda brasileira

Naiara Galarraga Gortázar, El País

O governador do Maranhão, Flávio Dino (São Luís, 52 anos), tem uma presença no debate nacional brasileiro muito acima do que indicaria o peso real desse pequeno estado litorâneo, muito desigual, situado no extremo leste da Amazônia Legal. Juiz e deputado antes de romper, há seis anos, a hegemonia da oligarquia local, combina sua filiação ao Partido Comunista do Brasil (PCdoB) com um esquerdismo pragmático e a fé católica. Dino recebeu este jornal no impressionante palácio do governador, em sua cidade natal, momentos depois da posse de Joe Biden nos Estados Unidos. Falou de Bolsonaro, da pandemia, da Amazônia... Só tirou a máscara para posar rapidamente para as fotos.

Pergunta. Como um governador comunista convive com um presidente de extrema direita?

Resposta. É uma relação difícil porque tem a diferença político-ideológica e, neste caso, há uma singularidade. Bolsonaro é uma figura que prioriza o confronto, é o que integra sua identidade política desde a origem. Ele busca sempre uma polêmica até para disfarçar as suas incompetências. A convivência é muito difícil com todos os Estados. É o período da nossa história em que há o maior afastamento entre o Governo federal e os Governos estaduais de um modo geral.

P. O senhor afirmou em seu Twitter que “o fim do Governo Trump é (...) um anúncio da alvorada que virá no Brasil”. Acredita que isso influenciará tanto nas possibilidades de reeleição de Bolsonaro?

R. É um fator que amplia o isolamento de Bolsonaro. Ele já tem muitas dificuldades no cenário internacional. Trump era, praticamente, seu único aliado e agora ele ficou totalmente sem apoio. Em um mundo interconectado, esse isolamento acaba sendo um problema maior do que seria 200 anos atrás. Vemos consequências em vários âmbitos. Um Governo isolado tem muita dificuldade em encontrar saídas para problemas que transcendem as fronteiras nacionais. Os fluxos de comércio, a temática ambiental e a da saúde pública em um contexto de pandemia são temas que ultrapassam as fronteiras do país, então obviamente as soluções são supranacionais. Quando você tem um Governo que pratica e se orgulha do isolamento, isso implica em dificuldades práticas, como estamos vendo agora com as vacinas.

P. Como Maranhão está se organizando em relação à vacina?

R. Desde o início da pandemia, tivemos a criação de uma novidade, que é uma diplomacia dos entes subnacionais. Tradicionalmente, quem faz relações internacionais é a esfera Federal, não a estadual. Ocorre que por conta desses fatores, o Governo Federal deixou uma lacuna que tem que ser preenchida de algum modo. Desde o início da pandemia procuramos compensar isso. Isso se deu com os respiradores, por exemplo, e com insumos de um modo geral. Agora todos nós estamos procurando saídas que complementem o programa nacional [de imunização]. Mas, até agora o mercado está realmente muito difícil. Os países produtores de insumos e vacina estão priorizando as suas próprias nações. Não vislumbro que consigamos, a curto prazo, vacinas por vias próprias. Não descartamos nenhuma vacina. Temos dialogado muito com a Pfizer também, mas na medida em que o Governo brasileiro não se interessou pelas vacinas da Pfizer, isso dificultou o acesso dos Estados. E esse foi um dos grandes erros do Governo Federal: ele deveria ter ao menos oferecido aos Estados. Eu teria comprado uma parte, outros também. E hoje nós teríamos uma conjugação de esforços entre a esfera federal e estadual.

P. O fim do auxílio emergencial para atenuar os efeitos da pandemia é outro problema grave. Agora toda a pressão recairá sobre os Estados e municípios. Como enfrentará essa situação?

R. É um problema muito profundo. Além de a probreza extrema se configurar ainda mais nitidamente, temos também o fato de que pessoas serão excluídas do mercado de consumo e isso repercute na criação de empregos. É um erro monumental terminar o auxílio emergencial. Se ele foi criado para mitigar os efeitos da pandemia e ela continua tão viva quanto está, não há razão material para extingui-lo. Acredito que a responsabilidade fiscal não pode caminhar separada da responsabilidade social. São dois pilares de um bom Governo. Só existe equilíbrio fiscal quando existem também compromissos sociais, pois isso explode de algum jeito, inclusive do ponto de vista fiscal. Se as pessoas não comem, elas adoecem. Você tira a despesa do auxílio emergencial e objetivamente joga em outras políticas públicas, como o próprio sistema de saúde. O certo seria prorrogar a ajuda até meados deste ano, quando acredito que veremos os efeitos da vacinação. Mas temos que procurar, de algum modo, diminuir o desastre. Não tenho um Banco Central, não emito moeda, não posso contrair dívida, então a margem de manobra fiscal é muito menor. Tenho procurado adotar políticas para determinados públicos. Implementamos um auxílio para os catadores de resíduos sólidos, desde abril distribuímos mais de 300.000 cestas básicas para famílias e vou lançar um cheque de 600 reais [pagamento único] para que algumas famílias possam comprar produtos para permitir algum tipo de consumo, para ajudar o comércio. E fizemos um plano de obras públicas de 559 milhões de reais. São ações de reduções de danos.

P. Como presidente do consórcio de governadores da Amazônia legal o senhor tem medo que Biden faça pressão comercial para que o Brasil mude sua política ambiental?

R. É um risco. Temos uma preocupação global justa. Mas há também outros interesses que se manifestam e que se aproveitam da temática ambiental. Sabemos que a agricultura brasileira enfrenta dificuldades desde que o Bolsonaro assumiu porque ele liberou geral na questão ambiental, chancelou políticas de desmatamento e de queimadas ilegais. No cenário internacional, os concorrentes do Brasil podem querer se aproveitar. Isso tudo se junta com o isolamento do Brasil, um país que não tem hoje alianças. E isso compõe um cenário de muita fragilidade. Na esfera internacional, mais importante do que punir o Brasil é fortalecer os esforços de quem quer proteger a Amazônia, por exemplo, o consórcio de governadores da Amazônia, que tem uma posição diferente daquela do Governo Federal. Há muito pluralismo político-partidário no consórcio, mas todos concordam que é negativa para o Brasil essa ideia de que não existe lei ou controle na Amazônia. Os grandes produtores do Mato Grosso, que faz parte da Amazônia Legal, sabem que o risco de sanções internacionais é grave. Biden falou de um fundo de 20 bilhões de dólares. Ótimo. Quer constituir um fundo internacional, que envolva, inclusive, capitais privados? O consórcio tem todo interesse nisso. Esse fundo poderia servir para o pagamento de serviços ambientais porque isso vai viabilizar que comunidades sejam financiadas, que se ofereça práticas alternativas para que as pessoas vivam sem devastar a floresta.

P. Será possível forjar uma frente ampla de oposição a Bolsonaro para as eleições presidenciais de 2022?

R. Acredito que num primeiro momento teremos uma ou duas candidaturas mais para a esquerda, e candidaturas mais a centro-direita. Estamos vivendo um processo interessante que é a eleição da Mesa da Câmara dos Deputados em que se formou uma frente ampla em torno de Baleia (Rossi), que é do MDB, de centro-direita, mas que praticamente toda a esquerda está apoiando. Isso sinaliza um momento diferente. Há dois anos, na eleição da Mesa da Câmara, apenas nosso partido na esquerda apoiou Rodrigo Maia. E fomos muito criticados. A história mostrou que estávamos certos porque Maia, que não é da esquerda, foi muito importante na contenção dos intuitos golpistas e ditatoriais de Bolsonaro. É um sinal positivo de que mesmo que no primeiro turno você não tenha uma união ampla, no segundo é possível. É uma mudança qualitativa importante. Todos em torno da compreensão de que o Brasil, a Amazônia, não aguenta mais quatro de Bolsonaro.

P. O que o senhor tem de comunista?

R. É claro que o conceito de comunismo e socialismo não é o mesmo do século XIX. O mundo não é mais o mesmo e a temática do trabalho é diferente. Costumo dizer no PCdoB que o símbolo da foice e do martelo não expressa mais o mundo do trabalho. Não se tem mais uma classe operária como se imaginava no século XIX porque se tem uma economia de outro feitio. O fator de distinção [da esquerda] é como você lida com a desigualdade. Não se pode tratar a desigualdade como algo inevitável, natural. Por isso me considero de esquerda, porque sou um militante contra as injustiças sociais e acredito que o papel do Estado e das políticas públicas é insubstituível para corrigir uma tendência do mercado de concentração de riqueza na mão de poucos. Não é eliminar o mercado. E essa é outra distinção importante do nosso pensamento em relação à esquerda clássica.


Merval Pereira: Um outro lado

Flávio Dino acha que, se a eleição fosse hoje, o centro político ganharia, diferentemente do que aconteceu na eleição que Bolsonaro venceu

A visão do governador do Maranhão, Flavio Dino, de que a eleição municipal pode se transformar, pelo menos nas capitais, num plebiscito sobre o governo Bolsonaro, sem necessariamente significar com isso que a esquerda possa ser considerada vencedora, mostra bem a abertura política de seu pensamento.

Ao falar ontem na live promovida pelo Centro Brasileiro de Relações Internacionais (CEBRI) em uma grande concertação das lideranças nacionais a favor da democracia, mostrou-se respeitoso em relação ao ex-presidente José Sarney, principal líder político maranhense cujo grupo derrotou nas eleições de 2014 e 2018, depois de décadas de prevalência sarneysista no Estado.

O governador Flávio Dino colocou Sarney como presença certa na mesa de negociações, juntamente com outros ex-presidentes da República, dando a seu adversário político regional a dimensão nacional que tem e a que ele, Dino, pode ser alçado como expoente da nova esquerda nacional, que se desvincula da relação carnal com o PT que marcou a trajetória do PC do B até a eleição de 2018, quando apoiou Fernando Haddad.

O petismo, no entanto, não pretende abrir mão da parceria com o PC do B, mais especificamente de Flavio Dino, a quem o líder petista José Dirceu já atribui o papel de vice-presidente “numa chapa imbatível” com o petista governador da Bahia Rui Costa na cabeça da chapa, naturalmente.

Dino não renega o PT, e atribui a uma tática momentânea de Lula a recusa de fazer parte de uma grande aliança de forças de oposição a Bolsonaro. Mas deixa claro que a coligação automática com o PT não são favas contadas na eleição de 2022. Se a eleição fosse hoje, ele acha que o centro político ganharia, diferentemente do que aconteceu na eleição que Bolsonaro venceu.

Não se refere ao Centrão parlamentar, mas a um grupo heterogêneo, que representa a maioria hoje no país, que a esquerda deveria procurar para acordos eleitorais, pelo menos nos segundos turnos das eleições municipais este ano e, quem sabe, na de 2022.

Que, aliás, Dino não tem certeza se ocorrerão no prazo certo, e se ocorrerão. Não falou explicitamente, mas estava se referindo à possibilidade de um impeachment ou até mesmo da impugnação da chapa presidencial pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Ele se disse “preocupado” com a situação política, e não menosprezou a força dos bolsonaristas, lembrando que esse radicalismo de direita tem raízes fortes no país. As relações externas do Brasil no governo Bolsonaro, por exemplo, ele considera desastrosas, fugindo à tradição de multilateralismo do Itamaraty.

Criticou a submissão aos Estados Unidos, inclusive abrindo mão de relações proveitosas com a China, nossa principal parceira comercial. Chamou atenção especialmente para nossas exportações agropecuárias, que estão prejudicadas pela questão ideológica, não apenas políticas, mas também ambientais.

O governador do Maranhão considera um erro grave dos militares (não todos, ressalva) colocarem-se como parte do governo Bolsonaro, pois, na sua visão, as Forças Armadas têm que estar fora de governos, como organizações de Estado e, por isso, permanentes, longe das disputas políticas. Muito mais quando a relação dos Bolsonaro com a milícia vai ficando evidente.

No plano econômico, definiu como equívocos ideológicos considerar que o Estado tem que ser o principal responsável por tudo, e também os que defendem que os mercados, por si sós, resolverão todos os problemas.

Numa visão muito próxima da social-democracia, Flávio Dino quer o investimento privado impulsionando o crescimento econômico, mas com o Estado direcionando esses investimentos com uma visão social.

Compreende o papel da livre iniciativa no capitalismo, e a considera indispensável, mas lembrou a importância do SUS na atual pandemia para dizer que, se não fosse a estrutura pública montada a partir da Constituição de 1988, teríamos tido muito mais problemas, pois o sistema privado de saúde não pode dedicar seus esforços prioritários onde não há lucro, como no caso dos leitos de UTI para tratamento da Covid 19.


Folha de S. Paulo: Prefiro Huck dialogando comigo do que com Bolsonaro, diz Flávio Dino

Governador do MA vê 'conjuntura de trevas' e quer frente de esquerda e centro para eleições

Thais Arbex, da Folha e Constança Rezende, do UOL

BRASÍLIA- Empenhado em construir uma frente ampla, que reúna a esquerda e partidos de centro, o governador do Maranhão, Flávio Dino (PC do B), diz que, hoje, "ninguém tem força hoje para conter, sozinho, essa avalanche que está aí".

Segundo ele, para que a esquerda vença as eleições, é preciso "sentar com quem pensa diferente de você". "E não tem nada de pecaminoso."

Por isso, o governador, que se define como um "militante antibolha", diz preferir o apresentador Luciano Huck dialogando com ele do que com o presidente Jair Bolsonaro.

"O Brasil vive uma conjuntura de trevas. Nós temos uma ameaça objetiva à vida democrática, à dissolução da nação. O nazismo está entronizado como política de Estado daqui e de acolá. O vídeo desse secretário [Roberto Alvim] não é algo isolado. É preciso ter responsabilidade", afirmou ao programa de entrevistas da Folha e do UOL, em estúdio compartilhado em Brasília.

Dino se refere ao vídeo com referências ao nazismo protagonizado pelo então secretário e que levou à sua demissão.

"Eu tenho responsabilidade com o Brasil e, por isso mesmo, não fico olhando preconceitos e rótulos, porque eu sei o tamanho dessa ameaça. O que estou procurando fazer é não deixar essa tal dessa bolha se cristalizar. Isso seria ruim para o Brasil."

DEMISSÃO DE ROBERTO ALVIM
É importante assinalar que o episódio traz uma conquista civilizacional e democrática importante.

Por outro lado, é também importante destacar que a demissão do secretário é insuficiente, na medida em que não houve a revogação da concepção que embasou os anúncios que foram feitos pelo próprio presidente da República.

É fundamental que, em complemento a essa necessária atitude de demissão do secretário, que fez, na prática, apologia de um dos piores momentos da história da humanidade, haja também a revisão da política cultural no sentido de que ela não seja extremista, não seja excludente, não seja ontologicamente violenta.

FABIO WAJNGARTEN
Nós temos claramente uma situação em que há uma confusão entre o papel próprio do agente público e transações no mercado. E isso não é possível porque distorce um dos valores da nossa Constituição, que é a chamada livre concorrência.

Ora, se você tem um agente público comprometido com algumas empresas, naturalmente isso significa dizer que há objetivamente, independentemente de intenções, uma política de favorecimento de uns e prejuízos a outros.

Ou ele se livra das empresas privadas, hipótese número um, deixa de atuar no mercado diretamente ou por interposta pessoa, ou sai do governo.

O que não pode é ter a chamada porta giratória, em que o mesmo cidadão ora está dentro ora está fora.

Na medida em que até o presente momento, após a revelação dos fatos, não houve nenhuma atitude por parte de quem deveria tomar, no caso o presidente da República, é que claro que pode se configurar uma conivência com uma prática ilegal.

RELIGIÃO E POLÍTICA
A religião é algo positivo para a sociedade, é algo inerente à vida humana, desde os seus primórdios.

Eu, particularmente, tenho a minha crença religiosa e a prático e a defendo, mas claro que não é possível, em nome da chamada laicidade do Estado, que eu transforme a minha concepção religiosa em uma imposição para as outras pessoas.

Por isso, a laicidade é um mecanismo de proteção da liberdade religiosa de todos os cidadãos e de todas as igrejas.

O que estamos vendo é uma fronteira sendo ultrapassada na medida em que, por parte de alguns segmentos extremistas, há uma ideia de colonização da esfera pública por concepções religiosas unilaterais. Isso acaba sendo antidemocrático e uma violação à liberdade religiosa.

UM COMUNISTA NA PRESIDÊNCIA
Os mesmos que diziam que eu não posso concorrer à Presidência pelo PC do B são aqueles que achavam que eu jamais seria governador do Maranhão pelo PC do B.

E nós vencemos duas eleições em primeiro turno em um estado em que tive apoio de católicos, evangélicos e outras religiões. Está muito longe de ser uma verdade objetiva que isso constitui um obstáculo, e eu já testei empiricamente.

Não é verdade, nos dias de hoje, que o PC do B seja um partido antirreligioso.

Se hoje, lamentavelmente, esse preconceito ainda é repetido é por um terrível eco das heranças ditatoriais que o Brasil infelizmente carrega.

São os ecos do Doi-Codi, da Operação Bandeirante e da tortura que fazem com que esse preconceito seja alimentado. Mas ele é destituído de base objetiva.

FRENTE AMPLA
O que eu tenho defendido com a ideia da Frente Ampla é a compreensão de que, quando você está num quadro de defensiva estratégica, que é o que nós vivemos em 2013, e mais acentuadamente desde o impeachment, você tem de reunir forças para retomar as condições de apresentar o seu programa, transformá-lo [em] vitorioso e implementá-lo.

Quando você não consegue fazer isso sozinho, você busca alianças, como nós fizemos no Maranhão.

Eu reuni nove partidos em 2014 para enfrentar o político mais longevo da vida brasileira, o ex-presidente e ex-senador José Sarney [MDB].

E agora, [em 2018], para enfrentar a ex-governadora Roseana Sarney [MDB], reunimos 16 partidos exatamente porque reconhecemos que era necessário reunir forças para continuar mudando a realidade do nosso estado.

Às vezes, a gente fica preso a rótulos e esquece o conteúdo. Nós temos que olhar o conteúdo e, no conteúdo, é claro que eu vejo uma ameaça, minha gente.

O Brasil vive uma conjuntura de trevas. Nós temos uma ameaça objetiva à vida democrática, à dissolução da nação.

O nazismo está entronizado como política de Estado daqui e de acolá.

LULA
É a maior liderança popular da vida brasileira. Você pode fazer cem pesquisas e, em cem pesquisas, dará o ex-presidente Lula [PT] como, se não o melhor na visão de alguns, como um dos três melhores presidentes da vida brasileira.

Não é pouca coisa, é muita coisa. E ele está vivo. Graças a Deus.

É claro que o meu campo político se referencia na liderança do ex-presidente Lula, e por isso ele tem um papel muito grande, e espero que ele faça os movimentos necessários e cabe a ele, mais do que a mim ou qualquer outra pessoa, cabe a ele, sem dúvida, liderar esse rearranjo de forças.

2022
Só haverá uma chapa unificada [da esquerda] se a gente construir uma unidade desde já de outra forma. Não pode ser um processo atropelado em 2022.

Eu coloco como premissa, como pré-condição: nós temos que agora, em 2020, nas eleições municipais, atuar juntos no maior número de cidades quanto possível, seja em primeiro, seja em segundo turno.

Isso me refiro ao campo da esquerda, mas também à vertente liberal social-democrata da vida brasileira. Ou seja, em segundos turnos nós queremos o apoio do centro, e também apoiá-lo nas cidades em que ficarmos fora do segundo turno.

LUCIANO HUCK
Acredito que não há nenhum muro que deva ser visto como um intransponível. Agora, é preciso que as pessoas queiram.
E eu, particularmente, não tenho medo de crítica. Não preciso ficar disputando torneio de valentia.

Eu tenho coragem, tenho perspectiva, tem um lado, eu tenho seriedade, sei o que eu represento, o que eu defendo.

Sou militante da esquerda brasileira, defendo uma perspectiva social, os mais pobres, a soberania do país. Outras pessoas querem se somar a isso? É nosso papel trazer.

Eu prefiro Luciano Huck dialogando comigo do que dialogando com Bolsonaro.

Isso é elementar porque, se ele está dialogando com o outro campo, significa dizer que nós estamos alienando não apenas ele, mas, sobretudo, nós estamos afastando segmentos sociais que se sentem representados por ele.

Quando me reúno com o Fernando Henrique [Cardoso, ex-presidente], com o Luciano Huck, com o Rodrigo Maia [presidenta da Câmara e deputado pelo DEM-RJ], não estou reunido com o indivíduo. Estou mostrando que o segmento social que eu represento pode e deve dialogar com o segmento social que eles representam.

Eles possuem também legitimidade no jogo político e sempre foi assim. Não é hora de sectarismo.


O Globo: 'O centro é essencial para a esquerda em 2020', diz Flávio Dino

Membro do PCdoB acredita que polarização entre bolsonarismo e lulismo seguirá 'bastante viva' nas eleições deste

Rayanderson Guerra, O Globo

RIO - Filiado ao PCdoB e reeleito com uma aliança de 16 partidos, o governador do Maranhão, Flávio Dino, defende uma frente ampla para superar a polarização nas eleições municipais deste ano — ele projeta que a divisão entre o bolsarismo e o lulismo ficará "bastante viva" durante a disputa pela preferência dos brasileiros.

Em entrevista ao GLOBO, Dino também afirmou que ainda "há inúmeros caminhos a serem percorridos" até as próximas eleições presidenciais, em 2022, e explicou seu encontro com o apresentador Luciano Huck (a reunião gerou reação em setores da esquerda): "O fato de ele não integrar a esquerda não significa que não devemos dialogar".

Leia a entrevista completa abaixo:

Como será a atuação dos partidos de esquerda e do PCdoB nas eleições municipais deste ano?
A eleição de 2020 será um teste para todos os partidos porque será a primeira eleição na História sem coligações para vereadores. Claro que para os partidos que têm desempenhos eleitorais menores, o desafio é ainda maior. Nós estamos investindo em chapas próprias. De um modo geral, especialmente no Maranhão, eu vou participar e vou apoiar os candidatos do partido e das legendas aliadas, que no nosso estado são 16 (entre elas DEM, PT, PP, PR, Solidariedade e PRB). Nacionalmente, de acordo com as alianças que o PCdoB fizer, estou à disposição.

• Como não repetir o fracasso de 2018 nas urnas?
É fundamental que tenhamos espírito de humildade e de diálogo. Muita abertura para promover uniões entre o campo da esquerda, o campo progressista, e também alcançando forças políticas que estão externas ao nosso campo, como os setores liberais, chamados de partidos de centro. A meu ver, eles são essenciais para que a gente possa ter vitórias eleitorais importantes em 2020.

O antipetismo pode atrapalhar uma frente ampla?
As alianças partidárias e políticas são fundamentais porque são expressões de segmentos da sociedade. Quando você rejeita ou hostiliza partidos ou lideranças está, na verdade, hostilizando segmentos sociais que são representados por esses partidos. É evidente que você não pode perder identidade. Tem que ter identidade e lucidez programática. Com base numa identidade definida, quem quiser apoiar esse programa, no nosso caso, voltado ao combate de desigualdade, distribuição de renda e defesa dos direitos dos mais pobres, pode somar. Não vamos inverter uma situação de perda de espaço e transformar isso em um ciclo de novas vitórias se tivermos um sentimento isolacionista.

Como superar esse sentimento?
O ano de 2018, de fato, foi um momento muito difícil para o nosso campo político porque viemos de uma sequência de derrotas, sobretudo após a votação do impeachment da presidente Dilma (Rousseff). Houve uma sequência de dificuldades agudas, que já se manifestaram nas eleições de 2016, quando perdemos prefeituras importantes, a exemplo de São Paulo. O pior momento foi 2018. Minha expectativa neste ano é de recuperação. Nossos resultados eleitorais serão melhores do que o que tivemos na eleição municipal anterior. O desgaste do próprio governo Bolsonaro contribui para isso. Estamos chegando ao quinto ano que estamos fora do governo, desde o impeachment, e vemos que persistem problemas gravíssimos econômicos e sociais, a exemplo do desemprego.

Bolsonaro e Lula serão os principais cabos eleitorais desta eleição?
Sem dúvida, o bolsonarismo e o lulismo são correntes políticas hegemônicas na vida brasileira atualmente. A polarização do segundo turno das eleições de 2018 ficará bastante viva em 2020. É claro que são 5.570 cidades no Brasil e há também fatores locais. É da natureza da eleição municipal que esses fatores tenham predominância, mas, sobretudo nas grandes cidades, essa clivagem nacional terá grande relevância eleitoral.

O senhor se reuniu com o apresentador Luciano Huck. Há alguma perspectiva de aliança política?
Eu tive uma reunião com o Luciano Huck e gostei muito. Achei positiva a preocupação que ele tem de estudar os problemas do Brasil, refletir. Ele tem tratado muito sobre temas ligados ao combate à desigualdade. É claro que ele se situa em outro campo político. Não é um quadro, uma liderança, que busca se construir na esquerda. Mas o fato de ele não integrar a esquerda não significa que não devemos dialogar. Mantive essa reunião e vou continuar mantendo, como tenho quase semanalmente com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para troca de ideias. Devemos conversar com aqueles que neste momento nos ajudem na defesa do estado democrático de direito. Não houve nenhum tipo de debate com o Huck, nem da minha parte, nem da parte dele, sobre a eleição de 2022 por uma razão prática: estamos em 2020. Seria um debate destituído de objetividade, uma vez que daqui até lá há inúmeros caminhos a serem percorridos.

Setores da esquerda reagiram à sua reunião com Huck. O deputado Paulo Teixeira (PT-SP) afirmou que o senhor estará com Lula ou Haddad.
Eu prefiro o Luciano Huck conversando comigo do que conversando com o Bolsonaro. Sobre a declaração do deputado Paulo Teixeira, achei um gesto simpático, de respeito, amizade, até por causa da história de aliança que temos com o PT desde 1989, desde a primeira candidatura de Lula. É normal que o nosso candidato preferencial seja o PT, assim como outros partidos de esquerda como o PSB, o PDT. Defendo uma frente orgânica, uma reorganização da esquerda, e é claro que só é possível imaginar isso com o PT, jamais contra o PT, mas sem que haja uma imposição de liderança A ou B ou de partido A ou B.


Folha de S. Paulo: Sem Lula, PT, PC do B e PSOL devem apoiar Ciro, diz Dino

Para comunista, governador do MA, insistir em candidatura de ex-presidente é derrotismo

Por Thais Bilenky, da Folha de S. Paulo

SÃO LUÍS - Governador do Maranhão e aliado do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Flávio Dino (PC do B) defendeu que o seu partido, o PCdoB, e ainda o PSOL e o PT abram mão de suas pré-candidaturas para apoiar Ciro Gomes (PDT) na eleição para a Presidência da República.

Para Dino, a multiplicidade de candidaturas ameaça o seu campo político de perder já no primeiro turno. "Está chegando o momento de admitir uma nova agenda. Se não oferecermos uma alternativa viável, você pode perder a capacidade de atrair outros setores do centro que se guiam também pela viabilidade", disse na sexta (4), na sede do governo.

Segundo Dino, a união da esquerda hoje se daria em torno de Ciro, porque ele "é hoje e o melhor posicionado". Lula está inabilitado e "o PT não tem nome capaz de unir nesse momento", disse.

Sem Lula nas pesquisas de intenção de voto, entre os nomes identificados como de esquerda, o cearense é o que herda a maior parcela do eleitorado lulista —15% no cenário mais favorável medido pelo Datafolha em abril. Manuela D'Avila (PC do B) atrai 3% dos votos do ex-presidente.

Dino disse que a prisão de Lula é "muito dilacerante, muito traumática, uma tragédia política, a maior derrota da esquerda brasileira desde o golpe [militar] de 1964".

"É pior que o impeachment [da ex-presidente Dilma Rousseff (PT)] pelo simbolismo de o maior líder popular do país ao lado de Getulio Vargas está fora da eleição", afirmou.

Pela dramaticidade do episódio, argumentou, foi necessário a simpatizantes viver o "luto para processar a perda".

Agora, um mês depois, aproxima-se o momento de Lula e aliados admitirem que sua candidatura se tornou inviável e começarem a traçar estratégias para vencer a eleição. Do contrário, sustentou o governador maranhense, a divisão pode resultar em tragédia ainda pior, que seria a derrota para a direita.

"O ponto de interrogação que está dirigido sobretudo ao PT é se nós queremos uma eleição apenas de resistência, de marcar posição, eleger deputados, ou ganhar a eleição presidencial", disse. "Temos chance de ganhar, a eleição porque o pós-impeachment deu errado. O fracasso do Temer é o fracasso da alternativa que se gestou a nós."

Sem nominar, o comunista discordou da postura de setores do PT, inclusive da presidente do partido, Gleisi Hoffmann, de insistir na candidatura de Lula. "A tática de marcar posição é derrotista e não honra a importância do Lula, porque abre mão da possibilidade de haver uma virada geral na sociedade que possibilite julgamentos racionais dele", afirmou.

A possibilidade de aliança já para o primeiro turno divide o PT. O ex-prefeito paulistano Fernando Haddad sustenta a necessidade de diálogo entre setores de esquerda. O ex-ministro Jaques Wagner deu declaração simpática à possibilidade de o PT indicar um vice em chapa de Ciro. Gleisi contestou. "Mas ele não sabe que o Ciro não passa no PT nem com reza brava?", reagiu.

Fora do PT, a controvérsia se mantém. Aliado de Manuela, o deputado federal Orlando Silva (PC do B-SP) vê a hipótese de união com ceticismo.

"Ciro será candidato, o PT terá também. Boulos ficará na disputa. E ainda tem [o ex-ministro do Supremo Joaquim] Barbosa. Manuela traz frescor à disputa. É novidade, consistente. Não há motivos para não ser candidata", afirmou.

O presidente do PSOL, Juliano Medeiros, adota linha similar. "É necessário construir pontes entre partidos e setores sociais que estão preocupados com a escalada de ódio e intolerância", afirmou. "Mas a candidatura de Guilherme Boulos é indispensável ."