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Elena Landau: #Privatizatudo, do meme à realidade

Privatização é coisa séria, não combina com bravata eleitoral

Eu uso a hashtag #privatizatudo nas redes sociais. Começou como meme e foi ficando cada vez mais popular. É importante como ideia força. Mas a grande maioria que o usa não tem ideia da complexidade de se colocar em prática um programa radical de privatização. Muita gente imagina que basta um desejo político do governo. De fato, esta é uma condição necessária, mas não suficiente.

Uma coisa é certa. Privatizar leva tempo. Não é possível usar a venda de ativos como bala de prata político-eleitoral. Se essa for a principal arma para enfrentar a crise fiscal, pode-se terminar pior do que começou. A privatização ampla exige mudanças legais. Banco do Brasil, Caixa e Petrobrás, assim como a Eletrobrás, têm a venda do controle proibida por lei e dependem do Congresso Nacional.

Evidente que a firmeza do Executivo ajuda. Nesta quinta-feira, 30, mais três distribuidoras da Eletrobrás foram vendidas, apesar de toda a resistência política. Com isso, o número de estatais que era de 154 em 2015 passa para 140, consequência não só de privatizações, mas de fusões de empresas que atuavam na mesma atividade e liquidação das inviáveis ou desnecessárias.

É preciso muita cautela com as previsões de arrecadação. Organizando por áreas de atuação o quadro fica mais claro e ajuda na avaliação. No sistema Petrobrás são 37 empresas; na Eletrobrás mais 35. Vendendo o controle das duas empresas de energia cairia à metade o número de estatais. O Sistema Financeiro – incluídos Banco do Brasil, Caixa e BNDES – é composto por 25 instituições. Sem incluir esses setores a privatização não tem impacto fiscal.

Segue-se um grupo de empresas cuja privatização já passou da hora, como Telebrás, além de conjunto diversificado de outras estatais, muitas sem capacidade de sobrevivência sem os aportes permanentes do Tesouro. Algumas são justificáveis, como Embrapa. Outras dependem do fim do monopólio estatal estabelecido pela Constituição, caso da Nuclep. Mas a maioria, não.

Há várias estatais que são invendáveis porque não valem nada, como Ceitec e Valec. Nesse caso, só resta fechar e pelo menos estancar o prejuízo.

As empresas estatais de capital aberto têm, somadas, valor de mercado perto de R$ 480 bilhões, sendo que a fatia da União no capital é bem menor. Digamos, numa previsão otimista, que essa participação seja de R$ 300 bilhões. Com muito boa vontade vamos considerar uma valorização de 100% com o simples anúncio da privatização e chegaríamos a R$ 600 bilhões.

Petrobrás e Banco do Brasil respondem por 60% do total. A maioria dos candidatos não cogita vendê-las. Sem elas, seriam pouco mais de R$ 200 bilhões. Há também quem faça contas de forma mais pessimista: um feirão das estatais derrubaria os preços dos ativos, ao invés de valorizar.

Avaliar empresas de capital fechado é ainda mais difícil. Correios, por exemplo, tem valor patrimonial positivo no balanço, mas provavelmente valor presente negativo, dado o potencial passivo trabalhista.

Em muitos casos o que importa é o fim da sangria de recursos públicos, e não quanto seria arrecadado. Nos casos de fusão, há redução de estatais, mas nenhum recurso será gerado. Tudo somado não dá trilhão.

A desestatização deve buscar o equilíbrio entre maximização do valor arrecadado e o aumento da eficiência na oferta de produtos e serviços. A forma de venda depende do peso que se dá a cada um desses objetivos e o impacto fiscal no curto prazo idem.

Vejamos o caso da Petrobrás. A venda do controle numa simples operação de mercado seria o caminho mais rápido, mas apenas transferiria monopólio público para o privado. A forma de venda também define a destinação dos recursos.

Se o objetivo for gerar recursos para a União, subsidiárias devem ser separadas da holding, o que exige a cisão de ativos, que gera outros desdobramentos legais, como direito dos minoritários e a necessidade de lei autorizando a criação de novas estatais. Para evitar essas complicações, o plano de desinvestimento da empresa optou pela venda direta das subsidiárias, mas, nesse caso, os recursos vão para a empresa e não para a União.

Por fim, todos os processos devem ser aprovados pelo TCU antes da publicação do edital de venda. As dificuldades são imensas, mas não intransponíveis. Privatizar é coisa séria, não combina com bravata eleitoral.

E sim, eu, por mim, privatizava tudo.

*Elena Landau é economista e advogada


O Estado de S. Paulo: 'Eleição de Bolsonaro ou volta do PT seriam tragédias', diz Elena Landau

Recém empossada como presidente nacional do movimento Livres, que defende a pauta da liberdade na economia e nos costumes, a economista afirma que encara o atual cenário político com 'apreensão'

Por Paulo Beraldo, de O Estado de S.Paulo

A economista e advogada Elena Landau, recém-empossada como presidente nacional do movimento suprapartidário Livres, de orientação liberal, afirmou em entrevista ao Estado que a eleição de Jair Bolsonaro (PSL) ou a volta do PT seriam "duas tragédias para o País". Landau, que foi uma das principais economistas do PSDB por 25 anos e se desligou do partido em 2017, assumiu a liderança do movimento em 21 de agosto e disse que encara o atual cenário político com "apreensão". Ela também criticou o populismo das campanhas nas eleições 2018.

Nos anos 1990, Landau colaborou com o Programa Nacional de Desestatização e, durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, foi diretora do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), onde atuou de 1994 a 1996. Em agosto de 2017, Landau endereçou uma carta ao PSDB, escrita em conjunto com os economistas Edmar Bacha, Gustavo Franco e Luiz Roberto Cunha, anunciando o desligamento da sigla. A carta dizia que o PSDB deixou "vazio o centro político ético de que o País tanto precisa" porque foi "incapaz de se dissociar de um governo manchado pela corrupção".

Entre as propostas, o Livres defende a criação de "bancadas da liberdade" ao redor do País, com a defesa de temas como a igualdade de oportunidades, a redução do tamanho do Estado, mais eficiência na máquina pública e a desburocratização da economia. O grupo se define como liberal "por completo", tanto em temas econômicos quanto nos costumes.

A seguir, os principais trechos da entrevista:

O movimento Livres tem interesse de se tornar um partido no futuro?
No momento, descartamos a ideia de ser um partido. Existe uma enorme barreira à entrada do novo na política. Começar do zero é muito caro. Nossos associados não têm o perfil de construir um partido. Para montar um partido é preciso dezenas de milhões de reais.  A lei eleitoral é feita para se retroalimentar. Quem tem mais bancada ganha mais dinheiro, quem tem mais dinheiro ganha mais tempo de TV e por aí vai. Hoje, a gente acredita que é até melhor ser um movimento suprapartidário. Muitos potenciais apoiadores têm nos procurado porque isso dá mais liberdade. Mas isso não significa que o Livres abriu mão da ideia de atuação política. Temos a intenção de, ao longo do tempo e começando por essa eleição, termos 'bancadas da liberdade' ao redor do Brasil.

O que seriam bancadas da liberdade?
Se o Congresso tem a bancada da bala, a bancada do boi, queremos ter também as bancadas da liberdade, que defendem o combate à burocracia, que propõem um Estado eficiente, mais próximo da população, com igualdade de oportunidades e facilidades para os empreendedores de todas as rendas.  E também defendemos a liberdade nos costumes, uma pauta mais progressista, com liberdade de expressão, casamento homoafetivo e legalização da maconha. Deixamos de usar a palavra liberal porque ela ficou distorcida, já que muitos candidatos conservadores que não têm nada de liberal usam essa palavra. O Livres trabalha para dar ao cidadão a possibilidade de ser dono de seu destino.

Quais as metas do Livres para as eleições 2018?
Estamos com muita expectativa. Temos cerca de 40 candidatos em todos os níveis de governo. Temos muita capilaridade e nosso foco serão nos deputados estaduais. Mas, para 2020, quando estivermos mais consolidados, com grupos estruturados de governança, de política pública, com um conselho acadêmico, teremos mais força.

Após o processo eleitoral, quais os planos?
Vamos fazer uma série de eventos com os associados, conselheiros, debates e dar mais visibilidade (ao Livres). Nossa ideia é acompanhar a votação de projetos que sejam compatíveis com a agenda da liberdade. Vamos municiar parlamentares com análises de projetos, idas ao Congresso, participação nas assembleias e debater projetos que tenham a ver com o que defendemos. Não é só um grupo conceitual, teremos uma participação concreta.

De onde vem a cor roxa do movimento Livres?
Em geral, as pessoas dizem que a pauta progressista está na esquerda, simbolizada pela cor vermelha. E tem um grupo de pessoas com ideias liberais na economia que são representadas pela cor azul.

Como a sra. avalia o atual quadro político brasileiro?
Encaro com muita apreensão porque vejo nos dois candidatos que lideram as pesquisas (Lula e Bolsonaro) a gravidade da situação fiscal. A volta do PT ou a eleição de Bolsonaro seriam duas tragédias. O Centro tem que se unir porque, caso contrário, vai acabar empurrando os extremismos para o segundo turno.

Depois de termos passado por Mensalão, Petrolão, pela recessão, achei que seria diferente, mas começou a campanha e virou populismo de novo. Ninguém quer ouvir quem fala a verdade. Aí surgem ideias mirabolantes como resolver a dívida pública vendendo todas as estatais.

Vem o Ciro Gomes (PDT) com a proposta de tirar todo mundo do SPC, mas alguém vai ter que pagar essa conta. São ideias falsas que dão errado. Se puxar de um lado, falta do outro.

Depois, o PT vem com essa história de campanha de uma pessoa claramente inelegível aparecendo nas pesquisas. Isso confunde os eleitores.

O Fernando Haddad, que era considerado moderado, está falando as coisas mais impensáveis para se legitimar dentro do próprio partido. Então, eu estou muito pessimista.
Ao mesmo tempo, a sra. costuma defender uma agenda positiva da política...

Não adianta entrar na política com desprezo pela política, com esse discurso do "renova tudo, falando que nenhum político presta", cheio de ataques a adversários. Nem todo parlamentar é ruim e não precisa renovar tudo porque também tem muita gente boa no Congresso e na política. Defendemos uma agenda mais pragmática.