entrevista especial

'Não vejo o governo Bolsonaro capaz de se impor’, avalia Carlos Melo à Política Democrática online

Professor do Insper analisa política nacional e defende reforma da previdência justa, em entrevista da edição de dezembro da revista produzida pela FAP

Cleomar Almeida, assessor de comunicação da FAP

O cientista político Carlos Melo, mestre e doutor pela PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo), afirma que a deficiência do Executivo provocou uma transferência de poder para o Legislativo. “Não vejo o governo Bolsonaro capaz de se impor, de tomar a contento e moderadamente as rédeas do processo político”, destaca ele, em entrevista exclusiva concedida à revista Política Democrática online de dezembro. É gratuito o acesso a todos os conteúdos da publicação, no site da FAP (Fundação Astrojildo Pereira), que produz e edita a revista. “A grande incógnita é se o Congresso terá o tipo de liderança necessária, após a presidência de Rodrigo Maia”, acrescenta.

» Acesse aqui a 14ª edição da revista Política Democrática online

A FAP é vinculada ao Cidadania. Professor em tempo integral do Insper desde 1999, Carlos Melo é analista político com participação ativa em vários veículos de comunicação, palestrante e consultor de empresas nacionais e estrangeiras. Ele tem buscado contribuir com o debate político, econômico e social do Brasil por meio de uma análise conjuntural isenta e reflexão desapaixonada, conforme apresentado na revista Política Democrática online.

Na entrevista concedida ao consultor político e diretor da FAP Caetano Araújo, algumas reformas devem ser entendidas como clássicas e inevitáveis. “A reforma da previdência, uma reforma tributária, a questão do federalismo. Isso não tem a ver com direita ou esquerda, e o necessário ajuste deveria ser um ponto pacífico. Um imperativo”, afirma, para acrescentar: “Ninguém governa com desajustes fiscais. É necessária uma estrutura tributária que incentive a atividade econômica, senão não haverá emprego”, acentua.

Na avaliação do professor do Insper, a falta de líderes reflete na oposição ao governo Bolsonaro. “É preciso definir o que unifica a oposição. Qual é a pauta mínima para as oposições, no plural?”, questiona. “Eu diria que é a questão da democracia. Poderia haver também algum acordo em relação as reformas como a da Previdência”, avalia.

Colaborador de vários veículos de comunicação, é também colunista do UOL onde alimenta um Blog com análises a respeito da política brasileira (carlosmelo.blogosfera.uol. com.br), Melo é pesquisador de temas como eleições, partidos, conflito político e liderança política. “É imperativo uma reforma da previdência que seja justa e que envolva todos os setores da sociedade, que não proteja corporações; que não se volte apenas para o regime geral da previdência”, afirma.

 

Leia mais:

» ‘Governo Bolsonaro envenena o Brasil’, critica Randolfe Rodrigues à revista Política Democrática

» Brasil e Argentina têm nova tensão, explica Rubens Barbosa na Política Democrática de dezembro

» ‘Corrupção sistêmica mina instituições democráticas’, diz editorial da Política Democrática de dezembro

» Democracia está sob risco, destaca revista Política Democrática de dezembro

» Veja aqui todas as edições anteriores da revista


Revista Política Democrática || Entrevista Especial - A democracia no Brasil está sob risco, avalia Carlos Melo

Cientista político e professor do Insper, Carlos Melo avalia que o Brasil vive uma democracia porque tem eleições, mas não é liberal porque não aceita as instituições e os valores do liberalismo político, como os direitos essenciais - liberdade de expressão e de manifestação. De acordo com ele, os próprios direitos humanos são questionados dentro dessa visão 

Por Caetano Araújo

O cientista Político, mestre e doutor pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Carlos Melo, professor tempo integral do Insper desde 1999, é o entrevistado especial desta 13 edição da Revista Política Democrática Online. Analista político, com participação ativa em vários veículos de comunicação, palestrante e consultor de empresas nacionais e estrangeiras, Carlos Melo tem buscado contribuir com o debate político, econômico e social do Brasil por meio de uma análise conjuntural isenta e reflexão desapaixonada.

Mundo hoje, para Melo, vive uma crise de liderança, inclusive no Brasil. "Em minhas palestras, tenho chamado atenção para o fato de que, há 30, 40 anos, gostasse ou não das lideranças, se via Ronald Reagan; hoje, é o Donald Trump. Onde se via Margaret Thatcher, vê-se Boris Johnson. Onde se via Mikhail Gorbatchov, vê-se Vladimir Putin. E no caso do Brasil, sabemos a situação em que estamos", critica.

A falta de líderes reflete, ainda, na oposição ao governo Bolsonaro, avalia Melo. "É preciso definir o que unifica a oposição. Qual é a pauta mínima para as oposições, no plural? Eu diria que é a questão da democracia. Poderia haver também algum acordo em relação as reformas como a da Previdência", avalia.

Colaborador de vários veículos de comunicação, é também colunista do UOL onde alimenta um Blog com análises a respeito da política brasileira (carlosmelo.blogosfera.uol.com.br), Melo é pesquisador de temas como eleições, partidos, conflito político e liderança política. Na entrevista especial que concedeu ä Revista Política Democrática Online, ele também trata de temas como o governo Bolsonaro e o Legislativo brasileiro, que tem assumido um protagonismo inédito na política do país, entre outros temas. Confira, a seguir, os principais trechos da entrevista de Carlos Melo à Revista Política Democrática Online.

Revista Política Democrática Online (RPD) – A democracia corre risco no Brasil de hoje?
Carlos Melo (CM) - Corre sim. Existe um espírito antidemocrático, que tenta de alguma forma desqualificar as instituições da democracia; um espírito que não aceita um princípio básico da democracia que é um sistema de freios e contrapesos. Esse espírito acha normal o aparelhamento de instituições importantes como a diplomacia, a Polícia Federal, o Ministério Público, a Justiça. Isso tudo, evidentemente, coloca em risco a democracia. Não há como negar. Há, pelo menos, uma parcela significativa da população – não diria uma maioria – que é relativamente mobilizada que, se pudesse, liquidaria todas as instituições da democracia. É o que o cientista político alemão Yascha Mounk chamou “O Povo Contra a Democracia”; uma democracia iliberal. Ela é democracia porque há eleições, mas não é liberal porque não aceita as instituições e os valores do liberalismo político, como direitos essenciais, com liberdade de expressão, liberdade de manifestação; mesmo os direitos humanos são também questionados, nessa visão. Amplamente falando, penso que há risco sim.

RPD – Como se deveria comportar a oposição no tocante às reformas em discussão? Pensando em ser governo nas próximas eleições, deve apoiar as iniciativas reformistas, ou, ao contrário, é melhor combatê-las para pavimentar seu caminho ao poder?
CM – Vamos por partes. Algumas reformas devem ser entendidas como clássicas e inevitáveis: a reforma da previdência, uma reforma tributária, a questão do federalismo. Isso não tem a ver com direita ou esquerda, e o necessário ajuste deveria ser um ponto pacífico. Um imperativo. Ninguém governa com desajustes fiscais. É necessária uma estrutura tributária que incentive a atividade econômica, senão não haverá emprego. Simples assim. É imperativo uma reforma da previdência que seja justa e que envolva todos os setores da sociedade, que não proteja corporações; que não se volte apenas para o regime geral da previdência. As mudanças demográficas e no mundo do trabalho foram extraordinárias na maior parte do planeta, e em especial, no Brasil; o sistema que tínhamos – e cumpriu um importante papel – se esgotou, é hoje inviável. Reitero, pois: as reformas dessa natureza deveriam ser enfrentadas com muito pragmatismo, por imperativas. Assim deveria enxergar a oposição.

Mas há alguns desafios. Primeiro: definir o que unifica a oposição. Afinal de contas, qual é a pauta mínima capaz de aglutinar as oposições (no plural)? À parte do pragmatismo, diria que é a questão da democracia. Poderia haver acordos quanto a abrangência das reformas, pelo menos em relação a aspectos de algumas delas. Mas, então, superada essa fase, o desafio seria a formação do que tem sido chamado de uma frente ampla em nome da democracia e de uma pauta possível, de resgate da economia e das funções básicas e inescapáveis do Estado, como Educação, Saúde, Segurança e Política Externa. Assim, seria possível olhar para a política de uma forma mais propositiva e construtiva.

Estamos passando por um problema que é uma grande transformação do mundo do trabalho, e não estou falando do capitalismo, estou falando do mundo do trabalho, seja em qualquer regime, por conta da revolução tecnológica que vivemos. O termo uberização já é hoje um termo vulgar, bem conhecido. Uberização significa uma precarização das relações de trabalho, isto é, muita gente já está fora do mercado de trabalho e não mais dele fará parte, do modo como nos acostumamos, pelo menos. É diferente do que tivemos no passado, quando a tecnologia se impunha, acabava com alguns empregos, mas novos postos se abriam em outras áreas, nos serviços ou no comércio, por exemplo. Isso não mais ocorrerá.

Terá, assim, uma parte considerável da população que carecerá de políticas públicas para mitigar essa situação. Vivemos um momento de transição para alguma coisa que não sabemos exatamente o que será. Serão necessárias políticas públicas para mitigar todos os problemas dessa revolução tecnológica, econômica e social. Além de apenas reduzir danos, será importante também agir com sentido de antecipação. Qual é a Educação para esse novo mundo, para nossos filhos, para nossos netos? O tempo dos nossos pais e dos nossos avós já se foi. Nosso tempo é de transição. O mundo dos nossos filhos e dos nossos netos é um novo mundo, para o qual temos de nos preparar. Esse desafio da Educação implica a capacidade de aprender a aprender, educação em termos de valores humanos, democráticos, que tampouco podem ser perdidos. E claro, também a questão da Segurança, do combate ao crime organizado que hoje já atua na lógica de cartéis.

A oposição, que vai do centro liberal até a esquerda, deveria se unir em torno desta pauta mínima. Fazer oposição olhando para trás, falando dos velhos e bons tempos que o país viveu e que não retornarão, não nos levará a lugar algum. Aceita-se um conjunto de reformas como imperativo, é inevitável. Ponto. Sem transformar isto no pomo da discórdia. Unifica-se a oposição numa frente bastante ampla e democrática com uma pauta voltada ao futuro, capaz de responder à indagação e ao medo das pessoas, hoje atormentadas pelas incertezas do futuro. Política se faz olhando para frente, não para trás. O desafio não está à direita ou à esquerda, mas em avançar ou retroagir à idade das trevas. Naturalmente, não é simples. Qualquer resposta simples provavelmente estará errada; será preciso construir na complexidade.

RPD – Há hoje uma crise de lideranças?
CM – Sem dúvida, há uma crise de liderança mundial. Em minhas palestras, tenho chamado atenção para o fato de que, há 30, 40 anos, gostássemos ou não desta ou daquela liderança, o espaço era ocupado por gente como Ronald Reagan, onde hoje está Donald Trump. Onde se via Margaret Thatcher, vê-se Boris Johnson; Mikhail Gorbatchov, Vladimir Putin... E assim vai. No caso do Brasil, sabemos a situação em que vivemos.

De onde surgiu essa crise de liderança política mundial? Essa é a pergunta, que me tenho feito nos últimos anos. Decerto, haverá uma série de fatores que poderão ajudar a “cercar” o fenômeno, mas destaco uma frase emblemática de Thatcher, nos inícios dos anos 1980: “Esse negócio de sociedade não existe, o que existe são os indivíduos e suas famílias”. Esse pensamento fez um estrondoso sucesso e deu impulso ao liberalismo. A riqueza das empresas disparou e também se estabeleceu um individualismo hedonista, vinculado ao narcisismo e ao consumo extremo. Ora, se “sociedade não existe”, se o que existe são apenas indivíduos e suas famílias, a política é desnecessária. E, mais do que desnecessária, é um estorvo; as pessoas vão cuidar de suas próprias vidas, no mercado. Perde-se o elo comunitário forjado pela Política.

Essa lógica não é nova, pelo menos desde Weber, na "Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo", no começo do século XX, sabe-se disto. Mas, nas últimas décadas, a sociedade de consumo disparou e fez com que a política implodisse. A partir daí, as lideranças começaram a escassear.

Não é verdade que no Brasil não tenha havido grandes lideranças políticas. Houve, sim, desde a época do Império. Na República, também, tanto quanto no período do Getulismo, à direita e à esquerda. Tivemos lideranças políticas importantes durante o regime militar. Na transição para a democracia, tivemos lideranças importantíssimas, mas, depois – coincidente com essa transformação mundial –, elas começaram a rarear. Se olharmos, por exemplo, para o campo da esquerda – que entendo seja de esquerda – encontraremos Lula e Fernando Henrique Cardoso. Fernando Henrique Cardoso é um cidadão com cerca de 85 anos, e o Lula, 73 anos. Ambos chegaram à presidência da República, governaram por dois mandatos, e o tempo passou; não fizeram sucessores à altura. Não como “filhos” de uma sociedade patriarcal, mas como um processo natural de renovação política. Também a história foi madrasta com o Brasil: uma parte da possível renovação ficou comprometida pelo mensalão; outra, simplesmente morreu: Luiz Eduardo Magalhães, Eduardo Campos, Marcelo Deda, Luís Gushiken... E alguns morreram politicamente: Antônio Palocci, José Dirceu, Aécio Neves e, até, Eduardo Cunha, que chegou a despontar no cenário nacional como uma liderança conservadora, hábil e sagaz. E o que sobrou foi isso aí, que não é liderança. Na verdade, é uma coisa mítica. É mítica no sentido quase religioso mesmo, messiânico, que é a figura do Jair Bolsonaro, ou mesmo a beatificação que se chega a fazer de Lula. É uma crise muito grande de liderança política, no mundo e no Brasil. O novo, simplesmente, ainda não nasceu ou está apenas sendo gerado.

A indagação é: como, sem lideranças dispostas e capazes, construir essa pauta mínima? É uma excelente pergunta, para a qual evidentemente não tenho respostas. Mas posso lembrar que, até meados de 1941, Winston Churchill era considerado um derrotado, fracassado em Galípoli na primeira guerra mundial, quando era o primeiro lorde do almirantado. Era tido como excêntrico beberrão, mas se transformou pela própria crise, pela necessidade, pelas circunstâncias, no maior estadista do século XX. Acredito que as circunstâncias sejam capazes de produzir também suas lideranças. A liderança é sempre um fenômeno em contexto. Às vezes, é necessária uma bela crise para que apareçam. Penso que as condições objetivas estão dadas para que voltem a surgir, passem a propor projetos e tentem conversar; é questão de tempo. Embora, ao contrário dos chineses – capazes de esperar por séculos que as crises decantem –, somos bem mais ansiosos.


RPD –
 Como sabemos, não existe vácuo de poder em política. Quem, a seu ver, estaria tirando proveito dessa falta de liderança no governo?
CM – Muita gente, como se sabe, está-se reunindo, fazendo encontros por aí, tentando encontrar uma saída. Estamos no meio desse processo. Concordo que não exista vácuo de poder. Por exemplo, há dois anos Rodrigo Maia não era o que vemos hoje; ele cresceu, deu um salto enorme. Provavelmente, porque foi jogado ao mar e teve que aprender a nadar. Viveu ocasiões em que seria fácil se amesquinhar pelo poder, preferiu a prudência; como por exemplo não investir no impeachment do presidente Temer e assumir a presidência da República. Teve a clareza – a meu ver, até mesmo a grandeza – de não de deixar morder pela mosca azul. E mesmo agora tem tido postura interessante, sendo um importante freio às loucuras do Executivo. Em torno dele, Maia, vem-se formando um grupo eclético, política e ideologicamente; talvez, uma nova elite parlamentar. Fico preocupado, como analista, quanto à sucessão do Rodrigo Maia, lembrando que o próximo ano será complicadíssimo: carnaval no final de fevereiro, depois, março, abril, maio, junho, festa junina, eleição, votamos em novembro. E, logo depois, a pauta da sucessão do Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre. Rodrigo Maia terá um sucessor à altura? Será uma figura tipo Rodrigo ou estará mais para o estilo Eduardo Cunha? É preocupante. Mas, enfim, vejo que o Rodrigo Maia já é um dos exemplos de liderança que surgem justamente da crise.

RPD – O Legislativo tem assumido um protagonismo inédito na política brasileira. É de se prever a continuidade desse processo até o fim do governo Bolsonaro?
CM – Houve, pela deficiência do Executivo, uma transferência de poder para o Legislativo. Tenho dito que estamos vivendo um presidencialismo em transe. Certamente não é parlamentarismo, o sistema é presidencialista, mas é um presidencialismo em transe. Transe pode ser entendido como “em transição” ou como “em vertigem”; veremos. Depende do modo como a própria política queira traduzir o termo: se o sucessor de Rodrigo Maia, na presidência dos trabalhos, for alguém afinado com sua atuação ou a negação disto – que tanto pode ser a oposição desmedida ao Executivo, como, por outro lado, a total submissão a ele.  Ou ainda se, mesmo no chão do Plenário, Maia atuará como um centro agregador no Congresso Nacional, o que daria continuidade a esse processo de imposição do Poder Legislativo. De toda sorte, não vejo o governo Bolsonaro capaz de se impor, de tomar a contento e moderadamente as rédeas do processo político. A grande incógnita é se o Congresso terá o tipo de liderança necessária, após a presidência de Rodrigo Maia.

RPD – O Supremo Tribunal Federal está perdendo sua função histórica de poder moderador?
CM – Um elemento grave da crise é a politização da Justiça. Não só do Supremo, mas do Supremo inclusivo. As raízes desse processo talvez estejam na omissão do poder Legislativo no passado: a indecisão de votar questões como a união homoafetiva, o aborto anencéfalo, a fidelidade partidária ou se impor em relação à intervenção do STF quanto à cláusula de barreira. Sabemos, não há vácuo; o poder é como gás, ele tem a forma do que o contém. Se nada o contém, ele se expande, e eu acho que o Judiciário se expandiu politicamente, a meu ver, de modo perigoso. Por vários motivos: primeiro, porque não é seu papel, e, segundo, porque isso aconteceu de uma forma fragmentada, como a inegável divisão e politização entre os próprios ministros da Corte.

Digo desde 2014, pelo menos, que me surpreendo ao ver pessoas comuns capazes de declinar o nome dos onze ministros do STF, sem a mesma capacidade para escalar a seleção brasileira de futebol. A crise é séria; no futebol, na política, e na Justiça. Costumo provocar minha audiência com a pergunta: por qual turma que você torce? A primeira turma ou a segunda turma? Os garantistas ou os tais consequencialistas?

Isso é ruim, porque, num sistema democrático, o Supremo tem a “última palavra”, no limite dos conflitos políticos. Além de um papel contramajoritário. O Supremo não tem de agradar a maioria da população; tem de arbitrar de acordo com a lei. Claro que há um certo nível de hermenêutica na interpretação da lei, mas ele tem de arbitrar de acordo com leitura razoável e coerente, no tempo, a respeito da lei. E não está acontecendo exatamente isso, porque as interpretações têm variado substantivamente ao longo do tempo, talvez ao sabor das conveniências políticas de cada grupo ou indivíduo ali estabelecido. Quando a política não consegue o consenso, quando a política não consegue o pacto, quem vai arbitrar antes de um conflito de verdade, maior, com consequências indesejáveis, é a Justiça, o Supremo no limite. Quando o Supremo se politiza, ele perde esse papel importante de ser um árbitro respeitado e inconteste. E o que acontece hoje? Dependendo da decisão do Supremo, à direita ou à esquerda, setores da sociedade simplesmente desqualificam sua decisão. A desconfiança de influências políticas no processo decisório - ora para um lado, ora para o outro – faz com que se perca a importante característica salomônica (sábio e criterioso) que deveria possuir. Para contar com a confiança de seus súditos, o Rei Salomão precisa ser percebido como justo.

RPD – Como resumiria as opções para a saída dos problemas políticos da atualidade?
CM – O Brasil precisa de um processo de conciliação, e não é um processo de conciliação com todo mundo. Há uma parcela hoje que não aceita a conciliação, porque não é democrática. Os setores democráticos precisam de um processo de conciliação. Quando a gente pensa em liderança, pensa-se em um sujeito como o Mandela ou como o José Mojica no Uruguai, que saíram da cadeia para articular uma grande conciliação nacional. Quando saem da cadeia, transformam-se em grandes líderes, não porque conciliam com aqueles que os prenderam, mas porque articulam um campo bastante amplo para se opor e vencer o outro lado, com o qual é impossível conciliar. Acho que o Brasil precisa de lideranças com essa disposição, tipo Nelson Mandela ou José Mojica, capazes de abrir mão do poder individual; generosos ao abrir espaços para o surgimento de novas lideranças; novas opções.

 


‘Tinha escravos nos Palmares’, diz Antonio Risério à revista Política Democrática online

Em entrevista concedida à publicação da FAP, antropólogo diz saber de história de mulheres da classe dirigente

Cleomar Almeida, da Ascom/FAP

“A história brasileira é muito mal conhecida no Brasil. Às vezes, as pessoas se surpreendem quando você fala que tinha escravos nos Palmares e se surpreendem quando você fala que os Tupinambás eram escravistas”. A afirmação é do antropólogo, poeta, ensaísta e historiador brasileiro Antonio Risério, em entrevista exclusiva concedida à 13ª edição da revista Política Democrática online. Todos os conteúdos da publicação podem ser acessados, de graça, no site da FAP (Fundação Astrojildo Pereira), que produz e edita a publicação.

» Acesse aqui a 13ª edição da revista Política Democrática online

A FAP é vinculada ao partido político Cidadania, que tem fortalecido a sua identidade como esquerda democrática. Na entrevista, concedida à revista Política Democrática online, Risério diz que conhece uma história de mulheres da classe dirigente, o que, segundo ele, é completamente diferente das histórias das mulheres da classe dominada. A entrevista foi concedida ao diretor da fundação e consultor político Caetano Araújo com colaboração de Ivan Alves Filho.

“Porque as mulheres da classe dominada têm primazia, dominando, inclusive, o pequeno comércio no Brasil, nas vendas, porque eram mulheres da vida e da rua, ao passo que as sinhás e sinhazinhas ficavam enclausuradas em sobrados na casa grande”, afirma ele à revista Política Democrática online. “A gente tem de pegar cada ponto disso e discutir com conhecimento. Conhecimento acima de tudo, não adianta ficar só ideologizando; ideologizando a gente não vai para lugar nenhum”, acrescenta.

O historiador compara, ainda, que, as histórias dos Estados Unidos e da França, por exemplo, são muito bem conhecidas pelas suas respectivas populações, ao contrário do que ele diz ocorrer no Brasil. “Uma frase de que eu gosto muito que Freud estudava do Leonardo da Vinci: você não pode amar nem odiar nada se primeiro você não souber o que aquilo é, o que aquilo foi, como aconteceu e o que aquilo significa”, pondera, em outro trecho da entrevista publicada pela revista da Fundação Astrojildo Pereira.

De acordo com Antonio Risério, entre os principais líderes do movimento abolicionista, havia três eram negros: André Rebouças, José do Patrocínio e Luiz Gama. “Deram-se as mãos e acabaram com a escravidão”, afirma ele, na entrevista publicada na revista Política Democrática online.

Leia mais:

» Nova edição da Política Democrática online analisa desastre do petróleo no litoral brasileiro


Revista Política Democrática || Entrevista Especial - Antonio Risério: "A gente vive em uma sociedade bipolar"

Para o poeta e historiador Antonio Risério, o Brasil será modificado realmente quando os brasileiros aprenderem a dizer "nós fizemos isso" e pararem de falar na terceira pessoa: “Eles mataram os índios”, “Eles oprimem as mulheres”, “Eles são os culpados de tudo”, afirma

Por Caetano Araujo, com a colaboração de Ivan Alves Filho

Antropólogo, poeta, ensaísta e historiador brasileiro, Antonio Risério é o entrevistado especial da 13ª edição da Revista Política Democrática Online. Ele acredita que, hoje, muita gente do campo democrático anda preocupada em superar a atual polarização brasileira e encontrar um rumo para o País. "Eu me coloco claramente no campo da esquerda democrática e não tenho nenhum problema com isso. O que acho houve no país foi o seguinte. Ao se tornar independente e conquistar autonomia nacional, o Brasil teve de construir a imagem do que somos", diz Risério.

Antonio Risério nasceu na Bahia, em 1953. Fez política estudantil em 1968 e mergulhou na viagem da contracultura. Implantou a televisão educativa, as fundações Gregório de Mattos e Ondazul e o hospital Sarah Kubitschek, na Bahia. Fez o projeto para a implantação do Museu da Língua Portuguesa, em São Paulo.Tem feito roteiros de cinema e televisão. Diversas composições suas foram gravadas por estrelas da música popular brasileira. Integrou os núcleos de estratégia e criação das duas campanhas de Lula à presidência da República.

Escreveu, entre outros, os livros Carnaval Ijexá (Corrupio, 1981), Caymmi: Uma Utopia de Lugar (Perspectiva, 1993), Textos e Tribos (Imago, 1993), Avant-Garde na Bahia (Instituto Pietro Bardi e Lina Bo, 1995), Oriki Orixá (Perspectiva, 1996), Ensaio sobre o Texto Poético em Contexto Digital (Fundação Casa de Jorge Amado, 1998) e Uma História da Cidade da Bahia (Versal, 2004).

O poeta e historiador aponta, ainda, que o Brasil tem, atualmente, a necessidade de repensar a sociedade e reinventar a nação. "Está faltando, portando, uma releitura crítica da sociedade que se torna brasileira. A gente não pode ficar fazendo como esses filmes Carlota Joaquina, como o desfile da Mangueira, que é totalmente dominado por essa nova ideologia dominante da história do país entre ricos e pobres", alerta.

Na entrevista especial concedida a Caetano Araujo, com a colaboração de Ivan Alves Filho, Antonio Risério destaca temas como a esquerda democrática brasileira, a história oficial brasileira e organização intelectual e ideológica da sociedade brasileira, entre outros.

Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista:

Revista Política Democrática Online (RPD): O senhor acredita que o povo brasileiro ainda não superou sua baixa autoestima, padecendo do chamado complexo de vira-lata? 
Antonio Risério (AR): Pois eu acho o contrário. A gente vive em uma sociedade bipolar; vamos de um extremo a outro, da euforia à depressão (inint) [00:01:25]. Tem hora que nos vemos como os melhores do mundo; tem hora que o povo acha que o Brasil vai fazer merda. É uma certa dose de masoquismo nacional e, ao mesmo tempo, uma tentativa de fugir da responsabilidade. É muito comum as pessoas falarem no Brasil na terceira pessoa: “Eles mataram os índios”, “Eles oprimem as mulheres”, “Eles são os culpados de tudo”, mas nós não. A gente só vai modificar esse país quando aprender a dizer: “Nós fizemos isso”.

RPD: Por que razão a esquerda, se é que o senhor ainda se vale desse termo, perdeu de vista a ideia de que somos uma nação, com suas conquistas e também suas falhas, naturalmente? 
AR: Eu me coloco claramente no campo da esquerda democrática e não tenho nenhum problema com isso. O que acho houve no país foi o seguinte. Ao se tornar independente e conquistar autonomia nacional, o Brasil teve de construir a imagem do que somos. Daí a criação do Instituto Histórico Geográfico (IGH) e o trabalho pioneiro de Varnhagen, historiador francês, que nos descreveu em termos geográficos - cidades, rios, montanhas, Pico da Neblina etc – e, em termos históricos, o que éramos como personalidades e que feitos memoráveis definiam nossa identidade. Durante uns cem anos ou um pouco mais, o Instituto concentrou o estudo da história do Brasil.

Só muito recentemente é que vão surgir outros pólos de aspecto historiográfico, que irão proceder a uma releitura da visão tradicional cultivada do Brasil, que, na verdade, era uma celebração da colonização portuguesa e dos trópicos. Mas, em vez de reexaminar a experiência nacional brasileira, ela vai simplesmente inverter o sinal algébrico da velha história oficial e introduz a visão maniqueísta, de que a classe dominante é o mal e as classes dominadas, o bem. A classe dirigente vira alvo de ataque e, ao mesmo tempo, a classe dominada e as classes populares, objeto de celebração.

O que acontece, então? Passa-se a ter três figuras na nova história oficial do Brasil: o negro libertário, o índio ecofeliz e o português genocida. Cria-se uma mitificação do português genocida, considerando que a invasão portuguesa na Bahia é a quarta invasão que a gente tem documentada, bem como do índio libertário e do índio ecofeliz, já que a sociedade Tupinambá, por exemplo, era uma máquina de guerra implacável, que destruía outras sociedades indígenas, tomava suas, como tomou na Bahia. Não esquecer que os negros, identificados como libertários, nunca lutaram contra o sistema escravista enquanto sistema: lutaram contra a escravização de seus próprios grupos, mas aprendiam a escravizar os negros. Em resumo: ao se tentar reexaminar em profundidade a experiência, substituíram-se mentiras antigas por mentiras novas, na base de que “eles fizeram tudo” e “nós não fizemos nada”, isto é, os culpados são os outros, o culpado é o homem branco opressor.

RPD: Como poderíamos retomar o projeto Brasil como missão, tão caro à nossa intelectualidade desde a Conjuração Mineira? 
AR: Eu não sou tão fã da Conjuração Mineira. Aquilo foi uma rebelião senhorial, basicamente, a elite mineira querendo se livrar da exploração financeira do poder lisboeta. Daí todas as revoltas federalistas. Mas, para mim, revoluções separatistas são, por exemplo, a dos alfaiates na Bahia, que combina a luta contra o sistema escravista e contra a dominação colonial; são os alfaiates mulatos da Bahia que vão colocar isso.

Está faltando, portando, uma releitura crítica da sociedade que se torna brasileira. A gente não pode ficar fazendo como esses filmes Carlota Joaquina, como o desfile da Mangueira, que é totalmente dominado por essa nova ideologia dominante da história do país entre ricos e pobres. A maior contradição é celebrar os pretos e não o treze de maio, por um motivo muito simples: os negros eram escravistas, e o treze de maio é o dia que em que a gente oficializa. Assistindo a Carlota Joaquina e ao desfile da Mangueira, suprime-se a responsabilidade do Brasil. Não pode, é um absurdo dizer que não temos nada a ver com isso: “Eles fizeram isso”, fomos nós que fizemos. Como podemos assumir a grandeza nacional brasileira, dessa maneira? Ao longo de quinhentos anos de história, nós fizemos pelo menos duas grandes coisas: construímos um povo e uma nação. Eu não vou entregar isso.

RPD: O senhor acha que essa visão do eles dificulta uma organização intelectual e ideológica da sociedade brasileira? 
AR: Sim, totalmente. Marco Aurélio Nogueira resumiu muito bem essa questão, ao dizer em artigo recente: “É isso que está bloqueando mentalmente os democratas que ainda não se acham em condições sequer de defender seu legado”. É que tem coisas que a gente conquistou, o movimento abolicionista é uma pista central nisso. Entre os principais líderes do movimento abolicionista, havia três eram negros: André Rebouças, José do Patrocínio e Luiz Gama. Deram-se as mãos e acabaram com a escravidão. E tem gente que querer fazer charme com o movimento negro, ao dizer: “Aquilo foi um autógrafo da Princesa Isabel”, não foi isso. Aliás, o primeiro ato que visou realmente ao fim da escravidão no Brasil foi protagonizado pelas Forças Armadas, quando, depois de dominar o Paraguai, o Conde d'Eu, marido da Princesa Isabel e comandante das tropas brasileiras, decidiu abolir a escravidão no país vizinho. Por aqui, ainda não se podia agir assim, teria virado uma guerra civil barra pesada no país. Joaquim Nabuco fala isso muito bem, ao comentar que as lideranças nacionais conseguiram contornar o risco de uma guerra racial. A abolição só ocorreu ao cabo de vários acordos entre as elites brasileiras, envolvendo decisões do tipo reforma agrária, de tal forma que, até hoje, o treze de maio não é feriado, é o dia do zootecnista. Jogou-se nossa história na lata de lixo. E isso impede de fato a celebração e a defesa claras do legado da conquista democrática.

RPD: Segundo o senhor, construiu-se visão um pouco depreciativa de nossa história e de nossa identidade. O senhor você vê alguma relação entre esse movimento e o movimento oposto, que também foi muito frequente em nossa história, de exaltação ufanista de nossa história e de nossa identidade, tanto uma quanto outra postura presente desde o século dezenove? Existiria alguma relação necessária entre ambas ou se seria algo como um pêndulo, que vai certas vezes para um lado e, certas vezes, para o outro? 
AR: A gente tem de fato oscilado nessas coisas. Celebra a colonização portuguesa, condena a colonização portuguesa; celebra os índios, condena os índios; é o tempo inteiro nesse negócio inútil, fruto de uma ignorância generalizada sobre a história do país. A gente não conhece a história brasileira. É preciso conhecê-la para examiná-la. A história do futebol brasileiro é uma história vitoriosa do povo brasileiro. Mas, de resto, a gente acha que “Não, nós estamos fazendo a história. É o que a esquerda fica falando. É uma história populista, em que o porteiro do seu prédio é tão importante quanto os moradores. Tudo bem, temos de conhecer a mentalidade do porteiro do seu prédio, mas não foi ele que deu origem à história do país. Temos de ler a história do Brasil antropologicamente caso a caso, porque não é tão simples assim. Você vê, por exemplo, que muitos fazem isso, de uma ponta a outra do país, não existe um só orixá, não existe nenhuma empresa africana. O africano foi espiritualmente assassinado nos Estados Unidos. Mas, no Brasil, no país inteiro, você ouve falar de Iemanjá, nas comemorações do ano novo. O que houve aí? São processos, são realidades, são experiências nacionais distintas que a gente tem de conhecer, a gente tem de ter a coragem de reconhecer tudo que há de abominável, mas também a coragem de lembrar nossas conquistas. A gente vai entrar em parafuso vermelho, porque essa grandeza nacional é conquista nacional celebrada pela direita, que se veste de verde e amarelo. Eu também quero me vestir de verde e amarelo.

PRD: O senhor fala em revisão crítica, mas, ao mesmo tempo, em conhecimento da história, grande déficit da sociedade brasileira. A reinvenção da nação começa pelo conhecimento da história e com o que a gente poderá terminar com a polarização, a bipolaridade da sociedade brasileira? 
AR: Acho que ninguém tem de passar apenas pelo conhecimento, porque não adianta. Pega um livro do Francisco Bosco, um filósofo, que fala das mulheres negras que lutaram contra a dominação masculina no período colonial, mas não tem nenhuma informação segura sobre isso. Eu não conheço nada disso; conheço outra coisa. Temos uma história das mulheres da classe dirigente do Brasil que é completamente diferente das histórias das mulheres da classe dominada, porque as mulheres da classe dominada têm primazia, dominando, inclusive, o pequeno comércio no Brasil, nas vendas, porque eram mulheres da vida e da rua, ao passo que as sinhás e sinhazinhas ficavam enclausuradas em sobrados na casa grande. A gente tem de pegar cada ponto disso e discutir com conhecimento. Conhecimento acima de tudo, não adianta ficar só ideologizando; ideologizando a gente não vai para lugar nenhum. Repare que a história dos Estados Unidos é muito bem conhecida nos Estados Unidos; a história francesa também é muito bem conhecida na França; mas a história brasileira é muito mal conhecida no Brasil. Às vezes, as pessoas se surpreendem quando você fala que tinha escravos nos Palmares e se surpreendem quando você fala que os Tupinambás eram escravistas. A gente tem de conhecer, não pode ficar julgando. Uma frase que eu gosto muito que Freud estudava do Leonardo da Vinci: você não pode amar nem odiar nada se primeiro você não souber o que aquilo é, o que aquilo foi, como aconteceu e o que aquilo significa.

RPD: Qual sua opinião sobre as políticas educacionais e culturais, em cujo contexto já se fala inclusive de modelos militarizados das instituições de ensino?
AR: Eu vou lhe dizer uma coisa bem simples: eu estou a caminho dos meus setenta anos. Desde que eu me entendo por gente, o Brasil já acabou umas seis ou sete vezes, mas não acaba. É que os brasileiros são persistentes. Eu, por exemplo, não vou parar de trabalhar diariamente. Acho, portanto, que o Brasil sempre tem saída. Não vejo nada como catastrófico. Toda vez que eu discuto esses assuntos, a reação é, inicialmente, meio de surpresa e, depois, de concordância. De Marco Aurélio Nogueira a Caetano Veloso, a voz convergente é a de que “Eu tenho que fazer isso”, “Temos que fazer isso”. A gente não pode ficar restrito a esse filme em preto e branco, não. O Brasil é colorido.

 

 


'Cultura deveria funcionar dentro do Ministério da Educação’, diz Caio de Carvalho

Diretor executivo do Canal Arte 1 do Grupo Bandeirantes de Comunicação concedeu entrevista exclusiva à nova edição da revista Política Democrática online

“Penso que a cultura não deveria estar em um ministério à parte. Deveria funcionar dentro do Ministério da Educação, para que se pudesse fazer um trabalho de base, junto às escolas, à garotada, isto é, de forma que a gente pudesse ter um processo realmente na base da pirâmide”. A afirmação é do diretor executivo do Canal Arte 1 do Grupo Bandeirantes de Comunicação, Caio de Carvalho, em entrevista à 12ª edição da revista Política Democrática online, produzida e editada pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira), em Brasília.

» Acesse aqui a 12ª edição da revista Política Democrática online

Com acesso gratuito pelo site da FAP, a revista traz em sua nova edição a entrevista exclusiva com doutor em comunicação social e advogado formado pela USP (Universidade de São Paulo). Ele acredita que, se fosse feito um trabalho de base, seria possível influenciar, em um país com imensos problemas educacionais e culturais, a TV aberta a usar sua força para ajudar a educar e levar cultura a todos os brasileiros, e não medir com réguas de pesquisas programação centrada em alegria, entretenimento, como se o povo preferisse o banal.

“Um escritor conservador, como Mario Vargas Llosa, já questionou tudo isso que está acontecendo na televisão de nossos dias”, comentou ele, durante a entrevista concedida ao diretor da FAP Caetano Araújo, com colaboração de Vladimir Carvalho e Martin Cézar Feijó. Segundo ele, o Arte1 surgiu, justamente, por causa de legislação, que dispõe a obrigatoriedade de reservar três horas por dia para produção nacional.

“É uma missão do canal. Nessas três horas, temos de apresentar, no mínimo, de 22 a 23 horas por semana de produção nacional, que é fruto de produção independente e de produção própria nossa”, afirma. “Quanto à produção estrangeira, minha equipe, integrada por jovens muito competentes, circula por feiras e amostras no exterior, em busca de materiais novos que valham a pena. A tarefa se facilita porque nossos parceiros internacionais sabem já o que nós queremos”, conta.

Carvalho, que também é professor da Escola de Administração de Empresas de São Paulo (EAESP) da Fundação Getúlio Vargas (FGV), considera-se um cinéfilo. “Daí ter trazido para o Arte1 os filmes chamados clássicos, para não mencionar produções próprias, como a entrevista que fizemos com Ettore Scola, uma obra prima, um mês de sua morte. Outro dia eu peguei o Giancarlo Gianinni – que nem sabia que ele quase veio trabalhar no Brasil aqui, antes de ser cineasta – para falar de toda a história de seus filmes”.

Ele também foi ministro de Estado de Esportes e Turismo. Foi presidente da Empresa Brasileira de Turismo (Embratur), do Conselho Executivo da Organização Mundial de Turismo (OMT) e da São Paulo Turismo S/A. É membro dos Conselhos da Japan House, do Museu de Arte Moderna e do Museu da Língua Portuguesa.

Leia mais:

» Promessa de Bolsonaro movimenta garimpos em Serra Pelada, destaca nova edição da Política Democrática


Revista Política Democrática || Entrevista Especial - Caio Luiz de Carvalho: "Objetivo é levar arte e cultura a todos os brasileiros, sem censura"

Diretor Executivo no Grupo Bandeirantes de Comunicação e coordenador do Canal Arte 1, Caio Luiz de Carvalho critica qualquer tentativa de impor, de volta, a censura nos meios de comunicação em nosso país, onde a liberdade de expressão foi conquistada a duras penas

Por Caetano Araujo e com a colaboração de Vladimir Carvalho e Martin Cezar Feijó

Doutor pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (2009), graduado em Direito pela Universidade de São Paulo (1976) e professor extra carreira da Fundação Getúlio Vargas, o diretor geral da ENTER-Entertainment Experience, empresa de eventos do Grupo Bandeirantes de Comunicação, Caio Luiz de Carvalho, há 12 anos é responsável pelo Canal Arte 1, que nasceu com o objetivo de levar arte e cultura a todos os brasileiros. Ferrenho defensor da liberdade de expressão em nosso país, ele é o entrevistado especial desta edição da Revista Política Democrática Online.

Caio de Carvalho foi ministro de Estado de Esportes e Turismo, presidente da Embratur, presidente do Conselho Executivo da OMT –Organização Mundial de Turismo e presidente da São Paulo Turismo S/A. De acordo com ele, que também é membro dos Conselhos da Japan House, Museu de Arte Moderna e Museu da Língua Portuguesa, no Arte 1 não existe nenhuma forma de censura. "Os produtores dispõem de espaço totalmente aberto para criar nas mais diversas linguagens", afirma Caio de Carvalho. "O Arte 1 continua cumprindo seu papel, de ser um canal que nasceu com o objetivo de levar arte e cultura a todos os brasileiros. Censura não passa pela porta do canal, nem do grupo Bandeirantes", completa

Na entrevista especial, Caio de Carvalho comenta o papel do Arte 1 na difusão da cultura em todo o país, bem como a questão da democratização do acesso à cultura em nosso país e o avanço das novas tecnologias e plataformas digitais, como o streaming. Confira, a seguir, os principais trechos da entrevista:

 

Revista Política Democrática Online (RPD): O Arte 1 tem um formato clássico de televisão pública, a exemplo do que se passa na Europa e nos Estados Unidos. E, no entanto, o Arte 1 é levado por empresa privada. Como foi essa mágica?
Caio de Carvalho (CC): Tenho de esclarecer que não foi mágica minha. Quando saí do governo, em 2002, fui para Oxford e lá tomei contato e me apaixonei pelo projeto dos ingleses das indústrias criativas. Mais de dez anos depois, em 2011, veio o convite para assumir um posto no grupo Bandeirantes de Comunicação. Era, na realidade, um posto na área de seminários, eventos e tudo mais. Só que estava em gestação uma legislação na área de audiovisual, que abriria espaço para o surgimento de canais de espaços qualificados. No grupo Bandeirantes, o presidente, João Carlos Saad, o Johnny Saad, é um apaixonado por arte, ele mesmo sendo colecionador de obras. Seu sonho era atuar nessa área. A ele, juntaram-se outros amantes de arte, Paulo Saad Jafet e Salomão Schwartz, infelizmente falecido há pouco, além de Rogério Galo, que ainda hoje continua em televisão. Ao surgir a oportunidade de um canal cultural, a Bandeirantes conseguiu tornar realidade o sonho da família, e o Arte1 foi lançado, em 2011.

Assumi em fins de 2012 a direção executiva do que hoje é considerada a obra prima da televisão brasileira. Inspirou-se, sem dúvida, no exemplo da França, mas nos esforçamos para encontrar nosso próprio caminho. O canal “Artè” francês, de certa forma, se popularizou um pouco, ou seja, sua curadoria se abriu para permitir tipos de conteúdo mais light. O Arte1 se pauta por pesquisas que nos indicam estarmos com melhores conteúdos na comparação com os outros canais com programação semelhante. Atingimos o público classe A e B, mas, de certa forma, o canal nasceu com o objetivo de levar arte e cultura a todos os brasileiros. Pode parecer um paradoxo, porque nós estamos na TV paga, mas teve de ser assim. Não temos propriamente anúncios comerciais convencionais; temos, sim, bons parceiros, que querem estar com suas marcas associadas a conteúdos especiais, como é o caso daquilo que exibimos no canal Arte1. Ainda assim graças a esses parceiros e aos assinantes somos um canal autossustentável.

Estamos celebrando o sétimo aniversário, com cerca de 12 milhões e meio de assinantes. É um canal de sucesso. Já tivemos, é verdade, 13 milhões e 200, redução que acompanhou, no entanto, a queda dos assinantes das operadoras, no rastro de novas estratégias de mercado, como o streaming, plataformas diversas como Netflix, plataformas independentes etc. Os assinantes vêm migrando das operadoras para essas plataformas. De olho nisso, nós já estamos no streaming também com o Arte1 Play, que, para nós, é um desafio e é motivo de enorme orgulho. Arte1 está-se firmando como um produto de conteúdo, com mais de 40, 50 produtoras parceiras independentes. Ao longo desses sete anos, o canal já tem cerca de 800 horas de produção de conteúdo próprio, atemporal.

 

RPD: Em algum momento, vocês enfrentaram problemas com a censura?
CC: É um absurdo pensar em censura no mundo de hoje e num país como o nosso, cuja liberdade de expressão foi conquistada a duras penas. O Arte 1 continua cumprindo seu papel. Aqui não existe nenhuma forma de censura. Os produtores dispõem de espaço totalmente aberto para criar nas mais diversas linguagens. Censura não passa pela porta do canal, nem do grupo Bandeirantes. Adotamos, porém, alguns critérios de classificação etária para alguns programas, como se vê, aliás, no universo dos filmes comerciais.

 

RPD: A seu juízo, existe alguma relação entre a programação cultural, num sentido amplo, e a democratização do acesso a bens culturais? Caberia falar-se de uma questão paralela, o fortalecimento de uma política cultural democrática?
CC: O tema é extremamente complexo. Penso que a cultura não deveria estar em um ministério à parte. Deveria funcionar dentro do ministério da Educação, para que se pudesse fazer um trabalho de base, junto às escolas, à garotada, isto é, de forma que a gente pudesse ter um processo realmente na base da pirâmide. Talvez assim fosse possível influenciar, em um país com nossos imensos problemas educacionais e culturais, a TV aberta a usar sua força para ajudar a educar e levar cultura a todos os brasileiros, e não medir com réguas de pesquisas programação centrada em alegria, entretenimento, como se o povo preferisse o banal. Um escritor conservador, como Mario Vargas Llosa, já questionou tudo isso que está acontecendo na televisão de nossos dias. [1] Canais do tipo Arte1 se preocupam em fazer uma programação de qualidade para todo o público.

Você fez uma relação entre democracia e cultura. Acho que uma não existe sem a outra. Discutimos muito se tudo que é arte é cultura, se tudo que é cultura é arte. Mas o fato é que não são temas, conceitos, devidamente valorizados hoje pelos governos municipais, estaduais ou federal. A cultura é uma coisa muito séria, e eu só vejo essa questão da cultura a partir da educação. Não adianta termos ministérios frágeis, sem recursos. Reforço: a cultura é fundamental para qualquer país que queria tornar-se civilizado, um país que queira cuidar de suas gerações futuras.

 

RPD: Você se referiu à tendência à banalização das mensagens da televisão. No entanto, o Arte 1 populariza sem vulgarizar. Como conciliar entretenimento e arte?
CC: Acho que é possível. Eu mesmo fui atrás de um projeto francês de música clássica, proibido para maiores de 50 anos. Fiz de tudo para comprá-lo e consegui. Trata-se de um projeto maravilhoso, destinado a educar a criança sobre como se constitui uma orquestra, como se faz uma composição, a história dos grandes clássicos da música e tudo mais. É, sem dúvida, uma forma de entretenimento.

Há outro projeto no Arte 1, que é vitorioso. Estamos partindo para a quarta temporada. É sobre a arte da fotografia, que, na verdade, é um reality, sem ser uma competição, mais uma aula de fotografia. É conduzido por dois profissionais experientes, Claudio Feijó e Herbert Nogueira, que não ensinam apenas fotografia, ensinam a questão do olhar. É um projeto que está dando certo, num canal fechado, e é, também, de entretenimento.

Estamos explorando, agora, outro programa: uma batalha de pianos com a participação de jovens talentos de piano. Acreditamos, pois, que é possível trabalhar no Arte 1 mais para o lado do entretenimento, sem deixar o objetivo principal que é educar para a arte, educar para aquilo que é o objetivo do canal. Estamos convencidos de que esse é o caminho.

 

RPD: Como o Arte1 distribui a programação entre material produzido no Brasil e no exterior?
CC: O Arte1 surgiu, justamente, por causa de legislação, que dispõe a obrigatoriedade de reservar três horas por dia para produção nacional. É uma missão do canal. Nessas três horas, temos de apresentar no mínimo de 22 a 23 horas por semana de produção nacional, que é fruto de produção independente e de produção própria nossa. Quanto à produção estrangeira, minha equipe, integrada por jovens muito competentes, circula por feiras e mostras no exterior, em busca de materiais novos que valham a pena. A tarefa se facilita porque nossos parceiros internacionais já sabem o que nós queremos.

Além disso, tenho minhas preferências, que cultivo desde a universidade. Sou um cinéfilo. Daí ter trazido para o Arte1 os filmes chamados clássicos, para não mencionar produções próprias, como a entrevista que fizemos com Ettore Scola, uma obra prima, um mês antes de sua morte. Outro dia eu peguei o Giancarlo Giannini – que eu nem sabia que quase veio trabalhar aqui no Brasil, antes de ser cineasta – para falar de toda a história de seus filmes. Temos mais de 30 filmes brutos aqui, produções nossas, que estamos editando para passar em seu momento no canal, filmes atemporais e muito especiais.

 

RPD: Esses vídeos estão à venda?
CC: Temos o Arte1 Play que está no ar. Tanto em plataforma iOS da Apple quanto Android de Samsung e outros aparelhos nesse formato. É um produto barato, R$ 7,99 por mês, que dá direito a conteúdos os mais diversos possíveis e que podem ser acessados não só por televisores grandes, mas também por smartphones e tablets. Tenho uma série que é a paixão de muita gente. Já comprei a segunda temporada, num total de 30 programas, se chama This is Opera. É uma maravilha. É conduzido por um catalão que estou pensando em trazer para fazer uma apresentação aqui no Brasil. Esse programa é outro exemplo de que é possível conjugar arte e entretenimento.

 

RPD: Arte1 trabalha com grande diversidade de programas: música, cinema, filmes, artes plásticas, fotografia, dança. A seu ver, quais são, hoje, as principais frentes de atuação do Arte1 e quais serão em futuro próximo?
CC: Desde 2013, usamos o horário das 10 e meia da noite para programas com a diversidade a que você se refere. Sabemos que há amplo leque de idade em nosso universo de telespectadores, e que, naquela hora, as novelas já se encerraram, dando início à prática do zapeamento de canais. Decidimos nos concentrar aí em nosso prime time. Às segundas, é dia de concertos; às terças, artes visuais; às quartas, dança; às quintas, séries de arte; às sextas, filmes clássicos; aos sábados, Magazine Arte 1 com o New York Times, que é a única parceria fora da mídia impressa feita no mundo pelo New York Times; e aos domingos, literatura, com o Manoel da Costa Pinto, ComTexto, programa que já estamos renovando, graças ao apoio do Itaú Cultural.

A questão da literatura é para nós a mais complexa, porque envolve programas densos, em torno da obra de um escritor convidado e o Manoel. Mas, para nossa boa surpresa, em termos de audiência, nem tanto. Em termos de audiência, os filmes clássicos, as séries, os próprios concertos ganham, mas, na questão de tempo de permanência, Comtexto está bem à frente.

Isso reforça nossa proposta de programação cultural: interessar o público pelos caminhos das artes, como acontece em Arte na Fotografia e Thisis Opera. Não vulgarizamos e nem diminuímos a seriedade do canal; apenas permitimos que novos públicos também se interessem de uma maneira mais lúdica pela arte e pela cultura.

 

RPD: Arte1 sempre pergunta aos artistas da atualidade cultural sua definição de arte. Chegou sua vez: o que você entende por arte?
CC: Ferreira Gullar dizia que a arte existe porque a vida não basta. Acho que as definições de arte estão ligadas muito à questão da criatividade e do talento. Arte é fundamental para a gente sobreviver, pensar, refletir. Fico muito feliz de ter hoje a condição de dirigir uma equipe de jovens talentos, apaixonados pelo canal, que, embora sem receber grandes somas, vestem a camisa do canal, brigam por ele, porque têm esse prazer de saber que estão contribuindo para fazer uma obra prima na televisão. De certa forma, eles também estão fazendo arte, trabalhando no Arte1.

[1] Caio de Carvalho refere-se à obra La civilización del espetáculo, Santillana Ediciones Generales, S. L., Madrid, España, 2013.


‘Etanol é uma das maiores realizações do Brasil’, afirma Carlos Henrique Brito Cruz à Política Democrática online

Diretor científico da Fapesp é o entrevistado especial da nova edição da revista produzida pela FAP

“Somos um país praticamente autossuficiente em energia para o transporte, gasolina e etanol, porque investiu-se muito em ciência, tecnologia e engenharia para achar petróleo no alto-mar e criar um substituto para o petróleo, o etanol, que vai nos automóveis. Essa história do etanol é uma das maiores realizações que o Brasil logrou no campo da ciência, tecnologia e engenharia”. A afirmação é de Carlos Henrique Brito Cruz, engenheiro eletrônico e físico, diretor científico da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo). Ele é o entrevistado especial da 11ª edição da Revista Política Democrática Online.

» Acesse aqui à 11ª edição da revista Política Democrática online

A revista é produzida e editada pela FAP (Fundação Astrojildo Pereira), vinculada ao partido político Cidadania 23. Ex-reitor da Unicamp, Carlos Henrique Brito Cruz está há 13 anos à frente da Diretoria Científica da Fapesp, instituição de fomento que, em geral, sofre menos com as intempéries de Brasília. Seu orçamento anual corresponde a 1% da receita tributária de São Paulo.

Brito Cruz destaca que, em todos os países onde se consegue criar desenvolvimento econômico e social usando ciência e tecnologia, há parte expressiva de recursos investidos na pesquisa, tanto pela universidade quanto por institutos de pesquisa governamentais e por empresas.

“No Brasil, há quem ache que o único lugar onde tem pesquisa é nas universidades; nem é assim nem é para ser assim. Nos Estados Unidos, o laboratório de pesquisa da Google tem mais cientistas de computação do que qualquer departamento de universidade americana. O mesmo ocorre com o laboratório da Microsoft. Na Boeing, Airbus, Embraer, a quantidade de engenheiros é impressionante. É desse jeito que funciona. A empresa está conectada com um mercado e com as demandas do consumidor”, diz

Segundo o entrevistado, a universidade precisa também treinar as novas gerações de pesquisadores que vão trabalhar na empresa, no governo, na própria universidade e em institutos de pesquisa orientados a problemas ou temas específicos. Estes últimos, no Brasil, seriam os casos da Embrapa, para elevar os índices de produtividade da agricultura; do Instituto Butantã, para melhorar a saúde dos brasileiros, ou do INPE, de observação da terra, da floresta, das atividades espaciais.

Leia mais:

» Pesquisa e inovação são destaques da nova edição de Política Democrática online


Política Democrática: ‘Movimentos sociais estão destroçados’, diz Luiz Werneck Vianna

Sociólogo afirma que revolução democrática avança planetariamente

Cleomar Almeida

“A sociedade não vai abdicar facilmente do que conquistou, mas é preciso que transforme isso em motivação política, afirma o sociólogo Luiz Werneck Vianna em entrevista publicada na quarta edição da revista Política Democrática online. A publicação é produzida e editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), vinculada ao Partido Popular Socialista (PPS).

» Acesse aqui a edição de janeiro da revista Política Democrática online

Para o sociólogo, “não há oposição efetiva, os movimentos sociais estão destroçados, o sindicalismo também”. Então, de acordo com ele, por mais que a harmonia na atual coalizão governamental seja difícil, os riscos são pequenos para ela.”

“Há processos reais, inamovíveis, irremovíveis que vêm trabalhando na nossa sociedade; e que isso, no limite, propicia um avanço continuo da democracia”, diz o sociólogo, ao comentar este início do governo do presidente Jair Bolsonaro (PSL) e a onda à direita que está em curso atualmente no país.

De acordo com Werneck Vianna, a revolução democrática avança planetariamente, mas conhece também obstáculos que não são propriamente os que o campo adversário apresenta. “São, antes, interesses represados que se organizam de forma segmentada, com base em identidades culturais, com perda da ideia de bem comum”, diz ele.

Werneck Vianna também ressalta que a preocupação do lado de lá é refrear, é conter os processos que vêm atuando até agora como forças da natureza, embora com pouca reflexividade. Afinal, segundo ele, não é difícil descobrir, entre os jovens, centelhas brilhantes. “Não há caminho a ensinar para eles; eles têm de aprender por eles mesmos, como nós aprendemos, quando o país, em um certo dia de agosto de 1954, foi dormir de um jeito e, com o suicídio de Vargas, acordou de outro”, lembra.

“Eu e muitos da minha geração mudamos com a difusão da sua carta testamento no rádio, um dia inteiro, produzindo um impacto intelectual, moral, político muito grande sobre cada um de nós”, completa Vianna.

Sobre a possibilidade de Bolsonaro e sua nova ordem nacional pontilhada de projetos antagônicos vier um dia a fazer uso da força para manter o governo, Werneck Viana diz que cabe à sociedade impedi-lo. “O céu de brigadeiro a que alguns arautos do novo governo têm feito referência só existe em razão de os bloqueios políticos ao novo grupo no poder serem ainda muito frágeis.", completa

Luiz Werneck Vianna é professor-pesquisador na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e doutor em Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP). Ele é autor de, entre outras obras, A revolução passiva: iberismo e americanismo no Brasil (Rio de Janeiro: Revan, 1997); A judicialização da política e das relações sociais no Brasil (Rio de Janeiro: Revan, 1999); e Democracia e os três poderes no Brasil (Belo Horizonte: UFMG, 2002).

Sobre seu pensamento, conforme sugere a revista, o público pode ler Uma sociologia indignada. Diálogos com Luiz Werneck Vianna, organizada por Rubem Barboza Filho e Fernando Perlatto (Juiz de Fora: Ed. UFJF, 2012). Destacamos também seu novo livro (intitulado) Diálogos gramscianos sobre o Brasil atual (FAP e Verbena Editora, 2018), que é composto de uma coletânea de entrevistas (concedidas) que analisam a conjuntura brasileira nos últimos anos.

Leia mais:

» Revista Política Democrática de janeiro destaca reflexos de suposta corrupção na Belo Monte

» Revista Política Democrática de dezembro destaca viagem à Volta Grande do Xingu

» Política Democrática online de novembro repercute eleição de Bolsonaro

» FAP lança revista Política Democrática digital