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Vera Magalhães: Eleitor rejeita 2º turno de 2018

Bolsonarismo e lulopetismo são as forças mais derrotadas nas eleições municipais

Dois anos depois, o eleitor do Brasil mostra ter virado a página da polarização que levou ao segundo turno entre Jair Bolsonaro e o PT, em 2018. O mapa que sai das urnas não tem, no comando das capitais, nenhum bolsonarista-raiz e nenhum petista, e isso não é pouca coisa, nem é incidental. Tanto o presidente quanto Lula e o PT acharam que bastava manter o script de dois anos atrás que os resultados se repetiriam. O presidente montou seu circo nas redes sociais, liberou a tropa para plantar fake news, fez pouco caso da necessidade de um partido organizado e escolheu a esmo candidatos para chamar de seus em todo o País, com base quase sempre numa identificação ideológica rasa. Usou e abusou de recursos públicos para bombá-los. Foi fragorosamente derrotado.

Lula e o PT acharam que 2020 seria a forra de 2016 e 2018. Finalmente o eleitorado reconheceria que a Lava Jato foi uma farsa, o impeachment de Dilma Rousseff, um golpe, e a condenação e prisão de Lula uma jogada para dar vitória a Bolsonaro, com a cumplicidade da imprensa. Ficou falando sozinho e foi superado por outras legendas de esquerda, que já saem das urnas avisando: não vai dar para querer cantar de galo hegemônico para 2022.

E se esses foram os grandes derrotados, quem vence? Os grandes partidos de centro e centro-direita, aquele mainstream humilhado nas urnas em 2018, curiosamente. DEM, PSDB e PSD tiveram importantes vitórias nas capitais mais relevantes, e o MDB deu uma boa desidratada, mas manteve sua capilaridade nacional e agora vê o Progressistas lhe fazer sombra nas cidades pequenas e médias.

Na direita, a implosão do PSL e o envelhecimento precoce do Novo deram espaço a siglas como o Patriota, que será disputado entre bolsonaristas e MBL. E a esquerda pós-Lula? Viverá discreta corrida entre Ciro Gomes e Guilherme Boulos pelo protagonismo. O primeiro construiu boas alianças com PSB e até o DEM e fincou bandeira no Nordeste. O segundo é a ave mais vistosa da esquerda, case de sucesso em renovação de discurso e identificação com os jovens, tendo mostrado caminho exitoso nas pautas sociais sem precisar passar pano na corrupção petista nem pagar tributo a Lula.


Eliane Cantanhêde: Eleitor dá uma grande vitória ao País

Depois de se aventurar sem racionalidade em 2018, eleitorado desta vez preferiu caminhar em terra firme e a grande vitória destas eleições é da política tradicional

As eleições de 2018 foram um hiato e as de 2020 repõem as coisas nos devidos lugares. Assim como nesses dois anos evaporaram todas as bandeiras de campanha do presidente Jair Bolsonaro, também sumiram de Norte a Sul os partidos, candidatos e compromissos inventados sob o rótulo de “nova política”. Eles não tiveram vez.

Depois de se aventurar sem racionalidade em 2018, o eleitorado desta vez preferiu caminhar em terra firme e a grande vitória destas eleições é da política tradicional, do conhecido, de quem tem serviço prestado. A direita belicosa de Bolsonaro ficou pelo caminho, junto com o PSL, militares, policiais, bombeiros e juízes que se meteram onde não deviam.

A “nova-velha” centro direita, que se contrapõe à extrema direita bolsonarista, é mais moderna e confiável, não surpreende a vantagem de DEM e PSDB, que concorreram separados, mas devem se encontrar em 2022. O DEM ganhou em primeiro turno Salvador, Curitiba e Florianópolis e, no Rio, o ex-prefeito Eduardo Paes enfrenta no segundo turno o atual prefeito, Marcelo Crivella, que tem índices recordes de rejeição.

O PSDB chega em primeiro em São Paulo, reelegeu Cinthia Ribeiro em Palmas e disputa bem em Natal, Campo Grande e Porto Velho. Se Bruno Covas for reeleito, como tudo indica, deverá gerar um outro troféu: o MDB deverá ter o maior número de prefeituras, mas os tucanos poderão governar o maior número de eleitores no País.

Na outra ponta, a esquerda surpreende bem na reta final, mas não o PT. Guilherme Boulos (PSOL) terá dificuldades contra Covas no segundo turno, porque a resistência será forte em São Paulo, mas ele já teve uma conquista: a liderança das esquerdas, que estão bem em Belém, com PSOL, Porto Alegre, com PCdoB, e numa disputa em Recife entre PSB e PT, aliás, entre bisneto e neta do velho Miguel Arraes, grande referência política no Estado.

É assim que, apesar dos problemas do TSE, já se pode concluir que o eleitorado parou de brincar de novidades perigosas e voltou a olhar quem é quem, quem fez o que e o que são e representam os reais partidos. Só isso já é uma grande vitória.


Alon Feuerwerker: Duas eleições. E as dúvidas entre o "se" e o "quando"

Não haverá debates, ou haverá poucos. A propaganda compulsória no rádio e na TV, dizem, atrairá bem menos interesse. O eleitor está tomado de preocupações relacionadas à pandemia da Covid-19 e à situação da (própria) economia. Há candidatos demais a prefeito, uma grande dispersão, o que provoca certo cansaço antecipado. E a campanha de rua e o corpo a corpo estão bastante limitados.

Bem, se tudo isso for mesmo verdade estas serão as eleições da inércia. E a inércia beneficia os mais conhecidos, quem está na frente nas pesquisas. E a grande dúvida: o que pode romper a inércia?

Um forte propulsor da tendência inercial são a homogeneização e pasteurização das candidaturas. O desfile dos nomes e suas propostas transmite certa sensação de "fim da história". Todo mundo propõe alguma modalidade de renda básica, mais dinheiro para as escolas, mais atenção para a saúde, subsídio ou gratuidade para o transporte, e por aí vai.

Eleições locais têm mesmo a tendência de serem essencialmente paroquiais, mas o grau previsto de paroquialidade destas apresenta uma contradição flagrante com o ambiente de polarização em que a sociedade brasileira já vem mergulhada há anos. Outra dúvida: a chegada da polarização nestas eleições municipais é uma questão de "se" ou de "quando"?

Bem, aqui cada um tem seu palpite, então lá vai mais um. Talvez estejamos diante do cenário não de uma eleição, mas de duas. Uma nos primeiros turnos repletos de candidatos, na maioria inexpressivos, com o eleitor desatento e desinteressado. Outra nos segundos turnos, quando o mano a mano irá, quem sabe?, impor automaticamente alguma polarização.

Joga contra a polarização, mesmo na eventual segunda rodada, o fato de a esquerda exibir muita fraqueza, numa escala inédita pelo menos nos últimos trinta e poucos anos. Até agora, a presença de candidatos competitivos da esquerda tem sido exceção. A praxe é a disputa mais provável estar entre as diversas correntes que se autonomeiam do centro para a direita que se declara como tal.

Claro que sempre é possível uma reviravolta, mas talvez seja sinal de que a vitória de Jair Bolsonaro em 2018 tenha sido mais estratégica que circunstancial. A dispersão das candidaturas de esquerda explica apenas parte do quadro. Tirando as exceções, mesmo a soma das intenções de voto do chamado campo progressista está abaixo de desempenhos anteriores.

Outra variável a checar será a influência dos padrinhos nacionais. Outro palpite: ela tende a ser bem menor na eleição municipal que na presidencial.

Vamos então olhar o desenrolar dos acontecimentos. E vamos olhar também para o pós-eleição. Quando o eleitor finalmente se deparar com o provável cenário combinando 1) o fim do auxílio emergencial (mesmo os programas cogitados para substituir não parecem tão apetitosos assim), 2) o possível aumento de impostos, 3) a inelasticidade do desemprego.

Aguardam-se as consequências. Também aí a dúvida está entre o "se" e o "quando".

Alon Feuerwerker é jornalista e analista político/FSB Comunicação


Cristovam Buarque: Armas e urnas

Diante da violência generalizada por bandidos armados, os eleitores foram às urnas para eleger um candidato que defendia autorização para facilitar a posse de armas. Com a ilusão de que arma guardada em casa impede bandido, o eleitor teve razão no seu voto, e o presidente eleito, comprometido com sua promessa, tem razão em cumprir seu compromisso. As urnas pediram armas.

Os eleitores sempre têm razão, mas nem sempre estão certos. A razão vem do clima de desconfiança e do desespero, mas estar certo depende dos resultados que serão obtidos: nada indica que o armamentismo vai reduzir a violência no presente, e tudo indica que vai trazer consequências negativas no futuro.

Precisamos de polícia armada para nos defender, não de nos armarmos para reagir a ruídos na porta, desentendimento no trânsito, rejeição de atendimento a um familiar doente nas portas de hospitais. Em outubro, armas e urnas casaram, mas não darão bons frutos.

Um mínimo de lucidez sem demagogia permite imaginar os negativos resultados do armamentismo individual: aumento no desprezo e na falta de respeito aos policiais e soldados; mais armas nas mãos de bandidos que se dedicarão a roubar pessoas de que eles desconfiem ter armas; pessoas decentes que em momento de raiva se transformarão em assassinos; risco de nas mãos de crianças de famílias descuidadas provocarem tragédias definitivas. Autorizar posse de arma não combate a violência, expande-a, leva-a para dentro de casa, nas mãos de menores curiosos, de maridos violentos, de vizinhos nervosos.

Num tempo em que não se confia na polícia e nos policiais, nem em outras forças armadas e profissionais da segurança, o eleitor votou no que lhe parecia ser o melhor caminho para se defender. Sobretudo quando os próprios governantes recomendam não confiar na polícia nem nos policiais e autorizam cada um a comprar sua arma.

O eleitor iludido tem razão, mas comete um equívoco; o governante ilude e compromete a segurança, no lugar de enfrentá-la. A solução correta seria recuperar a confiança do eleitor na polícia e nas forças armadas, mas preferiu-se a solução simplista e demagógica de concordar com o cidadão para manter o desprezo à polícia e assumir o papel de defender pessoalmente a si e sua família.

O voto foi democrático, o presidente cumpre sua promessa de campanha, mas eleitores e ele estão errados, porque em política nem sempre ter razão é estar certo. Ter razão vem dos argumentos que ouvimos e nos convencem, estar certo decorre dos resultados positivos que ocorrerão em função da decisão tomada.

Pior é que esse armamentismo dificilmente será revertido. Uma vez armados, brasileiros nunca mais serão desarmados. Os que têm dinheiro para comprar armas e balas vão adquirir o direito e, no Brasil, direito adquirido fica pétreo para os ricos. Não faltarão políticos demagogos e populistas para serem aplaudidos ao proporem juros baixos para os pobres comprarem armas e “bolsas-bala” para municiá-las.

Além disso, medidas simplistas como essa tendem a impedir debates sérios. Iludem, ofuscam e fogem de perguntar por que o país que antes instigava pela tolerância agora intriga por substituir o diálogo pela intolerância; que aceitava e até se divertia com suas divergências, agora transforma as divergências em disputa, brigas, guerras.

O país que instigava pela tolerância é o campeão mundial de mortes violentas com mais de 60 mil assassinatos por ano, é campeão de concentração de renda e de desprezo aos professores; último colocado na qualidade de suas escolas e pior na desigualdade como suas crianças são educadas.

Não se debate como foi possível manter a persistência da pobreza ao longo de décadas, sem renda suficiente, água, esgoto, cultura; como deixamos nossas cidades se transformarem em “monstrópoles”, no lugar de metrópoles; como perdemos o controle e deixamos continuar o desmatamento da Amazônia, a contaminação dos rios, a sujeira nas ruas; sobretudo não nos perguntamos por que ficamos violentos, achando que o problema decorre da falta de armas nas mãos dos cidadãos e não do excesso delas na sociedade desigual, descontente, desconfiada.

No lugar de buscarmos soluções definitivas, o armamentismo aparece como opção simplista que não resolve e muito possivelmente agravará o problema. No lugar de entendermos o porquê da violência e como construir harmonia, estamos preferindo iludir o eleitor com a demagógica e grosseira falta de lucidez de que mais armas constrói paz e reduz mortes. (Correio Braziliense – 15/01/2019)

Cristovam Buarque, senador pelo PPS-DF e professor emérito da UnB (Universidade de Brasília)


William Waack: O abismo é outro

Diante do que vem aí, vencer as eleições foi só o mais fácil

Pergunta que começa com “se” não tem resposta. Por isso pode parecer inútil perguntar como teria sido a corrida eleitoral de 2018 se não tivesse ocorrido o atentado contra Jair Bolsonaro, se Lula não tivesse destruído a possibilidade de uma união inicial das esquerdas, se as forças ao “centro” do espectro político tivessem identificado lá atrás qual o eixo em torno do qual se alinhou a grande maioria do eleitorado (o repúdio ao sistema e o antipetismo).

Ocorre que o exercício do contrafactual (“o que teria sido se”) é útil, sim. Antes de mais nada, serve para demonstrar que não existe o “inevitável”. Que a política é, por definição, o terreno do imponderável e do acaso. E que escolhas feitas por agentes políticos – por Lula, Bolsonaro, Fernando Henrique, Ciro, ou quem você quiser – têm a condição de alterar o rumo das coisas dentro dos grandes limites impostos, por exemplo, pela herança do passado.

Sendo enorme a probabilidade de que o tsunami político que empurrou Bolsonaro o elegerá presidente, essa onda, “inevitavelmente”, nos conduzirá até onde? Parece evidente que esse fenômeno social e cultural (o embate político tem as características da “guerra cultural” de valores, não importa se a gente aplaude ou repudia o que Bolsonaro e o PT dizem) alterou fundamentalmente nossa paisagem política, dando cara e voz a um nutrido eleitorado antes disperso e desorganizado (estou evitando colocar rótulos).

É um eleitorado que desconfia da imprensa, da Justiça, da política e que tem medo, sente-se órfão das instituições, acha que seu esforço individual é torpedeado pelo Estado, pelos impostos, pela burocracia e por “eles” em Brasília, e encontrou uma resposta (se você gosta ou não, é outra conversa) na figura de Bolsonaro. O que eu algumas semanas atrás chamava de “choque de placas tectônicas” entre o desejo de mudança e a velha política parece ter produzido o rompimento de um dique político e abriu uma enorme avenida de oportunidade ao mesmo tempo em que levanta um ponto de interrogação igualmente enorme.

Pois sendo coerente com os princípios acima, nem está “garantido” que essa onda produza os resultados que Bolsonaro simboliza neste momento e nem sabemos que capacidade de articulação e liderança políticas ele será capaz de demonstrar – diante dos desafios e das encruzilhadas nos quais o País se encontra, vencer as eleições terá sido apenas a mais fácil de todas as tarefas.

Derrotar o petismo como agremiação política não significa derrotar as ideias que o partido defende e que, na minha opinião, estão na raiz do fato de o Brasil se encontrar perigosamente preso na armadilha dos países de renda média, ter sido complacente com corrupção, atraso e taxas horrendas de criminalidade. Essas características de mentalidade não foram inventadas pelo PT, que deve grande parte de seus sucessos eleitorais justamente por representá-las tão bem.

Essa mentalidade é o que chamei no fim do segundo parágrafo deste texto de limites impostos pela herança do passado. É neste ponto – na capacidade de rebelar-se contra os limites reconhecidos – que se destacam os verdadeiros agentes políticos da mudança e das transformações capazes de alterar o rumo de acontecimentos.

Do jeito que as coisas estão, o Brasil está à beira do perigosíssimo abismo da estagnação, paralisia e mediocridade.

Não é inevitável cair nesse abismo. Depende de escolhas humanas além daquelas que já parecem ter sido feitas pelos eleitores.


Ascânio Seleme: Não culpe o eleitor

Os partidos não apresentaram programas, e os pré-candidatos tampouco tiveram chance de mostrar o que pretendem fazer. O eleitor só decidirá depois de conhecer os dados

Aquilo que institutos de pesquisa chamam de indecisão é na verdade resultado da ausência de elementos objetivos para o eleitor fazer a sua escolha. A ele ainda não foram oferecidas as condições para apontar em quem vai votar para presidente. Os partidos não apresentaram programas, e os pré-candidatos tampouco tiveram chance de mostrar o que pretendem fazer. Até agora, tudo de que o eleitor dispõe são biografias, discursos e entrevistas recortados por aí. Não são suficientes. O eleitor só decidirá depois de reunidos os dados necessários.

O que se pode dizer a esta altura é que a história do Brasil prova que o eleitor é muito mais cuidadoso e racional quando vota em candidato a cargo executivo. Quando decide quem vai cuidar da sua rua, da sua cidade, do seu estado ou do país, ele tende a ser mais racional e caprichoso no seu voto. Desde Collor, talvez com essa única exceção que confirma a regra, os presidentes eleitos do Brasil foram melhores do que os seus Congressos.

Não há dúvida de que Fernando Henrique Cardoso era melhor que os deputados e senadores que ocuparam as cadeiras do Congresso durante seus dois mandatos. Pode-se afirmar a mesma coisa de Lula e até de Dilma, apesar de o primeiro estar preso por corrupção e lavagem de dinheiro e a segunda ter sido afastada do cargo por crime na execução do orçamento, as famosas pedaladas fiscais.

Mas você pode dizer que esta regra para valer precisa ser comprovada nos estados e nos municípios. Se você prestar atenção, verá que ela se comprova. Mesmo no Rio. Alguém discorda de que Cabral, antes de começar a meter a mão no cofre público, era melhor que a Assembleia Legislativa, a famosa Alerj? Acho que não.

Embora cada eleição seja uma nova corrida, o que o eleitor quer em todas é ver os seus problemas resolvidos ou pelo menos encaminhados. O eleitor brasileiro sabe que a eleição presidencial de outubro é a mais importante do país desde a redemocratização. Sabe que o que está em jogo é o futuro do país, da coletividade, o seu próprio futuro. O eleitor é pragmático. Não é por outra razão que muitos deixam para decidir apenas na última hora.

Entre os pré-candidatos a presidente já lançados, há os que atendem às demandas do eleitor e outros que jamais as alcançarão. Aquele que promete colocar bandido na cadeia e acabar com a corrupção na porrada não cola. O eleitor sabe que quem prende bandido e corrupto é juiz, não presidente. Ele reconhece, de longe, quem está mentindo, quem está enrolando, quem está jogando para a plateia. E sabe também até onde um candidato pode ir. Poucos ainda caem em promessas mirabolantes.

As pesquisas feitas hoje, mesmo as sérias, não servem de balizamento para se dizer como votará o eleitor. Apesar de as necessidades do eleitor serem bastante conhecidas, para atendê-las, não basta prometer e jurar. Tem que explicar como vai fazer, quanto vai custar, de onde vai tirar o dinheiro e quem vai pagar a conta. O custo da greve dos caminhoneiros foi muito educativo neste aspecto.

Na hora de votar, o brasileiro precisa que os candidatos a presidente mostrem o que farão com a economia para que o país volte a crescer e gerar empregos; como pretendem resolver o problema da Previdência; como vão controlar os gastos públicos e onde vão fazer cortes; de que maneira tratarão os impostos altíssimos que paga; e que respostas terão para a segurança, a saúde e a educação.

O eleitor, portanto, não é o problema. Atender às suas demandas é objetivo e obrigação de quem entra na vida pública. Sobretudo dos que querem presidir o país. São muitos os candidatos, o Brasil é uma fábrica de fazer partidos e candidatos. Mas são poucas as opções do eleitor. Variando entre a esquerda e a direita, há no máximo três ou quatro alternativas de orientação política disponíveis.

A lista de candidatos é desanimadora. Nas águas turvas da extrema-direita está o PSL (Bolsonaro). No Centro, PSDB (Alckmin), Podemos (Alvaro Dias) e PMDB (Meirelles). No Centro há variações para a esquerda ou para a direita. O PT (o poste de Lula) é centro-esquerda, assim como o PDT (Ciro) e a Rede (Marina). E há inúmeros nanicos na centro-direita. À esquerda estão os pequenos de sempre, PCdoB (Manuela) e PSOL (Boulos). Além dos partidos novos, que ainda terão de mostrar a que vieram, há os irrelevantes de sempre. O novo presidente do Brasil sairá dessa lista, é pegar ou largar.

* Ascânio Seleme é jornalista


Murillo de Aragão: O analógico, o digital e o abismo

Enquanto a sociedade caminha celeramente para ser digital, o mundo político continua analógico 

Enquanto o comércio e a indústria se esforçam para entender e atender o que o consumidor deseja, a política insiste em tratar o eleitor com desdém e distância, e com uma narrativa envelhecida e desassociada da realidade, destinada meramente à competição eleitoral.

Temos hoje quase 100 milhões de contas de Facebook. Quase 70% dos usuários de telefonia celular – cerca de 120 milhões de brasileiros – podem estar usando o WhatsApp. Mesmo assim, a política continua tratando o eleitor como se ele fosse analógico.

E, como resposta ao desafio dos novos tempos, propõe mudar o nome dos partidos. Por isso surge agora uma leva de agremiações com novos nomes, como Podemos, Patriotas, entre outros.

Os partidos mudam a roupa mas não o âmago da questão. Continuam mais antigos do que o telefone de manivela. E poucos se importam. A maioria ainda se vale do “deixa estar para ver como é que fica” e do “devagar se vai ao longe”. Só que o Brasil tem pressa, ainda que o mundo político não tenha. Não à toa a Reforma Política todo ano entra na pauta e não muda quase nada.

A política insiste em ser irrelevante. Descartável e quase abjeta. Não apenas por conta da cidadania deseducada e desinteressada, mas também pelo clientelismo desenfreado e afastado dos princípios. É a política tão somente vinculada a interesses particulares.

Outro dia li que em um debate das esquerdas radicais tinham colocado em um quadro os nomes dos políticos “velhos” e os dos políticos “novos”. O ex-presidente Lula e o senador Aécio Neves (PSDB-MG) tinham sido colocados no rol dos velhos. Já o ativista político Guilherme Boulos, líder do MTST, e o deputado Marcelo Freixo (PSOL-RJ) entraram na lista dos “novos”.

Grande ironia. Nessas listas temos de tudo em matéria do que é antigo e arcaico na política nacional. Lula e Aécio são políticos arcaicos e analógicos. Boulos e Freixo também. Nenhum dos quatro é digital. Acho que também nem são analógicos. Vivem no tempo do telefone a manivela e do guaraná de rolha!

A política digital está propondo um novo debate e uma forma mais pragmática de se tomar decisões, fundamentada sobretudo em princípios. Porém, não existem nomes para personificar essa política digital. A omissão de todos nos penaliza. Boulos e Freixo acreditam na utopia socialista. Lula e Aécio em utopias particularistas. Nenhum deles funciona para os novos tempos. Assim, sem políticos para os novos tempos, continuaremos a ser irrelevantes para nós mesmos. Enquanto isso, ocorrem cerca de 155 homicídios por dia no Brasil.

* Murillo de Aragão é cientista político