Dina Lida Kinoshita

Professora aposentada da USP conta saga familiar e luta pela democracia em livro

Dina Lida Kinoshita participará de webinar sobre a obra Um tijolo para uma construção grandiosa, de sua autoria, no dia 27 de setembro

Cleomar Almeida, da equipe FAP

Militante na luta pela redemocratização no Brasil e filha de judeus, a professora aposentada do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (IF-USP) Dina Lida Kinoshita, de 74 anos, registra a saga de sua família, atingida por epidemias, guerras, revoluções e mortes, em novo livro editado pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP). A obra será lançada, na segunda-feira (27/9), a partir das 19h, em webinar da entidade.

Com o título Um tijolo para uma construção grandiosa: memórias de Dina Lida Kinoshita (344 páginas), a obra reúne 48 textos da autora, abordando assuntos como o quase centenário Partido Comunista Brasileiro (PCB), assim como a anistia e a divisão da oposição. O livro também tem relatos sobre a redemocratização, a primeira eleição presidencial direta desde 190 e os governos Collor, Itamar e FHC.

Assista!



O evento de lançamento online do livro será transmitido em tempo real, no portal da FAP, na página da entidade no Facebook e no canal dela no Youtube. Além autora, também confirmaram participação no webinar o sociólogo José Claudio Berghella, prefaciador da obra; o físico e consultor Laurindo Junqueira e a doutora em ciências sociais Esther Kuperman.

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Dina mudou-se com os pais para o Brasil ainda nos primeiros anos de vida dela, com lembranças de seus antepassados. “Meu avô faleceu numa epidemia de tifo que grassou no fim da Primeira Guerra Mundial, e minha mãe, Frania Lida, nascida em 1917, mal se lembrava dele. Acabou sendo educada por sua mãe e por dois irmãos mais velhos, Alter e Israel Lida”, relata.

livro Um tijolo para uma construção grandiosa
Professora aposentada da USP Dina Lida Kinoshita
Dina Lida Kinoshita mudou-se para o Brasil ainda criança
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Anos depois, com a invasão nazista no dia 1º de setembro de 1939, conforme escreve a autora, as pessoas que ficaram na Polônia tiveram o mesmo fim de toda a comunidade judaica do país do leste europeu. Diversos familiares da autora morreram. “Não conheci avós, irmãos, tios e primos de primeiro grau”, conta ela, na obra.

https://youtu.be/f8CO0wX6U1U

“No pós-2ª Guerra, viemos para o Brasil, onde me criei, estudei, trabalhei, constituí uma família, mas não tive uma vida comum”, lembra. Ela militou no PCB, desde os 14 anos de idade, durante a maior parte do tempo no partido considerado clandestino e ilegal por causa da ditadura.

Além disso, Dina participou da luta pela redemocratização e acompanhou as grandes mudanças ocorridas no mundo, no limiar do século 21. Elas acarretaram uma nova formação política do PCB, com o Partido Popular Socialista (PPS), que mais tarde viria a se tornar o Cidadania.

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A autora também militou no movimento estudantil secundarista, ainda durante o governo de João Goulart (1961-1964), e durante a ditadura de 1964-1985, em condições muito adversas no movimento estudantil universitário. Em 1971, foi contratada como docente na USP, pouco depois das aposentadorias compulsórias de grandes mestres.

“O ar na universidade era irrespirável”, afirma. Após 1975, ela ajudou na reorganização do núcleo de professores e teve uma grande participação na Associação dos Docentes da USP (Adusp).

Com a ascensão de Ronald Reagan e Margareth Tatcher ao poder, nos anos 1980, acirrou-se a escalada da Guerra Fria, e ela passou a militar mais diretamente, no campo da esquerda, em nível nacional e internacional, assumindo maiores responsabilidades e cargos.

Decorreu daí o seu trabalho, durante vinte anos, na Cátedra Unesco de Educação para a Paz, Direitos Humanos, Democracia e Tolerância. Durante 16 anos, colaborou com a FAP, criada no ano 2000, em Brasília.

“Penso ter contribuído com um tijolo para uma construção grandiosa que depende de milhões de homens e mulheres que lutaram, lutam e lutarão por um mundo melhor. Não estou desistindo e continuarei, dentro de minhas possibilidades, a dar o melhor de mim por este maravilhoso objetivo”, ressalta.

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Prefaciador do livro, o doutor em sociologia pela UPS José Claudio Berghella observa que “as memórias de Dina não são tão somente a narrativa de episódios de uma vida ou de um tempo”. “É, acima de tudo, a encarnação daquilo que é ser militante. Não a comparo aos quadros profissionais do Partido, de antes ou de hoje. Estes são quadros do aparelho”, pondera.

“Miro uma vida que abraça uma ideologia que, de per si, vai na contramão do status quo, que carrega o fardo da luta por liberdade e igualdade, enfrentando o peso da reação, a incompreensão, a repressão e, porque não, os desatinos não pouco frequentes dos seus dirigentes”, continua Berghella. “Miro aquele que é capaz de entender seus erros e ter a coragem de fazer e assumir, na prática, a autocrítica”, assevera.

Evento online de lançamento nacional livro

Título: Um tijolo para uma construção grandiosa: memórias de Dina Lida Kinoshita

Autora: Dina Lida Kinoshita

Editora: Fundação Astrojildo Pereira

Data do webinar: 27/9/2021

Transmissão: das 20h às 21h30

Onde: Portal e redes sociais (Facebook e Youtube)

Realização: Fundação Astrojildo Pereira


Dina Lida Kinoshita conta a história de judeus progressistas no Brasil

Professora aposentada da USP cita nomes que considera importantes, como o de seu pai, Wolf Lida

Cleomar Almeida, da equipe da FAP

Nascida em campo de refugiados nos arredores de Munique, na Alemanha, em 1947, a professora aposentada do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (IF-USP) Dina Lida Kinoshita, de 74 anos, é a memória viva de um país que recebeu centenas de judeus progressistas desde o início do século passado. Sua história carrega influências diretas de seu pai, Wolf Lida, do físico e cientista Mario Schenberg e do ex-presidente nacional do Partido Comunista Brasileiro (PCB) Salomão Malina.

Ainda nos primeiros anos de vida, Dina mudou-se com os pais para o Brasil, que recebeu três levas de judeus progressistas. A primeira delas chegou ao país, na primeira década do século 20, por causa de muitos problemas na Europa Oriental e, também, em razão da frustrada Revolução Russa de 1905. “Houve muita perseguição aos judeus. Então, começaram a migrar para vários países, inclusive para o Brasil”, lembra Dina, em entrevista ao portal da Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília.

Depois, perto do fim da Primeira Guerra Mundial, que iniciou em 1914 e se estendeu até 1918, o país recebeu a segunda mobilização de judeus, após a guerra civil e, concomitantemente, a guerra russo-polonesa, que marcaram o cenário lá fora.

“Os judeus foram muito perseguidos, e muita gente veio nos anos 1920. A família de Mario Schenberg chegou, por exemplo, na primeira leva. A família Malina, na segunda. Depois, nos anos 1930, com a ascensão do nazismo, veio, de novo, muita gente para cá, apesar de o Vargas ser ditador também, mas eles preferiram ficar aqui a ficar em zonas que poderiam ser ocupadas pelos nazistas”, conta a professora.






“Velho lar”
É nesse contexto que os judeus foram se “enraizando no Brasil e aprendendo a língua”, como diz a cientista. “Eles tinham um olhar sobre o que ocorria no velho lar, que é onde viveram, nasceram, e essa gente criou muitas identidades culturais. A cultura sempre mesclada com a política. Fizeram teatro, coro, escolas, colônia de férias. Então, já havia uma movimentação muito grande desses judeus que se consideravam progressistas”, afirma ela.

No entanto, no Brasil, segundo Dina, os judeus imigrantes nunca falavam que eram comunistas porque sempre tinham a espada de Dâmocles, por medo de serem deportados já para a Europa nazifacista. Assim, à medida que o tempo foi passando, os filhos deles passaram a nascer em casas comunistas. “Os jovens brasileiros foram se incluindo nesse meio”, relembra a professora, cuja vida é marcada por um enredo distinto do que foi contado até aqui.



Integrantes das brigadas internacionais na Espanha. Foto: Wikipedia

“A minha história é um pouco diferente. Meu pai nasceu no começo do século 20, em família religiosa, e saiu da casa dos pais para Varsóvia. Ele acabou se envolvendo com a juventude comunista e chegou a ser membro do Comitê Central nos anos 1930. Lutou na Guerra Civil Espanhola”, recorda Dina.

Wolf Lida era comissário político de um pedaço da Brigada Polonesa, onde lutavam os judeus. O rumo dele, porém, mudou de repente. O Partido Comunista Polonês, em 1938, foi dissolvido pela internacional comunista e não tinha mais força alguma, assim que acabou a Guerra Civil Espanhola.

“Meu pai não pôde voltar para Polônia, não tinha jeito. Ele acabou indo para a União Soviética, não ficou em Moscou porque a cidade era o centro da Internacional. Ele foi morar na região da Ucrânia que está em litígio, começou trabalhando numa mina de carvão e depois trabalhou no correio”, lembra.



A Batalha de Stalingrado foi  ponto de virada da guerra na Frente Oriental, marcando o limite da expansão alemã na URSS. Foto: Reprodução

Batalha de Stalingrado
No dia em que os nazistas invadiram a União Soviética, em 22 de junho de 1941, Wolf Lida se alistou no exército soviético, e não no polonês. “Ele passou a guerra toda na União Soviética. Lutou, inclusive, na Batalha de Stalingrado e, depois, ainda, foi para o Oriente lutar contra o Japão, mas foram lançadas bombas atômicas. E ele foi desmobilizado, voltando para Polônia”, conta.

Ainda muito criança, no Brasil, Dina passou a viver em uma atmosfera ligada diretamente não só ao PCB, mas aos partidos comunistas do movimento internacional. Ela ingressou no partido em 1961, no primeiro ano do governo de João Goulart. “Nós todos, os mais jovens, éramos mais ou menos filhos da Declaração de Março de 58, quando o partido muda toda a sua política e acaba tendo como estratégia permanente a aliança”.

Em sua juventude, Dina viveu um momento de muita efervescência cultural e política. Além de ver, de perto, o governo Jango, presenciou greves e lutas de camponeses e a série de tentativas de reformas urbanas, na época. Com atuação de destaque, ela chegou a ser dirigente da União Paulista dos Estudantes Secundaristas. Nomes como os de Mário Schenberg e Salomão Malina passaram a ser ouvidos por ela ainda nos anos 1950.



Mario Schenberg: Considerado por Albert Einstein como um dos mais importantes cientistas de sua época. Foto: Reprodução

Mario Schenberg
Aos 15 anos de idade, Dina conheceu Mario Schenberg, em 1962, ano em que ele foi candidato a deputado estadual pela segunda vez, antes de ser eleito suplente, no período da democratização pós-Segunda Guerra Mundial. “Fiz a campanha dele. Ganhou, e ainda tinha mais três deputados eleitos, mas eles não foram empossados, porque o Tribunal Eleitoral disse que eram notórios comunistas e não poderiam assumir”, relata Dina.

Logo depois do golpe militar de 1964, a jovem ingressou na faculdade. Em seguida, Mário Schenberg foi preso. Ele, que era defensor do desenvolvimento da ciência e da tecnologia no Brasil, já era um dos maiores físicos do mundo e considerado por Albert Einstein como um dos mais importantes cientistas de sua época.

Apesar de ser renomado, conforme descreve Dina, Mário Schenberg, um dos fundadores do Conselho Mundial da Paz, “era uma pessoa muito simples”. Recebia os estudantes em casa para conversar. Além disso, trabalhou com os maiores vencedores de Prêmio Nobel do mundo.

“Ele não era uma pessoa interna do partido, mas era uma pessoa que nós podíamos apresentar em qualquer lugar do país e do mundo como uma pessoa que é preocupada com o Brasil e o mundo, contra guerra e defensor da igualdade entre as pessoas”, diz a professora aposentada da USP. Ela também é autora da biografia “Mario Schenberg: o cientista e o político”. O físico morreu, em novembro de 1990, aos 76 anos.



Salomão Malina, “figura ímpar do partido”, define Dina Lida Kinoshita. Foto: Acervo O Globo

Salomão Malina
Outro grande nome da história de Dina é Salomão Malina, definido por ela como “figura ímpar do partido”. Ele era de uma turma de descendentes de judeus nascidos no Brasil. Alistou-se na Força Expedicionária Brasileira (FEB) e lutou na Itália. “Ganhou o maior prêmio de heroísmo e bravura, que foi cassado”, conta a professora aposentada.

Na época, Salomão Malina era estudante de engenharia da hoje Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e militava na juventude do partido. Abandonou tudo. Ao retornar ao Brasil, voltou com ainda mais energia política. Ele trabalhava na Tribuna Popular do Rio. Chegou a ser candidato a vereador, mas não foi eleito. Durante a ditadura, ele foi para o exílio.

Dina fortaleceu os laços com Salomão Malina depois da redemocratização do país, que ocorreu em 1985. No ano seguinte, os dois passaram a trabalhar juntos. “Uma pessoa firme, com ideias muito determinadas, mas, também, um ser humano doce, que conversava, na época, com muitos jovens intelectuais, recém-doutorados ou que ainda estavam estudando”, diz ela.

Diplomático, ele foi uma figura bastante emblemática para o fortalecimento do partido e também se preocupou com as relações exteriores. “Ele teve um câncer muito agressivo e parou de viajar. Confiava muito em mim. Como falo muitas línguas e conhecia muita gente no exterior, até por causa das comunidades judaicas, ele me mandava para tudo quanto é canto do mundo. Aprendi muito com ele”, relembra Dina.

“Não era um homem que tinha algum título universitário, mas tinha um nível intelectual muito alto. Ele foi o meu grande professor da política”, orgulha-se a professora aposentada da USP. Ela também integrou a executiva mundial da Associação Internacional dos Educadores para a Paz e o Conselho Mundial da Paz. Além disso, foi membro da Cátedra Unesco de Educação para a Paz, Direitos Humanos, Democracia e Tolerância.







Dina Lida Kinoshita: 30 anos de democracia no Brasil

Ao longo dos 126 anos do Brasil republicano ocorreram revoltas, crises institucionais e duas ditaduras de larga duração. Em 2015 comemoraram-se 30 anos de instituições democráticas ininterruptas no país, após uma transição denominada pelo General Ernesto Geisel, “lenta, gradual e segura” (KINOSHITA, D.L.,2005).

O regime republicano teve início no Brasil no dia 15 de novembro de 1889 por meio de um golpe militar que derrubou o Império e os “detentores das espadas”, mormente militares, que sofreram grande influência do ideário positivista, quer sejam de esquerda quer de direita, dominaram o cenário político durante quase um século.

A última fase ditatorial durou 21 anos e pode ser dividida em quatro momentos: a ditadura envergonhada (GASPARI, E. 2002), a ditadura escancarada (GASPARI, E.,2002), a ditadura derrotada (GASPARI, E., 2003) e a ditadura encurralada (GASPARI, E., 2004). Durante todo este período houve uma resistência ao regime cívico-militar. Os partidos existentes antes do golpe de 31 de março de 1964 foram extintos por meio de um Ato Institucional em 1965, depois que dois Estados muito importantes, Rio de Janeiro e Minas Gerais, elegeram governadores vinculados ao Presidente João Goulart, deposto pelos golpistas. Foram criados dois partidos por este Ato Institucional: a Aliança Renovadora Nacional (ARENA) de apoio ao novo regime e o Movimento Democrático Brasileiro (MDB), de oposição consentida onde se concentraram os liberais e democratas. Ainda em 1962 houve uma cisão no Partido Comunista Brasileiro (PCB) decorrente do cisma sino-soviético após o XX Congresso do Partido Comunista da União Soviética (PCUS), quando foi criado o Partido Comunista do Brasil (PCdoB). Após o golpe de 1964 travou-se uma luta renhida na esquerda. No PCB a discussão se acirrava entre os que entendiam que a política do partido, anterior ao golpe, foi muito direitista, não preparando as massas para resistir ao golpe e os que entendiam que a política foi muito esquerdista, dando ensejo à direita para prepará-lo. Entre os que entendiam que a única forma de derrotar a ditadura era a luta armada e os que compreendiam que esta só seria derrotada por uma ampla frente de massas. Em dezembro de 1967, na mais estrita clandestinidade, ocorreu o VI Congresso do PCB com a tese vitoriosa: “…mobilizar, unir e organizar a classe operária e demais forças patrióticas e democráticas para a luta contra o regime ditatorial, para sua derrota e a conquista das liberdades democráticas.” (CARNERO PESSOA, R, X, 1980).
Esta tática de isolar e derrotar a ditadura através de um amplo arco de alianças não foi aceita por amplos setores do PCB, dando origem a vários grupos armados. As outras organizações de esquerda também se fragmentaram em dezenas de siglas, todas deslumbradas com a luta armada e com a Revolução Cubana, com exceção dos maoístas que pretendiam seguir o modelo chinês. O PCdoB (maoísta) começou a implantar a infra-estrutura para a guerrilha do Araguaia, em uma região tradicional de conflitos de terra, em plena selva amazônica.

A trajetória singular do PCB que havia apostado na via pacífica e democrática num contexto internacional adverso, com os cubamos e chineses apoiando as guerrilhas enquanto a URSS congelava as reformas encetadas por Kruchev, o “socialismo com face humana” na Checoslováquia havia sido derrubado pelas forças do Tratado de Varsóvia, sem contar que a luta no Vietnã, apontava numa outra via (ALMEIDA, F, I., 2002). O PCB, em linhas gerais dava continuidade à política definida pela Declaração de Março de 1958 (REIS, D., 1981).

O confronto foi se acirrando entre as oposições e o regime militar, com greves operárias, manifestações estudantis, reuniões de ex-presidentes e governadores depostos e cassados e grupos guerrilheiros iniciando ações urbanas e rurais. Em 13 de dezembro de 1968 o governo decretou o Ato Institucional-5 (AI-5) responsável pela completa fascistização do país, com o fechamento do Congresso, censura à imprensa, centenas de pessoas presas e torturadas ou com direitos políticos cassados.

Em outubro de 1969 o Congresso foi reaberto, após a promulgação de uma nova Constituição, com a incorporação de toda a estrutura do AI-5. Durante os anos de chumbo, entre 1969 e 1973 todos os grupos armados foram aniquilados.

A partir de meados da década de 1970 há um novo contexto internacional favorável à distensão da Guerra Fria. No plano interno, a Igreja Católica que havia apoiado ativamente o golpe em 1964, passou a fazer oposição ao regime, denunciando as torturas, mortes e “desaparecimentos” e mostrando as misérias e a péssima distribuição de renda com o modelo econômico implantado no país (PONTIFÍCIA COMISSÃO DE JUSTIÇA E PAZ, 1976). O papel desempenhado por esta esquerda católica nas lutas pela redemocratização foi muito importante.

No que se refere à liberalização do regime, o caminho não foi linear. Ao contrário, havia avanços e retrocessos. Enquanto a rede de tortura solidamente estabelecida no governo do General Médici ignorava a cadeia de comando, “subvertendo a hierarquia militar”, o Presidente Geisel e o General Golbery do Couto e Silva procuraram reduzir este poder com uma política de abertura gradual e altamente controlada, que mantivesse o poder sem contestação e, sem permitir que a oposição chegasse ao poder. Apesar disto, nas eleições parlamentares de 1974 a oposição liberal-democrática, em unidade com o PCB clandestino, infligiu uma grande derrota ao regime no Congresso. Os governadores eram eleitos indiretamente por um Colégio Eleitoral controlado pelo regime.

O Brasil havia mudado: o novo desenvolvimento capitalista brasileiro, com uma classe operária mais numerosa e moderna e uma crescente camada média urbana assalariada, sob a dominação do capitalismo monopolista articulado com o Estado, determinou uma mudança qualitativa no seu papel político na vida nacional (PCB,1984). Nos grandes centros urbanos do Centro-Sul do país, onde se localizava esta classe operária numerosa e uma classe média intelectualizada, a oposição teve uma vitória retumbante. Os remanescentes da luta armada, os grupos trotskistas e setores mais extremados da Igreja da Teologia da Libertação entendiam que ARENA e MDB eram semelhantes e se recusavam a ingressar na oposição consentida, propugnando pelo voto nulo. Depois de derrotar os movimentos guerrilheiros, o governo esperava ter uma grande maioria na eleição convocada em 1974 para eleger senadores e deputados. Na prática esta eleição caracterizou o começo do fim da ditadura.

Mas o aparelho repressivo ou os homens dos porões continuavam o seu trabalho e entre final de 1974 e outubro de 1975, o regime iniciou uma perseguição sistemática ao PCB considerando-o um dos artífices da política oposicionista vitoriosa (SKIDMORE, T., 2000). Assim, assassinaram mais de um terço dos membros do Comitê Central deste partido clandestino, muitos deles da Comissão Executiva Nacional. O regime jamais assumiu estes assassinatos e os considerou como desaparecidos.

Em outubro de 1975, foi morto sob tortura e anunciado como “suicídio”, nas dependências do DOI-CODI, o jornalista e professor Vladimir Herzog, membro do PCB que não fazia parte do aparato clandestino, sendo um intelectual muito conhecido, por ser um jornalista de uma emissora de televisão educativa, que atingiu o ápice da carreira profissional. O caso teve muita repercussão, apesar da censura aos meios de comunicação de massa, e foi noticiado no exterior pela BBC, onde Herzog havia trabalhado por vários anos. O fato causou um clamor popular e não obstante as intimidações policiais, cerca de 10 mil pessoas compareceram ao ato ecumênico na Catedral da Sé de São Paulo. Foi o primeiro protesto de massa desde o AI–5, ocorrido quase sete anos antes (MARKUN, P., 1985). Entretanto, ainda não foi nesta ocasião que o Presidente, General Geisel, pode desarticular a rede de repressão. O Presidente havia alertado o General Ednardo D’Avila, comandante do II Exército que não toleraria um novo caso. No entanto, no começo de 1976, um operário metalúrgico, militante de base do PCB, Manoel Fiel Filho, que distribuía a Voz Operária, também morreu sob tortura no DOI-CODI, em São Paulo, embora a versão oficial fosse de um novo suicídio. O General Ednardo D’Ávila foi sumariamente demitido pelo Presidente Geisel. Tal decisão foi tomada pelo Presidente sem consultar o Alto Comando do Exército o que abalou a linha dura do regime; a partir de então, seus integrantes nas forças de segurança não mais poderiam presumir que os seus superiores lhes dariam cobertura quando se repetissem cenas de clamor público por causa de violências contra suspeitos políticos (ABREU, H., 1979). Após este episódio, não se tem notícia de novos mortos ou desaparecidos nos porões da ditadura. Poucos meses depois, foram liquidados, num tiroteio, dirigentes do PCdoB reunidos em uma casa em São Paulo.
Foi neste contexto que o Presidente Geisel e Golbery do Couto e Silva pretendiam aliviar a repressão que haviam herdado. Tudo parecia caminhar para a democratização do país. Nas eleições municipais realizadas em 1976, a ARENA foi amplamente majoritária nos grotões enquanto o MDB foi vitorioso e obteve maioria nas Câmaras Municipais das grandes cidades.

Com a preocupação de ganhar as eleições parlamentares em 1978, num novo retrocesso, o governo decretou o Pacote de Abril para assegurar a vitória da ARENA. O Congresso foi novamente fechado, vários deputados do MDB foram cassados. De acordo com o Pacote, as emendas constitucionais passaram a exigir maioria simples; os governadores de Estados e uma terça parte dos senadores seriam escolhidos indiretamente por colégios eleitorais e os deputados federais teriam seu número fixado de acordo com a população e não do total de eleitores registrados. A eleição deixou de ser proporcional, isto é, “um cidadão um voto” na medida em que, seja qual fosse o tamanho do Estado, assegurava-se um número mínimo de 8 deputados. O desequilíbrio de representação entre os Estados da federação foi enorme e, os estados mais atrasados, onde era possível maior manipulação, passaram a garantir maioria para o governo. O acesso dos candidatos aos meios de comunicação foi rigorosamente limitado. Apesar disso, após o ato ecumênico, em memória de Herzog, houve um ascenso de lutas de movimentos populares pela democracia; surgiu o Movimento contra a Carestia, os jornalistas protestaram contra a censura, os estudantes se reorganizaram após quase dez anos de silêncio absoluto, a luta pela anistia tinha ganhado forEnquanto os oposicionistas liberais e democráticos fundam o Movimento Democrático Brasileiro (MDB), trava-se uma luta renhida na esquerda. No PCB, a discussão se acirrava entre os que entendiam que a política do partido, anterior ao golpe, foi muito direitista, não preparando as massas para resistir ao golpe e os que entendiam que a política foi muito esquerdista, dando ensejo à direita para prepará-lo. Entre os que entendiam que a única forma de derrotar a ditadura era a luta armada e os que compreendiam que esta só seria derrotada por uma ampla frente de massas. Em dezembro de 1967 ocorre o VI Congresso desta agremiação política clandestina em que a tese vencedora foi: “…mobilizar, unir e organizar a classe operária e demais forças patrióticas e democráticas para a luta contra o regime ditatorial, para sua derrota e a conquista das liberdades democráticas…” . Esta tática de isolar e derrotar a ditadura através de um amplo arco de alianças não é aceita por setores expressivos que rompem com o Partido e dão origem à Aliança Libertadora Nacional (ALN), ao Partido Comunista Brasileiro Revolucionário (PCBR) e ao Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8). As outras organizações de esquerda também se fragmentaram em dezenas de siglas, todas deslumbradas com a luta armada e com a Revolução Cubana, com exceção dos maoístas que pretendiam seguir o modelo chinês. O Partido Comunista do Brasil, PCdoB (maoísta) começa a implantar a infraestrutura para a guerrilha do Araguaia, em uma região tradicional de conflitos de terra, em plena Floresta Amazônicaça, culminando com as grandes manifestações operárias da década, quando surgiu o novo sindicalismo. (BENEVIDES, M. V. M., 2009) Os sinais vindos das ruas evidenciavam impaciência com a estratégia do governo de prometer a liberalização e, frequentemente, fazer concessões à linha dura.

Em 1978 o General João Baptista Figueiredo, candidato da ARENA, foi escolhido Presidente da República pelo Colégio Eleitoral, sem unanimidade entre os militares. Porém, na eleição parlamentar convocada para novembro do mesmo ano, a derrota do regime foi ainda maior que em 1974. A ARENA obteve em todo o país 13 milhões de votos para o Senado e 15 milhões de votos para a Câmara dos Deputados. O MDB conseguiu 17 milhões de votos para o Senado e 14,8 milhões para a Câmara. No cômputo geral do país a derrota do regime foi arrasadora, o MDB foi vitorioso em todos os estados importantes da Federação.

1979 é o ano da conquista da Anistia e também da fragmentação da oposição. A pressão organizada da sociedade levou o governo autoritário, a propor-se, inicialmente, a revisar a situação dos inquéritos e processos de cassação e condenação de políticos, e, logo depois, a admitir encaminhar um projeto de lei de anistia ao Congresso Nacional. O projeto, após debates intensos, foi aprovado em 18 de agosto e promulgado no dia 28 do mesmo mês. Os direitos políticos passavam por uma situação complexa na medida em que o direito de reunião era restrito, apesar da anistia política.

A Anistia não foi ampla e irrestrita e só foi ampliada quase dez anos depois com a promulgação de uma nova Constituição. “Mas ela cumpriu uma função importante, pois permitiu a libertação de dezenas de presos de consciência e trouxe para o cenário político milhares de cidadãos proscritos por mais de uma década pela ditadura militar […] Em números, permitiu a libertação imediata de 200 presos políticos; recuperou os direitos de 128 brasileiros banidos e de 4877 políticos que tiveram seus mandatos cassados; viabilizou a volta de 10 mil exilados que haviam sido obrigados a deixar a sua pátria e tornou sem efeito a punição a 263 estudantes, atingidos pelos decretos da ditadura. Mais de 500 mil pessoas tiveram processos e outras punições de caráter político, anulados […] Os grilhões que cercearam a liberdade estavam rompidos. Foi uma virada histórica, um passo largo no sentido de acreditar ser possível deixar para trás, um dia, o nosso legado autoritário.” (FREIRE, R., 1999)

Por outra parte, percebendo que não teria condições de prolongar a permanência do regime nessa situação plebiscitária entre ARENA e MDB, o estrategista do regime autoritário, General Golbery do Couto e Silva propôs e o regime militar optou por dividir a oposição, permitindo a criação de vários partidos. Setores da oposição, os liberais-democratas do MDB e os comunistas do PCB e do PCdoB bem como o MR-8 abrigados nessa grande frente contra a ditadura se pronunciaram contra a divisão das oposições naquele momento e advogaram a primazia da luta pela Assembléia Nacional Constituinte e pelo fim do “entulho autoritário” que consistia nos Atos Institucionais e na Lei de Segurança Nacional, para que cada um se organizasse a seu modo após a redemocratização. Mas todas as tentativas foram infrutíferas e a oposição se dividiu. Ressurgiu o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) e uma cisão desse partido, o Partido Democrático Trabalhista (PDT). O Partido Popular (PP) teve duração efêmera. Com o apoio decidido do Partido Comunista Cubano, mas também, da Social Democracia sueca e alemã, os setores remanescentes da luta armada, a esquerda católica, os trotskistas e os setores operários de ponta decidiram criar um partido novo, o Partido dos Trabalhadores (PT), onde no fundo encontraram guarida todos os setores que propugnavam pelo voto nulo anteriormente. Na verdade, para muitos desses setores que engrossaram a proposta do PT, a questão da democracia não era fundamental, uma vez que não apostavam na luta parlamentar e por isso o desprezo por uma nova constituição democrática. Neste processo ocorreu também a divisão nos movimentos sociais e nos sindicatos. O PCB e o PCdoB foram mantidos na ilegalidade. Significativamente, a ARENA não se dividiu, só mudou de nome.

Em 1982 deu-se a primeira eleição direta para governadores desde 1965. Esta eleição veio acoplada à de todos os cargos legislativos. Os resultados eleitorais confirmaram a estratégia de Golbery. A oposição obteve 59% dos votos populares sem conseguir fazer maioria no Congresso por estar dividida. Embora não lograsse maioria absoluta na Câmara Federal, o Partido Democrático Social (PDS), ex-ARENA, foi majoritário. Neste contexto, a oposição unida, teria condições de vetar as propostas do Executivo. Mas o governo federal mantinha maioria para impor seu candidato a Presidente da República no Colégio Eleitoral.

Quanto aos governos estaduais, a oposição foi francamente vitoriosa nas regiões mais desenvolvidas do País, tendo o controle nos Estados-chave: São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Paraná. O partido do governo elegeu os governadores do Nordeste e do Centro-Oeste.

A crise econômica já se manifestava desde o final da década de 1970 e se aprofundara em 1982. O governo central cada vez mais se desgastava. A legitimidade da eleição indireta para a Presidência da República passa a ser fortemente contestada e o deputado Dante de Oliveira, do PMDB, apresentou uma Emenda Constitucional para que o Presidente fosse eleito diretamente. A direção nacional do PMDB lançou uma campanha nacional à qual aderiram Luis Inácio Lula da Silva (PT) e Leonel Brizola (PDT). Apesar de jornadas memoráveis, com comícios que reuniram milhões de pessoas nas capitais, a emenda foi derrotada por apenas 22 votos. O resultado indicava que o futuro presidente ainda seria eleito pelo Colégio Eleitoral, mas ao mesmo tempo, era uma clara demonstração de que o partido do governo havia rachado de alto a baixo.

Pela primeira vez desde 1964, o candidato do governo foi escolhido sem que o Presidente da República impusesse um nome. A escolha de Paulo Maluf não foi unânime -havia vários outros candidatos-, o que acabou gerando uma dissidência, a Frente Liberal, dos que não aceitavam o nome dele. A oposição também se dividiu: enquanto o PT recusou-se a participar do Colégio Eleitoral, o PMDB demonstrou unidade em torno de Tancredo Neves, um político moderado, de centro. Sua moderação seduzia um público muito amplo que ia da centro-direita à centro-esquerda. Era o candidato adequado para enfrentar Maluf num momento difícil em que a linha dura não aceitava a liberalização e não esmorecia em provocar atos de violência. Tancredo, porém, comprometeu-se com militares influentes em não levar o país à situação anterior a 1964 nem processar militares ou policiais acusados de tortura ou outras violações dos direitos humanos. Acabou conseguindo o apoio discreto de vários militares, entre os quais o General Geisel, que continuava a gozar de grande prestígio no Exército.

Os dissidentes da Frente Liberal que não aceitavam a candidatura de Maluf, acabaram fundando o Partido da Frente Liberal e formaram com o PMDB a Aliança Democrática – Tancredo Neves (PMDB) seu candidato a presidente e José Sarney(PFL) a vice. A Aliança Democrática foi amplamente vitoriosa obtendo 480 votos contra 180 de Maluf no Colégio Eleitoral. Entre as 17 abstenções e 9 ausências estavam os deputados do PT. Três deputados do PT que votaram no Colégio Eleitoral foram expulsos da agremiação.

A Nova República

Tancredo Neves, primeiro Presidente da República civil eleito desde 1964 ainda que no Colégio Eleitoral, faleceu na véspera de sua posse como Presidente. Com o seu falecimento criou-se um impasse. Havia dúvidas se deveria assumir o vice indicado, José Sarney, embora não tivessem tomado posse ou Ulysses Guimarães, o Presidente do Congresso. Neste clima, ainda havia quem acreditasse que os militares retomariam o poder. Ulysses acabou abrindo mão e Sarney foi empossado. A Nova República passou incólume pela primeira crise institucional enfrentada.

O ministério de Sarney herdado de Tancredo tinha representantes de todas as forças políticas que passaram a apostar na democracia. Era praticamente um governo de União Nacional, porém, com muitas dificuldades devido à grande diversidade de posturas de seus ministros. A redemocratização brasileira vem acoplada à década perdida da economia latino-americana com uma herança da maior dívida externa da face da terra.
Apesar da crise econômica que se agravava o Brasil continuava sendo a oitava economia do mundo mas comparava-se aos países africanos em termos de indicadores sociais. O governo Sarney tentou melhorar o salário real dos trabalhadores e, através do Plano Cruzado, diminuir a inflação. Entretanto as dificuldades aumentaram e no começo de 1987 o governo foi obrigado a suspender o pagamento dos juros da dívida. O governo Sarney acabou com uma inflação de 80% ao mês.

Se do ponto de vista econômico o governo Sarney fracassou, politicamente, houve avanços tremendos. Ainda no ano de 1985, os dois PC’s foram legalizados. Em meados de 1986 foram reatadas as relações diplomáticas com Cuba, rompidas desde 1964. Também foi criada a Comunidade de Países de Língua Portuguesa.

Apesar das dificuldades econômicas, nas eleições municipais de 1985, quando os prefeitos das capitais voltaram a ser eleitos diretamente, o PMDB foi vitorioso em 19 das 25 capitais e em 110 das 201 outras cidades com mais de 200 mil eleitores, o que demonstrava confiança no novo governo democrático. Na esteira do Plano Cruzado, nas eleições de 1986, o PMDB teve uma vitória estrondosa: elegeu 22 dos 23 governadores e obteve maioria absoluta na Câmara Federal e no Senado. O PFL de Sarney foi derrotado e deixou a coligação. A legitimidade de Sarney estava sendo abalada na medida em que os governadores tinham sido eleitos diretamente enquanto ele o fora no Colégio Eleitoral.
A grande conquista do governo Sarney foi a promulgação da Constituição Cidadã em 1988. O Congresso eleito em 1986 funcionou como Congresso Constituinte que, apesar de divergências enormes entre os diversos setores representados, promulgou a Constituição mais democrática de toda a história brasileira. Foram revogados a Lei de Segurança Nacional e todos os atos discricionários vigentes ao longo de 24 anos. Neste processo, Sarney negociou a prorrogação do mandato presidencial de quatro para cinco anos; foi a gota d’água para que setores descontentes do PMDB abandonassem o partido e formassem o Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), entre eles, Mário Covas, Fernando Henrique Cardoso, Franco Montoro e José Serra. Enquanto isto, os parlamentares do PT se recusaram a homologar a Constituição com exceção de dois que acabaram sendo expulsos.

É neste contexto que ocorre em 1989 a primeira eleição direta para Presidente da República Federativa do Brasil, depois de 29 anos. No primeiro turno concorreram vários candidatos: Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Leonel Brizola (PDT), Mário Covas (PSDB), Ulysses Guimarães (PMDB), Roberto Freire (PCB), Fernando Collor de Mello (PRN), Aureliano Chaves (PFL), Afif Domingos (PL) e Paulo Maluf (PDS). Como nenhum dos candidatos obteve maioria absoluta, os dois mais votados, Lula e Collor, se enfrentaram no segundo turno. Foi uma eleição plebiscitária, entre direita e esquerda, com a vitória de Collor por pequena margem, com os candidatos obtendo cerca de 35 milhões de votos cada. Em recente debate da Fundação “Astrojildo Pereira”, Luiz Sérgio Henriques alerta para o paradoxo da eleição em que dois outsiders são os vitoriosos do primeiro turno. Collor é eleito sem um apoio partidário. Para concorrer, cria o Partido da Juventude que se transforma no Partido da Renovação Nacional (PRN). Lula, líder do PT, não tem nenhum compromisso com a institucionalidade democrática. As forças que lutaram consistentemente pela anistia e pela redemocratização foram derrotadas. (ver o link: http://www.tvfap.net/2015/08/a-crise-do-governo-dilma-e.html#!/2015/08/a-crise-do-governo-dilma-e.html)

O segundo turno da eleição no Brasil ocorreu uma semana após a queda do Muro de Berlim. Embora derrotado, o PT aproveitou-se magistralmente do resultado do segundo turno sem explicar que 10,5 milhões de votos de Brizola, 10 de Covas, 3,5 de Ulysses Guimarães e 1 de Freire migraram majoritariamente para Lula. O mundo tomou conhecimento no ocaso do socialismo real que um operário metalúrgico brasileiro era detentor de 35 milhões de votos e a esquerda mundial trocou a estrela do Kremlin pela estrela do PT. Seis meses depois foi criado em São Paulo o Foro São Paulo, para coordenar as atividades da esquerda latino-americana. Uma espécie de Organização Latino-Americana de Solidariedade (OLAS) repaginada. . .

Consolidação democrática

Collor foi eleito sem uma sólida base parlamentar, como Salvador da Pátria, com um discurso populista centrado na denúncia da corrupção e com a promessa de redução dos gastos suntuosos do Estado bem como assistência às capas mais desfavorecidas da sociedade.

O governo Collor, procurou destacar a inserção do Brasil na corrente de desregulamentação e liberalização econômicas que já batiam com força na América Latina. Seu plano de estabilização econômica bem como outras iniciativas acabaram fracassando. Embora acusado de corrupção, o verdadeiro motivo do impeachment, foi a falta de base parlamentar. Afinal, muitos outros presidentes e governadores não primaram pelo zelo da coisa pública, tornando-se até figuras folclóricas sem perder o mandato. Collor, montado sobre os seus 35 milhões de votos, tentou governar com total desprezo ao Legislativo. O PT foi o primeiro partido a convocar os movimentos sociais e outras forças políticas para derrubar o Presidente da República com o lema Ética na Política. A Constituição brasileira tem um dispositivo legal, o impeachment, para afastar do cargo sob determinadas condições o mandatário. Quando o irmão do Presidente, Pedro Collor fez denúncias comprovadas, o Congresso pôde abrir o processo de Impeachment. Enquanto o Congresso estava votando, o Presidente apresentou o seu pedido de renúncia. Como nas outras crises institucionais , suicídio de Getúlio Vargas e renúncia de Jânio Quadros, o verdadeiro motivo foi o problema da governabilidade por falta de base parlamentar. Mas diferentemente dos casos anteriores, demonstrando a maturidade da democracia brasileira, ainda que incipiente, o vice-presidente, Itamar Franco assumiu o governo sem nenhuma solução de continuidade nem golpes (Sallum Jr, B., 2015).
Itamar Franco assumiu o governo após um período de interinidade em dezembro de 1992 com uma inflação galopante. Conclamou todas as forças progressistas a participar de seu governo e o PT novamente não atendeu ao pedido. Havia uma crença messiânica nesta agremiação de que eram os únicos bons e honestos, capazes de modificar as estruturas de poder em benefício dos desfavorecidos. Luiza Erundina, havia recém concluído o seu mandato de Prefeita em São Paulo e assumiu o cargo de Ministra da Administração Federal, o que causou novo mal estar no PT. Foi punida com afastamento de seus cargos, o que na prática foi uma expulsão.

Itamar instituiu a Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS) que deu início aos programas sociais preconizados na Constituição de 1988. Também realizou em 1993 o plebiscito previsto pela Constituição de 1988 para definir se o Brasil seria uma monarquia ou uma república e se o regime seria presidencialista ou parlamentarista. PT, PDT e setores do PMDB sob lideranças personalistas muito fortes (Lula, Brizola e Quércia) trabalharam pelo presidencialismo, não obstante as forças progressistas e democráticas mundiais serem majoritariamente parlamentaristas. A república e o presidencialismo foram confirmados no Brasil.

Mas o maior feito de Itamar foi acabar com a hiperinflação que fustigava o país por um longo período com conseqüências nefastas para a economia. Depois de várias trocas de Ministros da Fazenda, convidou Fernando Henrique Cardoso para assumir este ministério. Foi então proposto pelo governo e o Congresso Nacional aprovou o Plano Real, novamente sem o apoio do PT. Esse Plano deu um grande alívio à economia brasileira, com influência decisiva na eleição presidencial de 1994. Fernando Henrique Cardoso venceu a eleição no primeiro turno com 53% do total de votos. Seu principal contendor, Lula, obteve 27% dos votos (dados do Tribunal Superior Eleitoral).

Ainda no seu primeiro ano de governo foi promulgada uma lei que visa a reparação moral dos militantes políticos mortos ou desaparecidos durante o regime militar e a reparação financeira aos seus familiares. De imediato, 136 desaparecidos foram reconhecidos como mortos. Desse modo, o Estado assumiu a responsabilidade pelo seqüestro, prisão, tortura e morte destas pessoas e condenou esta modalidade atroz de violação dos direitos humanos utilizada pela repressão brasileira e que se estendeu por toda a América Latina. A lei ainda criou uma Comissão Especial, composta por sete integrantes designados pelo Presidente da República, para analisar, caso a caso, denúncias de outros desaparecimentos e mortes de militantes em dependências policiais assemelhadas. (MIRANDA, N. 1996). Apesar de dificuldades em definir o que seria a dependência policial assemelhada, da sonegação de informações por parte da Polícia Federal e pressão de setores militares, no dia 11 de setembro de 1996 a Comissão acolheu os casos de Carlos Marighella e de Carlos Lamarca, os dois principais símbolos da resistência armada e os principais inimigos do regime militar. Talvez este seja o grande marco do fim da transição.
Entretanto, familiares, juristas, advogados, movimentos de direitos humanos, ex-presos políticos e parlamentares ligados a esta questão pretendiam uma lei mais abrangente. Uma lei que revelasse e tornasse públicas as circunstâncias das mortes e que contemplasse mortes decorrentes de outras modalidades de violência política, tais como a de Frei Tito que se suicidou para escapar à lembrança das torturas e dos torturadores; os que morreram em tiroteio ou se suicidaram para não caírem nas mãos da repressão, exercendo o direito de resistência a um Estado que estava longe de ser de Direito ou os que morreram em decorrência da Operação Condor em outros países do Cone Sul. Mas foi em vão. Todas as emendas apresentadas para ampliar o conceito da reparação foram derrotadas em nome de um limite provável entre o governo e as forças armadas.

O governo Fernando Henrique Cardoso centrou seu primeiro mandato na estabilização da economia e da moeda bem como na diminuição do desemprego. Seguindo a social-democracia européia, buscou romper com a tradição getulista de uma economia fundada em monopólios estatais apoiados por militares nacionalistas e na Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT). A esquerda brasileira também apoiava fortemente esse modelo por considerá-lo semelhante, em alguns aspectos, com os modelos do socialismo real. Mas, no novo contexto da globalização, para modernizar o país, Fernando Henrique decidiu privatizar as estatais de telecomunicações, minero-siderúrgicas e do setor elétrico , a despeito de uma oposição feroz da oposição (PT, PDT, PCdoB, PSB) sob a liderança de Lula e Brizola. Apesar da criação de Agências Reguladoras para acompanhar os serviços públicos, a oposição acusava o governo de corrupção nesse processo de privatização.

O Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), criado em 1993, se confrontava constantemente com o governo, exigindo um processo acelerado de Reforma Agrária, quando o modo de produção agrícola no Brasil já havia se modernizado e constituía verdadeiras empresas capitalistas de agronegócio, com maquinário altamente sofisticado e, graças à EMBRAPA, com tecnologias voltadas para a agropecuária muito avançadas. O setor é responsável por uma grande fatia da economia brasileira. Os velhos latifúndios estavam quase em processo de extinção. Houve dois incidentes graves com mortes na região Norte do país.

Contudo, apesar desses percalços, o governo conseguiu aprovar uma Emenda Constitucional que permitia a reeleição por mais um mandato de presidente, governadores e prefeitos no Brasil. Fernando Henrique concorreu à reeleição em 1998 vencendo novamente no primeiro turno com 54% dos votos. Lula concorreu pela terceira vez, obtendo 32% dos votos e Ciro Gomes, do Partido Popular Socialista (PPS) obteve quase 11%. Fernando Henrique tinha o apoio do PFL e um apoio tácito do PMDB o que lhe dava uma ampla maioria no Congresso. Todas as tentativas de impeachment encaminhadas pela oposição não prosperaram por falta de provas.

O seu governo deu continuidade à assistência social por meio de programas como a bolsa escola e o comunidade solidária; teve avanços expressivos na área da saúde como na prevenção da AIDS, e ao quebrar as patentes de empresas farmacêuticas internacionais conseguiu baratear os medicamentos; na área ambiental foram criadas as unidades de conservação ambiental, medidas para punir crimes ambientais, incentivar o reflorestamento com espécies nativas. Firmou e ratificou os Protocolos de Kyoto.
O governo Fernando Henrique adquiriu um grande protagonismo internacional ao obter assento, ainda que não permanente, no Conselho de Segurança das Nações Unidas, ao implementar o comércio com a União Européia e o Mercosul, apoiar a criação de um Estado Palestino e ao mesmo tempo abandonar o conceito do sionismo como forma de racismo. Também firmou o Tratado de Tlatelolco de proibição de armas nucleares na América Latina.

No seu governo o salário mínimo cresceu ao longo de oito anos 44%, o PIB teve um crescimento anual médio de 2,3%, o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) melhorou e a inflação permaneceu em um dígito. Mas a dívida pública crescia por causa da dívida dos Estados que continuava descontrolada. A crise da Ásia, do México e da Rússia em 1998 afetou bastante a economia brasileira e o governo foi obrigado a desvalorizar o Real e criar a Lei da Responsabilidade Fiscal como medida de austeridade. Aliado a um quadro mundial adverso decorrente das crises externas, ocorreu na região Sudeste do país uma estiagem prolongada e problemas de transmissão de energia do Sul provocaram apagões elétricos. Para amenizar o problema os consumidores foram obrigados a racionar energia e para minimizar os efeitos foram ligadas usinas termoelétricas mais poluentes e com custo mais elevado.

Tentativas de aprovação de uma Reforma Previdenciária profunda sob protestos veementes, somados às acusações permanentes da oposição, de que houve corrupção na aprovação da Emenda Constitucional da Reeleição, foram desgastando o governo, incapacitando-o como o grande eleitor de um sucessor.

Lula concorreu pela quarta vez à presidência da República, vencendo as eleições no segundo turno com 61,3% dos votos. A situação no Legislativo era muito adversa para a coligação do PT: 18% dos deputados e 14% de senadores. Com esse resultado não era possível aprovar sequer uma lei ordinária quanto mais uma emenda constitucional. Portanto, em nome da governabilidade, teriam que optar entre uma aliança com partidos pequenos sem compromissos ideológicos que negociavam seu apoio por cargos ou uma coalizão com o PSDB, isto é, um partido socialista com um partido social democrata, como ocorre normalmente em vários países do mundo. A oposição feroz e apolítica, acusações de extrema direita neoliberal e o mote uma herança maldita deixada pelo antecessor, não permitiram a segunda opção. Acabou pactuando com a oligarquia nordestina e com figuras consideradas arquiinimigas como Collor e Maluf (indicado para prefeito e governador em São Paulo pela ditadura militar). O PMDB esvaziado das grandes personalidades que lutaram pela redemocratização, também aderiu ao novo governo. A esperança depositada no governo, apesar de tudo, era enorme no Brasil e no exterior.
Como o Governo de Dilma Rousseff é uma continuidade do Governo Lula e foi concebido por seu criador como um mandato tampão para que ele voltasse ao poder preferencialmente em 2014, tratar-se-á os governos de ambos ao mesmo tempo na maioria das vezes.

O grande objetivo do novo governo era tirar milhões de brasileiros da miséria absoluta. Inicialmente foi lançado o Programa Fome Zero que foi um grande fiasco. Em seguida foram agrupados vários programas já existentes anteriormente para lançar o Bolsa Família. Esse Programa foi muito ampliado sem dar saída aos que usufruíam do mesmo por falta de controle (se os filhos freqüentavam a escola, ou os chefes de família realizavam algum curso de qualificação, por exemplo). As famílias passaram a viver, em muitos casos, da aposentadoria rural dos idosos e da bolsa família e, em algumas regiões passou a faltar mão de obra sem contar que foi se perdendo o valor social do trabalho.
O programa ProUni deu oportunidade para muitos estudantes realizarem um curso superior, atitude louvável e necessária para qualificar a mão de obra e modernizar a economia. Mas, ao invés de ampliar vagas em boas universidades, o financiamento salvou faculdades privadas quase falidas e de péssima qualidade. Ao introduzir cotas raciais exacerbou-se as manifestações racistas. As novas universidades federais, com raras exceções, não possuem infra-estrutura adequada nem corpo docente preparado enquanto as antigas, padecem de muitos problemas que as asfixiam.

Pelo tamanho e difusão desses dois programas pode-se pensar que o maior objetivo é o voto cativo dessas populações para a manutenção do governo no poder e não para beneficiar os desfavorecidos. Na medida em que o tempo foi passando novos programas foram sendo criados.

Na economia e na infra-estrutura foram cometidos muitos erros. O primeiro grande programa foi a transposição do Rio São Francisco, já pensado pelo governo Fernando Henrique e considerado inviável por falta de água na bacia. Era\preciso reflorestar a bacia e cuidar da mata ciliar. Abandonado este projeto, deu-se grande destaque ao Projeto de produção de biodiesel em detrimento do Proálcool, já testado e produzido em escala comercial; também abandonado em favor da proposta de prospecção de petróleo do Pré-sal, cuja tecnologia ainda não é completamente dominada e é caríssima – sem levar em conta a busca mundial de uma nova matriz energética com eliminação gradativa de combustíveis fósseis.

A crise mundial começou por volta de 2008 e foi considerada por muitos analistas tão grave como a de 1929. Lula menosprezou-a ao afirmar que o Brasil seria atingido por uma marolinha. Iniciou-se um ciclo de incentivos ao consumo interno com incentivos fiscais a setores industriais, principalmente automobilística, à linha branca e aos eletro-eletrônicos. Esses incentivos setoriais desorganizaram a indústria como um todo. Com crédito fácil, o povo se endividava e o governo perdia receita sem obedecer a Lei da Responsabilidade Fiscal. Sem melhorar o nível cultural e educacional nem habitacional característico da classe média, difundia-se que milhões atingiram este patamar da sociedade. Essa maneira de manejar a economia continuou no primeiro mandato de Dilma, eleita em 2010, com o intuito de ganhar novamente a eleição em 2014. Os preços controlados pelo governo foram congelados ou reduzidos.

Aos poucos a indústria brasileira foi perdendo espaço justamente por falta de inovação e produtividade e o país virou um grande produtor de commodities, sem valor agregado embora, no caso da agropecuária, com tecnologias avançadas já mencionadas anteriormente. Os minérios são exportados em bruto. Durante o primeiro governo Lula e metade do segundo, com o mundo crescendo, em particular a China com taxas de11% ao ano, o Brasil foi se mantendo em pé. O Brasil diminuiu o comércio com a União Européia e os Estados Unidos depois de desmantelar a ALCA. Privilegiou o comércio com países ideologicamente afinados na chamada política Sul-Sul e participou da criação dos BRICS.
Nossos grandes compradores externos eram Argentina e China. A Argentina em crise econômica há mais tempo começou a criar dificuldades ao adotar políticas protecionistas contrárias ao acordado no MERCOSUL e a China tem dado sinais há alguns anos de um crescimento menor. Mas o Brasil não se preocupou em firmar acordos bilaterais com os dois grandes blocos mundiais como vem fazendo com sucesso Chile, Peru e Colômbia. O MERCOSUL acabou sendo um bloco mais político-ideológico do que propriamente comercial,

Lula com o protagonismo alcançado na política internacional pressionou para o Brasil ter assento permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas, sem respeitar a opinião dos países da América Latina. Para atingir tal objetivo a qualquer custo aproximou-se de países ditatoriais onde os direitos humanos são violados a todo momento. (KINOSHITA, D. L.,2014). Apesar do esforço dispendido Lula não conseguiu atingir seu pleito. Com o governo Dilma houve desinteresse na política internacional.
Os equívocos foram imensos mas o maior problema dos governos petistas foi o comportamento ético, motivo de grande decepção de toda uma geração que acreditou em grandes mudanças. Já no início do primeiro mandato de Lula foi descoberta a corrupção de um funcionário da Casa Civil chefiada por José Dirceu. Esse evento foi atribuído por muitos a um comportamento individual. No entanto alguns meses depois foi instalada uma Comissão Parlamentar de Inquérito para averiguar irregularidades nos Correios. À medida que se avançava nas investigações foi possível constatar que se tratava de um grande esquema de corrupção, por meio do qual deputados da base aliada eram pagos com regularidade para aprovar projetos do governo. A partir daí originou-se o Processo do “Mensalão” no qual foram punidos 25 entre deputados, empresários, dirigentes políticos do PT e da base aliada. Lula afirmava “que não sabia de nada”. Mas o mote “Ética na Política” foi se esvaindo e foi substituído por ”todos fazem o mesmo”. Na época muitos já comentavam que era só a ponta do iceberg.

A partir de 2013 as evidências de irregularidades cometidas foram se avolumando, sobretudo em instâncias de responsabilidade da futura candidata Dilma, como o Ministério das Minas e Energia e na Petrobrás que foi literalmente quebrada devido à corrupção. Uma corrupção especial que não beneficia indivíduos mas também um Partido que quer se perpetuar no poder utilizando dinheiro do povo para fins particulares. Dilma e Lula continuaram afirmando “que não sabiam de nada”. .

De fato, está em andamento um processo de investigação desse megaprojeto de corrupção com desvio de bilhões de dólares, envolvendo dezenas de políticos do Congresso Nacional e os maiores empreiteiros do país. A Presidente recém eleita tem apenas 7% de aprovação popular, as investigações continuam e o Tribunal de Contas da União (TCU) resiste em aprovar as contas do governo de 2014 e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) reabriu o processo para investigar se o dinheiro da corrupção foi utilizado na campanha eleitoral.

Não obstante a grande instabilidade, com desemprego e alta inflação, o Brasil está em compasso de espera: mais de um milhão de pessoas já firmaram uma petição de impeachment, juristas renomados também já fizeram o mesmo e há os que aguardam o resultados do TCU e do TSE, enquanto forças aliadas ao governo denunciam o golpismo da oposição. Será que esse processo se arrastará até o fim do mandato? Ou haverá renúncia? ou impeachment em breve? Quem assumirá a Presidência, qual será o novo pacto de poder? Até o momento não se sabe. O importante é que os militares estão recolhidos nos quartéis e as instituições democráticas da República continuam sólidas. Há bravatas isoladas de convocação de movimentos sociais mas a desaprovação do governo indicam que elas não prosperarão.

Dina Lida Kinoshita é Professora Doutora da USP, membro da Cátedra UNESCO de Educação para a Paz, Direitos Humanos, Democracia e Tolerância junto ao Instituto de Estudos Av ançados – USP (de 1996 a 2015)

NOTAS

2 Carneiro Pessoa, R. X. (org), PCB: vinte anos de política, documentos (1958-1978), Livraria Editora Ciências Humanas, São Paulo, 1980

3 Esta atitude de não homologação da Constituição é inusitada no Brasil e mesmo em outros países da Europa Ocidental. Os partidos comunistas stalinistas, sem exceção, firmaram as novas constituições democráticas no pós II Guerra e pós fascismo.
4 Ensaísta, tradutor, editor dos site Instituto Gramsci no Brasil e Esquerda Democrática, colaborador do jornal O Estado de S. Paulo e vice presidente do Conselho Curador da FAP
5 O grande gargalo desta produção, com perdas consideráveis de grãos é a falta de estradas, ferrovias e portos para escoamento de mercadorias. Essa questão continua sem solução até hoje.

REFERÊNCIAS

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Por: Dina Lida Kinoshita


TVFAP.net acompanha debate sobre livro de Mario Schenberg na Unesp

A TVFAP.net acompanhou um debate promovido na Unesp, no centro de São Paulo, sobre o livro "Mario Schenberg: o cientista e o político", escrito por Dina Lida Kinoshita e editado pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP). Assista.

Como afirma o professor Silvio Salinas na sua apresentação, esta obra é a biografia política de um militante notável, intelectual que se manteve fiel às perspectivas socialistas desde a sua juventude, e que foi também um dos grandes cientistas brasileiros. Foi um dos fundadores da "física moderna" no Brasil e manteve uma produção científica respeitadíssima no Brasil e no exterior.

O livro e o debate apresentam Mario Schenberg (1914 - 1990) como um homem de partido, participante ativo das lutas democráticas no país, mas também um militante muito especial, pois foi um daqueles intelectuais de formação e interesse amplos, herdeiros do Renascimento e do Iluminismo, que fazem muita falta na cultura especializada do Brasil contemporâneo. Marxista heterodoxo e anti-stalinista, muito antes da morte de Stalin e do 20º Congresso do Partido Comunista da União Soviética, sempre pertenceu à "alma civilista", institucional, parlamentar e democrática do comunismo brasileiro.

Sempre foi um defensor da pesquisa científica universitária, do desenvolvimento tecnológico nacional e da educação de qualidade. Além de físico teórico de trânsito internacional, com trabalhos de pesquisa científica admirado pelos seus pares, foi colecionador e crítico de arte, contribuindo para a carreira de diversos artistas brasileiros. Este livro preenche uma lacuna importante, trazendo ao público mais jovem a visão política de um dos nossos grandes cientistas.
Com este desafio de manter viva a memória de Mario Schenberg e debater a importância da sua atuação política, reuniram-se para este evento promovido pela Unesp, na Praça da Sé, em São Paulo:
Dina Lida Kinoshita – Bacharel, Mestre e Doutora em Física pela USP, possui especialização em Problemas Globais pelo Instituto de Ciências Sociais (atual Fundação Gorbachev, em Moscou). É Profa. Dra. aposentada do Instituto de Física da USP e membro do Conselho de Redação da Revista Política Democrática; do Conselho da Cátedra Unesco de Educação para a Paz, Direitos Humanos, Democracia e Tolerância (IEA/USP) e da Executiva Internacional da Associação Internacional dos Educadores para a Paz.

Silvio R. A. Salinas – Bacharel em Física e Professor Titular aposentado, ambos no Instituto de Física da USP. Doutor em Física pela Carnegie-Mellon University, Pittsburgh/EUA. Publicou artigos científicos e livros na área de física estatística, principalmente sobre propriedades de modelos estatísticos para transições de fase em sistemas de interesse físico.

Alberto Aggio - Graduado em História, Mestre e Doutor em História Social, todos pela USP. Professor Titular aposentado da Unesp, campus de Franca. Atuou como professor visitante na Universidade de Valencia (Espanha) e na Universidade Roma (Itália), onde realizou Pós-Doutorado. Atua na área de História Política, com ênfase em história política da América Latina contemporânea, cultura política e democracia, intelectuais e pensamento político. É autor de "Um lugar no mundo: estudos de história política latino-americana" (FAP/Contraponto, 2015).