casa civil

O pacto com o Centrão

Bolsonaro não vai matar a fome de elefantes com alface. O PP é o antigo PDS, originário da Arena, partido do regime militar, mas o Centrão tem outras legendas

Luiz Carlos Azedo / Nas Entrelinhas / Correio Braziliense

O presidente Jair Bolsonaro confirmou, na manhã de ontem, depois de duas horas e meia de conversa, a indicação do senador Ciro Nogueira (PI), presidente doPP, para o estratégico cargo de ministro-chefe da Casa Civil do Palácio do Planalto. Entre suas tarefas, estão a coordenação dos principais programas do governo, a participação nas decisões sobre remanejamento de verbas do Orçamento, a construção de alianças regionais e a articulação com o Congresso Nacional, na qual terá dois objetivos prioritárias: domar a CPI da Covid no Senado, em que os governistas estão em minoria, e articular a aprovação do voto impresso na Câmara. São duas missões quase impossíveis, a esta altura do campeonato.

O repertório de mudanças bem-sucedidas no Palácio do Planalto, em momentos de apuros, não é pequeno. Entretanto, também houve fracassos. Um deles ocorreu no governo Collor, quando o presidente do PFL, Jorge Bornhausen, assumiu a recém-criada Secretaria de Governo. Collor tentara manter seu governo afastado do jogo político-partidário e, por meio de medidas provisórias, viabilizar seu programa. Entretanto, no início de 1992, o recrudescimento da inflação, o crescimento do desemprego e as denúncias envolvendo membros do governo levaram-no a buscar uma base parlamentar que lhe assegurasse apoio.

Havia duas hipóteses: ceder alguns postos ao PSDB, que fracassou; ou trazer para o governo o PDS (atual PP), o PTB e o PL, a solução adotada. Entretanto, Pedro Collor, irmão do presidente, denunciou a existência de vasto esquema de corrupção no interior do governo, que teria sido montado por Paulo César Farias, o PC, ex-tesoureiro de sua campanha presidencial. Em consequência, uma CPI no Congresso começou a investigar o governo. Na ocasião, Bornhausen afirmou: “As CPIs nunca deram em nada”. No final de agosto, porém, aconselhou Collor a renunciar ao mandato. O resto da história todos já sabem.
Outro fracasso foi a indicação de Michel Temer, vice-presidente da República, como articulador político do governo, após a vitória do deputado Eduardo Cunha (MDB-RJ) na disputa pela Presidência da Câmara, contra o petista Arlindo Chinaglia (SP), candidato da presidente Dilma Rousseff, que interferiu na eleição e foi derrotada. Temer assumiu em 7 de abril de 2017, após as manifestações ocorridas no mês anterior, quando milhares de pessoas foram às ruas pedir o impeachment de Dilma. As funções da Secretaria de Relações Institucionais passaram à alçada da Vice-Presidência. Temer procurou acalmar os ânimos, porém, quatro meses depois, deixou a articulação, alegando ter sofrido boicote em seu trabalho. Ainda se reuniu com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e lideranças do PMDB, na tentativa de aproximar o partido do governo.

Sede de poder
Dilma fizera uma reforma ministerial em 5 de outubro, cortando oito da 39 pastas e ampliando o espaço do PMDB, que passou de seis para sete ministérios, incluindo a pasta da Saúde; Ciência, Tecnologia e Inovação; dos Portos; Agricultura; Minas e Energia; Turismo e Secretaria de Aviação Civil já eram controlados pelo PMDB. Entretanto, em 2 de dezembro, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) acatou um dos pedidos de abertura do processo de impeachment de Dilma. Dias depois, Eliseu Padilha deixou o governo e, em seguida, Michael Temer enviou carta à presidente da República na qual afirmou: “Passei os quatro anos de governo como vice decorativo… Perdi todo protagonismo político que tivera no passado e que poderia ter sido usado pelo governo. Só era chamado para resolver as votações do PMDB e as crises políticas”. O desfecho da crise todos também conhecem.

O presidente Bolsonaro não vai matar a fome de elefantes com alface. Tudo bem que o PP seja o antigo PDS, originário da Arena, o partido do regime militar, mas o Centrão tem outras legendas gulosas. A repactuação do “sistema de poder” entre os militares, as oligarquias nordestinas, as igrejas evangélicas e setores empresariais que apoiam o governo, sobretudo do agronegócio, depende de três variáveis: uma redistribuição de cargos na Esplanada, principalmente nos ministérios “capilarizados”; a retomada do crescimento econômico e um horizonte eleitoral nos estados no qual Bolsonaro consiga resgatar sua expectativa de poder nas eleições de 2022.

https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-o-pacto-com-o-centrao

Democratas liberais, em quem votar em 2022?

Augusto de Franco / Democracia Política e novo Reformismo

Democratas liberais não esperam que as mudanças sejam feitas de cima para baixo a partir de um líder escolhido para chefiar o governo. A democracia liberal não é propriamente sobre governo e sim sobre controlar o governo a partir da auto-organização da sociedade.

Por isso, o que nós - os democratas liberais - desejamos é um chefe de governo que assegure um ambiente democrático para que a sociedade, diretamente e por meio de seus representantes eleitos, introduza inovações políticas que, salvaguardada a democracia que temos, permita a continuidade do processo de democratização para que alcancemos as democracias que queremos.

Dito isto, fica claro que a opção dos democratas para chefiar o governo não pode ser manter ou recolocar na presidência um populista, seja um populista-autoritário de extrema-direita (como Bolsonaro), seja um neopopulista de esquerda (como Lula). Líderes populistas, pela sua alta gravitatem, são espécies de buracos negros que introduzem perturbações no campo social, engolindo as energias da sociedade.

Pela sua própria natureza, caudilhos e condutores de rebanhos populistas, desarmam continuamente a sociedade democrática para que ela não possa cumprir o seu papel de controlar o governo e de realizar mudanças moleculares que permitam a continuidade do processo de democratização. Sua busca constante por hegemonia se contrapõe aos legítimos desejos de autonomia de pessoas e comunidades.

Também fica claro, por razões semelhantes, que não se pode entregar a chefia do governo a qualquer líder antipolítico, que pretenda implantar cruzadas de limpeza (como Moro). Nenhuma cruzada de limpeza - seja étnica, ética, religiosa ou nacional - resultou em mais democracia. Pelo contrário, essas iniciativas, em geral moralistas e punitivistas, em qualquer lugar do mundo ou época da história em que foram tentadas, constituíram-se como antessalas de governos mais autoritários.

Via de regra toda antipolítica de limpeza - como o restauracionismo robespierriano - exige a terra arrasada para começar de novo, separando os bons dos maus e com isso sacrificando as liberdades em nome da pureza ou da segurança.

Afastada essas três tentações messiânicas, qualquer candidato que não seja populista ou punitivista - que se comprometa a manter a democracia realmente existente, sem tentar enfrear a continuidade do processo de democratização - é bem-vindo.

Não é necessário que tal candidato seja um democrata radical (quer dizer, liberal - no sentido democrático original do termo). Pode ser um democrata eleitoral ou liberal formal que não queira dar um golpe de Estado (rápido, com tanques nas ruas, ou lento, por erosão da democracia).

Pode ser qualquer um que não queira transformar nossa democracia eleitoral em uma autocracia eleitoral ou mesmo paralisar o processo de democratização para que nossa democracia eleitoral não chegue a ser uma democracia liberal.

Pode ser qualquer um que não queira usar seu cargo para conquistar hegemonia sobre a sociedade a partir do Estado aparelhado por um partido ou por algum movimento para se delongar no governo.

Pode ser qualquer um que não queira, a partir do Estado, educar a sociedade.

O melhor é que não seja alguém muito carismático, que ocupe excessivamente a cena pública com seu protagonismo, sufocando os demais atores e suas iniciativas.

O ideal é que seja alguém discreto, que cumpra suas funções constitucionais e que seja como aquele juiz que pouco aparece numa partida. Governos existem para servir a sociedade e não para tomar o seu lugar.

Sendo assim, não estaríamos mal-servidos com (em ordem alfabética) Amoedo, Doria, Eduardo Jorge, Huck, Leite, Maia, Mandetta, Marina, Meirelles, Roberto Freire, Rossi, Tasso, Tebet - entre outros. Ou até, como última alternativa, com Ciro (ainda que isso possa significar ter que assinar um contrato temporário com o século 20).

*Consultor, palestrante e escritor


O terrível cenário revelado pela CPI

Míriam Leitão / O Globo

A CPI encontrou rastros de movimentação financeira atípica no montante de R$ 50 milhões ao analisar os documentos resultantes das quebras de sigilo. São, segundo o senador Alessandro Vieira, transações entre empresas do empresário Francisco Maximiano, da Precisa, e com pessoas físicas. Segundo o senador, são “movimentações sem lastro na realidade, compatíveis com processos de lavagem de dinheiro”.

Vieira acha que não há como fugir da convocação do ministro Braga Netto. “Ele fazia parte da cadeia de comando”. O relatório final da Comissão pode ser enviado ao Tribunal Penal Internacional.

Eu entrevistei o senador Alessandro Vieira, membro suplente da CPI, e que está em vários grupos temáticos que têm trabalhado durante o recesso. A entrevista foi ao ar na Globonews, no meu programa de segunda, às 23h30. perguntei a ele sobre Airton Cascavel, o personagem cuja história foi contada no programa Conexão Globonews.

Airton Cascavel é uma figura meio estranha. Negociava com governadores de estado a compra de equipamento, liberava dinheiro público do combate à Covid, reuniu-se com parlamentares, trabalhou durante dois meses sendo apresentado como o principal assessor pelo próprio ministro Pazuello e nunca fez parte dos quadros do Ministério da Saúde. O senador admite que a CPI tem limitações e precisa evitar perder-se no cipoal que sempre se forma nos casos de corrupção.

— É um risco. A CPI não pode fazer busca e apreensão, interceptação telefônica ou negociar delação premiada. Isso tudo dificulta investigação de maior complexidade. Por outro lado, o foco da comissão é investigar as ações e omissões do governo federal na pandemia. Os erros e as protelações na compra de vacinas e insumos, e a falta de uma campanha de comunicação provocaram centenas de milhares de mortes e isso está provado e documentado. Quando a gente investiga a corrupção é para saber as motivações para os erros. Dois grupos, um de militares da reserva e outro vinculado ao centrão, brigaram nas entranhas do Ministério da Saúde buscando vantagens financeiras. É nessa etapa que a CPI se encontra, mas ela não pode perder o foco, que são as vidas que nós perdemos.

A CPI formou um grupo de juristas que vai preparar um estudo para “dar um encaixe dos fatos e a tipificação penal”, segundo o senador. O professor Miguel Reali chefia o grupo de juristas. Perguntei ao senador o que será feito com o relatório quando ficar pronto:

— Os crimes de responsabilidade devem ser encaminhados à Câmara, os crimes comuns à Procuradoria Geral da República e, eventualmente, os fatos podem ser levados ao Tribunal Penal Internacional, para avaliar o cometimento de crime contra a humanidade. É muito grave o que aconteceu no Brasil e o que ainda acontece, nessa gestão totalmente descolada daquilo que a Constituição exige, que é o respeito à vida.

O senador lembrou que existe uma cadeia de comando clara, que vai do ex-secretário executivo do Ministério da Saúde coronel Élcio Franco, o general Pazuello, e ministros Braga Netto e Ramos e o próprio presidente da República.

— Não dá para fugir (na hora da responsabilização) da cadeia de comando. Alguns temem fazer a convocação do ministro Braga Netto por conta da posição que ele ocupa agora como ministro da Defesa. Mas ele fazia parte da coordenação da resposta brasileira à pandemia e o resultado foi desastroso. A gente precisa ouvir essas pessoas e, se for o caso, responsabilizá-las sem nenhum tipo de preocupação com a questão de farda. No Brasil, ainda se tem muito medo dos generais, mas quando ele ocupa um cargo civil eu não posso dar um tratamento diferenciado.

Sobre o presidente, o senador disse que ele “testa os limites da democracia”, e o país não pode esperar “até outubro de 2022 para saber se vai ter golpe ou não”. Por isso ele entrou com uma interpelação judicial de Bolsonaro junto ao Supremo para que ele diga que provas tem de fraude eleitoral.

— O ataque diário é preparação para um auto golpe. Ele mente com foco, com organização. Usa a mentira como método. E tem objetivos. O principal é atacar a democracia. Não dá para tolerar dois anos de mentiras e ataques ao sistema de eleição.

Segundo Alessandro Vieira, a CPI revelou que no Ministério da Saúde atuavam o centrão e o “centrão de fardas”.


Lula joga parado e Bolsonaro erra o passe

Enquanto petista administra placar, presidente faz faltas em si mesmo

Andrea Jubé, do Valor Econômico

No futebol, “o craque é decisivo”, escreveu Nelson Rodrigues. O time é indispensável, mas o que leva público ao estádio e faz bilheteria é o craque. “No time de Pelé, só ele existe, o resto é paisagem”, sentenciou.

Parafraseando o cronista, na política nacional, até agora, dois políticos dominam a bola: os veteranos Luiz Inácio Lula da Silva e Jair Bolsonaro.

Faltam 15 meses para as eleições, a política é como nuvem e tudo pode mudar. Mas na partida de hoje, a terceira via é paisagem.

A frase de Nelson Rodrigues sobre a importância do craque aparece em uma crônica de 1966, na célebre coluna “À sombra das chuteiras imortais”, na qual ele repercutiu uma entrevista do técnico alvinegro Admildo Chirol, crítico das “estrelas solitárias do futebol”. Para Chirol, o “personalismo” era inconcebível no futebol, que deveria ser marcado pelo “coletivismo”.

Rebatendo Chirol, o cronista ponderou que, historicamente, o coletivo não empolga as multidões. “Ninguém admite uma fé sem Cristo, ou Buda, ou Alá, ou Maomé. Ou uma devoção sem o santo respectivo. Ou um exército sem napoleões... No futebol, a própria bola parece reconhecer Pelé ou Garrincha e só falta lamber-lhes os pés”, argumentou Nelson Rodrigues. Para o autor, o torcedor - e quiçá, o eleitor - exige o “mistério das grandes individualidades”.

A premissa rodriguiana vale para a política nacional, historicamente marcada pelo culto a personalidades, como Getúlio Vargas, Juscelino Kubitschek, Tancredo Neves, que nem chegou a tomar posse, mas entrou para o imaginário afetivo do eleitor. Lula e Bolsonaro despontam como os craques contemporâneos da política nacional, já que, segundo vários institutos de pesquisas, detêm a maioria expressiva das intenções de votos para a disputa presidencial.

Ainda na esteira da tese da individualidade dos craques, é sintomático que o presidente da República, que quer a reeleição, nem esteja filiado a um partido há meses, desde o rompimento com o PSL. Seu partido é o “bolsonarismo”, que se contrapõe ao “lulismo”.

Desde que a pré-campanha esquentou, com Lula em ascensão nas pesquisas e a terceira via ainda fazendo água, petistas e aliados se dividem sobre a estratégia de jogo. A leitura predominante é de que Lula está jogando parado, enquanto Bolsonaro comete faltas em si mesmo.

O presidente persiste no erro na condução da pandemia, ao insistir no negacionismo das máscaras e na recomendação de medicamentos sem eficácia contra a covid-19. Bolsonaro chuta as próprias canelas ao proferir ataques quase diários a autoridades dos demais Poderes e às instituições, como a Justiça Eleitoral e o Supremo Tribunal Federal.

Há cerca de 15 dias, Lula ouviu de um interlocutor que para chegar à eleição na liderança das pesquisas, deveria simplesmente fazer o que já está fazendo: jogar parado.

“Eu disse a ele: o cavalinho está se aproximando arreado, devagarinho, e vai passar na sua porta, pronto para o senhor montar”, relatou à coluna este interlocutor de Lula. “Não faça nada”, recomendou.

A exemplo de um meio-de-campo experiente, Lula administra a vantagem de até 20 pontos, em alguns cenários de segundo turno, sobre Bolsonaro. Cadencia o jogo. Não aceita provocações dos adversários, evita as bolas divididas e não parte desesperado para o ataque, para não sofrer um contra-ataque fatal aos 45 do segundo tempo.

É um estilo de jogo que nem sempre enche os olhos da torcida, mas que tem se mostrado eficiente para prolongar o placar elástico sobre Bolsonaro. Lula joga parado, como se dissesse, fiel à velha máxima futebolística: “quem corre é a bola” (ou os adversários, no caso).

O estilo cauteloso vai se repetir na viagem ao Nordeste, remarcada para a primeira quinzena de agosto. Lula visitará seis Estados: Bahia, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Ceará, Piauí e Maranhão. Fará poucas agendas, fechadas, ou restritas a um público pequeno, no protocolo da pandemia. Além de se reunir com lideranças locais, estão previstos compromissos pontuais, como visitas a escolas, ou alguma obra relevante, que seja cartão-postal do governador aliado.

Há no PT, entretanto, quem discorde desse modelo de jogo e cobre mais movimentos de Lula. “Quem joga parado, no futebol, precisa distribuir o jogo. Ou seja, colocar o time em movimento para chegar ao gol”, argumenta um decano do PT.

Para este petista, “é tempo de organizar a equipe, definir as posições de cada um e partir para o ataque”. Alerta para o risco de se restringirem à “visão romântica do diálogo”, prática de eleições passadas, num cenário de vale-tudo eleitoral.

Este petista acredita que o momento urge porque “o adversário, temporariamente enfraquecido, tenta reorganizar-se e alterar a tática”. De fato, Bolsonaro num momento de derretimento nas pesquisas, reorganizou o time e deve colocar o seu camisa 10, o senador Ciro Nogueira (Progressistas-PI), na Casa Civil.

O vice-presidente nacional do PT e um dos organizadores da viagem de Lula ao Nordeste, deputado José Guimarães (CE), reclamou dos “intérpretes do pensamento alheio” dentro do partido e afirmou à coluna que o ritmo de Lula nessa etapa de pré-campanha está calibrado.

“Lula não está discutindo eleição, está preocupado com os problemas do país”, afirmou o dirigente petista. Segundo Guimarães, nas reuniões que fará durante a viagem pelos seis Estados nordestinos, Lula quer retomar a agenda de desenvolvimento regional, discutir a fome que voltou a se alastrar e denunciar a escassez de vacinas contra a covid-19, cujo estoque esgotou-se em várias capitais.

Para Guimarães, a metáfora que se aplica ao jogo eleitoral não é futebolística, é musical. “O ritmo do Lula é a pisadinha democrática, com diálogo e mantendo a liderança da frente ampla contra Bolsonaro”.

“Pisadinha” é o novo forró, o ritmo mais popular, que arrebatou o nordestino nos últimos tempos. Dança ou futebol, a verdade é que a metáfora não importa. Porque jogador que é bom de drible, faz o rival dançar em campo.


O governo abre a porta para quem quiser surfar na onda do Centrão

Cargos, dinheiro para obras em redutos eleitorais e outras vantagens inconfessáveis. É pegar ou largar

Blog do Noblat / Metrópoles

Quer só ter uma ideia do que será a ocupação do governo pelo Centrão desde que o presidente Jair Bolsonaro decidiu entregar a chefia da Casa Civil ao senador Ciro Nogueira (PP-PI)?

Só no recriado Ministério do Trabalho, agora com o nome de Ministério do Emprego e Previdência, o ministro Onyx Lorenzoni (DEM-RS) terá 202 cargos a preencher com indicações políticas.

Indicação política é aquela feita em nome de um partido que apoia o governo. Ou feita por um deputado, senador ou governador que apoia o governo ou que mediante isso se propõe a apoiar.

Há indicações cruzadas. O atual ministro da Cidadania, João Roma, é do PL, mas foi ACM Neto, presidente do DEM, quem o indicou. ACM nega que apoie o governo.

O DEM tem seus próprios ministros no governo, como Teresa Cristina na Agricultura, mas quando cobrado, responde que foram escolhas pessoais de Bolsonaro. Assim procedem outros partidos.

Fábio Faria, ministro das Comunicações, é do PSD, presidido por Gilberto Kassab, ex-prefeito de São Paulo. O PSD terá candidato próprio à sucessão de Bolsonaro ou então apoiará Lula.

O MDB já teve um ministro. Parte de sua bancada na Câmara quer aproveitar a chegada de Nogueira (foto em destaque) ao governo para indicar outro. A direção nacional ameaça expulsar quem aceite o convite.

Ide a Bolsonaro, o Messias, todos que precisem de acolhimento e de ter seus desejos saciados. O orçamento secreto serve para isso.


Cerco a Conrado Hübner Mendes

A truculência é coordenada e tem o propósito de intimidação e censura

Cristina Serra, Folha de S. Paulo

Às vésperas da Páscoa, o vírus se espalhava com fúria entre nós. Março havia fechado com 320 mil brasileiros mortos, quase 4.000 por dia. E o que fez o ministro do Supremo Tribunal Federal Kássio Nunes Marques? No Sábado de Aleluia, atendeu pedido de uma associação de juristas evangélicos e liberou a presença dos fieis em templos. Dias depois, o plenário derrubou a liminar.

Na época, a decisão do ministro foi criticada em artigo de Conrado Hübner Mendes, professor de direito constitucional da Universidade de São Paulo (USP) e colunista desta Folha. Hübner Mendes tem sido observador atento de desvios e falhas do Judiciário, em especial do STF, prestando serviço inestimável aos leitores, ajudando-nos a entender o funcionamento do mais opaco dos Poderes.

Sabe-se agora que Sua Excelência não gostou do texto e pediu investigação criminal ao procurador-geral da República, Augusto Aras, que já persegue Hübner Mendes por contrariedade com outras publicações do colunista, inclusive postagens em rede social. Aras entrou com uma ação na Justiça Federal e com representação no Conselho de Ética da USP. A truculência é coordenada e tem o propósito de intimidação e censura.

Autoridades deveriam entender que a submissão ao escrutínio público é inseparável do exercício do poder. Não é o caso, obviamente, do ministro e do procurador-geral, que agem como instrumentos do bolsonarismo. Ambos desconhecem —ou fingem desconhecer— que a liberdade de expressão é direito consagrado na Constituição e reafirmado pelo Supremo.

O cerco a Conrado Hübner Mendes fere também a autonomia universitária. A representação contra ele está parada no âmbito da Reitoria da USP. Investidas autoritárias têm que ser enfrentadas sem medo e hesitação. O corpo docente precisa ter a certeza de que a universidade está do seu lado contra qualquer tentativa de silenciamento.


Governo militar do Centrão

Carlos Andreazza, O Globo

Braga Netto, ministro da Defesa (e um dos grandes salários de Brasília), mandou avisar que, sem o “voto eletrônico auditável”, não haverá eleições em 2022. O recado destinara-se ao presidente da Câmara. Assim informou o Estadão; que também descreveu a forma como Arthur Lira recebera a mensagem: movimento grave, em função do qual procurou Bolsonaro para lhe dizer que iria até o fim com o presidente, mesmo que para perder a eleição, mas que não contasse com ele para qualquer ato de ruptura institucional.

A leitura do episódio propõe fotografia fácil: o presidente da Câmara impondo limites ao general golpista. (Voltaremos a isso.)

As reações à publicação da notícia a confirmaram. Lira, que em off negava a ameaça, publicamente ensaboava-se de nem-nem para declarar que, independentemente de qualquer intimidação, votaremos no ano que vem — um velho expediente de quem não quer ser desmentido. A foto estava boa para o deputado. A nota de Braga Netto a nos comunicar que ele, assumindo-se como agente político, move-se de maneira ainda mais ostensiva, que não precisa de intermediários para falar a outros Poderes e que é isto mesmo, asseverado por escrito: à vontade para disparar manifestos políticos e fazer carga sobre o Parlamento, com o peso de quem controla o paiol, por uma pauta — do populismo autoritário bolsonarista — que atribui ao governo federal e que, não havendo mais fronteiras entre Planalto e instituições impessoais de Estado, estende às Forças Armadas. Uma demonstração de musculatura. Estava bom para o general.

Braga Netto é o panfleto circunstancial a defender uma compreensão viciada que circula desde o tuíte em que o general Villas Bôas advertiu o Supremo (à véspera de o tribunal deliberar sobre habeas corpus de Lula, em 2018), que contaminou o Exército e que avança por Aeronáutica e Marinha: que as Armas, autorizadas por leitura doente da Constituição, comporiam espécie enviesada de poder moderador — a serviço de Bolsonaro para tutelar Legislativo e Judiciário.

O subserviente Braga Netto expressa o comando golpista do presidente. Bolsonaro não manda recado por terceiros e está diariamente dizendo, a quem quiser ouvir, que, sem a contagem de votos como deseja, não haverá eleições. (Como é intelectualmente desonesto e depende do conspiracionismo para existir, o bolsonarismo acusará fraude de qualquer maneira, com ou sem voto impresso.) Nada pode ser mais grave; o general sendo somente mais um estafeta muito bem aquinhoado para dispor as Forças Armadas aos interesses autoritários do mito.

Voltemos a Arthur Lira. Saiu bem na fotografia do episódio. Como democrata, garantidor da República contra a ameaça de golpe. Contra a ameaça de um golpe que é a mais perfeita impossibilidade. Lira reagindo a um golpismo do século XX, com tanques na rua para desfechar a tal ruptura — o que, por absoluta falta de meios, não haverá. Lira reagindo, pois, a um inimigo artificial, a um espantalho, fantasia que talvez ele próprio tenha criado, enquanto se cala — mui bem acolhido pelo golpista — ante os modos do verdadeiro ataque de Bolsonaro, aquele executado progressivamente, num investimento constante para minar, por dentro, o equilíbrio institucional, para esgarçar o tecido social, para destroçar a guarda constitucional, para enfraquecer a confiança no sistema eleitoral, para dilapidar, carcomendo os fundamentos, a democracia representativa e, mais amplamente, a democracia liberal; para o que colabora o presidente da Câmara, passador agressivo de boiada, atropelador dos instrumentos de defesa regimental das minorias legislativas.

Golpe, aquele (impossível) com ruptura institucional modelo 1964, é ruim para os negócios. Lira não aceita. Mas não só compõe com o populismo autoritário, esse (real) que golpeia por desgaste, sem tirar-lhe a fartura das tetas do Estado, como é sócio do governo militar de Bolsonaro. Não apenas alguém que mama, mas que controla o destino e o ritmo da ordenha. Governo militar do Centrão. Ou, como preferiria o professor Wilson Gomes, já que Centrão seria figura amorfa que não se poderá punir nas urnas: governo militar do Progressistas, com Ciro Nogueira, com general Heleno, com tudo. Sócios.

Prudência, portanto, antes de olhar para arranjo eventual do governo e logo supor que os militares perdem espaço para Lira e turma. São sócios. E só reforçam a sociedade. O governo é militar; e são os militares, os generais ramos e outros com teto duplex para remuneração, os primeiros a compreender a importância do orçamento secreto e da necessidade objetiva de ter a operação de um profissional tocada desde o Planalto. Os generais investiram as próprias Forças Armadas no sucesso do governo. Precisam da reeleição em 2022.

Nada mais representativo deste momento decisivo do que o presidente falando — ocorrência raríssima — a verdade. Sim, o capitão é — sempre foi — do Centrão. Um militar condicionado pela cultura do Progressistas. Mas não da gema do Centrão. Bolsonaro é das bordas, catador de migalhas, de rachadinhas. Um marginal do Centrão. Do Centrão ressentido. Assentado — imaginemos uma daquelas pizzas gordurosas que levam recheio na borda — dentro da casca, aboletado no catupiry da extremidade, condição ideal para que constituísse bem-sucedida empresa familiar. Nunca esteve sozinho.

Se gritar “pega Centrão”, Ricardo Barros corre com Pazuello (e Elcio Franco) no colo.


Radiografia das ‘lives’ e discursos de Bolsonaro mostra escalada de autoritarismo e desinformação

Análise do vocabulário do presidente feita pela Lagom Data para o EL PAÍS expõe aumento de falas contra o sistema eleitoral, maior simbiose com Exército e informações erradas sobre vacinas. YouTube retirou do ar vídeos do presidente com dados médicos incorretos

Marcelo Soares, El País

No primeiro semestre de 2021 Jair Bolsonaro subiu o tom de suas falas, intensificando a frequência a referências autoritárias. A 14 meses das eleições presidenciais, reforçou a campanha de desconfiança sobre o sistema eleitoral brasileiro. Passou também a usar com mais frequência em suas lives no YouTube expressões como “meu Exército” e “minhas Forças Armadas”, em que evoca simbiose com os militares e se apropria para uso pessoal da atribuição constitucional de que foi incumbido. E se finalmente o Governo Bolsonaro abraçou a campanha de vacinação contra a covid-19, nas transmissões nas redes sociais o presidente seguiu difundindo informações errôneas sobre a doença. É o que aponta uma análise dos padrões de falas e discursos do presidente, feita com exclusividade para o EL PAÍS pelo estúdio de inteligência de dados Lagom Data. É esse discurso que molda as decisões políticas e sanitárias do Governo, ainda que as ideias afrontem a democracia e a ciência.

Vários dos vídeos em que Bolsonaro espalha desinformação sobre a covid-19 foram tirados do ar pelo YouTube na última quarta (21), numa decisão inédita. “Nossas regras não permitem conteúdo que afirma que hidroxicloroquina e/ou ivermectina são eficazes para tratar ou prevenir a covid-19, garante que há uma cura para a doença; ou assegura que as máscaras não funcionam para evitar a propagação do vírus”, explicou o canal. O vocabulário desses vídeos entrou na análise antes que ela saísse do ar. As regras do YouTube batem em cheio sobre o conteúdo produzido pelo presidente, arma poderosa para amalgamar o apoio de seus eleitores, que multiplicam quase instantaneamente as informações divulgadas por Bolsonaro.


MAIS INFORMAÇÕES


Para a análise, o Lagom Data coletou a íntegra do texto dos 406 discursos de Bolsonaro disponíveis no site oficial do Planalto, além das legendas automáticas de 89 das 110 lives do presidente, entre sua vitória eleitoral, em 2018, e o final do primeiro semestre de 2021. Destas, ao menos 10 lives parecem ter sido removidas pelo YouTube, em uma nova análise feita nesta quarta pelo estúdio de inteligência de dados. Ao todo, 14 vídeos ao vivo foram retirados do canal do presidente.

“Se eu levantar minha caneta Bic e falar ‘Shazam’, eu vou ser ditador. Vou ficar sozinho nessa briga? O meu exército que tenho falado o tempo todo é o povo. Sempre digo que eu devo lealdade absoluta ao povo brasileiro, e esse povo está em toda sociedade, inclusive o Exército fardado”, disse na transmissão ao vivo do YouTube em 11 de março de 2021. Em 20 de maio, o presidente utilizou a expressão novamente para criticar as medidas de isolamento impostas pelos Governos locais por conta da pandemia. “Eu já falei várias vezes que o meu exército jamais irá às ruas para manter o povo dentro de casa, como as forças policiais de alguns governadores”.

Quando menciona a caserna, Bolsonaro gosta de fazer reminiscências do seu passado militar (ele foi capitão do Exército), afirmações grandiloquentes sobre sacrificar a própria vida e soberania do povo e elocubrar sobre “o inimigo”, uma referência velada ao combate ao “comunismo” muitas vezes tratado como sinônimo de esquerdismo ou petismo. Presidente que mais empregou militares na administração pública desde o fim da ditadura, Bolsonaro, desde a posse, já falou em 31 formaturas de academias militares e policiais ―23 das Forças Armadas, 8 de polícias militares, uma frequência de participação que não era comum a outros presidentes.



“Quando estava no Exército, Bolsonaro era um estorvo que foi afastado por motivos políticos em 1988. Em 2014, 2015, ele foi transformado num mito. No poder, virou um cavalo de troia, para que esse grupo ocupasse os espaços de poder. Cabeça, tronco, membros, entranhas e alma do Governo”, afirmou ao repórter Afonso Beniteso coronel da reserva do Exército Marcelo Pimentel, que enxerga no comando do país um “Partido Militar”.

Caos nas eleições e vacinas
Em março de 2020, um ano e cinco meses após ser declarado vencedor da eleição presidencial, Bolsonaro prometeu em Miami apresentar supostas evidências de que, devido a uma fraude, não conseguiu vencer no primeiro turno as eleições de 2018. Desde então, tem se esquivado de apresentar essas tais provas às autoridades competentes, o que não o impede de voltar a fazer as mesmas acusações.

A análise do seu vocabulário mostra que as eleições de 2022 têm presença constante no seu discurso desde os primeiros meses do seu mandato. Essas menções vêm se avolumando desde outubro de 2020, e cresceram no primeiro semestre de 2021. Desde janeiro, as expressões “voto impresso” e “voto auditável” também aparecem com mais frequência na fala do presidente. Nas lives, elas já apareceram 27 vezes. Em discursos, 16.

Na live de 25 de junho, o alvo foi a campanha contra o sistema eleitoral: “Ministro [Edson] Fachin, o mesmo que proibiu policiais militares do Rio de Janeiro de entrar na comunidade atrás de vagabundo, o mesmo que proibiu que helicópteros façam operações dentro de comunidades, agora disse que quem luta pelo voto auditável comete um ato de violência contra a Constituição. Dá para entender? Dando palpite. Palpiteiro!”, disse Bolsonaro.



Se nos discursos, geralmente em ocasiões solenes, o presidente usa um vocabulário mais comedido e muitos cumprimentos, é nas lives, destinadas a sua base mais fiel e radicalizadaque ele afrouxa a gravata e faz a maior parte das menções distópicas. Em média, Bolsonaro fala durante 49 minutos em suas transmissões ao vivo semanais. Seus discursos, por sua vez, tendem a ser mais curtos. A live mais longa, de 1º de julho deste ano, teve quase uma hora e cinco minutos. Com isso, o conjunto completo de falas analisadas forma uma massa de vocabulário mais extensa do que a Bíblia: são 871.412 palavras ―sites religiosos estimam que o texto completo da Bíblia tenha até 810.000 palavras, dependendo da tradução.

Essas diferenças entre discurso formal e o feito sob medida para mobilizar para seus seguidores também fica claro no manejo discursivo da pandemia de covid-19. No segundo semestre de 2020, a bala de prata favorita de Bolsonaro para enfrentar a covid-19 era a cloroquina, ou hidroxicloroquina, remédios prescritos para malária que o Governo transformou em política de Estado pela qual agora nenhum ministério se responsabiliza, como mostrou o EL PAÍS.

As menções ao fármaco se reduziram a quase nada no final do ano, quando a busca pelas vacinas se tornou o principal assunto do Brasil. As citações ao remédio voltaram, agora de maneira defensiva, após a abertura da CPI da Pandemia, no final de abril. Neste mês, o órgão técnico que assessora o Ministério da Saúde finalmente enviou documento à CPI no qual afirma que os remédios do chamado “kit covid” promovido pelo Planalto, mas também por clínicas privadas, não têm qualquer efeito para mitigar a covid-19. E e o YouTube tomou sua primeira reação oficial contra esses vídeos, o que pode culminar com a suspensão do próprio canal pessoal do presidente.

As falas de Bolsonaro sobre a vacina neste ano flertam com contradições o tempo inteiro: numa mesma live, ele pode questionar a eficácia e a segurança das vacinas num momento para, minutos depois, afirmar que por virtude sua o Brasil é um dos países que mais vacinam no mundo. Na live de 24 de dezembro, por exemplo, ele disse que a eficácia da Coronavac ―de tecnologia chinesa e fabricada ao Brasil pelo Instituto Butantan por iniciativa do Governo de São Paulo― seria “lá embaixo”.

Mesmo depois de fazer um discurso em cadeia de rádio e TV em março defendendo a imunização, Bolsonaro segue sabotando a campanha pela vacina com informações equivocadas, como a de quem já teve covid-19 não precisa se vacinar: “Todos que contraíram o vírus estão vacinados, até de forma mais eficaz que a própria vacina porque você pegou o vírus para valer. Então, quem contraiu o vírus, não se discute, esse está imunizado”, afirmou Bolsonaro em live em 17 de junho.



Antes da iniciativa desta semana do YouTube, outras dez lives já haviam sido retiradas do ar, especialmente quando afirmações feitas por Bolsonaro tiveram consequências jurídicas. É o caso do vídeo de 14 de janeiro, dia em que faltou oxigênio em Manaus ―mais de 30 pessoas morreram na capital amazonense em dois dias de falta de oxigênio. Ao lado do então ministro Eduardo Pazuello, foram feitas oito afirmações checadas pela Agência Lupa. O presidente louvou, mais uma vez, os medicamentos sem eficácia comprovada contra a doença e o ex-ministro disse não saber se o distanciamento social funciona. Também desapareceu a live de 26 de março de 2020, logo no início da pandemia, quando ele dizia que a covid-19 não seria problema porque brasileiro mergulha no esgoto e não acontece nada.

Limitação de dados e transparência
Além dos vídeos retirados do ar, há uma limitação importante nos dados das lives, o que remete a mais uma questão de falta de transparência do Governo Bolsonaro. Se os discursos oficiais são transcritos rotineiramente pelo cerimonial da Presidência e publicados no site oficial do Planalto desde o Governo Fernando Henrique Cardoso, as transmissões em rede social, embora contem com infraestrutura oficial, são tidas iniciativa pessoal do presidente. Algumas chegaram a ter meio milhão de espectadores. De todo modo, como estão publicadas no YouTube, foi possível extrair a transcrição automática da maioria delas.

Para análise, essas transcrições foram mantidas como vieram, sem revisão. O algoritmo de reconhecimento de voz depende da clareza da dicção, o que não é uma marca constante das falas de Bolsonaro. Com isso, é possível que algumas menções a palavras de interesse possam ter ficado para trás porque o presidente gaguejou ou embaralhou sílabas. Palavras pouco comuns também podem ser transcritas com erro. É o caso do ministro Edson Fachin, do STF, cujo sobrenome a transcrição automática do YouTube compreende como “Faquinha”. Também não é possível automaticamente separar o que Bolsonaro diz do que seus convidados falam ―por isso, não foram analisadas palavras como “presidente”, que podem indicar uma saudação do interlocutor.

Outras transmissões ao vivo estão sem a legenda gerada pelo computador. Todas as lives de dezembro de 2020 estão nessa situação. Uma consulta ao noticiário sobre as lives do período mostra que foram nessas transmissões que Bolsonaro mais fez senões às vacinas contra a covid-19. O período coletado tampouco abrange as revelações que surgiram em julho na CPI da Pandemia sobre os negócios suspeitos que teriam sido endossados por autoridades do Ministério da Saúde para comprar vacinas tendo empresas improvisadas como atravessadoras.

“Parte da imprensa”
É nas lives, de longe, que Bolsonaro faz a maior parte dos seus ataques à imprensa. Menções genéricas às palavras “imprensa” e “mídia” se avolumam ao sabor das críticas recebidas pelo presidente, e tiveram seu ápice em junho de 2020. Foi naquele mês, logo após a entrada de Eduardo Pazuello no Ministério da Saúde, que o Governo tomou medidas para tentar ocultar dados de mortes causadas pela covid-19.



Desde meados de maio, a divulgação dos dados atrasava um pouco mais a cada dia, até que, questionado por jornalistas, Bolsonaro estourou: “Acabou matéria do Jornal Nacional”. Os dados eram propositalmente atrasados para que não fossem mostrados em horário nobre. Naquele dia, o Jornal Nacional entrou com boletim urgente na TV assim que os dados foram anunciados. Na semana seguinte,numa decisão que teve a participação do empresário Carlos Wizard, aliado de Bolsonaro e agora alvo da CPI da Pandemia, o Ministério da Saúde deixou temporariamente de publicar os dados diários sobre a covid-19 até que o Supremo Tribunal Federal ordenou que voltasse a publicá-los.

As menções à imprensa também se avolumam ao longo do primeiro semestre deste ano. As palavras Folha e Globo, nomes de duas das maiores empresas de comunicação do Brasil, foram mais citadas neste semestre do que em todo o segundo semestre de 2020. Em 2020, tem destaque o uso da expressão fake news por parte do presidente, tanto para defender a si e a aliados de processos por atos democráticos e desinformação quanto para acusar empresas de comunicação de mentir.

Em diagrama que mostra a estrutura do discurso, chamada de árvores de palavras, é possível ver estatisticamente a frequência com que outras palavras acompanham os termos de interesse na fala de Bolsonaro, em lives e em discursos. É mais fácil ele fazer referências à “grande mídia” e “parte da imprensa” em lives do que em situações formais, por exemplo.


Ciro Nogueira aceita convite de Bolsonaro para ocupar a Casa Civil

Anúncio foi feito nas redes sociais pelo parlamentar, que falou em 'dedicação em busca do equilíbrio'

Ricardo Della Coletta, da Folha de S. Paulo

Presidente do PP, o senador Ciro Nogueira (PI) aceitou o convite de Jair Bolsonaro para ser o novo ministro da Casa Civil.

O anúncio foi feito pelo parlamentar no Twitter. "Acabo de aceitar o honroso convite para assumir a chefia da Casa Civil, feito pelo presidente Jair Bolsonaro", escreveu Ciro. "Peço a proteção de Deus para cumprir esse desafio da melhor forma que eu puder, com empenho e dedicação em busca do equilíbrio e dos avanços de que nosso país necessita.


Na manhã desta terça-feira (27), o senador esteve no Palácio do Planalto por cerca de duas horas, para uma reunião com Bolsonaro.

A chegada de Ciro ao Planalto não deve ser a única mudança no primeiro escalão.

Pelo desenho definido, a reforma ministerial envolve trocas em três pastas: o senador pelo Piauí vai para a Casa Civil no lugar do general Luiz Eduardo Ramos Ramos, que deve passar para a Secretaria-Geral da Presidência —ocupada hoje por Onyx Lorenzoni.

Já Onyx deve ser titular do Ministério do Emprego e Previdência, a ser recriado com o desmembramento do Ministério da Economia.

Após o encontro no Planalto, Ciro compartilhou uma foto em que, além de Bolsonaro, também aparecem o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e os ministros Ramos, Fábio Faria (Comunicações) e Flávia Arruda (Secretaria de Governo). "Tenho certeza também de que contaremos com o apoio do meu querido amigo Arthur Lira, presidente da Câmara dos Deputados, nessa honrosa missão", disse o senador, na publicação.

Ao deixar o Planalto, Ciro apenas afirmou que a posse deve ser "o mais rápido possível" e confirmou a recriação do ministério do Emprego.

Também nesta terça, Ramos confirmou sua transferência para a Secretaria-Geral.

"Seja bem-vindo Ciro Nogueira ao time Jair Bolsonaro. Desejo muito sucesso na Casa Civil. Agradeço aos servidores que estiveram comigo nessa jornada e sigo em nova missão determinada pelo Presidente da República na Secretaria-Geral. Tenham certeza que mais uma vez darei o meu melhor em defesa do Brasil", escreveu Ramos em uma rede social.

O convite de Bolsonaro para que Ciro Nogueira vá para a principal pasta do Palácio do Planalto é a jogada mais robusta que o presidente fez até aqui para assegurar o apoio de partidos e da base de congressistas ao seu governo.

Parlamentares, sobretudo os do centrão, vinham pressionando pela saída de Ramos da Casa Civil.
A avaliação é que o general não tem traquejo político, falha na articulação com o Legislativo e breca demandas de senadores e deputados, como a liberação de emendas.

Há ainda a constatação de que, com a proximidade das eleições de 2022, é preciso ter alguém na Casa Civil que saiba dar visibilidade aos feitos do governo.

Aliados também esperam que Ciro Nogueira costure as alianças políticas necessárias para a campanha de reeleição de Bolsonaro.

A prioridade para articuladores políticos e dirigentes de siglas que hoje pretendem apoiar a campanha à reeleição de Bolsonaro é a reformulação do Bolsa Família e outras medidas que impulsionem a recuperação da economia em 2022, após a vacinação da população contra a Covid-19.

A aposta é que, com um programa de forte apelo popular e uma economia aquecida, o presidente deve conseguir recuperar a popularidade.

Atualmente, pesquisas indicam aumento na reprovação do governo e favoritismo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para o pleito do próximo ano.

Ao trazer o senador para o coração do governo, Bolsonaro sela seu casamento com o centrão —grupo de legendas fisiológicas que, na campanha de 2018, era frequentemente criticado pelo então presidenciável.

O episódio que marcou o discurso contra a velha política na campanha foi protagonizado pelo atual ministro do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), Augusto Heleno. "Se gritar pega centrão, não fica um, meu irmão", cantou o general num ato partidário de 2018. Em sua versão, ele canta “centrão” no lugar de “ladrão”, que consta na letra original composta por Ary do Cavaco e Bebeto Di São João.

Pouco mais de dois anos depois, o discurso mudou radicalmente. "Eu nasci de lá [do centrão]", afirmou Bolsonaro nesta quinta-feira (22), também em entrevista. "Eu sou do centrão."

A aproximação do chefe do Executivo com o centrão ocorre em um momento de extrema fragilidade do governo, quando Bolsonaro se vê ameaçado por mais de cem pedidos de impeachment e pelo avanço da CPI da Covid, que tem jogado luz sobre supostos casos de corrupção na gestão.

​Hoje o governo Bolsonaro tem 22 ministérios, 7 a mais do que os 15 prometidos na campanha eleitoral de 2018. Sob a gestão de Michel Temer (MDB), seu antecessor, eram 29 pastas.

A administração atual chegou a ter 23 órgãos com status de ministério. Porém, o Banco Central perdeu este status com a aprovação de sua autonomia.


Quem tem medo do impeachment?

Engrossa a adesão de centro-esquerda e centro-direita à tese do afastamento de Bolsonaro, mas, em contrapartida, cresce a resistência da esquerda tradicional 

Luiz Carlos Azedo / Nas entrelinhas
Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado

Existe uma explicação para a surpreendente troca de ministros na Casa Civil, com a entrada do senador Ciro Nogueira (PI), presidente do PP, no lugar do general Luiz Ramos, transferido para a Secretaria-Geral da Presidência: Bolsonaro está com medo do impeachment, já não confia na liderança e na capacidade política do grupo de generais que o cerca e teme a deriva das Forças Armadas em apoio ao vice, Hamilton Mourão, um general de quatro estrelas escanteado pelo presidente da República. Entregar o coração do governo ao Partido Progressista — herdeiro da antiga Arena e do PDS, partidos que apoiaram o regime militar — foi a maneira que encontrou para evitar que a legenda governista embarque no impeachment, diante do desgaste de Bolsonaro e da pressão das ruas a favor do afastamento.

Os generais palacianos que mandavam e desmandavam no Palácio do Planalto levaram um baile dos políticos do Centrão, que se aproveitam do enfraquecimento do governo para abocanhar fatias maiores de poder e do Orçamento da União. O último lance dessa disputa de bastidor foi o vazamento da suposta ameaça feita pelo ministro da Defesa, Braga Netto, de que não haveria eleição sem voto impresso. O novo ministro da Casa Civil teria sido o portador do recado ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que vazaria a informação para as jornalistas Vera Rosa e Andreza Matais, do jornal O Estado de S. Paulo.

A dúvida é se o vazamento foi combinado entre os dois políticos ou não. Resultado: o general acabou na berlinda, mesmo tendo desmentido a informação, porque insistiu em defender a tese de que as urnas eletrônicas não são seguras, o que é uma forma de tumultuar o processo eleitoral, além de uma atitude inadequada para quem ocupa o cargo de ministro da Defesa. Nos bastidores da política de Brasília, todos sabem que Braga Netto põe pilha na radicalização de Bolsonaro e, para agradá-lo, constrange os comandantes militares, com exceção do ministro da Aeronáutica, brigadeiro Carlos de Almeida Baptista Junior, bolsonarista convicto. A disputa entre os militares e os políticos do Centrão pelo controle político dos ministérios será a grande contradição interna do governo até as eleições.

A mudança coincide com o crescimento das manifestações de protesto contra o governo em todo o país, em parte, porque o avanço da vacinação permite que as pessoas se sintam mais seguras nas ruas, mas principalmente por causa dos quase 550 mil mortos por covid- 19 e do desmonte das políticas públicas. Esses protestos passaram por três estágios: no primeiro momento, foram manifestações convocadas pela esquerda mais radical e alguns sindicatos; depois, entraram em cena os partidos de esquerda tradicional e as centrais sindicais; agora, está se ampliando, com maior participação dos partidos de centro-esquerda, como PSDB e Cidadania, e os movimentos cívicos Vem Pra Rua, MBL, Agora,Acontece, Livres etc. Mas há contradições também na oposição.

Polarização eleitoral
O que une os protestos de rua é o “Fora Bolsonaro”, ou seja, a oposição ao governo; o impeachment de Bolsonaro empolga o senso comum oposicionista, mas não é unanimidade. Há setores que não concordam com a tese, porque afastar Bolsonaro significa entregar o governo ao general Hamilton Mourão, vice-presidente da República, e abrir espaço para a consolidação da hegemonia militar, além de facilitar o surgimento de uma candidatura conservadora competitiva, que pode ser a dele próprio e/ou de outro candidato. Esse posicionamento parte sobretudo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que lidera as pesquisas de opinião sobre as eleições de 2022.

Esse favoritismo do petista engrossa a adesão de setores de centro-esquerda e centro-direita à tese do impeachment, mas, em contrapartida, aumenta a resistência da esquerda tradicional ao afastamento, pois prefere um embate eleitoral com Bolsonaro. Há uma espécie de “me engana que eu gosto”. Uns fingem que querem o impeachment e só jogam para a arquibancada; outros dizem que são contra, mas, se houver necessidade de se livrar de Bolsonaro para permanecer no poder, não hesitarão em entrar na conspiração no Congresso, como já aconteceu antes com os presidentes Collor de Mello e Dilma Rousseff.

No terceiro ano de mandato, o governo Bolsonaro fracassa em três frentes: a econômica, a social e a sanitária. Até agora, não tem volume de entregas administrativas para garantir a própria reeleição. Bolsonaro confia o governo aos aliados do Centrão para sobreviver e chegar às eleições como alternativa de poder, na polarização com Lula. Para isso, precisa evitar o surgimento de um candidato competitivo de centro. Isso coincide com os interesses eleitorais de Lula, que também não quer uma “terceira via” que possa ameaçá-lo no segundo turno. Na velha dialética, essa é a lei da “unidade dos contrários”.

https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-quem-tem-medo-do-impeachment/

Luiz Carlos Azedo: O outro lado da praça

“Com o deslocamento da ala mais ideológica do centro do poder, o Palácio do Planalto deve ganhar mais coordenação e eficiência, porém, reforça seu distanciamento do campo político”

A confirmação da nomeação do general Braga Netto como novo ministro da Casa Civil, com o deslocamento do deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS) dessa pasta para o Ministério da Cidadania, reforça o viés bonapartista do governo Bolsonaro, o que não significa que esse seja o caráter do regime político brasileiro. Como se sabe, o bonapartismo se caracteriza pela centralização do poder na figura de um líder populista que se coloca acima das classes sociais e procura se legitimar através da comunicação direta com as massas. Estamos longe, porém, de um regime autoritário e militarista, porque o Brasil é uma democracia de massas, na qual o Congresso e o Judiciário têm grande protagonismo.

A mudança no Palácio dos Planalto completa uma troca de guarda: saiu a tropa de assalto e entrou a de ocupação. Os militares que darão as cartas no Palácio do Planalto — além do general Braga Netto, o ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, e o ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva — sempre trabalharam juntos e são mais novos e bem mais moderados do que o general Augusto Heleno, chefe do Gabinete de Segurança Institucional, que já não tem a mesma ascendência sobre Bolsonaro do começo do governo.

Em termos de imagem, a ida de mais um general para o Planalto agrega ao governo valores identificados pela opinião pública como atributos positivos dos militares, como austeridade, competência e patriotismo. Com o deslocamento da ala mais ideológica do governo do centro do poder, o Palácio do Planalto deve ganhar mais coordenação e eficiência, porém, reforça seu distanciamento do campo político propriamente dito.

Entretanto, as pesquisas de opinião estão mostrando que a estratégia de Bolsonaro de manter a polarização com a esquerda, ignorar a imprensa e manter distância dos políticos está dando resultados positivos em termos eleitorais. O presidente da República mantém grande vantagem em relação aos seus principais adversários nas pesquisas, como candidato à reeleição, enquanto o governo, que sofre desgastes por causa de suas crises, recupera pontos na aprovação. Manter-se como um político antissistema não deixa de ser uma proeza de Bolsonaro, já que está no vértice do próprio sistema.

O outro lado dessa moeda, porém, é o fortalecimento do Congresso como poder político. A postura avessa às articulações políticas de Bolsonaro levou de volta ao Congresso a negociação dos interesses da sociedade e a liderança das reformas. O presidente da República já deu demonstrações de que sua agenda prioritária é a dos costumes e de combate aos movimentos identitários, não só com declarações, mas com atos administrativos. Mas essa pauta não prospera no Congresso, muito menos no Judiciário.

Disneylândia
Bolsonaro também não se entusiasma com as propostas de reformas que podem causar desgastes com os setores que o apoiam, como policiais, caminhoneiros e evangélicos. O ministro da Economia, Paulo Guedes, que lidera as reformas econômicas no governo, também não ajuda muito, por causa de declarações bombásticas, como comparar os servidores públicos a parasitas. A última de Guedes foi um comentário desastroso sobre o câmbio, que revelou grande preconceito em relação aos mais pobres.

“Não tem negócio de câmbio a R$ 1,80. Vou exportar menos, substituição de importações, turismo, todo mundo indo para a Disneylândia. Empregada doméstica indo pra Disneylândia, uma festa danada. Mas espera aí? Espera aí. Vai passear ali em Foz do Iguaçu, vai ali passear nas praias do Nordeste, está cheio de praia bonita. Vai para Cachoeiro do Itapemirim, vai conhecer onde o Roberto Carlos nasceu. Vai passear no Brasil, vai conhecer o Brasil, que está cheio de coisa bonita para ver”, disse.

Com essas e outras, o fato é que o Congresso ganha cada vez mais protagonismo, porque os políticos sabem agarrar as oportunidades com as duas mãos e resolveram assumir como bandeiras as reformas da economia, principalmente o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Vão matar no peito a reforma tributária e a reforma administrativa, das quais o governo já abriu mão. A ironia, porém, é que o grande beneficiário das reformas, em termos eleitorais, será Bolsonaro. Enquanto o Congresso arcará com o desgaste das maldades, o presidente da República colherá os louros dos seus benefícios para a economia. Mas é do jogo.

http://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-o-outro-lado-da-praca/


Foto: Beto Barata\PR

Bruno Boghossian: Bolsonaro se afasta mais da política ao buscar novo ministro militar

Saída de Onyx simboliza desapreço do presidente por trabalho de articulação

Ao buscar um homem das Forças Armadas para ocupar o principal ministério do Planalto, Jair Bolsonaro elimina as migalhas políticas que restavam no coração do governo. O presidente já havia esvaziado as funções do deputado Onyx Lorenzoni na Casa Civil. Agora, pretende entregar a um militar as chaves do último gabinete do palácio.

Bolsonaro bateu à porta do Quartel-General do Exército e convidou o quatro estrelas Walter Braga Netto para ajeitar as confusas atividades do governo. Cada vez mais fraco, Onyx não dava conta do recado e já não participava da interlocução com o Congresso. Era um bibelô político que deve dar lugar ao quarto ministro de farda no Planalto.

O presidente nunca escondeu seu desapreço pelo trabalho de articulação. De saída, ele se recusou a montar uma base de apoio no Congresso e distribuiu de maneira descuidada entre seus auxiliares a missão de conversar com parlamentares.

A divisão de tarefas funcionou mal, e o Planalto foi perdendo credibilidade. O ex-ministro Santos Cruz, que chegou a dividir com Onyx o relacionamento com deputados e senadores, já disse que a falta de nitidez nas funções de articulação política e coordenação de programas prejudicava o funcionamento do governo.

Depois de provocar uma sequência de colisões com o Congresso, o presidente ainda tentou concentrar o trabalho político nas mãos de outro militar. Sete meses após assumir o cargo, o general Luiz Eduardo Ramos ainda é visto com desconfiança até por parlamentares aliados.

Bolsonaro parece transferir essa função para fora do palácio. Agora, o ex-deputado Rogério Marinho é a aposta do governo para azeitar a relação com o Congresso. Novo ministro do Desenvolvimento Regional, ele vai gerenciar um orçamento milionário, cobiçado por parlamentares.

Ao defenestrar o único ministro político do Planalto, o presidente terceiriza uma tarefa que despreza. A decisão de pintar mais um gabinete de verde-oliva mostra de vez que o pilar de seu governo é outro.