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El País: Eleições põem à prova o potencial das alianças anti-Bolsonaro

Pleito vai vislumbrar o potencial de frentes amplas criadas em oposição ao presidente em capitais como Rio de Janeiro e Fortaleza e se a esquerda intensifica o avanço apontado nas pesquisas em SP

Naiara Gallarraga Cortázar, El País

As prefeituras de São Paulo e Rio de Janeiro, as duas maiores cidades do Brasil, são o prato principal do segundo turno das eleições municipais que 60 cidades realizam no domingo. O primeiro turno, no dia 15, foi um revés ao presidente Jair Bolsonaro e uma vitória da direita tradicional. Ainda que sejam eleições decididas principalmente por dinâmicas locais, também permitirão vislumbrar o potencial das alianças anti-Bolsonaro ― os prognósticos para seus candidatos são ruins ― e se a esquerda intensifica o avanço que lhe dão as pesquisas em São Paulo até surpreender e ganhar a prefeitura da cidade mais rica do país.

Mesmo com pouca repercussão midiática, a violência golpeou com força a campanha. Por volta de 200 candidatos foram assassinados, feridos e vítimas de tentativa de assassinato, segundo o Tribunal Superior Eleitoral.

Para Bolsonaro, o tiro saiu pela culatra em sua estratégia de desprezar a gravidade do coronavírus, que matou 172.000 brasileiros, e culpar governadores e prefeitos pelos estragos econômicos da pandemia. O presidente parecia acreditar que os milhões de dinheiro público entregues aos brasileiros mais pobres bastariam para que os candidatos indicados por ele triunfassem. Não foi assim no primeiro turno e, de acordo com as pesquisas, também não será no segundo. Nesta semana, coincidindo com um aumento de hospitalizações por covid-19, chegou a acusar a imprensa de inventar a declaração que se transformou na síntese de sua gestão da pandemia, a de que o coronavírus é “como uma gripezinha”, palavras que pronunciou em um discurso ao país em março.

Nestas eleições “vemos um esfriamento da extrema-direita, um fortalecimento de uma direita tradicional, uma maior pluralidade na esquerda”, resume a cientista política Flavia Bozza Martins, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Ela acrescenta que em plena crise sanitária, o eleitorado apostou em políticos com experiência de gestão e castigou as candidaturas antissistema e de outsiders.

O ultradireitista apoiou no primeiro turno das eleições municipais um punhado de candidatos divididos por diversas siglas porque ele há tempos está sem partido. Dois foram ao segundo turno. Estes dois apadrinhados são sua opção para salvar a honra nas eleições. Sua principal aposta é o pastor evangélico Marcelo Crivella, que disputa a reeleição à prefeitura do Rio de Janeiro, feudo político do presidente e a segunda maior cidade do Brasil.

Mas o desempenho ruim de Crivella no primeiro turno se somou a uma frente ampla de quase todos os outros contra ele, que acabou por afundá-lo nas pesquisas. Crivella tem por volta de 32% das intenções de voto contra 68% de Eduardo Paes, de acordo com o Datafolha deste sábado. Quase todo o arco político, da direita tradicional à extrema-esquerda, pediu voto a Paes para derrotar um prefeito que encarna o ultraconservadorismo e gera grande repúdio.

O apoio a Paes é entusiasta em alguns casos. Outros votarão nele tapando o nariz. Por que o que foi o prefeito do Rio nos anos da Copa e das Olimpíadas é cercado por suspeitas de corrupção, ainda que nunca tenha sido formalmente acusado. Apaixonado pelo Carnaval, seus partidários destacam as melhorias no transporte como o grande feito de sua gestão (2009-2016).

Também em Fortaleza foi criada uma grande frente contra o candidato apoiado pelo presidente, o policial militar Wagner Souza, agora empenhado em se desvincular de Bolsonaro. Lá a aliança foi forjada ao redor do homem do clã político que manda na região, a família do esquerdista Ciro Gomes. Tem 20 pontos de vantagem em relação ao capitão Wagner.

A batalha mais encarniçada é a de São Paulo, onde Bolsonaro não conseguiu colocar seu candidato no segundo turno. O duelo é entre o prefeito, Bruno Covas, de centro-direita, e o esquerdista Guilherme Boulos, um ativista e professor que surpreendeu ao passar ao segundo turno e que desde então foi subindo até se colocar a 10 pontos de Covas. Como se não faltasse intriga à disputa, Boulos testou positivo para coronavírus na sexta-feira, o que causou a suspensão do último debate e sua entrada em quarentena. Boulos deu um impulso formidável ao pequeno Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), uma cisão nascida do flanco esquerdo do Partido dos Trabalhadores.

“Não quero gritar gol antes, mas acho que estamos em um período de paixões menos desatadas, onde aumenta a racionalidade, a escuta, o espaço às propostas de Governo, ao debate, isso que toda democracia precisa”, diz a cientista política Martins. “Isso irá se manter para (as eleições presidenciais de) 2022? Não se sabe”.

A melhor aposta do PT para salvar sua honra, após os resultados ruins no primeiro turno, está em Recife. É também a disputa eleitoral que atrai mais curiosidade porque coloca dois primos frente a frente, herdeiros de um clã político. A petista Marília Arraes e João Campos estão em empate técnico. Ambos têm 50% dos votos válidos, segundo pesquisa Datafolha deste sábado.


Eliane Cantanhêde: Eleitor dá uma grande vitória ao País

Depois de se aventurar sem racionalidade em 2018, eleitorado desta vez preferiu caminhar em terra firme e a grande vitória destas eleições é da política tradicional

As eleições de 2018 foram um hiato e as de 2020 repõem as coisas nos devidos lugares. Assim como nesses dois anos evaporaram todas as bandeiras de campanha do presidente Jair Bolsonaro, também sumiram de Norte a Sul os partidos, candidatos e compromissos inventados sob o rótulo de “nova política”. Eles não tiveram vez.

Depois de se aventurar sem racionalidade em 2018, o eleitorado desta vez preferiu caminhar em terra firme e a grande vitória destas eleições é da política tradicional, do conhecido, de quem tem serviço prestado. A direita belicosa de Bolsonaro ficou pelo caminho, junto com o PSL, militares, policiais, bombeiros e juízes que se meteram onde não deviam.

A “nova-velha” centro direita, que se contrapõe à extrema direita bolsonarista, é mais moderna e confiável, não surpreende a vantagem de DEM e PSDB, que concorreram separados, mas devem se encontrar em 2022. O DEM ganhou em primeiro turno Salvador, Curitiba e Florianópolis e, no Rio, o ex-prefeito Eduardo Paes enfrenta no segundo turno o atual prefeito, Marcelo Crivella, que tem índices recordes de rejeição.

O PSDB chega em primeiro em São Paulo, reelegeu Cinthia Ribeiro em Palmas e disputa bem em Natal, Campo Grande e Porto Velho. Se Bruno Covas for reeleito, como tudo indica, deverá gerar um outro troféu: o MDB deverá ter o maior número de prefeituras, mas os tucanos poderão governar o maior número de eleitores no País.

Na outra ponta, a esquerda surpreende bem na reta final, mas não o PT. Guilherme Boulos (PSOL) terá dificuldades contra Covas no segundo turno, porque a resistência será forte em São Paulo, mas ele já teve uma conquista: a liderança das esquerdas, que estão bem em Belém, com PSOL, Porto Alegre, com PCdoB, e numa disputa em Recife entre PSB e PT, aliás, entre bisneto e neta do velho Miguel Arraes, grande referência política no Estado.

É assim que, apesar dos problemas do TSE, já se pode concluir que o eleitorado parou de brincar de novidades perigosas e voltou a olhar quem é quem, quem fez o que e o que são e representam os reais partidos. Só isso já é uma grande vitória.


O Globo: ‘O discurso da nova política perdeu a força’, diz cientista político Jairo Nicolau

Ainda sem o resultado oficial do primeiro turno, especialista avalia que as urnas apontam para uma vitória dos grandes partidos e uma redução do impacto das redes sociais

Maiá Menezes, O Globo

Especialista nos meandros da política e autor do livro “O Brasil virou à direita”, publicado este ano, o cientista político Jairo Nicolau interpreta o resultado das urnas como um retorno ao que classifica como velha ordem, em uma eleição em que o espectro da “nova política”, que dominou 2018, se dispersou. Em entrevista ao GLOBO, ainda sem o resultado oficial das urnas, ele avalia o cenário pós-primeiro turno e o impacto desta eleição em 2022.

Na sua avaliação, o presidente Jair Bolsonaro demonstrou peso na transferência de voto?

O presidente Jair Bolsonaro não tem projeto de organizar um campo político, um partido, todo jogo dele é muito solitário. Nesses dois anos, ele perdeu lideranças que o apoiaram. Não conseguiu agregar nada coletivamente. Ele agiu, na eleição, no estilo que manteve no governo: dando apoios pessoais e ocasionais em lives. Não mirou um campo político. Apoiou candidatos diferentes entre si. Não transferiu votos para ninguém. E quem se elegeu com o poder de transferência que ele tinha em 2018 foi embora. No Rio, na reta final, ele no máximo deu quatro pontos ao (Marcelo) Crivella para chegar ao segundo turno — um candidato que tem a máquina da igreja (Universal) e da própria gestão.

O que as urnas marcaram neste 2020?

Ficou claro que o discurso da “nova política” perdeu a força. As redes sociais perderam a força, muitos candidatos que subiram com o Bolsonaro em 2018 não foram bem. O próprio Crivella tem 1/5 dos votos que teve em 2016. Vejo uma chance remotíssima de se reeleger.

O discurso da nova política então não prosperou?

Houve de fato um insucesso. A maior renovação de 2018 foi a renovação dos votos do PSL. (Em 2016) Houve uma frustração, que levou o Rio a defenestrar o candidato do ex-prefeito Eduardo Paes (o deputado federal Pedro Paulo). O (governador afastado do Rio) Wilson Witzel deu no que deu. Me parece que houve um reencontro com a política. Um entendimento de que ela deve ser feita por intermédio de lideranças. (Guilherme) Boulos (candidato do PSOL em São Paulo) é liderança política importante. Lideranças do DEM ressurgiram.

Que recado as urnas trouxeram?

A impressão é que estamos voltando a uma velha ordem. Depois de 2016 e 2018, retomamos os trilhos de 2014. Os que venceram foram os partidos maiores, mais tradicionais. É o DEM, o PSOL (que não é tão jovem). O mundo era assim. Até que veio a hecatombe de 2016, com os resultados de Rio, São Paulo e Minas reforçando um discurso antipolítica. Sem querer reforçar o clichê, tenho a sensação de que voltamos ao velho normal.

Como explicar a diferença de performance da esquerda no Rio e em São Paulo? A divisão parece ter ficado explícita no Rio.

No Rio, a gente sabe desde sempre que a esquerda sai divida. Novamente, cada um lançou um candidato. Não há garantia de que, sem a Benedita da Silva (candidata do PT, deputada federal), a Martha (Rocha, deputada estadual) teria fôlego para chegar ao segundo turno. Mas essa conta tinha que ter sido feita antes. É preciso lembrar que a esquerda, desde 1992, só concorreu duas vezes no segundo turno no Rio. O fato é que saíram maiores do que entraram.

Qual a repercussão deste resultado em 2022?

Sabemos que os vereadores serão cabos eleitorais. Mas o resultado de uma eleição municipal nem sempre espelha o de uma eleição geral. O fato é que, em 2018, havia uma expectativa de que Bolsonaro teria condições muito propícias para expandir seu poder, e um partido que concorreria com solidez. No entanto, Bolsonaro não tem nada para comemorar. Não tem partido. E seus nomes terem ido mal nas urnas é um mal sinal. Seriam os ativistas de 2022. Ficou clara a derrota de um campo que se dispersou nesta eleição.

A esquerda ganhou espaço. Mas como ficou o Lulismo?

O que aconteceu em São Paulo, com (Guilherme) Boulos foi um fenômeno eleitoral. Ele conseguiu entrar na periferia, foi criativo. Transcende a esquerda. Com um apoio explícito de Lula, talvez carregasse a rejeição ao PT. Ainda não sabemos como se dará essa influência no Nordeste (até o fim da noite, os dados ainda não indicavam o efeito da presença de Lula nas campanhas regionais).

A pandemia de Covid-19 de fato repercutiu na abstenção?

Tudo indica que esta vai ser a eleição que terá a maior taxa de abstenção do país. Algumas cidades como São Paulo ultrapassaram os 30%. Muito provavelmente a pandemia pautou isso. A abstenção já vinha subindo. Agora, certamente será muito mais alta. O aumento da rejeição à política não aumentou. O que ficou claro é que bairros onde majoritariamente moram idosos, como Copacabana, o medo do contágio falou mais alto.

Isso significa que o interesse pela eleição diminuiu?

Não. O medo da pandemia surgiu, mas o interessante é que o número de votos em branco ou nulo diminuiu. Na maioria, quem saiu, tinha candidato.


Qual capital lidera o ranking de bem-estar urbano no Brasil?

Levantamento inédito do Observatório das Metrópoles, coordenado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), revela que o Índice de Bem-Estar Urbano (Ibeu) da cidade de São Paulo é pior do que o indicador de capitais como Goiânia (GO), Aracaju (SE) e Palmas (TO). A pesquisa mediu o bem-estar nos 5.565 municípios do país.

Entre as 27 capitais, a cidade paulista ocupa a 12ª posição, com índice de 0,8119 --ela está no 1.897º lugar entre todas as cidades do país. Vitória (ES) lidera, com 0,9. Quanto mais próximo de 1,0, melhor é a condição de bem-estar urbano.

No ranking geral, considerando todos os municípios do Brasil, as cinco primeiras colocadas estão no Estado de São Paulo. Buritizal é a campeã nacional (0,951). Na 5.565.ª posição, o pior índice é de Presidente Sarney (MA), com 0,444.

Ranking das 27 capitais brasileiras

Vitória (ES) - 0,9000
Goiânia (GO) - 0,8742
Curitiba (PR) - 0,8740
Belo Horizonte (MG) - 0,8619
Porto Alegre (RS) - 0,8499
Campo Grande (MS) - 0,8275
Aracaju (SE) - 0,8214
Rio de Janeiro (RJ) - 0,8194
Florianópolis (SC) - 0,8161
Brasília (DF) - 0,8131
Palmas (TO) - 0,8129
São Paulo (SP) - 0,8119
João Pessoa (PB) - 0,7992
Fortaleza (CE) - 0,7819
Recife (PE) - 0,7758
Salvador (BA) - 0,7719
Cuiabá (MT) - 0,7704
Natal (RN) - 0,7383
Boa Vista (RR) - 0,7249
Teresina (PI) - 0,7218
Maceió (AL) - 0,7036
São Luís (MA) - 0,7003
Rio Branco (AC) - 0,6972
Manaus (AM) - 0,6903
Belém (PA) - 0,6593
Porto Velho (RO) - 0,6542
Macapá (AP) - 0,6413

O estudo Ibeu Municipal avaliou cinco indicadores de qualidade: mobilidade urbana, como o tempo de deslocamento de casa para o trabalho; condições ambientais (arborização, esgoto a céu aberto, lixo acumulado); condições habitacionais (número de pessoas por domicílio e de dormitórios); serviços coletivos urbanos (atendimento adequado de água, esgoto, energia e coleta de lixo); e infraestrutura.

A dimensão que apresenta a pior situação de bem-estar, nacionalmente, é a infraestrutura das cidades: 91,5% dos municípios estão em níveis ruins e muito ruins. Para avaliar a infraestrutura, o Observatório considerou sete indicadores: iluminação pública, pavimentação, calçada, meio-fio/guia, bueiro ou boca de lobo, rampa para cadeirantes e logradouros. Somente um município apresenta condição muito boa de infraestrutura: Balneário Camboriú (SC).

Para Marcelo Ribeiro, professor da UFRJ e pesquisador do Observatório, o Ibeu revela uma desigualdade regional. "Os municípios que apresentaram as melhores condições estão nas regiões Sudeste e Sul, um pouco no Centro-Oeste. Os piores índices, em geral, estão no Norte e Nordeste, e também no Centro-Oeste, uma zona de transição", disse.

Arquiteto e professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, Lúcio Gomes Machado destaca que Palmas e Brasília, com melhores Índices do que a capital paulista, são cidades planejadas.

"Uma cidade razoavelmente planejada, ainda que seja mal gerida, carrega durante bom tempo esse planejamento como trunfo positivo."

Segundo Machado, a falta de integração com os municípios da região metropolitana e o crescimento desordenado de São Paulo ajudam a explicar a 12ª posição entre as capitais.

Em nota, o governo do Estado disse que "trabalha continuamente para garantir as condições necessárias ao crescimento dos municípios paulistas". Procurada, a Prefeitura de São Paulo não comentou.

Campeã

Há um ano, a administradora Janete Rodrigues, 40, trocou uma vida agitada em Belo Horizonte, metrópole de 2,5 milhões de habitantes, pelos dias pacatos em Buritizal, de 4.077 moradores, no norte do Estado de São Paulo.

Ela gostou tanto do lugar que decidiu fincar raízes: arrendou uma pousada e levou o filho de 16 anos para a cidade paulista.

"Estava num nível de estresse muito alto. Vim a passeio, ver minha mãe, e decidi ficar. Aqui é tudo organizado, parece que cada coisa está em seu lugar. Já dispensei os remédios para o estresse", disse Janete.

A cidade é planejada. Todas as ruas têm rampas para cadeirantes e não há terrenos vazios na área urbana de Buritizal. As informações são do jornal "O Estado de S. Paulo".

Matéria publicada no portal UOL.


Fonte: cidadessustentaveis.org.br